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Imre Kertész. Foto: Olivier Mark |
LANÇAMENTOS
O regresso do mercado editorial
brasileiro à obra do húngaro Imre Kertész.
Lançado originalmente em 1975,
Ausência
de destino é um dos grandes livros da literatura de testemunho do
Holocausto. Escrito pelo húngaro Imre Kertész, Prêmio Nobel de Literatura, o
romance é baseado na experiência do autor, que foi ele mesmo sobrevivente de
campos de extermínio nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. A obra estava
fora de catálogo no Brasil e recebeu nova edição com tradução e posfácio de
Paulo Schiller, diretamente do húngaro. A narrativa acompanha a história de
György Köves, um adolescente húngaro de 14 anos que é retirado de um ônibus nos
arredores de Budapeste e enviado, junto a outros sessenta meninos, para um trem
com destino a Auschwitz. Judeu não religioso e sem a compreensão exata do que
estava acontecendo, ele consegue entender, em meio à Babel de línguas e
sotaques dos prisioneiros, que deve mentir sua idade. Dessa forma, ao chegar ao
campo na Polônia ele escapa do envio imediato à câmara de gás, para onde iam as
crianças de até 16 anos, e é designado para trabalhos forçados. Com uma
narrativa implacavelmente objetiva, Kertész constrói uma espécie de romance de
formação no qual vão sendo desveladas ao leitor, a partir do olhar do
adolescente, a brutalidade cotidiana e a complexa luta pela sobrevivência nos
campos. A força de
Ausência de destino vai, no entanto, muito além do
relato pessoal. A hábil construção de Kertész retrata a experiência indizível
de sofrimento de um ponto de vista singular: o de um jovem que não se vê como
vítima, que busca compreender a realidade à sua volta sem o filtro do heroísmo
ou do martírio. Essa perspectiva traz um impacto avassalador, revelando não
apenas a violência, mas também a forma como a mente humana tenta se adaptar ao
inadaptável. Publicação da editora Carambaia.
Você pode comprar o livro aqui.
Uma crônica devastadora da vida
de uma mulher na Itália do século XX.
Tendo como pano de fundo uma
Itália devastada pelo fascismo e pela guerra, esta é a história de Alessandra
Corteggiani, uma mulher que percebe que não deseja ocupar o lugar de esposa
subserviente e calada que a sociedade lhe reserva. Depois do suicídio da mãe,
ela é enviada para Abruzzo com a esperança de seguir o tradicional roteiro
reservado às mulheres da época. Mas, conforme toma consciência da “questão
feminina” e das injustiças de gênero, passa a buscar o mesmo respeito
normalmente dispensado aos homens. Quando se apaixona por Francesco, um
professor antifascista, Alessandra é lançada numa espiral de acontecimentos que
mudará o curso de sua vida para sempre. Uma joia da literatura italiana e a
obra-prima de Alba de Céspedes,
Na voz dela permanece assustadoramente
atual ao examinar os desejos, as vontades e as ambições femininas — e até onde
se está disposto a ir por libertação. Publicação da Companhia das Letras com
tradução de Joana Angélica d'Avila Melo.
Você pode comprar o livro aqui.
O retrato magistral, fiel e
desencantado de toda uma geração. Uma parábola mordaz das nossas vidas
assediadas pelas imagens e da procura por uma autenticidade cada vez mais
frágil ― e talvez inexistente.
Anna e Tom, jovem casal de nômades
digitais italianos, estão vivendo o sonho em Berlim, em um apartamento
iluminado e cheio de plantas em um bairro onde moram tantos outros jovens
expatriados como eles. Os dois são criativos, freelancers sem muitas restrições,
apaixonados por comida, política progressista, experimentação sexual e pela
noite ininterrupta da cidade. É realmente tudo aquilo com que sonharam. No
entanto, por trás dessa imagem de perfeição e privilégio nasce um mal-estar tão
profundo quanto difícil de compreender. Os anos passam. O trabalho torna-se
repetitivo, a vida social, monótona. A cidade já não tem nada de novo para lhes
oferecer. Anna e Tom sentem-se presos e atormentados por encontrar algo mais
real e genuíno. Resta-lhes perseguir em outro lugar esse sonho de autenticidade
que parece lhes escapar por entre os dedos. Quando decidem se mudar mais uma
vez, se veem vítimas de duas vidas desencontradas, uma real e outra permeada
por imagens, o que só desencadeia mais frustrações. E assim, apesar de fazerem
parte de uma época em que os jovens adultos parecem ter possibilidades infinitas,
experimentam a angústia sutil que surge da consciência de que muitos desses
caminhos podem se revelar ilusões. Com uma prosa permeada de humor e ironia,
inspirada em
As coisas, de Georges Perec, Vincenzo Latronico transforma
em texto um imaginário geracional, nascido na sociedade de consumo hiper contemporânea,
e apresenta um epitáfio consciente a força estética, emocional e até mesmo
erótica que o universo das redes pode produzir em cada um de nós. Um dos
romances mais aclamados da literatura italiana contemporânea,
As perfeições
é publicado pela editora Todavia com tradução de Bruna Paroni.
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O quinto livro de poesia de Adriana
Lisboa.
Os versos de
Antes de dar nomes
ao mundo contemplam a passagem do tempo, a transitoriedade da experiência e
a ética das relações do humano com o não humano, temas presentes em anteriores
trabalhos poéticos e ficcionais da escritora carioca. Segundo Edimilson de Almeida
Pereira, em seu texto de orelha: “Num período histórico acossado pelo abandono
e a violência, Antes de dar nomes ao mundo soa como um livro de sabedoria;
recusa a eloquência e o dogmatismo para valorizar, com discrição, a relevância
do sujeito autocrítico. Não por acaso, nas ‘Variações sobre um tema de Li Po’,
a poeta nos lembra do risco inerente àquilo que existe, incluindo a linguagem e
o conhecimento — ‘todo este meu discurso/ consignado ao chão’. Ciente de que
‘existir é um sinal de menos’ e é também júbilo pela floração do sentido,
Adriana Lisboa prenuncia uma certa beleza a ser compreendida e, talvez,
nomeada.” Publicação da Relicário Edições.
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A jornada de uma jovem
palestina pelo mundo fora do vilarejo onde nasceu e cresceu.
Nascida em um pequeno vilarejo
isolado na Palestina, com suas tradições e modo de vida particulares, Qamar, a
protagonista deste livro, está sempre em busca de conhecimento, ora no mundo
dos livros, ora por meio de suas indagações. Ao sair do vilarejo à procura de
novas experiências, ela entra em contato com outras culturas e vive uma jornada
repleta de aventuras, perigos e imprevistos, mas também de muitos aprendizados.
Viagens fabulosas em terras estrangeiras foi vencedor, em 2014, do
Etisalat Award for Arabic Children’s Literature na categoria jovem adulto e
incluído na lista de honra do IBBY (International Board on Books for Young
People) no mesmo ano. O livro sai pela editora Tabla; a tradução é de Maria
Carolina Gonçalves.
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O quarto título da Coleção
Estudos Saramaguianos, publicada pela Editora Moinhos, é um estudo acerca do
romance mais polêmico de José Saramago, O Evangelho segundo Jesus Cristo.
A primeira edição de
Do mito ao romance: o evangelho segundo Saramago foi
publicada em 2000 e permaneceu restrita a um círculo especializado. Se tantos
anos depois é resgatada nesta coleção, revista e com material inédito, é por
dois motivos: estabelecida na prodigiosa década de descoberta da literatura de
José Saramago pelos diversos campos acadêmicos, esta é uma obra precursora dos
estudos saramaguianos; e, principalmente, a atualidade e a relevância para a
leitura de um dos principais romances do escritor Prêmio Nobel de Literatura
continuam preservadas. Conceição Flores acessa
O Evangelho segundo Jesus Cristo
com uma chave que serve a duas trancas: a compreensão dos estreitamentos entre
a ficção literária e o mito cristão e das múltiplas implicações históricas,
culturais e ideológicas do cristianismo envolvidas na formação da mentalidade
ocidental, duas das principais diretrizes do romance de Saramago fundadas a
partir de uma exegese própria, a do romancista, acerca das narrativas acerca da
vida de Jesus. Através da interface literatura e mito, este livro passa em
revista uma parte essencial dos fundamentos do romance a fim de evidenciar como
o evangelho de Saramago procura a “descanonização” de uma história
arquiconhecida e o retorno de seu protagonista à natureza fora do mito e da
divinização, isto é, um “retorno de humanização” para repetir uma das definições
empregada pelo próprio autor na correspondência mantida com a estudiosa durante
o desenvolvimento deste estudo. O leitor tem agora em mãos um desses livros
fundamentais que, em linguagem acessível, escarifica a obra literária a partir
dos seus mecanismos de sentido e de significação devolvendo-nos renovada em sua
expressão.
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As mulheres e os diários de
amor.
Qual o papel dos diários na
história da literatura? Por que esse gênero é tão associado ao universo
feminino? O que os escritos íntimos de grandes escritoras nos contam sobre a
obra delas? Que função ocupa o amor, ou o fim dele, nos diários? Em seu livro
de estreia, a jornalista, pesquisadora e professora Ingrid Fagundez se debruça
sobre essas e outras questões. Mesclando uma pesquisa aprofundada sobre a
história e as transformações da escrita diarística com entradas do próprio
diário, além de passagens dos escritos de Sylvia Plath, Susan Sontag, Katherine
Mansfield, Virginia Woolf e Marie Bashkirtseff, a autora cria um texto
original. Fagundez nos convida a repensar a importância dos diários e do amor
para o fazer literário e oferece uma nova perspectiva para a chamada literatura
feminina. Gênero originalmente destinado ao registro da vida pública e aos
relatos de viagens, a escrita de diários passou por uma modificação radical no
século XIX, quando, graças à Modernidade, a vida interior se tornou
gradativamente seu principal objeto. Foi então que passou a ser o território
por excelência da mulher, a quem a escrita de outros domínios era interditada.
Essa mudança social tem um papel decisivo na transformação da literatura do
século 20. Afinal, “é impossível ‘capturar a vida’ se a gente não mantém
diários”, escreveu Plath. Pelas páginas deste
Diário do fim do amor,
acompanhamos o relato comovente do fim de um relacionamento e a busca da cura
pela escrita, ao mesmo tempo que mergulhamos nos registros dos diários de
grandes escritoras. Descobrimos, assim, não apenas aspectos importantes da obra
de cada uma, mas também as dificuldades que circundam a literatura escrita por
mulheres, pois “os cadernos delas desvendam [...] os embates para se assumirem
como mulheres que escrevem”. Nas palavras de Tatiana Salem Levy, “este é um
belíssimo livro sobre uma escritora que, na companhia de tantas outras, se
revela enquanto se cria. O que Ingrid Fagundez nos mostra [...] é o quanto as
pequenas experiências interiores guardam da imensidão do mundo”. Publicação da
editora Fósforo.
Você pode comprar o livro aqui.
REEDIÇÕES
A Nova Fronteira reedita um
segundo livro da obra de Oswaldo França Júnior.
O passo-bandeira, décimo
romance do escritor mineiro ganha 5ª edição. A narrativa nos apresenta o piloto
de caça Paulo César, que foi expulso da Força Aérea Brasileira por motivos
políticos, assim como aconteceu com o autor. O livro, no entanto, não é
biográfico. Seu subtítulo,
Uma história de aviadores, nos leva a crer
então que teremos pela frente um livro de aventuras, o que também não acontece.
A trama construída por França Júnior retrata um homem com dificuldade de se
firmar na vida, reconquistar sua dignidade e encontrar um novo propósito num
mundo que o rejeitou. Arquitetado com simplicidade, este livro é um exemplo da
maestria de Oswaldo França Júnior no mundo das letras e compõe uma obra
memorável da literatura brasileira. A edição conta com prefácio inédito do
escritor e crítico literário Eliezer Moreira.
Você pode comprar o livro aqui.
Uma nova edição do premiado
romance em que Elisa Lispector rompe com os estereótipos de mulher ao discutir
de forma original temas como divórcio, maternidade e relações familiares.
Publicado em 1963,
O muro de
pedras rapidamente angariou críticas elogiosas de alguns dos grandes
intelectuais de seu tempo e conquistou prêmios relevantes como o Coelho Neto,
da Academia Brasileira de Letras. Neste grande monólogo, conhecemos Marta, uma
mulher em conflito que se tornou refém de seu casamento tedioso e de sua
complexa relação com a mãe. Para se ver livre de sua rotina aprisionante, ela
pede o divórcio, sem contar, porém, que tamanha liberdade a levaria à
paralisia. Frustrada, Marta traça então um novo plano: se isolar no sítio da
família e se tornar mãe. Elisa Lispector apresenta com originalidade e maestria
a angústia de uma mulher que, desejando encontrar sua autonomia, caminha em
direção ao próprio isolamento. A partir dos ciclos de recomeços de Marta, esta
poderosa narrativa aborda temas considerados difíceis, como o desamparo, a
solidão e a liberdade, mas que constituem o cerne dos sentimentos humanos. A
presente edição conta com apresentação inédita de Nádia Battella Gotlib —
escritora e biógrafa da irmã Lispector mais nova, Clarice —, além de prefácio
de Jeferson Alves Masson — especialista na obra de Elisa Lispector. Temos aqui
o romance mais emblemático da escritora. Publicação da José Olympio.
Você pode comprar o livro aqui.
RAPIDINHAS
Os diários de Katherine
Mansfield. Depois da sua morte, o marido publicou em quatro volumes parte
dos cadernos da escritora. A edição completa do material aparecida anos depois chegará
aos leitores brasileiros na novíssima editora Inglesa, casa editorial interessada em obras da
literatura inglesa sob domínio público. Projeto de Nara Vidal.
Poemóbiles. A caixa
concebida por Augusto de Campos e Julio Plaza que convida o leitor a manipular
os movimentos escultóricos dos 12 poemas-objeto tridimensionais, alguns, marcos da poesia concreta, ganha nova
tiragem preservando o projeto gráfico original da publicação de 1974. Trabalho
conjunto das editoras Lote 42 e Selo Demônio Negro.
Mais Christopher Isherwood. A Companhia das Letras deve
ter obtido bom retorno com a publicação de
Um homem só. A casa publica
em abril mais um título do escritor britânico:
Adeus a Berlim. No livro,
um retrato dos anos dourados da República de Weimar.
OBITUÁRIO
Morreu José Rubens Siqueira.
Tradutor de autores como Mario
Vargas Llosa, Salman Rushdie, J. M. Coetzee, Toni Morrison, Pedro Juan
Gutiérrez, Paul Auster, Hannah Arendt, Tom Wolfe, Isaac Bashevis Singer,
William Shakespeare, Federico García Lorca, Molière, dentre outros, José Rubens
Siqueira nasceu no dia 20 de outubro de 1945 em Sorocaba, São Paulo. Foram mais
de duas centenas de livros traduzidos para casas editoriais como Companhia das
Letras, Record, Globo e Cosac Naify. Ao lado da carreira de tradutor, construiu
uma vida no teatro e no cinema a partir dos anos 1960. No teatro, além de ator,
destaca-se com a direção. Em 1970, dirigiu
Cordão umbilical, a partir de
texto de Mário Prata; da pareceria com o encenador Francisco Medeiros esteve à
frente de vários espetáculos premiados, como
Artaud, o espírito do teatro
(1984). Em 2021, adaptou
Os Lusíadas, dirigido por Iacov Hillel e
produzido por Ruth Escobar. Nesse âmbito das adaptações de obras literárias
para o teatro, constam ainda Franz Kafka, Mário de Andrade, Oswald de Andrade,
João Guimarães Rosa, entre outros. No cinema, roteirizou e dirigiu filmes como
Amor
e medo (1974),
O viajante (2022) e vários curta-metragem. Entre os
livros publicados, deixou
Uma biografia de Flávio Rangel, escrita a
partir de depoimentos oferecidos pelo também diretor teatral e tradutor ao
poeta Ferreira Gullar. José Rubens morreu no dia 16 de fevereiro de 2025.
DICAS DE LEITURA
Na aquisição de qualquer um dos
livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a
manter o Letras.
1.
O pasto incendiado, de Ariano
Suassuna
(Nova Fronteira, 640p.) Este livro é, sem dúvidas, um
acontecimento no mercado editorial brasileiro. A última vez que um livro
reunindo parte da poesia publicada do escritor paraibano foi em 1999. Organizado
por Carlos Newton Júnior, estão aqui os poemas daquela edição e uma variedade
de inéditos.
Você pode comprar o livro aqui.
2.
Em nome do desejo, de João
Silvério Trevisan
(Editora Record, 216p.) Um homem de meia-idade regressa
ao colégio interno onde realizou os primeiros estudos à procura de um exame
acerca de uma história de amor vivida nesse lugar.
Você pode comprar o livro aqui.
3.
Juntas e medulas, de Walter
Kempowski (Trad. Tito Lívio Cruz Romão, DBA, 224p.) Numa viagem-teste num
Santubara, o jornalista Jonathan Fabrizius faz um percurso à procura da parte
perdida da Alemanha e do seu próprio passado marcado pela morte da mãe logo
depois do seu nascimento e do pai, um oficial nazista morto em combate.
Você pode comprar o livro aqui.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
Neste vídeo, um recorte do programa
Os mágicos exibido na TVE-Rio
em 1979, Ariano Suassuna diz de improviso o soneto “A Acauhan - A Malhada da Onça”, escrito
como homenagem para o pai. Como se sabe, João Urbano Suassuna foi assassinado quando Ariano contava três anos, episódio que ganhou contornos diversos no imaginário literário do escritor. Em 1982, ele compôs
esta iluminogravura com o poema.
BAÚ DE LETRAS
A obra de Imre Kertész viveu certo
auge no mercado editorial brasileiro antes de ficar meio esquecida nos
últimos anos. Aqui, no
Letras, o leitor encontra referência a alguns dos
seus livros. Temos
resenha de
História policial; de
Liquidação — disponível
aqui;
e
aqui, de
O fiasco. Outros dois livros do escritor estão
neste texto.
Um homem só, de Christopher Isherwood, saiu em nova edição há quatro anos. Em 2022, o livro foi resenhado por Pedro Fernandes — leia
aqui.
DUAS PALAVRINHAS
Acredito que a arte precisa descer
ao mal, lidar com temas negativos, lançar luz, para que as gerações futuras
possam ver a memória dos outros com mais clareza.
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