Publicado em 1979, quando Elizabeth Hardwick tinha sessenta e três anos
Noites
insones faz uma sensível e literariamente brilhante reflexão sobre a
própria memória, além de ser precursor da autoficção. Nas lembranças que povoam
as noites insones da narradora — uma idosa chamada Elizabeth, internada em uma
clínica geriátrica —, figuras reais, como a cantora Billie Holiday, dividem
espaço com fictícias, as quais por vezes se misturam à vida de Hardwick, como o
personagem sem nome que alude a Robert Lowell, prestigiado poeta com quem viveu
um tumultuado casamento. O romance inclui vislumbres das corridas de cavalo no
Kentucky, dos clubes de jazz de Nova York, do bairro mais elegante de Boston,
Beacon Hill, dos canais de Amsterdã, além de encontros com comunistas, poetas e
a intelligentsia literária nova-iorquina. Ainda lança luz sobre questões que já
afligiam Hardwick na época, como racismo, sexismo e pobreza. Apesar da tristeza
incrustada nas memórias, a obra se dá ao luxo de acreditar que no futuro tudo
será diferente. Com tradução de Gisele Eberspacher, o livro sai pela editora
Instante.
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Este segundo volume da coleção
César Aira ― composta de dezesseis títulos a serem publicados ao longo de
quatro anos ― apresenta outras e diversas faces do prismático escritor
argentino que vem implodindo incansavelmente o senso comum literário. Com mais
quatro peças de um gigantesco mosaico, a caixa publicada pela editora Fósforo
traz desde uma nova tradução da
novelita mais adorada do público
brasileiro até um ensaio autobiográfico profundamente poético, espécie de
balanço da vida do escritor, sem deixar de fora, é claro, as
pulp fiction
amalucadas e adoradas (leia os detalhes de cada livro a seguir): Com tradução a quatro mãos de Joca Wolff e Paloma Vidal,
a coleção continua a oferecer posfácios de especialistas brasileiros e
escritores contemporâneos do Brasil e da Argentina, reiterando o convite para
observar de perto a constelação airiana.
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1.
O divórcio. Diz-se que
este livro foi escrito sob influência de
A divina comédia, lida por
César Aira pouco antes de concluí-lo, em 2008. Dada a espiralização de
histórias cada vez mais idiossincráticas, é mesmo provável que o autor
argentino tenha sido impactado pelos círculos do inferno de Dante Alighieri.
Dizendo assim, a
novelita pode não parecer tão divertida, mas, como
afirma Patti Smith em posfácio a esta edição “o brilhantismo do pesadelo o
torna irresistível”. De início, engatamos na história de um professor
universitário recém-divorciado que passa férias no bairro de Palermo, em Buenos
Aires. Em seguida, por uma sucessão de coincidências que põe em xeque todas as
convenções literárias, acompanhamos um incêndio, um aprendiz de artista e um
misterioso manual. Terminando, uma coisa é certa: fica-se totalmente
transformado pelo frescor criativo da cosmologia airiana.
2.
Parmênides. O político e
sacerdote grego Parmênides decide escrever um livro. Há muito com o propósito
em mente, acredita que é a peça que falta para firmar o seu prestígio na
sociedade. O hierarca deseja elaborar um tratado “sobre a natureza”, mas lhe
falta o conhecimento literário, o que o leva a contratar o poeta Perinola para
ajudá-lo. Em meio a encontros e conversas animadas, os dois constroem uma
amizade equilibrada em uma cega e mútua confiança. Assim os anos vão passando,
e o livro, sonho de um e motivo de angústia para o outro, parece não deixar o
mundo das ideias. Tecida com o fio da mais fina ironia, esta
novelita
contém reflexões antológicas sobre o ofício de escritor, o reconhecimento
profissional e as contradições imiscuídas na equação tempo e dinheiro. E, como
afirma Antonio Marcos Pereira no posfácio à edição, na narrativa de Aira, “tudo
é passível de ser banalizado […], tudo pode virar burla”.
3.
Aniversário. Alguns
meses depois de completar cinquenta anos, em uma conversa corriqueira com sua
esposa sobre fases da Lua, César Aira se dá conta da dimensão da própria
ignorância acerca de assuntos banais. A anedota dispara uma série de reflexões
sobre as certezas, o conhecimento, a vida, a morte, a juventude, o tempo e o
seu desfrutar. Este é um ensaio magistral, profundo e sensível, que lança luz
sobre os principais pilares do pensamento e dos procedimentos de escrita de um
dos maiores autores argentinos vivos. Trata-se de leitura indispensável tanto
para quem já o admira, quanto para quem quer conhecer a mente genial em sua
forma mais sincera e autêntica possível, uma vez que, como afirma Joca Reiners
Terron em posfácio à edição, nela “Aira nos oferece uma das mais precisas
metáforas jamais concebidas acerca do fazer literário”.
4.
Um episódio na vida do
pintor viajante.
Johann Moritz
Rugendas foi um pintor naturalista alemão, discípulo de Humboldt, que viajou à
América Latina para documentar o exotismo tropical, registrando em imagens um
imaginário que se fixaria por séculos no mundo ocidental. Essa história
amplamente conhecida ganha novos e cômicos contornos pelas tintas de César
Aira. Nesta
novelita , uma de suas mais aclamadas, o narrador refaz o
percurso de Rugendas, interrompendo seu destino de viagem com um episódio
inesperado. À semelhança dos modernistas, Aira nos faz refletir sobre
colonialismo e arte ao brincar com ideias preconcebidas ― como o mito
originário argentino de que Rugendas desejava chegar a Buenos Aires, ou a
crença de que era apenas um documentalista, como explica Luciene Azevedo no
posfácio à edição ―, e desconstrói os lugares-comuns históricos, dando sempre
um passo além, ou, em suas palavras, fugindo para a frente.
Tove Jansson para adultos. Chega
aos leitores brasileiros um romance da autora já nossa conhecida na literatura
infantil.
Passando o verão em uma ilha
remota na costa finlandesa, Sofia e sua avó vivem uma série de pequenos
alumbramentos. Juntas, caminham pela praia e pela floresta; constroem barcos de
cortiça e uma Veneza em miniatura; escrevem um rebuscado estudo sobre os insetos
locais. Em meio a tudo isso, discutem — às vezes fervorosamente — questões que
interessam a pessoas de qualquer idade: vida e morte, a natureza de Deus e o
amor. Escrito em 22 capítulos curtos, interligados e ao mesmo tempo autônomos,
O
livro do verão é um mosaico extraordinário de sensações ligadas à temporada
na praia: seus cheiros, suas paisagens, seu tempo. Ilustradas pela própria
autora, estas páginas mostram Tove Jansson em todo o seu domínio da narrativa
breve, desdobrando universos com um simples toque. Publicação da editora
Martins Fontes; tradução de Luciano Dutra.
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A Editora 34 oferece sua edição
de uma obra que começou a ser resgatada em 2024 por ocasião do Vestibular da
FUVEST.
Em 1873, um ano após o lançamento
de
Nebulosas, um crítico português de renome considerou que os versos do
livro mais pareciam “trabalho de um poeta de combate do que estrofes saídas da
pena de uma senhora”. A observação dá a medida do espanto que causou a obra de
Narcisa Amália, publicada em 1872, quando tinha apenas vinte anos de idade, e
da resistência que encontrou. A presente edição procura resgatar do
esquecimento a obra dessa poeta singular, abolicionista, republicana e
feminista, pioneira em vários campos. Para isso, foi feito um cotejo minucioso
com o texto da primeira edição de 1872, o que permitiu recuperar a divisão
original do livro em três partes e o sentido de muitos versos, obscurecido pelo
acúmulo de erros em sucessivas publicações. O volume conta com uma apresentação
da historiadora e socióloga Maria de Lourdes Eleutério, que situa a escritora e
sua obra no quadro das ideias e das disputas políticas do Brasil à época,
analisando a recepção de
Nebulosas no meio literário de então. Todos os
poemas do livro são acompanhados por notas, glossário e um comentário que
oferece chaves de leitura para o seu entendimento. Completam a edição o
prefácio original de Pessanha Póvoa, a crítica de Machado de Assis feita no ano
de seu lançamento (1872), o ensaio “A mulher no século XIX”, de Narcisa Amália
(1882), e dois poemas adicionais de sua autoria, “Perfil de escrava” (1879) e
“Por que sou forte” (1886).
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O livro de Sónia Serrano conta
a história de várias mulheres que, ao longo dos séculos, desafiaram convenções
e viajaram sozinhas.
São mulheres que muitas vezes
tiveram que assumir identidades masculinas para viver livremente seus sonhos e
não se deixaram restringir aos espaços que lhes eram reservados. Enquanto
descobriam a si próprias e a um mundo que sempre lhes foi proibido, essas
mulheres também se destacaram ao mapear regiões, descobrir novas espécies de
plantas, tratamentos para doenças e tesouros arqueológicos, além de assumir
posições centrais nos debates e negociações geopolíticas de sua época. Desde
Egéria que, no século IV partiu da Península Ibérica para a Terra Santa,
passando pelas aventureiras que se lançaram às grandes navegações e pelas
arrojadas vitorianas que desbravaram os confins do Império Britânico ― até o
século XXI, que traz um capítulo sobre Tamara Klink escrito exclusivamente para
a edição brasileira, entre o de diversas autoras contemporâneas ―, Serrano
seleciona e cita trechos das obras que resultaram desses périplos, oferecendo
uma bela amostra da literatura de viagens escrita por mulheres ao longo do
tempo.
Mulheres viajantes é publicado pela Tinta-da-China Brasil.
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REEDIÇÕES
Nova edição do romance de
estreia de Oscar Nakasato, vencedor do Prêmio Jabuti em 2012.
Uma saga familiar contada a partir
da vida de Hideo Inabata, um imigrante orgulhoso da própria nacionalidade que,
como tantos conterrâneos, aporta no Brasil no início do século XX para
trabalhar nas lavouras de café do interior de São Paulo. Imbuído da sagrada
missão de levar recursos ao seu país natal, conforme orientação do imperador
aos seus súditos, Hideo logo se defronta com mais dificuldades do que
imaginava, e as expectativas dos primeiros dias no navio logo se transformam
diante do trabalho árduo e dos choques culturais na nova terra. Ele, no
entanto, não cede às dificuldades: resiste à morte da primeira esposa, Kimie, e
rejeita as influências da cultura local apresentadas pelos filhos nikkei Haruo
e Sumie com a inflexibilidade do que considera ser a honra de um autêntico
nihonjin. Narrada pelo neto de Hideo, Noboru, essa saga lança luz sobre o amor,
a união, as distâncias e as diferenças de três gerações de uma comunidade que
há mais de cem anos vem se emaranhando a outras para tecer juntas os fios da
história brasileira. Da vida dura na lavoura ao comércio no bairro da
Liberdade, em São Paulo, da hospitalidade de um país que se abriu para
imigrantes às perseguições sofridas por este mesmo país durante a Segunda
Guerra Mundial,
Nihonjin retrata os dilemas no seio da comunidade
nipônica, e vai além ao destrinchar o que há de mais universal na dor humana de
ver os próprios sonhos se esvaírem. Quando foi publicado pela primeira vez, em
2011, o romance logo conquistou a crítica, angariando os prêmios Benvirá
(2011), Nikkei — Bunkyo de São Paulo (2011) e Jabuti (2012) na categoria
romance. Depois de ser adaptado para a animação
Meu avô é um Nihonjin
(2024), o livro volta em nova edição para reencantar leitores com a jornada da
família Inabata, e, como afirma Leonardo Sakamoto no texto de orelha: “
Nihonjin
é um espelho, talvez desconfortável. Porque, no final, todos estamos tentando
responder à mesma pergunta: quem somos nós nesta imensa lavoura chamada
Brasil?” Publicação da editora Fósforo.
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