Boletim Letras 360º #618

Gonçalo M. Tavares. Foto: Pedro Nunes


 
LANÇAMENTOS
 
Os leitores brasileiros iniciam 2025 com um novo livro do escritor português Gonçalo M. Tavares.
 
O diabo está a rondar a casa. E pelas mãos de Gonçalo M. Tavares, ele vem se juntar ao universo literário das Mitologias ao lado de personagens como os Doze-Apóstolos-de-Bicicleta, os Nómadas, os Meninos, o Homem-Que-Quando-Fala-Não-se-Entende-Nada e o Povo-Armazenado. Neste espaço imaginário de possibilidades infinitas, a verdade científica e sua lógica pouco importam, com narrativas e tipos que só obedecem regras próprias se cruzando e nos conduzindo por uma dimensão de originalidade poucas vezes vista. O diabo é publicado pela editora Dublinense. Você pode comprar o livro aqui.
 
O novo romance de Sidney Rocha.
 
No tecido intricado da literatura, encontramos romances que não apenas nos envolvem em narrativas cativantes, mas também nos desafiam a refletir sobre os grandes dilemas que permeiam a condição humana. O melhor dos mundos, obra do notável escritor Sidney Rocha, cujo zelo pela linguagem e aversão aos lugares-comuns são inconfundíveis, emerge como uma jor­nada pela complexidade da vida, da morte e dos dilemas éticos, diante da “morte pacífica”. O título por si só evoca uma dualidade intrigante: o que realmente constitui o “melhor” em um mundo onde as escolhas muitas vezes se entrelaçam com o sofrimento e a inevitabilidade da morte? É neste ponto de interseção que somos lançados para este romance que nos convida a confrontar nossas próprias convicções e questionar os limites éticos de nossas decisões. Central para o enredo está o tema complexo da eutanásia, um tópico que transcende a mera discussão médica e legal, adentrando as profundezas do bem, do mal, do mundo que pode, ou não, ser corruptível: a autonomia do indivíduo versus os laços que nos unem, a compaixão versus o respeito à vida, o desejo pelo alívio do sofrimento versus o temor do desconhecido além da morte. O livro é publicado pela editora Iluminuras. Você pode comprar o livro aqui.
 
A editora Fósforo abre o seu catálogo de 2025 com um novo romance de Brandon Taylor.
 
Desde a sua estreia na ficção com o romance Mundo real, Brandon Taylor vem se destacando como um cronista excepcional de nosso tempo. Descrito por Roxane Gay como “um escritor que exerce sua arte de maneiras absolutamente inesquecíveis”, o estadunidense eleva suas habilidades em Vidas tardias ao criar, com destreza e sensibilidade, um mosaico de personagens, a maior parte deles jovens negros e gays, que são retratos fidedignos das angústias e incertezas da geração milllenial. Em meio às ruas, aos bares e ao campus universitário de Iowa City, circula um grupo singular do último ano da pós-graduação. Entre escritores, dançarinos e músicos estão Seamus, um jovem poeta que não esconde dos colegas suas opiniões afiadas; Ivan, que precisou abandonar a carreira na dança depois de um golpe do destino e passou a recorrer à pornografia amadora; Noah, um bailarino cuja personalidade o deixa exposto a relacionamentos tempestuosos; e Fatima, que, cercada por julgamentos dos outros, precisa conciliar turnos de trabalho em um café com os ensaios de dança na faculdade. Os quatro são confrontados por um elenco de professores, namorados, vizinhos e colegas que levam ao limite os dilemas relacionados à identidade e à carreira. Envolta em preocupações com o futuro, frustrações com a vida artística e buscas por conexão e autoconhecimento, essa constelação de vidas mostra as forças multifacetadas que operam no presente — a falta de horizonte, as diferenças de gênero e classe, o racismo e a precarização —, que estão refletidas nas personalidades, nas escolhas e nos relacionamentos desses jovens inquietos e talentosos. Com Vidas tardias, Taylor conduz a literatura contemporânea a novos rumos e estabelece diferentes parâmetros para o que ela é capaz de desdobrar. O livro tem tradução de Floresta. Você pode comprar o livro aqui.
 
Livro de Stefano Volp toca em feridas profundas e exemplifica o quanto o sistema patriarcal, além de rebaixar qualquer outro gênero que não o masculino, precariza a subjetividade dos próprios homens.
 
Uma onça mata um homem no meio da floresta. Enquanto a família se organiza para enterrar o patriarca, a narrativa costura entre os personagens uma colcha de memórias, desprazeres e suspeitas, interseccionando o luto com temas urgentes como as masculinidades negras, a violência doméstica e a dominação masculina. Três irmãos, Alan, Alex e Betina, se reúnem para organizar o velório do pai, Zé Maria, após sua morte trágica. Enquanto a cidade realiza uma procissão para se despedir de um morador benquisto, Rute, a mãe, e os três filhos atravessam as complexidades do luto: apesar da saudade, o patriarca deixou na família marcas de violência e opressão. Com alternância de vozes e perspectivas, a construção narrativa explora o terreno das masculinidades negras e revela as facetas da violência de gênero em suas múltiplas formas, investigando as dores provocadas pela sociedade machista. Volp faz aqui uma incursão ousada em um gênero novo, estreando no romance contemporâneo e experimentando uma linguagem distinta das que já explorou em suas obras anteriores. Santo de casa sai pela editora Record. Você pode comprar o livro aqui.
 
A estreia literária de Felipe Poroger.
 
Filho de pais separados — pelo divórcio e por origens culturais completamente distintas —, o narrador desta estreia luminosa de Felipe Poroger apresenta alguns pensamentos fixos na vida: seus cinquenta por cento de sangue judaico a correr nas veias, as célebres aventuras do jovem inglês que descobre aos onze anos que tem poderes de bruxo, seu lugar na história humana meio século depois do genocídio da Segunda Guerra e, claro, a sexualidade. Personagem de si mesmo, ele conta a história de sua vida desde a concepção, passando pela infância, o bullying escolar, a descoberta do desejo e da genitália — a sua e a dos outros. De certa forma ele é, como todos nós, um sobrevivente: alguém que consegue se levantar todos os dias a despeito das neuroses familiares, das pressões da vida escolar, da vergonha, dos afetos danificados ao longo da vida e das mudanças no próprio corpo com a chegada da puberdade. Sua resposta a tudo isso é, num primeiro momento, mergulhar na fantasia. E reescrever — numa prosa que parece amalgamar a influência dos livros de Philip Roth e de J.K. Rowling — a própria história. Com veia satírica, ritmo veloz e um olhar devastador e mordaz sobre as ilusões que criamos para nós mesmos, este romance observa sobretudo as hipocrisias das relações familiares, tendo a adolescência como o maior desafio mortal a ser atravessado e superado — para que então se possa sobreviver à vida adulta. Uma narrativa audaciosa que consegue encapsular de forma surpreendente a trajetória pessoal e coletiva, a realidade e a ficção que parecem brotar dos livros de aventura. Alguém sobrevive nesta história sai pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
A Companhia das Letras reúne os três volumes da trilogia autobiográfica de J.M. Coetzee em edição revista pelo autor.
 
No primeiro destes três relatos autobiográficos, Infância, um narrador seco e distante conta, sempre no presente, a dura experiência de isolamento de um garoto sul-africano. Em uma sociedade baseada na violência, o menino John encontra refúgio numa aguda introspecção, e o leitor testemunha o desenvolvimento de uma personalidade fechada e solitária, a um só tempo herdeira e vítima da brutalidade circundante. Já em Juventude, acompanhamos o jovem John, aspirante a poeta e recém-formado em matemática, que deixa a África do Sul rumo a Londres em busca de seu sonhado destino de escritor. Enquanto espera a chegada de uma paixão avassaladora — e o momento de ser ungido pelo talento e pela inspiração —, precisa lidar com suas origens e sua condição de estrangeiro. Em Verão, por fim, a vida do recém-falecido escritor John Coetzee será objeto de pesquisa de Vincent, um biógrafo inglês interessado em traçar um retrato afetivo, íntimo e humano do autor. Sem ter conhecido pessoalmente o biografado, Vincent consulta cadernos de anotações em que ele registrou fragmentos de memórias e toma depoimento de pessoas que conheceram John quando este vivia um período difícil de readaptação a uma África do Sul convulsionada pela segregação racial. Construída com maestria, a imagem que emerge dessas três narrativas nos revela um personagem que se torna mais complexo a cada parágrafo. A memória pessoal nunca alcançou tamanha força narrativa como neste projeto. E não seria exagero afirmar que através das palavras de J.M. Coetzee a literatura tem realizado seu maior triunfo em nosso tempo. Traduções de Luiz Roberto Mendes Gonçalves e José Rubens Siqueira. Você pode comprar o livro aqui.


Esta é uma edição de recesso, por isso o Boletim Letras 360º é apresentado sem as seções complementares desta publicação.


...
CLIQUE AQUI E SAIBA COMO AJUDAR COM A PERMANÊNCIA ONLINE DO LETRAS
Siga o Letras no FacebookTwitterThreadsBlueskyTumblrInstagramFlipboard
Quer receber as nossas publicações diárias? Vem para o nosso grupo no Telegram

* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.
 

Comentários

AS MAIS LIDAS DA SEMANA

Mortes de intelectual

Cinco coisas que você precisa saber sobre Cem anos de solidão

Boletim Letras 360º #617

Considerações em torno do Auto da Compadecida

Boletim Letras 360º #607

O século das luzes, de Alejo Carpentier