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Mostrando postagens de julho 5, 2024

Correspondência alheia

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Por Alejandro Zambra Vincent van Gogh. Natureza-morta com prato de cebolas (1889). Museu Kröller-Müller.   É difícil ler a correspondência alheia sem pensar nas próprias cartas. Minha geração foi a última que escreveu e recebeu cartas. Só algumas, muito poucas, sobreviveram às mudanças.   O que buscamos nas cartas alheias? Segredos, revelações, detalhes? “Se a letra sair torta é porque bebi muita cidra esta noite”, escreve Sylvia Plath à mãe. “Te digo que estou triste. Te digo que estou só. Te digo que estou morta. Preciso de um ataúde e de um discurso ridículo”, lemos em uma atordoante carta de Violeta Parra a Gilbert Favre.   Às vezes as revelações não aparecem. A correspondência entre Mishima e Kawabata é, por exemplo, estranhíssima. Durante longas passagens presenciamos nada mais do que uma incansável troca de cortesias. Mishima manda um salmão e Kawabata responde com bocados de castanha e misteriosas palavras de alento: “Diga sua mãe o que quiser, sua escrita é magnífica.” Mishim