Boletim Letras 360º #604
Ágota Kristóf. Foto: John Foley |
Um romance de estreia
surpreendente sobre injustiça, desigualdade, racismo e luta.
Aos dezessete anos, Kiara tem muito com que se preocupar. A mãe está numa casa de recuperação. O irmão mais velho não quer saber de trabalhar, e o aluguel do apartamento do conjunto habitacional onde eles vivem vai aumentar. Uma amiga e o vizinho, um menino de nove anos, são o único alívio para a realidade dura que a cerca. Uma noite, o que começa como um mal-entendido com um estranho torna-se, aos olhos de Kiara, uma solução. Sem conseguir emprego fixo e pulando de bico em bico, ela decide se prostituir. Em meio às caminhadas noturnas em busca de dinheiro e redenção, ela encontra um problema muito maior quando cai nas mãos de policiais corruptos. Com lirismo único, Leila Mottley constrói com Criaturas noturnas uma narrativa implacável sobre jovens navegando pelos cantos mais sombrios do universo adulto. Com tradução da poeta Bianca Gonçalves. Você pode comprar o livro aqui.
Um novo romance da colombiana
Margarita García Robayo para se ter em conta.
A narradora deste romance
inquietante é uma mulher mergulhada em incertezas, que vive a cinco mil
quilômetros de seu país natal, trabalha para uma agência de publicidade, quer
obter uma bolsa para ir escrever na Holanda e mantém videochamadas periódicas com
sua irmã. Em cada ângulo de sua vida estão seus medos e sua solidão, suas
lembranças, seus desejos de maternidade, e o tecido muitas vezes frágil das
relações familiares. Uma série de acontecimentos em sua vida cotidiana vão
revelando as fissuras que se abrem na rotina da protagonista: o recebimento de
uma enorme caixa difícil de abrir, um gato que passeia pelo prédio em que vive,
os vizinhos que se ausentam e os que batem à sua porta, o filho de uma vizinha,
as idas e vindas de seu namorado, um morador de rua. A encomenda é,
também, uma obra sobre o poder arrasador do imprevisto — e da nossa
incapacidade de ter controle sobre tudo, da fragilidade daquilo a que chamamos
de ‘rotina’, que pode se estilhaçar em segundos, por mais que a gente tente
protegê-la. Com maestria e notável economia de recursos, a colombiana Margarita
García Robayo guia o leitor pelo labirinto de sua protagonista, intensa e
contida a um só tempo, em uma obra repleta de vislumbres mais do que de
certezas, que reafirma a autora como uma das vozes mais impactantes da atual
narrativa latino-americana. (Marco Severo) Publicação da editora Moinhos com
tradução de Silvia Massimini Felix. Você pode comprar o livro aqui.
Romance histórico inédito de
José Eduardo Agualusa, uma história de amor e guerra — e música — na África
colonial.
Em Mestre dos batuques, o
escritor angolano discute questões de identidade e de pertencimento,
subvertendo estereótipos e ideias predefinidas, ao mesmo tempo em que expõe os
crimes e contradições do processo colonial português no continente africano. Leila Pinto está em algum lugar
num futuro próximo, escrevendo uma história que começa em 1902, no planalto
central de Angola. É a história de amor entre os seus avós, Jan e Lucrécia. A
história de como uma remota e obscura sociedade secreta de guerreiros
ovimbundos poderá ser capaz de definir o destino da humanidade. Publicação do
selo Tusquets. Você pode comprar o livro aqui.
Releituras da peste.
Marcado pela pandemia de covid-19
e a invasão russa à Ucrânia, o início da década de 2020 exacerbou as discussões
sobre o valor da vida humana. Entre os extremos das correntes de solidariedade
e da exibição de diferenças sociais, o mundo teve a chance de se olhar no
espelho e perguntar: quais vidas importam? Foi a partir de questionamentos como
esse, potencializados pelo acompanhamento diário da tragédia durante o
lockdown, que a psicanalista e crítica inglesa Jacqueline Rose lançou-se neste
poderoso ensaio sobre a morte em nossos tempos. Para tanto, ela buscou
respostas nas obras de intelectuais que se propuseram questões semelhantes em
seu tempo: Albert Camus, Sigmund Freud e Simone Weil. A autora começa seu
percurso pelo romance homônimo de Camus, em que a população de uma cidade da
Argélia, então colônia francesa, se vê às voltas com uma epidemia devastadora.
Novamente best-seller em razão dos danos causados pelo coronavírus, o livro de
Camus desnuda o modo como os homens lidam com o desastre: recorrendo à negação,
ou defesa, parte intrínseca do mecanismo da mente. A fina trama do ensaio segue
com o exame de escritos e cartas de Freud, que no fim dos anos 1910 recebera
seu quinhão de desastres ao viver a Primeira Guerra Mundial e perder uma filha
para a gripe espanhola ― fato que, especula a autora, teria contribuído
enormemente para que ele chegasse ao conceito de “pulsão de morte”, central na
teoria psicanalítica. Já a filósofa política Simone Weil, às vésperas da
Segunda Guerra, dedica-se a pensar a justiça e a violência, vendo, por exemplo,
na sinistra idolatria que acometia a Alemanha nazista nos anos 1930, um espelho
revelador da face da própria Europa ― inclusive da França, com sua prepotência
colonial. Qual a face do mundo atual? Rose chama a atenção para a desigualdade
entre os mais atingidos nestes últimos tempos ― despossuídos, mulheres
trancadas em casa com homens violentos, negros vítimas da polícia ― e os
super-ricos, cada vez mais ricos à custa da exploração da mão de obra e dos
recursos do planeta. Mas, ao mesmo tempo, enxerga na explicitação dessas
diferenças uma semente que traz imensa oportunidade de transformação. Algo
praticamente obrigatório se considerarmos a próxima peste a nos espreitar ― a
das mudanças climáticas. A peste: viver a morte em nosso tempo sai pela
editora Fósforo. Você pode comprar o livro aqui.
REEDIÇÕES
Nova edição marca os 40 anos de
um romance dos mais importantes da literatura brasileira recente.
A violência física e simbólica, os abismos sociais e os privilégios que os acentuam, a constituição de uma elite autoritária são encenados com maestria ao longo desta narrativa polifônica e lírica, muitas vezes irônica, que cobre quatrocentos anos de nossa história. Poucas obras atingiram esse mesmo nível de complexidade, e poucas alcançaram êxito semelhante. Lançado em 1984, o livro deu a João Ubaldo Ribeiro o prêmio Jabuti de Melhor Romance, seguindo a trajetória incomum de êxito na crítica e sucesso de público. Instaurando novo olhar ficcional sobre o nosso passado, relemos o Brasil do ponto de vista dos subalternos e conhecemos personagens antológicos, inventados ou não, por um autor essencial. Um livro que fascina e subverte. É uma joia literária, verdadeiro romance fundador de nossa educação cultural e sentimental. Com uma narrativa emblemática, Viva o povo brasileiro entrelaça vidas, mitos, sonhos e lutas, revelando as nuances e as contradições de uma nação em constante transformação. Da colonização portuguesa às revoltas populares, o livro oferece um olhar profundo sobre a identidade brasileira. Publicação da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
RAPIDINHAS
De olho na Academia Sueca. A
editora Fósforo publicará Histórias de amor no novo milênio, da chinesa
Can Xue. A escritora aparece nas listas de apostas entre os leitores como uma
possível premiada com o Nobel de Literatura neste ano. A tradução brasileira é
de Verena Veludo.
De olho no catálogo da Aboio.
A editora anunciou, por ocasião das celebrações do Dia Internacional do
Tradutor, que prepara a tradução de quatro obras estrangeiras, algumas delas há
muito fora de catálogo: Fome, de Knut Hamsun; Obras selecionadas,
de Chika Sagawa; Agostino, de Alberto Moravia; e Papéis de Aspern,
de Henry James.
E por falar em Alberto Moravia.
A Carambaia publica uma nova edição e tradução de A coisa e outros
contos. O livro integra a Coleção Sete Chaves, com obras de cunho erótico.
O livro do escritor italiano listado no Index romano é traduzido por Maurício
Santana Dias.
O Brasil entre os países do
lançamento mundial do... Novo livro de Chimamanda Ngozi Adichie. O
romance A contagem dos sonhos, que sairá aqui pela Companhia das Letras,
chega simultaneamente aos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá em março de 2025,
uma década depois do seu último título.
DICAS DE LEITURA
Na aquisição de qualquer um dos
livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a
manter o Letras.
1. Alamedas escuras, de Ivan
Búnin (Trad. de Irineu Franco Perpetuo, Ars et Vita, 408p.) Coletânea com 38
contos do primeiro escritor russo a receber o Prêmio Nobel de Literatura que
versam sobre amor e morte como matéria inerente da natureza catastrófica da existência.
Você pode comprar o livro aqui.
2. O sedutor do sertão, de
Ariano Suassuna (Nova Fronteira, 248p.) As proezas de Malaquias Pavão e
uma jornada hilariante pelos intrincados caminhos do contrabando de cachaça dão
a tônica deste romance de Suassuna que ficou esquecido durante anos e só veio ao
público depois da morte do escritor. Você pode comprar o livro aqui.
3. Arder na água, afundar no
fogo, de Charles Bukowski (Trad. Alexandre Bruno Tinelli, HarperCollins
Brasil, 240p.) Os amantes da poesia do Velho Buk têm aqui a reunião de quatro
dos livros que publicou entre 1955 e 1973: Meu coração em outras mãos, Crucifixo
na mão de uma caveira, Rua do Terror esquina com Via da Agonia e o
que dá título ao livro. Você pode comprar o livro aqui.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
Ainda Clarice Lispector. O Arquivo
Nacional divulgou em sua conta no YouTube um raro vídeo com um depoimento da
autora de A paixão segundo G. H. acerca da entrada de mulheres para a Academia
Brasileira de Letras. A instituição aprovara em 1976 a alteração do regimento
permitindo a candidatura e eleição de escritoras para compor o
panteão. No ano seguinte, o debate sobre o tema ganhou novos contornos com a
vaga na cadeira 5. Foi na ocasião que a TV Educativa do Rio de Janeiro realizou
uma enquete e ouviu vários setores da sociedade. Reproduzimos o vídeo aqui,
aqui e aqui. Rachel de Queiroz foi, naquele ano, a primeira mulher a
ingressar na ABL.
BAÚ DE LETRAS
Celebramos neste 5 de outubro de 2024, o centenário de José Donoso. Sublinhamos a efeméride recontando de algumas entradas para o Letras em torno do escritor e sua obra. Era 2013, quando a obra de Donoso começa a ganhar projeção no Brasil, eis uma matéria; e aqui uma leitura do seu principal romance. E do fundo do baú, recuperamos este depoimento de Mario Vargas Llosa.
Aos dezessete anos, Kiara tem muito com que se preocupar. A mãe está numa casa de recuperação. O irmão mais velho não quer saber de trabalhar, e o aluguel do apartamento do conjunto habitacional onde eles vivem vai aumentar. Uma amiga e o vizinho, um menino de nove anos, são o único alívio para a realidade dura que a cerca. Uma noite, o que começa como um mal-entendido com um estranho torna-se, aos olhos de Kiara, uma solução. Sem conseguir emprego fixo e pulando de bico em bico, ela decide se prostituir. Em meio às caminhadas noturnas em busca de dinheiro e redenção, ela encontra um problema muito maior quando cai nas mãos de policiais corruptos. Com lirismo único, Leila Mottley constrói com Criaturas noturnas uma narrativa implacável sobre jovens navegando pelos cantos mais sombrios do universo adulto. Com tradução da poeta Bianca Gonçalves. Você pode comprar o livro aqui.
A violência física e simbólica, os abismos sociais e os privilégios que os acentuam, a constituição de uma elite autoritária são encenados com maestria ao longo desta narrativa polifônica e lírica, muitas vezes irônica, que cobre quatrocentos anos de nossa história. Poucas obras atingiram esse mesmo nível de complexidade, e poucas alcançaram êxito semelhante. Lançado em 1984, o livro deu a João Ubaldo Ribeiro o prêmio Jabuti de Melhor Romance, seguindo a trajetória incomum de êxito na crítica e sucesso de público. Instaurando novo olhar ficcional sobre o nosso passado, relemos o Brasil do ponto de vista dos subalternos e conhecemos personagens antológicos, inventados ou não, por um autor essencial. Um livro que fascina e subverte. É uma joia literária, verdadeiro romance fundador de nossa educação cultural e sentimental. Com uma narrativa emblemática, Viva o povo brasileiro entrelaça vidas, mitos, sonhos e lutas, revelando as nuances e as contradições de uma nação em constante transformação. Da colonização portuguesa às revoltas populares, o livro oferece um olhar profundo sobre a identidade brasileira. Publicação da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
Na passagem dos 35 anos da eleição
de Rachel de Queiroz para a Academia Brasileira de Letras, o Letras
publicou esta matéria, que reúne outros materiais visuais, como vídeos e
imagens.
O romance de João Ubaldo Ribeiro Viva
o povo brasileiro alcança bem vividas quatro décadas como destacamos acima.
Em outubro de 2016, o livro foi comentado aqui no Letras por Rafael
Kafka.
DUAS PALAVRINHAS
O essencial é comprar muitos
livros que não são lidos na hora. Em seguida, depois de um ano, ou de dois
anos, ou de cinco, dez, vinte, trinta, quarenta, poderá chegar o momento em que
se pensará ter necessidade exatamente daquele livro — e quem sabe ele poderá
ser encontrado numa prateleira pouco frequentada da própria biblioteca.
—
Roberto Calasso, Como organizar uma biblioteca
...
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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.
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