Boletim Letras 360º #601

Gerald Murnane. Foto: Aaron Francis



LANÇAMENTOS
 
A estreia brasileira de um dos nomes de destaque na literatura australiana recente: Gerald Murnane. 

Publicado pela primeira vez em 1982, As planícies apresenta uma meditação sobre território, memória, amor e cultura, a partir da busca existencial de um jovem cineasta nas planícies do interior da Austrália. O livro é publicado pela editora Todavia; tradução de Caetano W. Galindo. Você pode comprar o livro aqui.

Primeira e mais ampla antologia brasileira com a poesia de Hans Magnus Enzensberger.
 
Nascido no Período Entreguerras, Hans Magnus Enzensberger cresceu na Alemanha nazista e refletiu, em poemas e ensaios, sobre a experiência histórica de viver no mundo conturbado que se desdobrou desde então. Destinatário desconhecido: uma antologia poética (1957-2023) reúne noventa de seus mais importantes poemas, selecionados e traduzidos do alemão pelo poeta e professor Daniel Arelli, que também traduziu a poesia de Hannah Arendt. Os textos estão organizados em seções que sugerem aproximações entre os diferentes momentos da obra do poeta, que escreveu e publicou por mais de sete décadas, formando um dos retratos mais intensos do mundo depois da Segunda Guerra Mundial. Durante todo esse período, Enzensberger lançou seu “olhar faiscante” (na precisa expressão do tradutor) sobre o tempo presente, demonstrando que “a poesia é onívora — tudo o que se experimenta ou percebe pode se tornar tema da poesia”. Como afirma Arelli, “parece não haver material, temática ou procedimento que não possa ser processado e assimilado pela moenda de Enzensberger”. Seus versos revelam uma capacidade rara de enfrentamento poético e político; é como se ele, a cada poema, encontrasse uma forma de se posicionar tanto em relação à modernidade poética (tensionando, rejeitando, incorporando criticamente) quanto em meio às tendências políticas ao seu redor. Enzensberger capta diversas correntes do tempo se cruzando: “Abra os olhos e o que aparece desapareceu/ Feche os olhos e o que desapareceu aparece”. Daí que a leitura desta antologia seja tanto um passeio pelo século passado quanto a mais contemporânea das experiências. Num ensaio repleto de ironias sobre a condição da poesia (“Notícias do fazer poético”, de 1989), Enzensberger cravou: “É quase um milagre que ela continue entre nós”. Entretanto, ao ler um poeta como ele, que soube traduzir e intervir com tanta força e beleza no mundo, não apenas entendemos esse “milagre”, como agradecemos muito que ele tenha insistido nessa arte “tão obstinada, inventiva e impagável”. Publicação do Círculo de Poemas, das editoras Fósforo e Luna Parque. Você pode comprar o livro aqui.
 
Publica-se pela primeira vez a poesia completa de Maria Lúcia Alvim; edição traz dois livros inéditos.
 
Poesia reunida, de Maria Lúcia Alvim, traz o arco completo de sua produção poética ao longo de aproximadamente seis décadas, reunindo as obras XX sonetos (1959), Coração incólume (1968), Pose (1968), Romanceiro de Dona Beja (1979) e A rosa malvada (1980). Na década de 1990, toda essa produção foi reunida em Vivenda: 1959-1989 (1990), volume que integra a coleção Claro Enigma. Também fazem parte do volume de agora Batendo pasto (de 1982 e publicado pela Relicário em 2020 e Prêmio Jabuti 2021) e os inéditos Rabo do olho (1992) e Sala de branco (2010), além de poemas esparsos. A edição conta com apresentação de Juliana Veloso, perfil biográfico da poeta por Guilherme Gontijo Flores e texto de orelha de Ricardo Domeneck. Você pode comprar o livro aqui.
 
A publicação na íntegra de um marco da poesia modernista nos Estados Unidos.
 
Até agora inédito em português, Estrofes em meditação é um poema de Gertrude Stein dividido em cinco partes. A tradução integral de Júlia Manacorda, com revisão técnica de Stephanie Fernandes, baseou-se na versão corrigida, publicada em 2012 pela Yale University Press. Além de incluir o original em inglês e uma resenha escrita por John Ashbery em 1956, a edição publicada pela Machado Editora conta com uma apresentação original por Ismar Tirelli Neto. Você pode comprar o livro aqui.
 
A superprodução teológico-pornográfica na qual Pier Paolo Pasolini trabalhou durante quase uma década.
 
“Em Sodoma a tolerância é real, a mansidão é real, a compreensão dos outros é real e tudo está fundado em uma prática democrática real. Minorias de qualquer tipo também encontram lugar no mundo de Sodoma. Não só as minorias heterossexuais, mas também as minorias de negros, de judeus, de ciganos, que vivem ali na mais absoluta liberdade, inclusive interior.” Porno-Teo-Kolossal teria sido o filme que encerraria sua brilhante e controversa carreira cinematográfica antes de se dedicar inteiramente à escrita. No entanto, o seu assassinato brutal em 1975 deixou inacabada esta alegoria sombria cheia de sadismo e irreverência. Porno-Teo-Kolosal se tratava de “um filme sobre ideologia” que deveria representar três tipos diferentes de utopias, ligadas a um passado paleoindustrial, a um presente neocapitalista e a um futuro tecnocrata, todos inexoravelmente destinados ao fracasso através de catástrofes apocalípticas que levariam ao fim até mesmo a última utopia: a da fé. Epifânio, um rei mágico napolitano, põe-se a caminho acompanhado por um fiel servo, Núncio, em busca da estrela que marca o local onde deverá prestar homenagem ao recém-nascido Messias. Como símbolo de esperança, os caprichos do cometa o levarão por cidades selvagens e utópicas, tão fantásticas quanto reconhecíveis. Estes alter egos satíricos das grandes metrópoles do norte de Itália e de França, onde reinam a violência e a degradação, servem a Pasolini para construir uma crítica severa à sociedade de consumo e à decadência cultural da Europa. Com tradução de Andityas Matos, o livro sai pela Sobinfluencia Edições. Você pode comprar o livro aqui.
 
A Assírio & Alvim Brasil publica a edição com a obra completa de Francisco de Sá de Miranda.
 
Organizado e anotado por Sérgio Guimarães de Sousa, João Paulo Braga e Luciana Braga, o livro oferece ao leitor brasileiro um encontro com um dos maiores clássicos da língua portuguesa. Colocado em um patamar de grandeza e importância historico-literária de Camões e Pessoa, Sá de Miranda é celebrado em Portugal como um “cultor e porta-voz da modernidade renascentista e das inovações classicistas, removendo da lírica portuguesa a matriz medieval em que esta perdurava com as redondilhas de gosto vulgar, bem como a mais-valia da sua inquebrável moralidade estoica”. Você pode comprar o livro aqui.
 
Nova tradução e edição de um dos principais livros de Jack London, o autor dos incontornáveis Caninos brancos e O chamado da floresta.
 
Martin Eden é um aventureiro do mar. Tosco, grosseiro, de origens humildes e sem nenhuma educação formal, tudo muda quando conhece Ruth, irmã de um amigo. Ela lhe abre as portas de um mundo de educação, delicadeza e refinamento até então desconhecido. O vivaz e obstinado Martin toma para si o desafio de rever suas maneiras rudes, educar-se e cultivar-se. Mas será possível vencer as barreiras que separam as classes sociais? Publicado em 1909, sete anos antes da morte do escritor norte-americano Jack London (1876-1916), Martin Eden é considerado por muitos a obra mais madura do autor. O protagonista pode ser visto como alter ego do autor, refletindo muitas de suas experiências. Este romance envolvente, que merece o status de clássico, também contém diversas reflexões de Jack London sobre a sociedade americana e sobre a luta de classes. Com tradução de Celso Mauro Paciornik e publicação da L&PM Editores. Você pode comprar o livro aqui.
 
O criativo road movie de Ariana Harwicz que desconstrói os clichês que cercam as noções de família.
 
Ninguém acredita ser capaz de praticar um crime... até o cometer. Lisa Trejman é o exemplo perfeito do que a justiça francesa considera uma mãe ruim: é argentina, judia e imigrante e recebeu uma medida protetiva para se afastar dos filhos gêmeos após trocar agressões com o marido. Farta das breves e esporádicas visitas assistidas aos meninos, decide atear fogo à casa onde eles moram com o pai e sequestrá-los. Foge com os gêmeos num carro roubado enquanto rememora as lembranças amargas de um relacionamento fadado à ruína, vendo até onde é capaz de ir para afastar os filhos do ex-marido, mesmo que para isso seja necessário cair na clandestinidade e comprometer o bem-estar das crianças. Em Perder o juízo, Ariana Harwicz concebe algo semelhante a um road movie no qual sua prosa afiada, cinematográfica e de sombria beleza mais uma vez destroça os clichês que cercam as noções de família, maternidade e relacionamentos. Também lança luz sobre a violência vicária, mas sobre seu tipo menos comum: quando a mãe usa os filhos para atingir o pai. Afinal, para Harwicz, qualquer pessoa está a apenas um passo de se tornar um criminoso. Publicação da editora Instante; tradução de Silvia Massimini Felix. Você pode comprar o livro aqui.
 
A trajetória poética de um dos nomes mais fascinantes da década de 1970 reunida em livro.
 
Toda vida reúne a obra de Angela Melim, poeta que se tornou uma das vozes mais instigantes da efervescente cena contracultural brasileira. Seu livro de estreia — O vidro o nome, de 1974 — impressionou pela dicção singular: os versos observam atentamente a vida lá fora ao mesmo tempo que perscrutam os movimentos internos, como se os arredores se fundissem ao sujeito, sem fazer distinção entre indivíduo e paisagem. Marcada pela sensualidade e pela curiosidade, a escrita de Melim é atenta às frutas na cozinha, às conversas entreouvidas nas ruas, aos letreiros luminosos e, sobretudo, às histórias íntimas das pessoas — ora ácidas, ora trágicas, mas nunca banais, frias ou tediosas. As imagens surgem com alta voltagem poética, sem medo da entrega, da confissão ao pé do ouvido e do erotismo: “Missão, míssil em voo reto — ouso/ partir ao meio o ar./ A guerra começou tem tempo/ o coração/ combate alucinado/ no ritmo mortal da sua beleza sempre nova/ se arroja/ na sua coragem”. A edição inclui ainda uma seção de poemas inéditos e fortuna crítica com textos de Armando Freitas Filho, Ana Cristina Cesar, Ivan Junqueira, Flora Süssekind e Leonardo Fróes. Publicação da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
Erika Fatland pelo Himalaia.
 
Poucos lugares na Terra são tão envoltos em lendas quanto o Himalaia. Erika Fatland nos leva à cadeia de montanhas mais alta do planeta, permitindo-nos descobrir seu povo, as milhares de culturas, o esplendor de suas paisagens, mas também a história pouco conhecida por trás de alguns dos conflitos mais sangrentos de hoje e de ontem. Partindo da China e atravessando o Paquistão, a Índia, o Butão, o Nepal e o Tibete, a escritora norueguesa segue um itinerário, fascinante e cheio de surpresas, onde não são apenas os picos majestosos e os horizontes infinitos que dominam a cena, mas homens e mulheres em carne e osso, cujos testemunhos ela coleta, descrevendo as pequenas vidas que pululam entre essas montanhas tão altas quanto gigantes. Com tradução de Leonardo Pinto Silva, Nas alturas: uma viagem pelo Himalaia sai pela editora Âyiné. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
Nova edição do premiado romance de estreia de Ana Luisa Escorel.
 
Anel de vidro é um livro sobre casamento e infidelidade, mas é também uma narrativa sobre classes sociais e suas implicações na vida amorosa. É, ainda, um romance que examina a dinâmica das relações, pondo em xeque a ideia da mulher como enigma. A narrativa se divide em quatro partes: cada uma conta a história segundo a perspectiva de um personagem, de que, é preciso dizer, o narrador guarda distância irônica, qual um cronista privilegiado da vida alheia. Publicação da editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS
 
Milton Hatoum, ensaísta. A editora Valer publica A natureza como ficção em que o escritor discute a representação do espaço comum da floresta nas obras A selva, de Ferreira de Castro, e Mad Maria, de Márcio de Souza. 

Novas reedições de Antonio Candido 1. A editora Todavia, que tem se empenhado na publicação de parte significativa da obra do crítico brasileiro, acrescenta dois novos títulos no catálogo: saem agora Ficção e confissão e Na sala de aula.
 
Novas reedições de Antonio Candido 2. O primeiro livro reúne os ensaios que Candido começou a escrever desde 1955 em torno da obra de Graciliano Ramos, um autor dos seus preferidos; o segundo colige seis intervenções analíticas do texto poético a partir das aulas do mestre.
 
Manter o Best-Seller. A mesma Todavia, responsável pela publicação da estreia portuguesa de Itamar Vieira Junior, prepara uma edição comemorativa (em capa dura, revista e com novo projeto gráfico) de Torto arado. O primeiro romance do escritor baiano já alcançou a cifra de 900 mil exemplares vendidos até meados de 2024.
 
De volta a Paul Auster. E, por falar em reimpressões, desde a morte de Paul Auster, ocorrida em abril desse ano, a Companhia das Letras tem recolocado no mercado os principais livros do escritor há muito esgotados. Saíram Noite do oráculo, O livro das ilusões, Sunset Park, Invisível e A invenção da solidão. E um dos próximos é Desvarios no Brooklin.
 
DICAS DE LEITURA
 
Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. Velar por ela, de Jean-Baptiste Andrea (Trad. de Julia da Rosa Simões, Vestígio, Com-Arte, 416p.) O autor vencedor do Prêmio Goncourt 2023 já era um conhecido dos leitores brasileiros com O pianista da estação. No livro aqui recomendado, o cruzamento entre Mimo e Viola, favorecido pelo destino, espoleta uma história pela turbulenta Itália fascista. Você pode comprar o livro aqui
 
2. O fato e a coisa, de Torquato Neto (Círculo de Poemas, Fósforo e Luna Parque Edições, 152p.) Este foi o único livro organizado pelo poeta piauiense que morreu precocemente aos 38 anos e é também uma obra que atesta seu nascimento como o multiartista que se revelaria nos anos seguintes no âmbito da Tropicália. A publicação reúne ainda uma seleta de outros poemas da juventude de Torquato até então inéditos em livro. Você pode comprar o livro aqui
 
3. O pombo torcaz, de André Gide (Trad. de Mauro Pinheiro, Estação Liberdade, 96p.) Os moedeiros falsos, obra-prima do escritor francês, já apareceu duas vezes nesta seção desde quando foi criada. Mas, valerá cada linha dessa novela póstuma que relata da maneira mais livre que textos como O imoralista a cumplicidade do desejo homoerótico numa época quando a homossexualidade era crime. Você pode comprar o livro aqui

VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS

Embora uma novidade entre os leitores brasileiros, a obra de Gerald Murnane tem sido reconhecida há muito pela crítica. É uma obra consolidada que se desenvolve pela prosa (romance, conto, ensaio) e pela poesia. Acrescentamos aqui o ensaio “Inland” (Interior, em tradução livre). Nele, o escritor australiano reflete sobre o seu romance de mesmo título publicado depois de As planícies. O ensaio está disponível aqui em The White Review

BAÚ DE LETRAS
 
No calor da publicação de Batendo pasto, o livro que revelou para muitos leitores o nome e a poesia de Maria Lúcia Alvim, publicamos neste blog um perfil escrito por Pedro Fernandes. Leia-o aqui.
 
Antes, em dezembro de 202, publicamos a tradução deste texto que investiga, pela literatura, uma parte do pensamento do escritor alemão Hans Magnus Enzensberger, autor também de uma obra poética sui generis e agora apresentada uma pequena amostra aos leitores brasileiros.

DUAS PALAVRINHAS
 
A poesia tem sua origem em palavras ditas pela metade, como as que um médico pode escutar todos os dias de seus pacientes enquanto os trata. 

— William Carlos Williams, em The Autobiography of William Carlos Williams

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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.
 

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