Por Alejandro Zambra
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Wolfgang Volz. Christo and Jeanne-Claude: Wrapped Trees, Fondation Beyeler and Berower Parc, Riehen, Switzerland (1997 - 1998) |
A história de
Bonsai é a
história longa de um livro curto. Nove anos atrás, em uma manhã de 1998,
encontrei no jornal a fotografia de uma árvore coberta por um tecido transparente.
A imagem pertencia a série
Wrapped Trees, de Christo &
Jeanne-Claude, artistas que há décadas correm mundo recobrindo paisagens e
monumentos nacionais. Lembro que escrevi, naqueles dias, um poema não muito bom
que falava de árvores cerradas, encerradas. E logo me deparei com os bonsais,
tão parecidos, em certo sentido, com as árvores de Christo e Jeanne-Claude,
embora reduzidas, à força, pelo capricho da poda.
Escrever é como cuidar de um
bonsai, então pensei e agora penso: escrever é podar os ramos até dar a ver uma
forma que já estava ali, oculta; escrever é alambrar a linguagem para que as
palavras digam, de uma vez, o que queremos dizer; escrever é ler um texto não
escrito.
Queria escrever — queria ler — um
livro que se chamasse
Bonsai, mas não sabia como: tinha apenas o título
e um punhado de poemas que crescia e decrescia ao longo dos meses. É desta
época “El alambrado” [O alambrado], um dos poucos textos que conservo, e que
agora transcrevo, como forma de homenagem àquelas horas perdidas:
En todo caso el árbol continúa
Su absurdo crecimiento en los alambres
Incluso si su forma se detiene
Un árbol es un golpe de raíces
Que rompen las costuras del bolsillo
Incluso si sus ramas se detienen
Y hacen la figura sospechosa
Del tiempo acomodado en su maceta
El árbol continúa en los alambres
Creciendo como un árbol crecería.
De todo modo continua a árvore
O seu crescer absurdo nos arames
Mesmo quando sua forma se detém
Uma árvore é um golpe de raízes
Que esfarrapam as costuras do
bolso
Mesmo quando seus ramos se detêm
E tornam a figura suspeitosa
Do tempo acomodado no seu vaso
A árvore continua nos arames
Crescendo como faria uma árvore.
A beleza controversa dos bonsais
me remetia a uma cena ou a uma história que eu não desejava contar e sim apenas
evocar: a história de um homem que, em vez de escrever — de viver —, preferia
ficar em casa observando o crescimento de uma árvore. Esse homem, é claro, não
era eu, e sim um borrado personagem que eu contemplava a uma certa distância.
Na primavera de 2001, porém, essa distância tendeu a desaparecer, pois dois
amigos me presentearam com um pequeno olmo (“para que escreva o seu livro”,
disseram-me), de maneira que me vi, de imediato, convertido no personagem de
uma história que ainda não havia escrito. Cuidei o melhor que pude do bonsai:
consegui manuais, consultei especialistas, e até mesmo, em uma irrupção de
paternidade responsável, assinei a revista
Bonsái Actual. Pouco depois
fui para Madri, por um ano. Quando voltei, o olmo havia secado por inteiro.
Não lembro precisamente o momento
em que Bonsai começou a ser (ou a parecer) um romance. Eu desconfiava da
ficção; desconfiava, em especial, de que fosse capaz de contar uma história, de
que houvesse, para mim, uma história para contar. Não queria escrever um
romance, mas apenas um resumo de romance. Um bonsai de romance. Borges
aconselhava escrever como se fosse redigir o resumo de um texto já escrito.
Isso eu fiz, isso tentei fazer: resumir as cenas de um livro inexistente. Em
vez de somar, subtraía: completava dez linhas e apagava oito; escrevia dez
páginas e apagava nove. Operando por subtração, somando pouco ou nada,
deparei-me com a forma de Bonsai.
Escrevi o romance, enfim, nos
primeiros meses de 2005. Antes de publicá-lo, fiz uma leitura e gostei, embora
já não fosse aquele o livro que queria ler. Pouco depois comecei A vida
privada das árvores, um romance que, em mais de um sentido, é o reverso de Bonsai.
Mas esta, creio, é outra história. Walter Benjamin dizia que a arte de contar
histórias é a arte de saber continuar contando-as. Não sei se entendo bem a
frase, cito-a de memória, provavelmente mal, mas me parece oportuna para
encerrar estas linhas. De novo: a arte de contar histórias é a arte de saber
continuar contando-as.
Agosto, 2007
* Tradução de Guilherme Mazzafera. O
texto “Árboles cerrados” encontra-se compilado no volume No leer (Editorial
Anagrama, 2018).
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