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A editora Iluminuras apresenta a
tradução de um novo título da obra de Horacio Quiroga e uma biografia do escritor;
1.
Os desterrados, do
contista uruguaio Horacio Quiroga (1878-1937), publicado inicialmente em 1926,
é considerado pela crítica como o auge de sua carreira literária. Todos os
contos nele reunidos se passam na selva de Misiones, na região da Tríplice
Fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai, nos primeiros anos do século XX.
Seus personagens são migrantes europeus que fugiram da Primeira Guerra Mundial
e que foram terminar seus dias nas então recém-descobertas ruínas das Missões
Jesuíticas, próximas ao povoado de San Ignacio, às margens do imponente Rio
Paraná. Esses ex-sábios ou ex-homens, como a eles se refere o narrador,
presenciam ou interagem com os moradores locais, indígenas guaranis
semi-aculturados, peões brasileiros, ambos explorados pelas madeireiras e pelos
plantadores de mate da região. Nessa mescla multicultural, numa região
fronteiriça e à margem do Estado, onde ninguém está em seu lugar, onde não há
lugar para estar, todos se curvam aos excessos: da exploração do trabalho, da
natureza selvagem e inóspita, da violência, da embriaguez e do próprio
intelecto. A tradução é de Wilson Alves-Bezerra.
Você pode comprar o livro aqui.
2.
O anarquista solitário, é
a biografia que faltava acerca de Horacio Quiroga.
No instante do dia 5
de março de 1902 em que um tiro de pistola encontrou a cabeça de Federico
Ferrando, era seu amigo o poeta e narrador uruguaio Horacio Quiroga (1878-1937)
quem tinha nas mãos a arma assassina. Uma resenha literária farpada provocou trocas
de ofensas em páginas de jornais de Montevideo e a rixa entre desafetos
desembocaria num duelo, do qual Horacio não teria sido mais do que
coadjuvante ― isto é, não fosse a ação do inesperado, com o azar como
autor de um disparo enquanto Quiroga conferia a arma de seu apadrinhado. Mas a
morte do companheiro foi também mais um entre os muitos desastres de sua
vida ― e, dependendo de como for contada, a sucessão de azares letais
ganha ares de destino, com tragédias empilhadas por uma moira com um fraco por
simetrias improváveis e amores difíceis (por mulheres, pela selva). Combinada
ao insólito de sua literatura, a imagem de Horacio Quiroga sai maior do que a
vida, mas também simplificada e um tanto folhetinesca. Já em
O anarquista
solitário, a história de Quiroga é outra ― e para a felicidade de seus
leitores, aliás. Sendo autor da primeira biografia do escritor em língua
portuguesa, Wilson Alves-Bezerra beneficiou-se aqui das versões da vida de
Horacio já contadas em espanhol, mas também delas se distanciou sem cerimônia
quando foram necessários alguns acertos de contas. Entre os mais importantes
estão sem dúvida sua contribuição à reconsideração da importância da relação
com a poeta argentina Alfonsina Storni; seu interesse no modo como os filhos
Darío, Eglé e Pitoca foram afetados pelo pai (e pela selva); e a atenção
dedicada a María Elena Bravo ― a amiga de escola da filha que veio a se
tornar a última esposa do escritor ―, que resulta do acesso ao material
deixado pela viúva, e adquirido nas circunstâncias improváveis (como não
poderia deixar de ser) relatadas no posfácio. Tudo isso importa, mas por cima
da descoberta e da polêmica, o que de fato move as páginas deste livro de
Alves-Bezerra é a preocupação constante em ver, através da imagem do herói
literário, um escritor de carne e osso, às voltas com preocupações bastante
materiais: há aqui todas as surpresas de uma vida intensa e cheia de
imprevistos, mas também contas a pagar, plantas a cultivar, altos e baixos do
prestígio literário, a distância entre a selva de Misiones e os centros locais
de difusão da cultura letrada, parentes entrando no caminho de paixões um tanto
impróprias, o corpo que envelhece e força decisões difíceis. De carne e osso o
biografado, então ― mas também o biógrafo.
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O regresso de Oscar Nakasato ao
romance.
Segundo romance do escritor
paranaense e vencedor do Jabuti Oscar Nakasato,
Ojiichan, que em japonês
significa “vovô”, retrata a vida de Satoshi a partir do seu aniversário de
setenta anos. A aposentadoria compulsória do colégio onde ele lecionou por
décadas é o primeiro dos eventos que o obrigam a confrontar as muitas faces da
velhice. Seus colegas preparam uma festa de despedida e os alunos, que
carinhosamente o apelidaram de Satossauro, prestam homenagem ao professor.
Preocupados em celebrar o merecido descanso após uma vida de trabalho, ninguém
ao redor parece enxergar a dor de Satoshi em deixar a rotina e dar início a uma
nova fase. Em casa, as coisas não estão muito melhores. A perda de memória de
Kimiko, sua esposa, vai se agravando, e os cuidados com ela recaem sobre ele,
sobretudo depois que uma tragédia acomete a filha do casal. Com o outro filho
vivendo no Japão e o neto ausente, Satoshi experimenta, de modo estoico, os
primeiros sinais da solidão, que só pioram quando ele é obrigado a se mudar
para um apartamento menor e se despedir de Peri, seu cachorro. No novo prédio
onde passa a morar, a solidão de Satoshi dá as mãos à de d. Estela e Altair,
seus vizinhos, cuja história de vida o protagonista descobre aos poucos. Com a
coragem de representar o desamparo em toda sua crueldade, porém avesso a
melodramas, Oscar Nakasato toca em pontos sensíveis da sociedade brasileira e
provoca a reflexão ao desafiar o final trágico que parece se anunciar: quando
Satoshi contrata Akemi como cuidadora de sua esposa, sua vida particular ganha
novos contornos e a configuração do cotidiano e da família se alteram de modo
inusitado. Em sua prosa a um só tempo austera e atenta aos detalhes, tão
característica da cultura japonesa na qual Nakasato cresceu,
Ojiichan
mostra que a terceira idade não é a linha de chegada, mas um caminho a ser
trilhado, e transborda a beleza e a serenidade necessárias a um mundo ocidental
de supervalorização da juventude e da velocidade. Publicação da editora
Fósforo.
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Nova edição e tradução de um dos principais livros de contos de Charles Bukowski.
Em vida, Charles Bukowski escreveu
cinco coletâneas de contos, sendo
Ao sul de lugar nenhum uma das mais
renomadas, por elevar sua prosa afiada e destacar a singularidade do autor.
Tratando de temas como solidão, miséria, amor e sexo, ele ergue a voz dos
degenerados e a encapsula em alguns de seus contos mais célebres, incluindo
“Amor por dezessete e cinquenta”, em que um homem se apaixona por uma manequim,
“O diabo era quente”, que conta com o próprio diabo como personagem, e
“Política”, que faz uma crítica mordaz à performatividade política. Nesta
coletânea ácida, Bukowski tece narrativas provocativas que o marcam como o
último maldito de literatura ― um símbolo da resistência dos exilados e um dos
mais importantes autores da contracultura. A nova edição no âmbito das
publicações da HarperCollins Brasil é comentada, com tradução de Isadora Prospero
e posfácio de Bruno Ribeiro.
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Luto, desejo, amor entre
mulheres: o aguardado romance de estreia da premiada poeta Sara Torres é um
mapa das rachaduras que nos tornam humanos; um convite para acariciar sem medo
as cicatrizes que nos formam.
A protagonista desta história, que
compartilha com a autora nome e vida, enfrenta há anos o duro diagnóstico de
câncer de sua mãe. E, no exato instante em que a mãe morre em uma cidade do
norte da Espanha, ela faz amor com uma mulher em um hotel em Barcelona, o que a
impede de se despedir. Pouco depois, sua amante desaparece de forma brusca e
definitiva. E o que existe, depois desse abalo de estruturas, é a vida com a
sua parceira em um pequeno apartamento à beira-mar; a parceira que tenta
acolher a angústia de um corpo que chora por uma mãe ao mesmo tempo que chora
de desejo por outra mulher. Temos aqui uma voz narrativa sincera, crítica, mas
também muito terna, que conta a perda a partir dos afetos e apegos, e não a
partir do discurso de ressignificação e superação. É preciso, sim, entender o
amor, processar o luto, mas - mérito da construção honesta e sofisticada de
Sara Torres — não temos aqui um manual de como refazer a vida após uma grande
perda. Em
O que existe, encontramos uma narrativa poética que oferece um
pulso entre o que é possível dizer e o que desejamos dizer mas ainda não
sabemos como articular. Acompanhamos a protagonista em sua investigação a
respeito das facetas do abandono e da vontade de tentar entender uma mãe que
marcou a vida e os modos de sua filha com sua avassaladora forma de amar. Publicação
do selo Contemporânea, da Autêntica; tradução de Silvia Massimini Felix.
Você pode comprar o livro aqui.
A versão moderna do mito de
Atena a partir de uma narrativa que se passa na mente de uma menina de doze
anos.
Separada de seu pai, que sofre de
problemas psiquiátricos, Anna é enviada para uma nova família. Contudo, ela
sucumbe à depressão e é internada. O grito de guerra de Anna ressoa pelas
páginas de
A catástrofe da Hélios, um romance conciso e penetrante como
um apelo apaixonado levado ao seu extremo emocional. Este é o terceiro livro de
Linda Boström Knausgård pela editora Rua do Sabão; a tradução é de Luciano
Dutra.
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Pela primeira vez em tradução
completa do japonês, Morte em pleno verão
oferece um panorama das
obsessões de Yukio Mishima: a degradação do Japão tradicional, a cultura do
teatro Nô, o fascismo, o universo das geishas
e, por fim, o questionamento de
gênero e a transexualidade.
Enquanto uma mulher dorme, sua
irmã e dois de seus filhos morrem afogados em um acidente trágico em um
balneário. A culpa paralisante desta mulher e sua busca por reconstruir a vida
são narradas em detalhes precisos, focando sempre nos seus sentimentos contraditórios
e complexos. Este conto, que dá título ao livro e que abre
Morte em pleno
verão, demonstra como Yukio Mishima deve figurar no panteão de melhores
escritores da história da literatura: avesso a simplificações maniqueístas, o
autor japonês construiu sua obra a partir das zonas cinzentas da consciência
humana. Uma coletânea de contos poderosos, nos quais o conflito entre tradição
e modernidade ocupa o primeiro plano: de um lado, cenários urbanos e
geishas em
crise; de outro, o budismo da Terra Pura e o teatro Nô. Suas histórias empregam
diferentes estratégias narrativas, mas possuem em comum a dedicação à
complexidade psicológica das personagens. Assim, Mishima toma o local e o
específico para mergulhar no que há de mais intrigante naquilo que nos torna
humanos. A tradução de Andrei Cunha sai pela Companhia das Letras.
Você pode comprar o livro aqui.
Uma afirmação do poder da arte
e da beleza, bem como da necessidade que todos temos de, como queria Rimbaud,
“reinventar a vida”.
Numa formulação certeira, o líder
ianomâmi Davi Kopenawa afirmou que “os brancos não sabem sonhar” — e o
resultado dessa incapacidade se traduz na destruição das florestas, na poluição
dos rios, na morte de muitas espécies, levando o planeta e todos os seres que
nele habitam à beira da extinção. Como um antídoto a essa “ausência de sonho”,
o que a antropóloga e pesquisadora das práticas de leitura Michèle Petit faz em “Somos animais poéticos: a arte, os livros e a beleza em tempos de
crise” é iluminar o modo como a literatura — oral e escrita —, e outras
formas de arte a elas associadas, podem nos ajudar a recuperar nossos desejos,
e a nos conectar conosco e com o mundo à nossa volta. Longe de qualquer
abordagem maniqueísta,
Somos animais poéticos desdobra e aprofunda os
temas que tornaram sua autora uma referência mundial nos estudos sobre a
leitura, a função das bibliotecas e dos mediadores culturais nos mais
diferentes contextos. Dando voz tanto a artistas consagrados como a pessoas
anônimas, muitas delas sobreviventes de grandes catástrofes — como a recente
pandemia da covid-19, também discutida aqui —, este livro é ele próprio uma
afirmação do poder da arte e da beleza, bem como da necessidade que todos temos
de, como queria Rimbaud, “reinventar a vida”. Com tradução de Raquel Camargo, o
livro é publicado pela Editora 34.
Você pode comprar o livro aqui.
REEDIÇÕES
Organizado pelo próprio
Fernando Sabino, Cartas perto do coração
apresenta sua troca de
correspondência com a amiga Clarice Lispector entre os anos 1946 e 1969.
O livro é republicado pela Editora
Record em edição especial com capa dura e novo projeto gráfico, prefácio
inédito de Nádia Battella Gotlib, professora da USP e biógrafa de Clarice, mais
fac-símiles também inéditos das cartas e das notas de leitura do original de
A
maçã no escuro (1998). “Em janeiro de 1944, eu mal havia completado vinte
anos e recebia em Belo Horizonte, onde ainda morava, o exemplar de um romance
chamado
Perto do coração selvagem, com uma dedicatória da autora,
Clarice Lispector, que eu não sabia quem fosse. Fiquei deslumbrado com o livro.
Rubem Braga conheceu Clarice em Nápoles durante a guerra. Quando ela retornou
ao Brasil, Rubem nos apresentou um ao outro. Fiquei deslumbrado com ela”, conta
Fernando Sabino na Apresentação de
Cartas perto do coração, livro que
faz jus à longa e profunda amizade que os dois dos mais importantes escritores
brasileiros construíram ao longo de décadas. Depois de apresentados por Rubem
Braga, Sabino e Lispector começaram uma relação fraternal marcada por horas de
conversa em encontros marcados ou na própria casa do escritor, onde Clarice
conheceu a esposa dele, Helena, e os amigos de longa data. Com as viagens
intensas de ambos, mantiveram o hábito de escrever um para o outro, cultivando
o vínculo de amizade e as trocas intelectuais e afetivas. Publicadas pela
primeira vez em 2001, as cartas aqui presentes nos permitem descobrir o mundo
interno desses dois escritores quando jovens. O diálogo entre ela e Sabino foi,
além de pioneiro, um dos mais intensos desde o início de sua carreira
literária.
Você pode comprar o livro aqui.
RAPIDINHAS
João do Rio 1. A Civilização
Brasileira anunciou que prepara a reedição de João do Rio. Vida, paixão e
obra, do jornalista João Carlos Rodrigues. João do Rio 2. A Chão Editora publica um livro reunindo 31 crônicas inéditas do cronista; trabalho organizado por Juliana Bulgarelli.
Alejo Carpentier na 34.
A editora apresenta ainda neste mês
A cidade das colunas, com tradução de Samuel
Titan Jr. e fotografias de Paolo Gasparini.
DICAS DE LEITURA
Na aquisição de qualquer um dos
livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a
manter o Letras.
1.
Romances de cordel, de Ferreira
Gullar (José Olympio, 104p.) Nos anos 1960, o poeta esteve engajado em várias
frentes da militância político-cultural e este livro reúne, dessa época, quatro
folhetos de cordel que tematizam as dores a agruras da gente num país assolado
pela ditadura. A edição traz ilustrações do xilogravurista Ciro Fernandes.
Você pode comprar o livro aqui.
2.
Do Amazonas a Paris: as lendas
indígenas de Vicente do Rego Monteiro (Trad. Regina Salgado Campos, Edusp, 176p.) Um
livro indispensável para os amantes de edições especiais e para os leitores da
vanguarda. A caixa reúne dois livros fac-similares que Vicente do Rego Monteiro
publicou em tiragens limitadas e especiais em Paris em que revisita literária e
plasticamente a arte figurativa indígena.
Você pode comprar o livro aqui.
3.
Abraço apertado, de Romain
Gary
(Trad. de Rosa Freire D’Aguiar, Todavia, 224p.) Uma fábula
humorística que trata da relação entre um funcionário de escritório e uma cobra
píton, seu animal de estima.
Você pode comprar o livro aqui.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
Preparamos para os leitores um
pequeno reel disponível em nosso Instagram com uma listinha batizada de sete pequenos
notáveis. Reúne sete pequenos livros (na extensão e no formato) mas grandiosos
na qualidade. Veja quais e interaja conosco — se já leu algum deles, se tem
curiosidade por algum, se recomenda outros, enfim, o caminho é
por aqui.
BAÚ DE LETRAS
No Brasil, o segundo domingo de
agosto é Dia dos Pais. E ainda olhando para as listas de livros, vale recordar
esta lista que foi apresentada no blog em 2012: com livros que lidam com a relação pais e
filhos.
E associado ao destaque desta edição
do Boletim, recordamos este texto trazido para o
Letras na ocasião do
centenário de um dos livros principais do escritor uruguaio Horacio Quiroga —
Contos
da selva.
Leia aqui.
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