Boletim Letras 360º #592

Jon Fosse. Foto: Tor Stenersen




LANÇAMENTOS
 
A chegada ao Brasil da poesia do Prêmio Nobel de Literatura 2023 Jon Fosse.
 
Quando o nome do norueguês Jon Fosse foi anunciado para receber o mais importante prêmio da literatura em 2023, os leitores de outros idiomas o conheciam principalmente pela sua produção para o teatro, mas não demorou para que sua obra em prosa começasse a aparecer nas vitrines em todo o mundo. Fosse, no entanto, é “poeta de ofício”, isto é, iniciou-se na escrita fazendo poemas, já na adolescência, e nunca abandonou os versos desde então, como revelam os livros agora reunidos em Poemas em coletânea, que acompanha uma produção que se estende de 1986 até 2016. Em todo esse período, com as tormentas próprias de uma obra visceral, os poemas de Fosse levam os leitores a experimentar um trânsito vertiginoso entre paisagem externa e vida interior, em que a peculiar geografia à sua volta — com suas cores intensas, dezenas de milhares de ilhas e lagos formando um mesmo território — se funde às imagens forjadas numa alma em que a contemplação namora o delírio. E há algo que torna ainda mais incrível o mergulho poético de Fosse: seus poemas sequer são escritos na língua em que a maioria de seus compatriotas se expressa. O poeta escreve numa variante minoritária do norueguês, nynorsk, em busca de um “frescor e clareza” que, para ele, a língua “usada e usada e usada” acaba perdendo. Este foi mais um dos desafios que a poesia de Fosse ofereceu a seu premiado tradutor brasileiro, Leonardo Pinto Silva, também responsável pela versão brasileira dos romances Brancura e A casa de barcos, publicados pela Fósforo. Para os leitores que já o admiram por seus romances, ler a poesia de Jon Fosse é, sem dúvida, uma forma ainda mais viva e inquietante de entrar nesse universo extraordinário em que “sempre há coisas demais para esquecer”, mas sobre a terra, nas águas, no peito, bate “um vento com o qual o coração ainda pode se contentar”. Poemas em coletânea sai pela coleção do Círculo de Poemas, das editoras Fósforo e Luna Parque. Você pode comprar o livro aqui.
 
O segundo volume da portentosa biografia de Franz Kafka escrita por Reiner Stach.
 
Kafka: os anos do discernimento conta a história dos últimos anos de vida do escritor, de 1916 a 1924. É a última década de um colapso pessoal e político. O autor de A metamorfose era agora um judeu alemão com passaporte tcheco e sofria de tuberculose, àquela altura uma sentença de morte que tornava impossível a existência literária. A fascinante narrativa de Stach, que reflete as últimas descobertas sobre a vida e a obra de Kafka, atrai os leitores com uma precisão quase cinematográfica, apresentando os momentos finais de um dos maiores escritores de todos os tempos. Com tradução de Claudia Abeling, o livro é publicado pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um hino à empatia e ao que nos faz humanos, um relato a um só tempo doce, brutal, irônico e amável sobre a vida que se vive até o fim. Inesquecível.
 
Residente de um lar para idosos, uma mulher registra, em um pequeno gravador de voz, o diário de seu último ano de vida. Sua filha, autora deste romance, transcreve essa memória, atribuindo-lhe força literária na forma de um condensado de incrível vitalidade, ironia, revolta e fé na vida. A história se passa no Hotel Paraíso, e a conhecemos por meio do olhar de Maria Alberta Nunes Amado, a dona Alberti, figura extraordinária, de complexidade notável, que narra os principais acontecimentos do local: as visitas, quem chega para ficar, quem parte (e quem tenta fugir), a convivência com as amigas mais próximas, com outros moradores e cuidadores — tudo permeado por sua curiosidade inesgotável, por sua pulsão de vida e pela força de sua mente, na contramão do corpo que, às vezes, insiste em fraquejar. Acompanham Maria Alberta personagens que desfazem qualquer ideia maniqueísta que se possa ter sobre lares como esse e seus habitantes, pessoas demasiado humanas em suas contradições, vivências, medos e anseios, gente que, mesmo com pouco futuro pela frente, ainda sonha. Imersos no Hotel Paraíso, somos impelidos a refletir sobre a condição humana em tempos incertos, sobre a velhice, os momentos fugazes da velhice e seus becos sem saída. Misericórdia é, entre tantas outras coisas, um diálogo entre a força e a fragilidade, o que se vive e o que se escreve, o que se sabe e o que se intui. O premiado romance de Lídia Jorge, sai pelo selo Contemporânea, da Autêntica. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um novo livro do poeta palestino Mahmud Darwich entre os leitores brasileiros.
 
Diário da tristeza comum é o primeiro livro em prosa escrito pelo poeta palestino Mahmud Darwich. Trata-se de um conjunto de ensaios publicado em 1973 em Beirute. Estes ensaios autobiográficos recuperam o passado do autor na Palestina ocupada. As experiências da Nakba, do deslocamento, do retorno, bem como o episódio de sua detenção vêm acompanhados de uma reflexão sobre a ocupação, sobre o projeto sionista e sobre o nacionalismo árabe, que, para o leitor de hoje, parecerá extremamente — e infelizmente — bastante atual. O livro sai pela editora Tabla; a tradução é de Safa Jubran. Você pode comprar o livro aqui.
 
As extraordinárias aventuras de Segurant — um cavaleiro da Távola Redonda do Rei Artur esquecido pelo tempo — foram redescobertas, após sete séculos.
 
Em 2023, um grande acontecimento entusiasmou os círculos literários na França. A descoberta de um novo cavaleiro na lenda do Rei Artur. Diferentemente de outros nomes, como Merlin, Lancelote, Tristão, Percival e Gilead, que ficaram imortalizados no imaginário ocidental, Segurant, o misterioso cavaleiro que venceu um dragão, foi esquecido de uma das narrativas mais famosas de todo o mundo. O paleógrafo arquivista Emanuele Arioli encontrou porções do romance com a história de Segurant em cópias medievais e malconservadas espalhadas por museus da Europa e dos Estados Unidos. O trabalho de pesquisa e reconstituição histórica levou 10 anos e passou por cinco países — França, Itália, Alemanha, Bélgica e Estados Unidos —, resultando em um total de 28 textos.  Juntos, eles formaram a base deste livro que, depois de enorme repercussão na França, chega ao Brasil pelo selo Vestígio/ Autêntica com tradução do próprio Emanuele Arioli. Segurant, o cavaleiro do dragão: o romance perdido da Távola Redonda sairá em versões infanto-juvenil e HQ. Você pode comprar o livro aqui.
 
O aguardado novo romance de Sally Rooney, autora de Pessoas normais e fenômeno literário internacional. Uma história comovente sobre luto, amor e laços familiares.
 
Além do fato de serem irmãos, Peter e Ivan Koubek não parecem ter muita coisa em comum. Peter é advogado em Dublin e está na faixa dos trinta anos — é bem-sucedido, competente e parece ser invencível. Mas logo depois da morte do pai, ele passa a tomar remédios para dormir e a sentir dificuldade de administrar a relação com duas mulheres bem diferentes — Sylvia, seu primeiro amor, e Naomi, uma universitária para quem a vida é uma grande brincadeira. Ivan tem 22 anos e é jogador de xadrez. Sempre se considerou um cara que não tem muito traquejo social, um solitário, a antítese do irmão mais velho e fútil. Nas primeiras semanas do luto, ele conhece Margaret, uma mulher mais velha que está deixando para trás um passado turbulento, e a história dos dois logo se entrelaça profundamente. Para os dois irmãos enlutados e as pessoas que eles amam, esse é um novo intermezzo — um interlúdio de desejo, desespero e possibilidades —, uma oportunidade de descobrirem o que uma vida pode conter sem se quebrar. Intermezzo sai pela Companhia das Letras com tradução de Débora Landsberg. Você pode comprar o livro aqui.
 
A nova edição e tradução brasileira de O retrato de Dorian Gray.
 
Publicado pela primeira vez em 1891, já no século XXI, descobriram-se versões anteriores, dando início a outro debate acerca de todas as versões da obra. A edição da Antofágica traz o texto de 1891 com notas de rodapé comentando o processo de escrita do autor ao longo de todas as versões deste que é um dos mais amados e analisados da literatura. Até onde você iria em troca da juventude eterna? Rico, jovem e extremamente atraente, Dorian Gray está no auge de sua vida. Mas quando se torna inspiração para o pintor Basil Hallward a ponto de ganhar dele um retrato, algo imediatamente se transforma: perturbado pela consciência do envelhecimento, faz uma espécie de barganha para que a pintura carregue o peso da idade enquanto sua própria juventude se mantenha preservada. Entregue à liberdade do prazer e da satisfação de todos os seus desejos, Dorian Gray passa a viver uma vida secreta. Embora aos olhos do conservadorismo inglês seja visto como um homem de moral intocada, no submundo londrino deixa-se levar por um hedonismo extremo, envolvido em relações violentas e com um distorcido senso de ética que degradam apenas o retrato. Polêmico, O retrato de Dorian Gray" carrega não somente a análise de uma época, mas também uma profunda crítica à sociedade, ao moralismo vitoriano e, sobretudo, ao desejo de uma juventude permanente. É a história de uma vida dupla marcada tanto pela culpa quanto pelo prazer. A edição traz notas assinadas pelos pesquisadores Manoel Carlos Alves (UFBA) e Liciane Guimarães Corrêa (UERJ) e conta com tradução inédita de Samir Machado de Machado. A edição é ilustrada pelo artista Marcelo Tolentino, que usou a técnica da monotipia para gravar mais de 60 ilustrações. A apresentação é do escritor Vitor Martins, e assinam os posfácios Manoel Carlos Alves (UFBA), a escritora Natalia Borges Polesso e Samuel Gomes. Você pode comprar o livro aqui.
 
Com a publicação de A chegada da escrita, o público leitor brasileiro tem acesso a mais uma obra fundamental de Hélène Cixous, autora franco-argelina com vasta e importante produção — entre ensaios, teatro e ficção —, e nome incontornável da literatura mundial contemporânea.
 
Este livro, lançado originalmente em 1976, um ano depois de seu trabalho mais conhecido, O riso da Medusa, reúne oito textos em que o tema da escrita das mulheres é mais uma vez o mote para pensar os caminhos da produção literária, fazendo dialogar diferentes tempos, personagens e gêneros — como o ensaio, o registro autobiográfico, cenas literárias e teatrais —, e criando um engenhoso jogo de sentidos no cruzamento da literatura e da psicanálise. Com tradução de Flavia Troccoli, o livro é publicado pela editora Bazar do Tempo. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
A edição da Penguin/ Companhia das Letras para a primeira parte da Comédia, de Dante.
 
Com tradução primorosa de Maurício Santana Dias e Pedro Falleiros Heise ganhadora do prêmio Paulo Rónai de tradução da Biblioteca Nacional 2022, o clássico de Dante ganha nova vida e convoca leitores a desbravar as visões infernais descritas pelo grande poeta italiano. Primeira parte da Comédia de Dante Alighieri, Inferno é uma viagem às profundezas para onde foram condenados os que não agiram de acordo com a ética cristã. O poeta romano Virgílio é o responsável por guiar Dante nesse trajeto. Ao descrever o percurso de uma alma cristã que parte da consciência do pecado (Inferno), passa pela purificação interior (Purgatório) e chega à visão de Deus (Paraíso), Dante dialoga com as tradições da poesia clássica greco-latina, dos textos bíblicos e mesmo do pensamento árabe. A edição bilíngue da Penguin-Companhia traz ainda um influente ensaio do russo Óssip Mandelstam, até então inédito no Brasil. Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS
 
O último romance de Ismail Kadaré 1. Dias depois da morte do escritor albanês, registrada no 1º de julho de 2024, a editora Companhia das Letras anunciou a publicação para setembro de Um ditador na linha. O livro sai com tradução de Bernardo Joffily.
 
O último romance de Ismail Kadaré 2. A narrativa reconstrói o telefonema de Stálin para Boris Pasternak acerca do destino de Óssip Mandelstam, poeta que morreu num campo de concentração comunista quatro anos depois do acontecimento de junho de 1934.
 
Inédito de Édouard Louis 1. A Todavia que tem cuidado da obra do escritor no Brasil desde 2022 se prepara para publicar um novo livro do francês: o seu romance mais recente.
 
Inédito de Édouard Louis 2. Monique se liberta é a continuação de Lutas e metamorfoses de uma mulher, acerca da separação da mãe de Louis de um casamento opressivo. A publicação coincide com a primeira estadia dele no Brasil por ocasião da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).

Reimpressões. A Moinhos reimprime dois sucessos do seu catálogo: Damas da lua, da omã Jokha Alharthi, com qual recebeu o prestigiado Man Booker em 2019; e O sagrado coração do homem, livro de contos do brasileiro Michel de Oliveira.

Literatura e cinema. A adaptação do romance Barba ensopada de sangue, do gaúcho Daniel Galera, dirigida por Aly Muritiba, estreia no 52º Festival de Cinema de Gramado. O evento acontece de 9 a 17 de agosto de 2024. 
 
DICAS DE LEITURA
 
Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. Mundo real, de Brandon Taylor (Trad. Alexandre Vidal Porto, Fósforo, 296p.) Um final de semana na vida de um jovem negro gay que saiu do Alabama, Estados Unidos, para estudar no norte do país. Você pode comprar o livro aqui
 
2. Às avessas, de Joris-Karl Huysmans (Trad. José Paulo Paes, Penguin/ Companhia das Letras, 352p.) Uma bíblia do decadentismo, um romance pioneiramente moderno, a pá de cal que restava para sepultar os postulados do naturalismo no romance a partir do último descendente de uma família aristocrática, Jean des Esseintes.  Você pode comprar o livro aqui
 
3. Coruja de trapo, de Andrey Pereira de Oliveira (Cepe Editora, 76p.) Uma via de olhar os dias pela expansão dos substratos da tradição reflexiva da poesia brasileira; a tentativa de captura do nosso tempo a partir das imagens do fim, da queda, da espera e outras possibilidades no tempo da poesia. Dos melhores livros da poesia brasileira neste ano. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
Marcando os 120 anos do nascimento de Pablo Neruda celebrados no dia 12 de julho de 2024, recordamos este pequeno curta de animação The Me Bird preparado pelo estúdio brasileiro 18Bis para o poema “O pássaro eu”. O trabalho que divulgamos em nossa página do Facebook em março de 2013 reimagina o poema do livro Arte de pássaros (1966) em strata stencil e tematiza a tormenta que conecta (no caso do filme) pássaro e dançarina.  É possível ouvir online a leitura na íntegra do poema original — “El pájaro yo” — na voz do próprio poeta chileno. E, por aqui, você lê a tradução brasileira de José Eduardo Degrazia.

Mais latino-americano na lista de efemérides. Neste 13 de julho de 2024 passam-se os setenta anos sobre a morte de Frida Kahlo. Recordamos este luminoso vídeo com raras imagens coloridas da artista na Casa Azul.  

BAÚ DE LETRAS
 
Também neste 13 de julho de 2024, passam-se os dez anos da morte de Nadine Gordimer. Neste endereço, o leitor encontra dois textos em torno da obra e da biografia da escritora sul-africana Prêmio Nobel de Literatura 1991. 
 
A obra de Édouard Louis começou aparecer entre os leitores brasileiros com O fim de Eddy, romance editado pelo selo Tusquets, da Planeta Livros, e seu trabalho mais conhecido. Na ocasião, em agosto de 2018, Pedro Fernandes escreveu resenha aqui.

DUAS PALAVRINHAS
 
Agora passamos a temer o próprio homem, um medo cósmico daquilo que o homem pode descobrir. Eu, é claro, não sinto nenhum desses pânicos. Penso que, pelo contrário, o caminho do homem é a descoberta, penso que Deus abdicou e que desde então Deus é homem.
 
— Pablo Neruda.


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