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Mostrando postagens de julho, 2024

Todd Haynes e suas destruidoras de lares

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Por Bruno Padilla del Valle Cate Blanchett e Rooney Mara, em Carol  (2015).   Inscrever o trabalho do diretor e roteirista Todd Haynes (Los Angeles, 1961) ao cinema queer parece tão reducionista quanto fixá-lo ao cinema de mulheres , rótulos tão absurdos quanto seria falar de cinema heteronormativo ou de homens, embora até recentemente tenham prevalecido. Em qualquer caso, a obra cinematográfica do estadunidense poderia ser considerada como um cinema com abordagem de gênero, que se integra plenamente numa narrativa e num estilo visual poderosíssimos. Ele mesmo afirmou que, desde seus primeiros filmes, a teoria feminista marcou seu pensamento criativo: “Tudo o que me fez questionar o que significava ser homem — e o quanto minha sexualidade desafiaria perpetuamente esses significados — pude encontrar nos argumentos feministas. […] me senti identificado”. A identidade, precisamente, é um dos temas substanciais da sua filmografia e, em particular, sim, a das mulheres.   Após o recente suc

“Filho nativo”: o primeiro grande romance afro-americano

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Por José Antonio Gurpegui Toni Morrison afirmava que a arte não devia ser despojada de algum tipo de implicação política e dava como exemplo disso o romance de Richard Wright, Native Son (traduzido como Filho nativo ). A publicação desse livro em 1940 abalou o panorama narrativo estadunidense e, segundo o renomado professor Irvin Howe, é o romance de maior influência social em toda a literatura dos Estados Unidos.   Nele, a degradante realidade social dos afro-americanos já delineada pela chamada “Renascença do Harlem” durante as décadas de 1920 e 1930 foi capturada artisticamente pela primeira vez. Depois vieram Black Boy (1945), também de Wright, Homem invisível (1952), de Ralph Ellison, ou Go Tell It on the Mountain (1953), de James Baldwin, que constituem um indiscutível cânone literário afro-americano ou os alicerces de uma literatura que culminaria com a atribuição, em 1993, do Prêmio Nobel de Literatura para a autora de Amada .   Bigger Thomas, o protagonista de Filho nativo

A máquina do doutor William Carlos Williams

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Por Tedi López Mills William Carlos Williams. Foto: Arquivo da Universidade da Pensilvânia.   Certa vez, enquanto procurava informações sobre o poema “The Desert Music” de William Carlos Williams na Internet, me deparei com um site curioso : Write An Instant William Carlos Williams Poem . 1 Parecia uma grande oportunidade. Abri a página e vi que para exemplificar sua metodologia o site utilizava um poema curto e intensamente circunstancial do poeta estadunidense, incluído na primeira edição de seus Collected Poems de 1934:   Isto é só para dizer Eu comi as ameixas que estavam na geladeira as quais você decerto guardara para o desjejum Desculpe-me estavam deliciosas tão doces e tão frias 2   O procedimento proposto pelo site era muito simples, mas não transcreverei aqui o resultado do meu exercício. Inicialmente, este poema de Williams foi uma espécie de paradigma do movimento dos Imagistas. À luz deste jogo, revela-se literalmente que se trata de uma questão de peças inte