Boletim Letras 360º #572

Virginia Woolf. Coleção Kirkpatrick, Universidade de St Andrews, St Andrews, Escócia.


LANÇAMENTOS
 
Uma completa seleção de ensaios de Virginia Woolf feita e traduzida por Leonardo Fróes.
 
Umas das maiores ficcionistas do século XX, Virginia Woolf foi também ensaísta prolífica e inovadora, tendo escrito profissionalmente resenhas e artigos para periódicos, como o Times Literary Supplement, durante toda sua vida. Tal como na prosa de ficção, também nos ensaios ela ultrapassa os limites dos gêneros literários, propondo uma forma de pensar e de escrever mais aberta e menos categórica, que não se conformava aos padrões vigentes, de tradição fortemente masculina: “um livro de mulher não é escrito como seria se o autor fosse homem”. Os ensaios reunidos neste volume — com seleção, tradução, apresentação e notas de Leonardo Fróes — foram escritos entre 1905 a 1940 e cobrem os principais temas de sua vasta produção, com destaque para os ensaios literários e os biográficos, ambos majoritariamente dedicados a figuras femininas, como Jane Austen, as irmãs Brontë, Christina Rossetti e Mary Wollstonecraft, cujas vidas e obras Virginia resgata e homenageia. No âmbito da teoria, “Ficção moderna”, “Carta a um jovem poeta” ou “Poesia, ficção e o futuro” revelam uma escritora com enorme integridade crítica e capacidade analítica. “Mulheres e ficção”, de 1929 (protótipo do famoso ensaio “Um quarto todo seu”), permanece até hoje um estudo inspirador sobre as condições materiais e simbólicas da literatura escrita por mulheres. Já em “A morte da mariposa”, Virginia Woolf conjuga reflexão filosófica e alta carga dramática ao tratar de um acontecimento tão singelo quanto a morte de um inseto. No conjunto, estes Ensaios seletos franqueiam ao leitor o acesso a uma das mentes mais brilhantes da história da literatura, em textos de uma lucidez e atualidade impressionantes. Publicação da Editora 34. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um novo livro de Jon Fosse. Originalmente publicado em 1989, A casa de barcos é até hoje uma das obras mais emblemáticas do estilo literário que rendeu ao escritor o prêmio Nobel de Literatura em 2023.
 
Narrado no ritmo frenético de um homem tomado pela angústia, o romance combina temas recorrentes da literatura mundial — amizade, ciúme e triângulos amorosos — com um estilo inovador e hipnótico, no qual um narrador pouco confiável mantém a tensão até a última página, nos fazendo avançar e recuar ao sabor do seu fluxo de consciência. A história se passa em uma pequena cidade costeira da Noruega, próxima a um fiorde. O protagonista é um homem solitário. Sem nunca ter se estabelecido profissionalmente, ele vive com a mãe e ganha algum dinheiro tocando guitarra em bailes da região. O encontro fortuito com Knut, um amigo de infância que mudara de cidade e agora volta para passar o verão com a esposa e as duas filhas, é o evento que desencadeia no narrador o sofrimento que o obriga a escrever. O convívio inesperado com a esposa do amigo traz à tona memórias da juventude dos dois e reabre feridas mal cicatrizadas. Neste romance virtuoso, que mescla ousadia estilística e elementos de thriller escandinavo, é possível experimentar fisicamente o transe literário criado por Fosse. Como os personagens, apequenados e à deriva ao pé do imenso fiorde, ao nos deixarmos levar por estas páginas, experimentamos uma das mais perfeitas traduções literárias dos tormentos humanos. A tradução é de Leonardo Pinto da Silva e o livro sai pela editora Fósforo. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um romance repleto de poesia sobre uma paixão profunda e o significado da vida.
 
Quando o jovem Tomura escuta o som de um piano sendo afinado pelo sr. Itadori no ginásio da escola, sua vida muda de repente. Sente o cheiro da floresta que emana de dentro do instrumento e é tomado por uma nostalgia que o transporta de volta ao vilarejo no meio das montanhas onde nasceu e cresceu. Tinha dezessete anos. Ao perceber a fascinação do jovem estudante, sr. Itadori convida Tomura para conhecer a loja de instrumentos Etô, onde trabalha como afinador de pianos. A partir desse encontro, nasce uma paixão não apenas pelo instrumento, mas também pelo mundo da afinação. Tomura inicia sua formação e logo começa a trabalhar na loja. Apesar de toda sua dedicação, vive constantemente tomado pelo medo do fracasso na busca da perfeição. Ao conhecer as gêmeas Yuni e Kazune e afinar o piano delas, Tomura percebe que não se trata apenas de habilidade técnica na hora de se afinar o instrumento ― e que não existe o som perfeito. Ao escutar uma das gêmeas tocando, o fascínio experimentado impacta sua vida, que até então era cheia de dúvidas e incertezas. O caminho antes sinuoso e difícil começa a ganhar sentido e beleza. Floresta de lã e aço é um romance repleto de poesia sobre uma paixão profunda e o significado da vida. Sobre o poder da música e sobre um jovem que deseja fazer a beleza do mundo ressoar através do piano, tentando fazer de si não só o melhor afinador possível, mas também o melhor ser humano que ele consegue ser. Com tradução de Eunice Suenaga, o livro sai pela editora Zain. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um romance sobre maneiras de enfrentar traumas, lidar com o passado e refletir sobre memória e perdão em uma sociedade cindida.
 
Davi Rieseman, um advogado e ativista judeu, está num palco diante de uma plateia formada por outros judeus. Num discurso que mistura cinismo e generosidade, ele conta a história de sua relação com o sogro, a mãe, a esposa e a filha à luz de juízos bastante particulares sobre temas do noticiário — uma eleição no Brasil, a ascensão evangélica, o antissemitismo, o conflito no Oriente Médio. Anos depois, enquanto caminha por um hospital onde fantasia e realidade se misturam, com as palavras do passado surgindo em fragmentos que iluminam a ação presente, Davi é confrontado por um misterioso coro de vozes, num diálogo que o faz reviver um trauma e se deparar com um dilema na definição do próprio futuro. A ironia do romance, com seu choque de visões morais e políticas construído em diferentes vozes, tempos e tons, guia uma tentativa humanista de lidar com a intolerância. O mundo que surge no desfecho do livro, no qual a esperança dá um aceno entre “palavras de choro ou riso”, é aquele onde precisaremos viver todos — judeus e não judeus, culpados ou inocentes nesse acerto de contas com a história. Passeio com o gigante, de Michel Laub, sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.

Com este livro Sandro Veronesi foi incensado por Ian McEwan, Leïla Slimani, Michael Cunningham e Domenico Starnone.
 
Ambientado em Florença e em outras pequenas cidades italianas, O colibri é a história de quatro gerações da família Carrera. O ponto de vista é o de Marco, filho médico do casal Letizia e Probo, irmão de Irene e Giacomo, pai de Adele e avô de Miraijin. Marco Carrera é o colibri, um homem com uma habilidade quase sobrenatural de pairar, permanecer firme, sem perder o ânimo em meio ao caos de um mundo em constante transformação, de uma vida com alegrias, mas também coincidências fatais, perdas atrozes e amores absolutos. Sandro Veronesi constrói, de modo não linear, a saga familiar dos Carrera. A história, contada por meio de diversos gêneros — cartas, documentos, e-mails, chamadas telefônicas, conversas de WhatsApp —, transita por memórias que vão dos anos 1970 aos dias atuais, aventurando-se até a audaciosa projeção de uma década. Permeado por traições, incomunicabilidades, questões geracionais e de saúde mental, resiliência, superações, doenças, morte e amor, este é um romance emocionante sobre a necessidade de olhar para o futuro com esperança; um retrato da existência humana, das vicissitudes e dos caprichos que nos impulsionam e, em última instância, nos definem. Com tradução de Karina Jannini, o livro sai pelo Selo Contemporânea, da editora Autêntica. Você pode comprar o livro aqui.
 
O primeiro de três volumes com a contística de Andrei Platônov.
 
Após ter publicado a primeira tradução para o português do romance Tchevengur, a Editora Ars et Vita apresenta aos leitores brasileiros uma seleção de contos do escritor russo Andrei Platônov (1899-1951). A coletânea será publicada em três volumes, contemplando 24 contos do autor russo e conta com ilustrações de renomados artistas visuais brasileiros. O primeiro volume é composto por oito contos, escritos entre a década de 1930 e os anos pós-Guerra de 1940: “A borboleta colorida”, “Iúchka”, “O curso do tempo”, “De bom coração”, “Toda a vida”, “O dom da vida”, “Afônia” e “A Oitavinha”. Abordando temas essenciais da humanidade e, em particular, uma percepção filosófica do destino humano em meio ao percurso histórico, a presente edição tece um diálogo entre os textos de um dos nomes incontornáveis da literatura do século XX e a obra visual do artista capixaba Rick Rodrigues, convidado a criar uma série de trabalhos inéditos inspirados nos contos de Andrei Platônov. Você pode comprar o livro aqui.
 
Compilação de ensaios traz três conhecidos escritores para o centro da análise: Paulo Coelho, Manuel Bandeira e Clarice Lispector.
 
Tendo por referência, entre outros, Pierre Bourdieu e Erving Goffman, e uma forte tradição local de sociologia da cultura, o autor examina não apenas a obra publicada dos três, mas também seus depoimentos, suas memórias e sua trajetória concreta. Seu foco é indagar como se construiu, em cada uma das trajetórias, a figura de escritor(a), e como cada um(a) lidou com a imagem pública que lhe tocou viver. O mago, o santo, a esfinge, de Antonio Fernando Pinheiro Filho sai pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
 
Fenômeno de público e crítica, Os náufragos do Wager reconstitui a história real de um naufrágio no século XVIII  e da história impressionante de seus sobreviventes.
 
Em 28 de janeiro de 1742, uma embarcação apareceu na costa do Brasil, tripulada por trinta homens famélicos, à beira da morte, com uma história assombrosa para contar. Eram sobreviventes do Wager, um navio britânico que naufragara em uma ilha deserta na costa da Patagônia. Abandonados durante meses e sob circunstâncias adversas, eles construíram o próprio navio e viajaram por mais de cem dias, sendo recebidos como heróis. Mas seis meses depois uma outra nave chegou à costa chilena, desta vez com apenas três náufragos e uma narrativa muito diferente: os trinta marinheiros que desembarcaram no Brasil não eram heróis, e sim amotinados. Assim começou uma guerra de versões entre os dois grupos, demonstrando que, enquanto estavam na ilha, a tripulação do Wager entrou em guerra, com facções lutando pelo domínio da região. Com mais acusações de traição e assassinato, o Almirantado convocou uma corte marcial para determinar quem estava dizendo a verdade, num processo que punha a vida de todos em xeque. Os náufragos do Wager é uma narrativa fascinante sobre o comportamento humano em situações extremas, repleta de reviravoltas e escrita com ritmo de tirar o fôlego. Indo além da aventura histórica, David Grann mostra que o que estava sob julgamento não eram apenas o capitão e seus tripulantes, mas a própria ideia de império. Com tradução de Pedro Maia Soares, o livro sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
Publicado originalmente em 1991, Breve história do espírito constitui um marco na trajetória de um dos mais notáveis escritores brasileiros.
 
A escrita de Sérgio Sant'Anna mistura vida e literatura ao borrar as fronteiras entre o que é real e o que é fruto da imaginação. Em Breve história do espírito, um dos livros mais celebrados do autor, linguagem e existência se embaralham em questionamentos extremamente filosóficos que jogam luz sobre a fragilidade de três narradores enredados em situações surpreendentes e emocionantes — e por vezes absolutamente constrangedoras. Com humor fino, inteligência aguçada e estilo implacável, este livro traz Sérgio Sant'Anna no auge do seu vigor e atesta a maestria de um autor que se dedicou a observar o comportamento humano — seus temores, suas obsessões e ambições — como ninguém. Reedição da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS
 
Novos livros de César Aira no Brasil. A editora Fósforo anunciou que publicará quatro títulos do escritor argentino ainda durante o ano de 2024: O vestido rosa, A prova, O congresso de literatura e Atos de caridade.  
 
O Surrealismo por dois de seus pais 1. A 100/Cabeças, casa editorial especializada em publicações do universo surrealista, prepara a tradução do Dicionário abreviado do Surrealismo.
 
O Surrealismo por dois de seus pais 2. Projetado por André Breton e Paul Éluard para a IV Exposição Internacional do Surrealismo em janeiro de 1938, na Galerie des Beaux-Arts, o Dicionário… sai com tradução de Diogo Cardoso.
 
Ouriço #3. Agora em parceria com a editora Relicário. A assim designada “revista de poesia & crítica cultural” chega ao terceiro número com textos de autores como Age de Carvalho, Ana Martins Marques, Anne Sexton, Ítalo Moriconi e Ricardo Domeneck.

OBITUÁRIO
 
Morreu o escritor Rui Mourão.
 
Rui Mourão nasceu em 18 de abril de 1929 em Bambuí, oeste de Minas Gerais. Ainda criança muda-se com a família para Divinópolis e depois para Belo Horizonte, onde viveu até 18 de fevereiro de 2024. Ingressa na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais em 1949, quando inicia seu convívio mais estreito com a literatura, tornando-se ávido leitor de Franz Kafka, William Faulkner, Ernest Hemingway, Machado de Assis, Mário de Andrade e Graciliano Ramos. Sobre a obra de alguns, escreverá mais tarde alguns dos seus trabalhos como ensaísta. Exerceu inúmeras atividades em torno da literatura e da cultura: foi fundador com Affonso Ávila e Fábio Lucas da revista Tendência; a parceria com Fábio Lucas renderiam outros frutos, como a criação da revista Vocação. Foi editor do Suplemento Literário de Minas Gerais, colaborador com meios como o suplemento Letras e Artes, do jornal A Manhã e do Suplemento do Estado de São Paulo; foi diretor do Museu da Inconfidência em Ouro Preto e exerceu a docência em várias instituições dentro e fora do Brasil, quando precisou se exiliar durante a perseguição dos militares na ditadura. Entre os livros publicados estão a novela As raízes (com a qual recebeu o Prêmio Cidade de Belo Horizonte), os romances Curral dos crucificados, Cidade Calabouço, Jardim pagão, Monólogo do escorpião, Boca de Chafariz, Servidão em família, Invasões no carrossel, entre outros.
 
DICAS DE LEITURA
 
Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. O estrangeiro, de Albert Camus (Trad. Valerie Rumjanek, Record, 128 p.) Meursault e a experiência radical da liberdade. Um dos livros mais conhecidos do escritor e filósofo francês, essencial para a compreensão do conceito de absurdo por ele formulado. Você pode comprar o livro aqui
 
2. Memorial de Maria Moura, de Rachel de Queiroz (José Olympio, 504 p.) A saga de uma sertaneja numa sociedade que tenta reduzir a todo custo a mulher. Uma luta por dignidade e justiça. Este é um dos principais romances da escritora. Você pode comprar o livro aqui
 
3. Cidade aberta, de Teju Cole (Trad. Rubens Figueiredo, Companhia das Letras, 320 p.) Um nigeriano em Nova York pós-11 de Setembro em errância enquanto refaz sua própria trajetória até sua chegada ao centro do mundo. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
No passado 18 de fevereiro de 2024 celebramos o centenário de Lêdo Ivo. Recordamos a efeméride com este documentário que copiamos no nosso arquivo virtual no Facebook em 2020. Trata-se de Imagem peninsular de Lêdo Ivo. Dirigido por Werner Salles Bagetti, o filme foi realizado para o Edital DOCTV, do qual foi vencedor em 2003, e é um registro, a partir de leituras, depoimentos do próprio poeta, amigos e leitores da sua obra, da biografia e da poesia de Ivo. 
  
BAÚ DE LETRAS
 
Nos arquivos do blog, é possível ler este breve perfil de Lêdo Ivo. O texto assinala ainda algumas das suas principais obras na poesia e na prosa, gênero no qual o alagoano também se destacou. 
 
Do Times Literary Supplement, publicamos recentemente no blog a tradução desta resenha de Virginia Woolf sobre Visits to Walt Whitman in 1890-1891, de John Johnston e James William Wallace — um texto que resulta num perfil do poeta de Folhas de relva
 
DUAS PALAVRINHAS
 
O poeta nasce poeta e se faz e é feito pela cultura que consegue incorporar ao seu ofício. E ele é apenas um elo no grande sistema poético do mundo, um grão de poeira numa tradição que vem do início do universo e haverá de continuar enquanto este nosso planeta existir. Isto porque há algo, no mundo e sobre o mundo, que só a linguagem poética tem condições de exprimir.
 
— Lêdo Ivo, em O vento do mar.

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