Boletim Letras 360º #567
DO EDITOR
Olá, leitores! Antes de chegar às
notícias recolhidas nesta edição do Boletim Letras 360.º, preciso registrar
duas outras novidades:
- o blog regressa com sua programação
normal na segunda-feira, 22 de janeiro de 2024, abrindo oficialmente nosso 17.º
ano online;
- nos próximos dias, será lançada
a chamada para a seleção de novos colunistas para o blog. Assim, se você
escreve sobre livros, arrume seus textos para sua candidatura.
A partir do próximo sábado, as
edições deste Boletim também regressam ao seu formato completo, trazendo as
demais seções que passaram a existir há algum tempo.
Espero que todos estejam bem. Seguimos de mãos dadas por aqui.
Karl Ove Knausgård. Foto: Magnus Liam Karlsson. |
1. Berthe, a contrita, de Balzac. “Sempre me pareceu que o seu mérito principal era ser um visionário e um visionário apaixonado. Todos os seus personagens são dotados do ardor vital com o qual ele mesmo foi animado. Toda a sua ficção é tão colorida quanto os sonhos. Do cume da aristocracia às terras baixas da plebe, todos os atores de sua comédia são mais amargos à vida, mais ativos e espertos na luta, mais pacientes no infortúnio, mais gananciosos no gozo, mais angelicais em devoção do que a comédia do mundo real nos mostra. Em suma, todo mundo em Balzac, até os porteiros, tem genialidade. Todas as almas são almas carregadas de vontade até o topo. Isso é o próprio Balzac. E como todos os seres do mundo externo se ofereciam aos olhos de sua mente com um alívio poderoso e trejeitos impressionantes, ele tornava suas figuras convulsivas; ele escureceu as sombras e iluminou as luzes. O seu gosto prodigioso pelos pormenores, que é devido a uma ambição desmesurada de ver tudo, para tornar tudo visível, para adivinhar tudo, para fazer tudo adivinhar, obrigou-o a marcar com maior força as linhas fundamentais, para salvar a perspectiva do todo. Às vezes me faz pensar naqueles aquafortistas que nunca estão felizes com o resultado, e que transformam em ravinas as principais escoriações do tabuleiro. Esta surpreendente disposição natural gerou maravilhas.” (Charles Baudelaire) Você pode comprar o livro aqui.
Leïla Slimani tem enorme apreço pela solidão, pelo silêncio e por passar tempo em sua casa, mas contrariando a própria natureza, aceita um convite para atravessar uma madrugada no museu Punta della Dogana para explorar as obras de arte sob o aroma das damas-da-noite e partir pela manhã. No espaço do novo e do antigo, ela confronta seu passado e seu presente, e vaga entre as memórias que a definiram como mulher, escritora e filha. Rodeada de arte, em O perfume das flores à noite Slimani explora em uma prosa delicada e envolvente o significado da beleza, da escrita, do eu e do outro, e, envolta pela noite, ela confronta, ainda, o papel da literatura. A tradução que sai pela HarperCollins Brasil é de Francesca Angiolillo. Você pode comprar o livro aqui.
Um coletânea de poemas e contos recorda a obra de Cruz e Sousa.
Organizada por Ismael Chaves, Missal para o
Diabo: contos e poemas assombrosos é uma seleção com as narrativas e os poemas mais
sinistros de Cruz e Sousa. Publicada pela editora O Grifo, a antologia conta com posfácio de Alcebiades Diniz e apresentação de Alê Garcia. Você pode comprar o livro aqui.
Natalia Borges Polesso e um
romance com duas histórias que se marcam pelo trânsito entre infância e a adolescência.
“Era o final dos anos 80, e tudo
isso era normal. Pessoas levavam a filha das outras para casa sem avisar,
crianças passeavam na caçamba dos carros, ninguém usava cinto de segurança,
ansiedade era coisa que se curava com chinelada e/ou benzedura. E o mais maluco
de tudo: existia uma bala assassina, a terrível e deliciosa bala Soft.” Nesse
universo tão real quanto imaginativo, Natalia Borges Polesso apresenta duas
histórias que trazem um olhar sensível sobre a passagem da sua própria infância
para a adolescência. A relação com o irmão mais novo, o possível divórcio dos
pais, os afetos pelas amigas e até a melhor forma de manejar um tchaku: tudo
pode rapidamente se transformar em dilemas e inseguranças. À medida que as
situações vêm à tona, a pequena Natalia vai descobrindo que compreender
sentimentos é tatear no escuro e que aprender a tratar das próprias
complexidades pode ser justamente o que faz ecoar a individualidade. Foi um
péssimo dia é publicado pela editora Dublinense. Você pode comprar o livro aqui.
Uma nova tradução de um dos principais tratados do filósofo Espinosa.
Baruch de Espinosa, ou Spinoza (1632-1677), nasceu em Amsterdã, filho de
pais judeus emigrados de Portugal. Aos 24 anos, por suas opiniões pouco
ortodoxas, foi expulso da sinagoga da cidade e acabou se mudando para Haia,
onde publicou duas obras em vida: os Princípios da filosofia de Descartes
(1663) e o Tratado teológico-político (1670), este editado de forma
anônima. Sua obra magna, a Ética demonstrada segundo a ordem geométrica,
só veio à luz no final de 1677, após a sua morte, com a publicação, por amigos,
das Opera Posthuma, tendo logo entrado para o Index da Inquisição. Constituída
de cinco partes — “De Deus”, “Da natureza e da origem da mente”, “Da origem e
da natureza dos afetos”, “Da servidão humana, ou das forças dos afetos” e “Da
potência do entendimento, ou da liberdade humana” — e abordando questões de
ontologia, epistemologia, física e psicologia, a Ética acabou se tornando uma
das obras mais influentes do pensamento ocidental, sendo debatida
apaixonadamente até os dias de hoje. Combinando o método euclidiano (usando de
definições, postulados, axiomas, proposições, demonstrações, corolários e
escólios) com o pessoal e o subjetivo (recorrendo à imaginação, ao corpo e à
sensibilidade), o rigoroso trabalho intelectual de Espinosa parte da definição
heterodoxa de que Deus está em tudo e tudo é Deus, para, assim, demonstrar
passo a passo como podemos lidar com os nossos afetos e usarmos a potência do
nosso intelecto para escapar da servidão e atingir a liberdade e a plenitude
enquanto seres humanos. O novo volume publicado pela Editora 34, bilíngue
latim-português, baseia-se na canônica edição Gebhardt da Ética, e traz
a apurada tradução de Diogo Pires Aurélio, um dos maiores especialistas da
atualidade na obra de Espinosa, que também assina as notas e a introdução a
este grande clássico da filosofia moderna. Você pode comprar o livro aqui.
Um livro para os amantes de livros sobre livros.
Qual a relação entre Santo Agostinho e as hashtags? O que os sermões de
padres do século XIII têm a ver com pesquisas no Google em 2024? Este livro
responde de modo divertido a essas e a outras perguntas ao narrar a história de
uma ferramenta cotidiana pouco conhecida, mas extraordinária, e que hoje é a
tecnologia-chave que alicerça toda a nossa leitura on-line: o índice. Com um passado ilustre, porém pouco visitado, o índice remissivo de
assuntos e seus irmãos correlatos, como a concordância e o sumário, estão
intimamente ligados à história dos livros, do conhecimento e das universidades,
passando pela política e pela literatura. Apesar de relegado às páginas finais
dos volumes impressos, e de mal constar nos livros digitais, o índice foi
objeto de interesse e de narrativas de Virginia Woolf, Italo Calvino, Vladimir
Nabokov e Platão. E é justamente esta a surpresa do livro de Dennis Duncan:
fazer com que pensemos sobre esse dispositivo textual muitas vezes considerado
menor ou trivial, mas que hoje é a base de nosso dia a dia. O autor domina a arte de desautomatizar visões pré-estabelecidas,
chamando a nossa atenção para a invenção da ordem alfabética, do número de
página nos livros impressos, bem como para polêmicas que parecem atuais, mas
que há oitocentos anos permeiam a vida pública. Um exemplo delas é o fato de
acharmos a ideologização dos dados um problema contemporâneo, sem nos darmos
conta de que as entregas personalizadas dos algoritmos do Vale do Silício não
estão muito distantes dos índices que, desde os primórdios, eram usados para
zombarias, maledicências e formação de opinião. Eleito um dos melhores livros de 2022 pela revista New
Yorker, Índice, uma história do traz uma série de anedotas com
papas, filósofos, primeiros-ministros, poetas e, claro, indexadores, que guiam
desde o bibliófilo mais apaixonado até o mais casual dos leitores por uma
viagem divertida à curiosidade humana. Com humor bastante espirituoso, este
livro não é só sobre leitura, mas sobre o modo como nos relacionamos com o
mundo, como o categorizamos e o entendemos. É impossível não esboçar ao menos
um sorriso ao navegar por esta ode às histórias bem contadas. A tradução de Flávia Costa Neves sai pela editora Fósforo. Você pode comprar o livro aqui.
Rever Debret, ainda.
Durante a década e meia que passou
no Rio de Janeiro, entre 1816 e 1831, Jean-Baptiste Debret viveu uma existência
dupla. Pintor da Corte, serviu dom João VI e dom Pedro I; ao mesmo tempo,
preenchia caderno após caderno com desenhos e aquarelas, registrando o que via
nas ruas da cidade tropical e escravocrata. De volta à França, valeu-se dos
frutos desse ateliê das ruas para ilustrar copiosamente sua Viagem pitoresca
e histórica ao Brasil, publicada entre 1834 e 1839. No coração das imagens
e dos textos que as acompanham, palpita uma pergunta premente para seu autor,
filho da Revolução Francesa: como criar uma nação moderna a partir de uma
história tão violenta, marcada pela perseguição aos indígenas e pela escravidão
africana? Estamos longe, como se vê, da imagem costumeira do pintor neoclássico
em exótico exílio ultramarino. Neste ensaio original que é Rever Debret:
Colônia — Ateliê — Nação, Jacques Leenhardt convida-nos a revisitar a obra
de Debret, bem como sua longa e atribulada fortuna entre nós, até o presente
mais próximo. Pois, rechaçado pela Biblioteca Imperial brasileira no século
XIX, redescoberto e traduzido no XX, o livro de Debret converteu-se, no início
do XXI, em ponto de partida para um intenso trabalho de crítica, paródia e
carnavalização na arte brasileira, sobretudo às mãos de artistas ameríndios e
afro-brasileiros. É para essa reviravolta que se dirige a atenção de Leenhardt
na parte final de Rever Debret — para esse momento em que vão se
invertendo simbolicamente as hierarquias iniciais, de tal modo que os herdeiros
dos antigos focos da atenção de Debret retomam e subvertem as imagens do
passado. Nesse ateliê contemporâneo vão se plasmando não apenas novas formas de
prática artística, mas também novas formas de imaginar os corpos e os saberes,
as fraturas e as possibilidades de uma nova história para a nação brasileira em
uma perspectiva livre da sombra colonial. Com tradução de Samuel Titan Jr., o
livro que integra a coleção Fábula, sai pela Editora 34. Você pode comprar o livro aqui.
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Durante o recesso de final de ano, as edições do Boletim Letras 360º são reduzidas; saem sem as demais seções de costume.
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