Boletim Letras 360º #545

Jon Fosse Foto: Tor Stenersen


LANÇAMENTOS
 
Um romance hipnótico e inesquecível de um dos grandes nomes da ficção literária norueguesa.
 
Signe está deitada em um banco de sua casa no fiorde e tem uma visão de si mesma há mais de vinte anos: parada na janela esperando por seu marido Asle, no fatídico dia de novembro quando ele saiu com seu barco e nunca mais voltou. Suas memórias se ampliam para incluir a vida do casal e mais: os laços de família e os dramas que remontam a cinco gerações, até Ales, a trisavó de Asle. Na prosa vívida e alucinante que fez de Jon Fosse um dos mais destacados autores contemporâneos, esses momentos — assim como os fantasmas do presente e do passado — coexistem no mesmo espaço. É a Ales é uma obra-prima visionária e oferece uma reflexão assombrosa sobre o amor, a perda e o legado de nossos antepassados. Com tradução de Guilherme da Silva Braga, livro sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
O novo título no projeto de reedição da obra de Autran Dourado.
 
O suposto roubo de uma arma de fogo mexe com todas as pessoas da pequena e pacata ilha de Boa Vista. Fortunato, uma pessoa com deficiência intelectual, rapidamente se torna suspeito e alvo de uma grande comoção e comitiva para encontrá-lo, vivo ou morto. Cerceados pelo mar e movidos pelo medo em um momento de perseguição e tensão, os moradores da ilha serão levados aos limites de seus próprios conflitos, nos quais vontades reprimidas aparecerão como uma forte ressaca do mar. Vencedora do prêmio Fernando Chinaglia, esta obra-prima é, nas palavras do próprio autor, “uma história de caça e pesca”. A nova edição de A barca dos homens publicada pela HarperCollins Brasil tem prefácio de Oscar Fussato Nakasato, autor de Nihonjin, vencedor do prêmio Jabuti. Você pode comprar o livro aqui.
 
A continuidade da publicação da obra completa de Augusto Abelaira.
 
O terceiro romance de Augusto Abelaira, publicado em 1963, localiza a ação no período da revolução republicana. Se o enredo gira à volta das relações políticas e amorosas entre Vasco Miroto, Maria Brenda e Bernardo Lória, é a relação com o Tempo o traço narrativo mais original deste romance. As boas intenções sai no Brasil pelo selo Minotauro no âmbito do projeto Obras Completas de Augusto Abelaira. Você pode comprar o livro aqui.
 
Em sete breves relatos, Margarita García Robayo demonstra sua habilidade para mostrar o lado mais difícil das coisas.
 
Seus personagens, expostos em sua complexa humanidade, lutam desesperadamente em um mundo no qual simplesmente não se encaixam. Uma mulher que tenta colocar ordem em sua nova vida de enferma; um homem preso em um enorme hotel; as incertezas de um casal frente a seu filho obeso; uma reunião de família desconcertante; a morbidez, a falta de comunicação e o desencontro são alguns dos temas em torno dos quais giram estes relatos inquietantes. A escrita rápida e o humor, às vezes brutal e às vezes compassivo, desta jovem escritora são, como na boa literatura, ferramentas poderosas para explorar e confrontar o leitor com as pequenas e grandes misérias da vida cotidiana. Traduzido por Silvia Massimini Felix, Coisas piores é obra que conversa com a realidade do ser humano, revelando suas mazelas inseridas na rotina do dia a dia, de forma direta e impactante. O livro sai pela Editora Moinhos. Você pode comprar o livro aqui.
 
Contundente e controverso, este romance autobiográfico causou furor por onde passou.
 
Uma mulher tem o rosto desfigurado depois de ser atacada com ácido pelo marido. Ao seu lado está o filho, que a partir de então a acompanhará no lento processo de reconstrução de sua identidade. Baseado em catastróficos episódios reais, vividos pelo autor e por seus pais na Argentina dos anos 1960, O deserto e sua semente é um romance assombroso e comovente. No centro da tragédia está Eligia, que sofre um ataque brutal. Quando estão prestes a oficializar o divórcio, o marido, Arón, com quem fora casada por vinte e oito anos, arremessa contra o rosto da mulher uma jarra de ácido sulfúrico. No dia seguinte, o homem se suicida com um tiro na cabeça no apartamento onde vivia. “Que nos oculta a pele?”, indaga o médico responsável pela tentativa de reconstruir o rosto de Eligia. A certa altura, ele propõe que se plante a semente no deserto, para que se comece algo do zero. Enquanto o narrador, o filho do casal, Mario, vaga de hospital em hospital, primeiro na cidade de Buenos Aires e mais tarde em Milão, em busca da reconstrução física de sua mãe, somos arremessados numa narrativa maior de desintegração, tanto pessoal quanto social. Depois de ser rejeitado por diversas editoras, O deserto e sua semente foi publicado em 1998, numa edição custeada pelo autor. “O livro foi bem recebido, sim. Mas lido numa chave muito autobiográfica, e o sofrimento não legitima a literatura. O que legitima a literatura é o texto”, declarou Jorge Baron Biza numa entrevista, em 1999. Três anos depois da publicação, tendo recebido uma avalanche de boas críticas pela obra, o autor se suicidou, lançando-se do 12.º andar de um prédio — o mesmo no qual seu pai havia se matado. Um romance que expõe a dor e o horror a ponto de parecer anular o sentido humano dos acontecimentos. Uma obra-prima sinistra e absolutamente única.  Com tradução de Sérgio Molina, o livro sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
A Arte & Letra acrescenta um novo título à sua coleção Alfaiate.
 
A menina invisível e outras histórias de visagem reúne um ensaio e três contos da autora Mary Shelley. “Sobre Fantasmas” é um ensaio sobre o medo — que passeia pelas noções desse sentimento desde a Antiguidade — e de como ele está presente nas histórias sobrenaturais. O primeiro conto é “A Menina Invisível” que junta elementos clássicos dos textos do gótico inglês, tais como ambientes em ruínas, uma pintura de mulher que enquadra a fantasmagoria de alguém que não se sabe se vive ou se já morreu, e a impossibilidade de um amor. Em “O Imortal Mortal” a voz narradora é o próprio fantasma de um humano que ele mesmo já foi. Ou melhor, ele deixa a pergunta: um humano que já vive há mais de três séculos ainda é um corpo com vida? O “Mau Olhado” é um dos textos mais complexos de Mary Shelley por ser bastante representativo sobre seu imaginário contemporâneo e narra questões familiares sobre grupos que habitavam a região da Albânia. A tradução é de Emanuela Siqueira. Você pode comprar o livro aqui.
 
Nova edição e tradução do primeiro romance de Gaël Faye.
 
Pequeno país nasceu de um desafio. A editora Catherine Nabokov, fascinada pelo talento narrativo do rapper Gaël Faye, que conheceu por meio de seu filho, sugeriu que ele escrevesse um livro. Foi assim que Gaël Faye estreou na literatura com um romance sólido e cativante. Nada no livro sugere inexperiência do autor, que tinha 34 anos em agosto de 2016, quando Pequeno país foi lançado na França. Naquele mesmo ano, que encerrou com mais de 700 mil exemplares vendidos, o livro ganhou o Goncourt des Lycéens, versão do principal prêmio literário do país, escolhido por um júri formado por 2 mil estudantes do ensino médio. O romance tem tradução de Marília Garcia e posfácio do escritor angolano Kalaf Epalanga, com quem Faye dividiu a mesa na Flip, em 2019. O “pequeno país” é o Burundi, na região central da África, onde nasceram Faye e seu personagem (e narrador), Gaby, um garoto que passa dos 10 aos 11 anos durante a narrativa. A história tem fortes traços autobiográficos, e o livro não seria tão comovente sem o suporte da vivência do autor. Gaby é filho de um casal de classe média morador de Bujumbura, antiga capital do Burundi, sendo a mãe negra e nascida em Ruanda (país vizinho ao Burundi) e o pai, branco e francês. Com a pele cor de caramelo, o garoto é, socialmente e até em casa, considerado branco. No início, a mãe viaja a Ruanda para procurar seus parentes depois de notícias de que a etnia tútsi, a que ela pertence, está sendo alvo de violência e assassinato. O romance deixa claro que o conceito e a configuração de etnias nos dois países se baseiam em fundamentos questionáveis que foram convenientes à dominação imperialista europeia de séculos. Pequeno país é ambientado em 1993, no momento da eclosão de uma guerra civil entre os tútsis e os hútus, conflito que, em Ruanda, culminou no genocídio de quase 1 milhão de pessoas. Mais do que um retrato de vidas dilaceradas pela guerra, trata-se de um romance de formação. O texto poético de Faye evoca uma infância idílica que aos poucos vai se transformando numa sequência de situações desafiadoras. Um exemplo é a tentativa de recuperar uma bicicleta roubada, acontecimento banal que encerra questões sociais e familiares complexas.  Além dos perigos e tragédias do ambiente de confronto armado, Gaby se vê diante da corrosão da própria família e do despertar amoroso desencadeado pelo diálogo por carta com uma garota francesa que não conhece pessoalmente. Ao mesmo tempo, o personagem vive, na companhia de um grupo de amigos, as delícias de uma infância passada em contato com uma natureza exuberante — e às vezes perigosa — à beira do imenso lago Tanganica. Eles roubam mangas e fumam cigarros escondidos, descem um rio numa jangada feita de tronco de bananeira e brincam de patrulhar as ruas do bairro em que moram, até que a guerra os leva para atividades mais perigosas. Entre os acontecimentos que os meninos presenciam está a primeira eleição direta para presidente no Burundi e, em poucos meses, o assassinato do vencedor, que foi o estopim da guerra. Faye também nasceu em Bujumbura e seus pais eram como os de Gaby: a mãe ruandesa e o pai francês. Escreveu seu primeiro poema aos 13 anos, e o tema era o medo – sentimento que o escritor rememora como predominante nessa fase de sua vida. No mesmo ano, ele se mudou para a França, fugindo da guerra, para ir viver com a mãe. Até hoje Faye vive entre Versalhes, na região de Paris, e Kigali, a capital do Burundi, país que ele preferia nunca ter deixado. A saudade do “pequeno país” é um tema recorrente de suas canções. Foi também um dos assuntos de sua palestra na Flip de 2019, onde recebeu demorados aplausos da plateia. Ao público do evento, ele disse: “Não cresci numa casa com uma grande biblioteca, mas tenho uma urgência de falar e não espero permissão dos outros. Foi isso que o hip-hop me ensinou”. Outra de suas canções é a “Balade brésilienne”, num ritmo que remete ao samba. O livro sai pela editora Carambaia. Você pode comprar o livro aqui.
 
Os últimos dias de um pai à vista de um filho.  
 
Toda narrativa é um recorte. O universo daquilo que uma filha poderia narrar sobre o fim da vida de seu pai é um campo de vastas possibilidades — do frio distanciamento que, para não ceder ao ‘dramalhão’, acaba enxugando as possibilidades de empatia, até a desmedida indulgência na angústia e na autocomiseração. Neste relato, Emmanuelle Lambert escolhe a terceira margem, da qual não estão ausentes o profundo sentimento (do contrário, por que narrar esta história?) nem a quase banal atestação de que, no fim das contas, o chavão nunca deixou de estar correto: acompanhar a morte pode ser, também, nos casos mais afortunados, celebrar quem se vai e quem, ao permanecer, ao ultrapassar seus mortos no tempo, de certo modo lhes confere sobrevida. Ao narrar os últimos cinco dias de seu pai, levado por um câncer, a autora justapõe memórias íntimas e coletivas, que tanto problematizam quanto conferem sentido umas às outras. A aventura da vida de uma família em seu contexto social e político e as anedotas mais íntimas, dolorosas e afetuosamente irônicas se conjugam para a composição de um texto quase inclassificável, belo, comovente, cheio de verve. Desse modo, a autora — ela era ‘o garoto do seu pai’, que só teve filhas — presta homenagem não só a um ente querido, mas à própria arte de narrar: outra grande aventura, da ordem da morte, da ordem da vida. (Adriana Lisboa) Com tradução de Adriana Lisboa, O garoto do meu pai é publicado pela Autêntica. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
Duas edições em capa dura de dois livros de Italo Calvino. Marcos da Companhia das Letras pelo centenário do escritor italiano.
 
1. Nesta obra-prima, Italo Calvino faz do próprio Leitor seu personagem principal, cuja grande missão é ler romances. E tal como você, leitor(a), ele compra um exemplar de Se um viajante numa noite de inverno e se vê imerso em uma trama fascinante, cheia de mistério e expectativa, mas que se interrompe por volta da página 30. Há um erro de encadernação e é preciso voltar à livraria e trocar o exemplar para prosseguir a leitura. Assim começam os obstáculos que o herói vai encontrar: erros de encadernação, roubo de livro, suicídio do autor, confisco, uma prisão inesperada. Na busca da satisfação do prazer da leitura, o Leitor envolve-se em situações kafkianas, encontra personagens bizarros, vive momentos cômicos e, como nas grandes histórias de amor, conhece uma Leitora. Repleto de engenhosidade, inteligência e humor, este livro é um elogio à literatura e à arte do romance, feito por um dos grandes autores do século XX. A tradução de Nilson Moulin sai acompanhada de prefácio de Mauricio Santana Dias. Você pode comprar o livro aqui.
 
2. A nova edição de Por que ler os clássicos inclui projeto gráfico especial e posfácio inédito de Maria Cecília Gomes dos Reis, professora de filosofia da Unifesp. É certo, como diz Italo Calvino, que “nenhum livro que fala de outro livro diz mais sobre o livro em questão”. Ou seja, a leitura crítica jamais substituirá a leitura da obra de criação — mas é fundamental, muitas vezes, para chamar a atenção para detalhes importantes, revelar aspectos despercebidos, projetar nova luz sobre autores já empoeirados. É o que o autor de As cidades invisíveis se propõe a fazer em Por que ler os clássicos. São textos sobre Voltaire, Balzac, Stendhal, Flaubert, Dickens, Tolstói, Borges, Montale, Homero, Ovídio, entre outros, marcados pela inteligência e argúcia de um dos mais celebrados autores do século XX. Um passeio guiado pelas obras fundamentais da literatura, este volume se mostra um clássico na definição do próprio Calvino: “um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”.
O livro é reeditado pela Companhia das Letras. Tradução de Nilson Moulin. Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS
 
George Orwell ensaísta. A Livraria Gráfica publica uma edição com tiragem artesanal e limitada de alguns ensaios do autor de A revolução dos Bichos e 1984 dedicados ao livro e à literatura. Organizado e traduzido por Gisele Eberspächer, as vendas estão disponíveis até o dia 20 de agosto.

Michael Löwy artista. A 100/Cabeças publica uma edição com tiragem limitada bilíngue português-francês com imagens do pensador e crítico marxista — Luz negra: rabiscos, collages e guaches surrealistas.

DICAS DE LEITURA
 
Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. A outra filha, de Santiago La Rosa (Trad. Rafael Ginane Bezerra, Arte & Letra, 216 p.) O segundo romance do escritor argentino acompanha o instante de um homem que a partir do nascimento da filha procura no pai alguma possibilidade de ajuda para as novas circunstâncias daí advindas, mas numa ocasião quando este desaparece sem quaisquer explicações. Você pode comprar o livro aqui
 
2. Do fim ao princípio: poesia completa (1973-1937), de Adalgisa Nery (José Olympio, 560 p.) Indispensável à seção de poesia na biblioteca de todo leitor brasileiro. Pela primeira vez, uma edição compila toda a obra poética de uma escritora que esteve entre os principais nomes da cena modernista no Brasil; estão reunidos aqui os sete livros de poemas de Adalgisa mais uma rica seleta de inéditos. Feito do também poeta Ramon Nunes de Mello. Você pode comprar o livro aqui

3. O cerco, de Alejo Carpentier (Trad. Silvia Massimini Felix, Companhia das Letras, 136 p.) Situada numa Havana mergulhada na incerteza após a queda do ditador Gerardo Machado em 1933, a narrativa acompanha poucas horas na vida de duas personagens misteriosas: um aficionado por música e um ex-integrante das fileiras da luta comunista. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
No dia 19 de agosto de 1929, nasceu o poeta Haroldo de Campos, nome singular para a poesia, o ensaio e a tradução no Brasil. O autor de Galáxias foi recebido pelo programa Roda Viva da TV Cultura, em 1996. A entrevista completa está disponível online aqui
 
BAÚ DE LETRAS
 
Publicado incialmente pela desaparecida Rádio Londres como Meu pequeno país, o livro Gaël Faye agora reapresentado entre os leitores brasileiros foi lido à época por Pedro Fernandes e comentado aqui no blog.
 
DUAS PALAVRINHAS

Acho necessário que a literatura seja poética. Pela formulação poética tento fazer com que o texto seja menos artificial, reflita a vida. Tento fazer com que as frases contenham mais do que as palavras que estão ali. É o que me motiva a escrever. O que quero contar, sei de imediato. A questão é como contar.

— Herta Müller, entrevista para O Globo 

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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.

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