Johnny vai à guerra, Dalton Trumbo
Por Bruno Botto
Dalton Trumbo. Foto: Bettmann. |
Dalton Trumbo lança Johnny vai à guerra no dia 3
de setembro de 1939, dois dias depois do começo da Segunda Guerra Mundial. Para
um livro com a proposta de ser pacifista é uma baita ironia. Mas nem Trumbo
na década de 30, poderia prever que tal livro deveria resistir às várias
intervenções militares estadunidenses nas décadas seguintes. Afinal, a paz
parecia uma fruta ainda meio verde para a maioria do mundo no começo do século
XX.
Para quem possa achar que Trumbo era um desses escritores panfletários
vazios, ele foi um dos célebres roteiristas da época de ouro de Hollywood dos
anos 1930 e 1940; roteirizou filmes como Trinta segundos sobre Tóquio
(1944), Roman Holiday (1953) e Spartacus (1960).
No final dos anos quarenta e começo dos anos cinquenta,
Hollywood decretou caça às bruxas aos comunistas e Dalton Trumbo, que era
filiado do Partido Comunista dos Estados Unidos, entrou para a lista negra; deliberadamente
esquecido, ninguém da indústria do cinema o convidava para assinar novos roteiros. Durante uma
década inteira, ele sobreviveu escrevendo usando vários pseudônimos
para barrar a censura. Essa parte de sua vida foi tratada no filme Trumbo
(2015), com Bryan Cranston no papel do roteirista.
Se em seus roteiros as predileções políticas de Trumbo não
aparecem tanto, em sua literatura fica bem clara. Johnny vai à guerra conta
a história de Joe, um sobrevivente de guerra que está surdo, sem braço e
completamente mutilado. Deitado numa cama de hospital, sem poder se comunicar
ou entender o que acontece ao seu redor, ele reflete sobre sua vida, relações,
família e a guerra.
Em um prefácio dos anos 1970, ainda no período da invasão
estadunidense no Vietnã, Trumbo é bem claro sobre o número de mortos, paralíticos
e mutilados deixados pela guerra e questiona se o país e os demais se importam
com eles.
“O que dizer dos 300 mil feridos? Alguém sabe onde eles
estão? Como se sentem? Quantos braços, pernas, orelhas, narizes, bocas, rostos,
pênis eles perderam? Quantos estão surdos, mudos e cegos — ou as três coisas
juntas?”
Essa tônica permeia as páginas do romance, com seu
personagem principal mutilado; a história explora as consequências físicas e
espirituais do pós-guerra no corpo de um soldado. Joe não sabe onde está, quem
está tratando-o ou qual é o estado do seu corpo, parte para uma experiência
sensorial. Joe define como submergir e emergir o ato de enquanto deitado
começar a lembrar momentos de sua vida.
Não é à toa que na primeira parte do livro, chamada de “Os mortos”,
recontando a vida pré-guerra, Joe fala de pessoas que ele nunca mais vai poder
ver, sentir o cheiro, tocar, conviver. Desde uma namorada que chora a sua
partida para front, um amigo que traiu sua confiança, a morte de seu pai e a
história de José, um porto-riquenho que chega nos Estados Unidos com o sonho de
trabalhar em um estúdio de cinema.
Pequenas lembranças que contam o amadurecimento de um jovem lidando com
o amor, a morte e a empatia. Afinal, é preciso conhecer quem foi esse rapaz
desfigurado; só a aparência não conta sua história.
Ligações a esta post
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Johnny vai à guerra, Dalton Trumbo
José Geraldo Couto (Trad.)
Biblioteca Azul, 2017
Biblioteca Azul, 2017
232 p.
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