Sete poemas de Miguel Torga
Por Pedro Belo Clara Miguel Torga. Foto: Eduardo Gageiro. LIVRO DE HORAS ( O Outro Livro de Job , 1936) Aqui, diante de mim, Eu, pecador, me confesso De ser assim como sou. Me confesso o bom e o mau Que vão ao leme da nau Nesta deriva em que vou. Me confesso Possesso De virtudes teologais, Que são três, E dos pecados mortais, Que são sete, Quando a terra não repete Que são mais. Me confesso O dono das minhas horas. O das facadas cegas e raivosas, E o das ternuras lúcidas e mansas. E de ser de qualquer modo Andanças Do mesmo todo. Me confesso de ser charco E luar de charco, à mistura. De ser a corda do arco Que atira setas acima E abaixo da minha altura. Me confesso de ser tudo Que possa nascer em mim. De ter raízes no chão Desta minha condição. Me confesso de Abel e de Caim. Me confesso de ser Homem. De ser um anjo caído Do tal Céu que Deus governa; De ser um monstro saído Do buraco mais fundo da caverna. Me confesso de ser eu. Eu, tal e qual como vim Para dizer que s