Boletim Letras 360º #505

DO EDITOR
 
1. Caro leitor, a edição deste boletim foge o usual. Ao invés de recuperarmos as notícias que correram a semana em nossa página no Facebook — foram muitas e aparecerão aqui futuramente —, dedicamos integralmente aos entornos de José Saramago.
 
2. No dia 16 de novembro de 2022, celebramos o centenário do escritor que é para este blog mais que o primeiro ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em língua portuguesa. A presença de Saramago é aqui uma constante desde a criação deste espaço em 2007.
 
3. O tratamento desta edição envolveu a consulta a outros boletins, o acréscimo de outras fontes e quer ser um pequeno portal de acesso para um dos momentos singulares na biografia saramaguiana neste país.
 
4. Reiteramos, por fim, que as formas de ajudar com o Letras permanecem ativas. Para saber melhor sobre o porquê e as formas de apoiar nosso trabalho, visite aqui. E, na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste Boletim garante a você desconto e ajuda ao blog sem pagar nada mais por isso.
 
5. Bom final de semana com boas leituras!


José Saramago. Foto: Lula Helfer.


 
LANÇAMENTOS
 
Uma coleção para marcar o centenário saramaguiano.
 
A Companhia das Letras publica três livros em tiragem para o ano do centenário de José Saramago; os mais cotados no catálogo da casa editorial. O primeiro título foi Ensaio sobre a cegueira; depois, O Evangelho segundo Jesus Cristo; e mais adiante A jangada de pedra. Em capa dura e com projeto gráfico diferenciado, essas edições reúnem ainda textos e/ ou materiais complementares. Julián Fuks, por exemplo, escreveu sobre o Ensaio; Andrea del Fuego, sobre O Evangelho; e Jeferson Tenório, sobre A jangada. A edição especial do primeiro romance reuniu ainda dados sobre a oficina do escritor na composição de um dos seus principais trabalhos; um material recolhido dos seus diários por Pedro Fernandes de Oliveira Neto e Graciela Castañeda. 
 
Leyla Perrone-Moisés regressa ao seu laboratório de leituras saramaguianas.
 
A professora ficou conhecida pela publicação de alguns dos mais citados ensaios sobre a obra de José Saramago publicados em jornais nos anos noventa. Talvez, o principal deles, “As artemages de Saramago”, saído na Folha de São Paulo em 1998 e depois recolhido em Inútil poesia. No ano do centenário, este e outros conhecidos textos da autora foram reunidos num livro que leva o mesmo título do seu principal trabalho. Eles passam em revista obras como Ensaio sobre a cegueira, O evangelho segundo Jesus Cristo, Memorial do convento, Todos os nomes e A caverna. Publicação também da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
José Saramago, 6 de novembro de 1985.
 
A data em título é a de quando o então jovem pesquisador Horácio Costa — que se tornaria um dos primeiros especialistas na obra de José Saramago a partir da publicação de O período formativo — reuniu-se com o ainda escritor em ascensão para conversar sobre literatura e, especificamente, seu projeto literário e os temas de seu domínio e interesse. O registro do episódio no Café des Artistes, no Greenwich Village, em Nova York, ficou gravado em fitas agora transcrito por Saulo Gomes Thimóteo e publicado pela Ateliê Editorial. É o Saramago com as ideias fixas na construção do que seria o seu A jangada de pedraVocê pode comprar o livro aqui.
 
Dois álbuns e muitas referências.
 
1. Quando publicou a edição especial de Ensaio sobre a cegueira em junho, a Companhia das Letras trouxe também, conforme registramos noutra edição deste Boletim, o livro de Alejandro García Schnetzer e Ricardo Viel editado agora em vários outros países ao redor do mundo. Saramago — os seus nomes. Um álbum biográfico reúne excertos variados da sua obra e de depoimentos oferecidos ao longo de sua atividade interventiva associados a registros fotográficos que ampliam o material verbal. Você pode comprar o livro aqui.
 
2. Saramagos. 100 anos de José. Organizado por Érico Vital Brasil e Liana de Camargo-Leão, o livro saiu primeiro em tiragem restrita para os que acompanharam a visita de Violante Matos ao Brasil em outubro deste ano. Concebido como uma homenagem para a única filha de José Saramago, o livro reúne vasto material de arquivo dela e de outros pesquisadores que conviveram com o escritor. Além disso, a edição inclui textos e depoimentos que contemplam a obra saramaguiana em suas mais variadas manifestações. Aparecem Pedro Fernandes de Oliveira Neto, Teresa Cristina Cerdeira, Horácio Costa, Mary del Priore, Maria Adelaide Amaral, Fernando Meirelles, Marcos Lopes, os integrantes da Cátedra José Saramago da Universidade Federal do Paraná, a própria Violante Matos e a filha Ana Saramago. O livro saiu pela Fundação Maria Luisa e Oscar Americano.
 
Saramago em Lanzarote.
 
E visto por seu olhar mais cúmplice: o Pilar del Río. A jornalista em A intuição da ilha, livro publicado em agosto pela Companhia das Letras, descreve os dias e as vivências do seu companheiro na vida em comum na ilha de Lanzarote para onde se mudou em 1992. Os trânsitos de visitas ilustres em A Casa — como o escritor nomeou seu pequeno reduto que agora funciona como um museu —, o trabalho com a escrita e como deste lugar via ativamente o mundo para o qual foi alçado com a projeção do Prêmio Nobel de Literatura, tudo é filtrado pela caneta de Pilar com uma atenção e sensibilidade raras. Você pode comprar o livro aqui.
 
Uma primeira coletânea para a ensaística de José Saramago.
 
Entre 2021 e 2022 a lista de celebrações em torno da obra de José Saramago ao redor do mundo foi interminável. Atento a quase tudo o que se disse, esteve o comissário para o centenário, o professor Carlos Reis. Numa destas celebrações, o Colóquio Internacional “José Saramago: palavra, pensamento, ação”, realizado em agosto deste ano na Universidade Federal do Pará com especialistas saramaguianos dos vários recantos do país, a Ed.ufpa deu conhecer Literatura e compromisso: textos de doutrina e de intervenção social, um trabalho organizado por Carlos Reis. O livro recolhe, pela primeira vez, ensaios esparsos de uma produção saramaguiana ainda por se conhecer melhor. São doze os textos que apresentam ora reflexões sobre o próprio fazer literário, ora o posicionamento político e a consciência social do autor. Você pode comprar o livro aqui.
 
Uma introdução a José Saramago.
 
A Ateliê Editorial reedita Saramago: um roteiro para os romances, de Eduardo Calbucci. No livro, o pesquisador reúne uma série de textos introdutórios aos principais romances saramaguianos, sobretudo, os que constituem a primeira fase: Memorial do convento, O ano da morte de Ricardo Reis, História do cerco de Lisboa e O Evangelho segundo Jesus Cristo. Nas palavras de Ivan Teixeira, autor da quarta capa, trata-se de uma obra que “possui a virtude de introduzir o leitor no civilizado hábito de discutir as coisas que aprecia.”  Você pode comprar o livro aqui.

DICAS DE LEITURA
 
Não recomendamos quais seriam os melhores livros para se iniciar na obra de José Saramago. Será mesmo que existe isso? Ao invés disso, privilegiamos destacar o que na opinião recorrente da crítica especializada é o melhor da sua obra. Esta lista foi divulgada em nossa conta no Instagram e marcou o início das várias atividades previstas naquele rede e noutras do Letras na semana por ocasião do centenário. Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. Memorial do convento. “Lá pelos finais de 80 ou princípios de 81, estando de passagem por Mafra e contemplando uma vez mais estas arquiteturas, achei-me, sem saber porquê, a dizer: ‘Um dia gostava de poder meter isto num romance.’ Foi assim que o Memorial nasceu.” — assim conta José Saramago nos seus diários sobre a concepção deste romance. Foi este o livro que lhe deu projeção internacional — está hoje traduzido em mais de três dezenas de idiomas. À história de construção do convento de franciscanos sobrepõe-se as histórias do invento fantástico, a passarola — uma máquina de voar — e do amor de Baltasar e Blimunda. Você pode comprar o livro aqui.
 
2. O ano da morte de Ricardo Reis. Durante muito tempo Saramago acreditou na existência cívica de um sujeito chamado Ricardo Reis e que escrevia odes (está registrado em Diálogos com José Saramago, entrevista que concedeu a Carlos Reis); só depois descobriu que fora encalacrado na blague do poeta Fernando Pessoa. Mas, persistente na ideia, terá sido por ela motivado a escrever este romance. Mais tarde, no célebre discurso Da estátua à pedra disse que se impressionava com um verso de Ricardo Reis, “Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo”; expressão, diz, que o indignava. “E assim, com a admiração por um lado, mas com um rancor surdo por outro, fui vivendo, até que uma tarde, em Berlim, descansando de um passeio excessivo, na sonolência que leva a nossa mente de um lugar a outro, caiu-me do teto uma evidência: o ano da morte de Ricardo Reis.” Testemunha de uma Europa em alucinação o heterônimo de Fernando Pessoa passa em revista sua visão contemplativa do mundo. Você pode comprar o livro aqui.

3. O Evangelho segundo Jesus Cristo. Na entrevista a Humberto Werneck para a Playboy, Saramago disse que esse romance “nasceu de uma ilusão de óptica, em Sevilha. Atravessando uma rua na direção de um quiosque de jornais e revistas, naquele conjunto de títulos e manchetes pareceu-me ler ‘O Evangelho Segundo Jesus Cristo’. Continuei a andar, depois parei e disse: ‘Isso não pode ser’ — e voltei atrás. De fato, não havia nem evangelho, nem Jesus nem Cristo. Se eu tivesse uma boa visão, se não fosse míope, provavelmente esse livro não existiria.” Este é o livro de um desterro. A vida de Jesus recontada ao sabor da imaginação com os intertextos bíblicos e apócrifos abriu uma fenda até hoje irreparável entre o escritor e os cristãos mais ortodoxos. Você pode comprar o livro aqui.

4. Ensaio sobre a cegueira. “Terminei ontem o Ensaio sobre a Cegueira, quase quatro anos após o surgimento da ideia, sucesso ocorrido no dia 6 de setembro de 1991, quando, sozinho, almoçava no restaurante Varina de Madregoa, do meu amigo António Oliveira(apontei a data e a circunstância num dos meus cadernos de capa preta). Exactamente três anos e três meses passados, em 6 de dezembro de 1994, anotava no mesmo caderno que, decorrido todo esse tempo, nem cinquenta páginas tinha ainda conseguido escrever: viajara, fui operado a uma catarata, mudei-me para Lanzarote... E lutei, lutei muito, só eu sei o quanto, contra as dúvidas, as perplexidades, os equívocos que a toda hora se me iam atravessando na história e me paralisavam.  Como se isto não fosse bastante, desesperava-me o próprio horror do que ia narrando. Enfim, acabou, não terei que sofrer mais.” Assim anota nos Cadernos de Lanzarote ao fim da escrita do romance.  Um livro escrito para justificar a ideia “Estamos cegos” se confirma como uma das mais potentes leituras sobre um tempo assinalado pelo excesso de visão. Você pode comprar o livro aqui.

VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
1. A 139.ª edição do podcast da Página Cinco, espaço dedicado aos livros no Portal Uol capitaneado pelo jornalista Rodrigo Casarin, recebeu Pedro Fernandes de Oliveira Neto. Autor de Retratos para a construção do feminino na prosa de José Saramago e diretor da Revista de Estudos Saramaguianos, ele discute com Casarin sobre a obra do escritor português, tecendo algumas projeções neste ano de centenário. Está em vários tocadores de podcast, mas pode ser ouvido também aqui no YouTube
 
2. As três entrevistas de José Saramago ao Roda Viva, programa da TV Cultura, estão disponíveis no YouTube: a primeira, de 1992, ou seja, no calor da publicação de O Evangelho segundo Jesus Cristo; a segunda, de dias depois quando recebeu a confirmação do Prêmio Nobel de Literatura; e a terceira, quando aqui esteve para a publicação de A caverna.

3. Os textos que servem às edições especiais da obra de José Saramago para o ano do centenário estão na base de parte dos encontros realizados pela Companhia das Letras. Você encontra todos os vídeos da jornada que incluiu ainda a presença de Leyla Perrone-Moisés e Pilar del Río aqui

4. Na web, o leitor encontra vários documentários sobre a obra de José Saramago: um deles é sobre Levantado do chão, o romance que inaugura o estilo com o qual o escritor português ficaria reconhecido. Dirigido por Alberto Serra para a RTP. Veja aqui.  
 
BAÚ DE LETRAS
 
1. Acompanhando o que dissemos na introdução deste boletim, é extensa a lista de entradas sobre a obra de José Saramago neste blog. Embora pareça que Twitter esteja com os dias contados, deixamos aqui o link para a missão que começamos e esperamos cumprir na semana do centenário: um fio com todas as nossas publicações, incluindo, as que estão preparadas para entre os dias 14 e 18 de novembro.

2. A edição n.349 do Boletim Letras 360.º dedicou todas as seções extras ao escritor José Saramago. O leitor encontrará, assim, outros caminhos para acessar a obra saramaguiana, novidades em vídeos e mesmo outras entradas no Baú de Letras que provavelmente escaparão ao fio no Twitter. Leia aqui
 
DUAS PALAVRINHAS

O tempo das verdades plurais acabou. Vivemos no tempo da mentira universal. Nunca se mentiu tanto. Vivemos na mentira, todos os dias. 

— José Saramago, em Sol (2008).

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