Boletim Letras 360º #477
DO EDITOR
1. Caro leitor, como o tempo voa rapidamente, é possível dizer que já entramos na reta final para o próximo sorteio no clube de apoios
ao Letras. Aproveite que este será o último sorteio da temporada nesse formato.
2. Como já disse noutras edições deste Boletim, desta vez, sairão três livros da editora-parceira Companhia das Letras:
romance O avesso da pele, de Jeferson Tenório; o livro de contos Gótico
nordestino, de Cristhiano Aguiar; e o romance Ossos secos escrito
pelo coletivo formado por Luisa Geisler, Marcelo Ferroni, Natalia Borges
Polesso e Samir Machado de Machado.
3. Para se inscrever é simples.
Envia R$25 através do PIX blogletras@yahoo.com.br; finalizada a
operação, envia neste mesmo endereço (nosso e-mail) o comprovante. O sorteio
está previsto para o dia 29 de maio. A escolha dos títulos desta vez sublinha o
Dia da Literatura Brasileira (celebrado no primeiro dia do próximo mês) e a
pluralidade de novas vozes de nossa literatura hoje.
4. Outras formas de colaborar com o
Letras estão disponíveis aqui. E, cabe não esquecer que na aquisição
de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem
desconto, também ajuda a manter o Letras sem pagar nada mais por isso.
5. Obrigado pela companhia! Seguimos.
Gabriel García Márquez. Foto: Leonardo Cendamo. |
LANÇAMENTOS
Publicada originalmente em 1987, a
única peça escrita por Gabriel García Márquez ganha tradução pela primeira vez
no Brasil.
É o relato íntimo e sincero de uma
mulher prestes a completar 25 anos de casada. “Nada se parece tanto com o
inferno como um casamento feliz!” Assim começa Graciela Jaraiz de la Vera —
esposa de um homem acomodado, neto de um marquês — às vésperas das bodas de
prata de seu casamento. Assim começa seu monólogo, seu diálogo frustrado sobre
a felicidade pública e a infelicidade íntima, sobre o paralelo entre a ascensão
social e o crescimento do desgosto. Graciela se dirige ao marido, mas ele nada
diz, limita-se a ficar sentado de terno escuro na poltrona lendo o jornal. Na
verdade, de acordo com García Márquez, trata-se de um manequim, um objeto sobre
o qual ela projeta o desencanto de uma vida marcada pela perda: da confiança
nele, do respeito por ele, do valor de seus sentimentos por ele. Tudo para
descobrir que, apesar de seus rancores, ela não consegue deixar de amá-lo.
Inédito no Brasil, Diatribe de amor contra um homem sentado é um
monólogo em um ato para uma única atriz, a única peça escrita por Gabriel
García Márquez. Encenada pela primeira vez em Buenos Aires, em 1988, no IV
Festival Ibero-Americano de Teatro, este livro é um texto curto, mas de
inigualável profundidade. União do trágico e do satírico, ele é a reconstrução
de uma vida a dois, o retrato de uma mulher prisioneira de um amor que sabe não
ter como compartilhar. Com tradução de Ivone Benedetti, o livro sai pela
editora Record. Você pode comprar o livro aqui.
Mário de Andrade e a canção
popular brasileira.
A estranha força da
canção reúne dez textos de Mário de Andrade, escritos entre 1930 e 1942,
sobre a canção popular brasileira. Assim, apresenta as variações de seu
pensamento sobre a música no decorrer do tempo. O estudo da identidade nacional
a partir da canção é feito de diferentes perspectivas: “Ensaio sobre a música
popular brasileira” e “Gravação nacional” oferecem, respectivamente, um
panorama geral do assunto, e uma observação da indústria fonográfica e os
ritmos e autores que privilegiam. Já “A pronúncia cantada...” pensa o problema
a partir de uma análise linguística do cantar brasileiro. Por fim, em “Dicionário
musical brasileiro” encontram-se alguns dos principais termos da música
brasileira, com todos os vocábulos próprios e características históricas
curiosas. Organizado por Marcos Lacerda, o livro é publicado pela Acorde.
Um livro essencial para
compreender o sovietismo e o que significou, para muitas pessoas, submeter a
própria mente ao Método.
Um esforço solitário, como define
seu autor, mas também um ensaio, um texto político, por vezes um romance.
Certamente um livro essencial para compreender o sovietismo e o que significou,
para muitas pessoas, submeter a própria mente ao Método, o Método que é uma
poção ou uma pílula “que conseguiu produzir um meio de transmitir 'uma visão de
mundo' de forma orgânica”. É dessa forma — o poeta Czesław Miłosz parece nos
dizer com uma prosa cálida, que deixa rastros de luz — que se apagam as dúvidas
metafísicas, que se aplaca a sede de conhecimento, que surge uma sensação de
serenidade e paz mental capaz de seduzir, entre outros, também os intelectuais.
E é assim que a mente, sempre vulnerável, torna-se escrava das doutrinas
sociopolíticas — do marxismo-leninismo como do pensamento totalitário em geral —,
o espírito se faz servo e o pensamento cede ao canto das sereias do
conformismo. O que há na origem dessa mente prisioneira, como se pode aceitar “o terror totalitário em troca de um futuro hipotético”? Que força
impulsiona artistas e intelectuais a negociar a sua liberdade artística e de
pensamento em troca de um cantinho seguro, a render-se a esse processo de
adequação e a continuar desempenhando tal papel sem pestanejar? Justamente
desse papel — o Ketman — nos fala o autor, descrevendo a dupla verdade dos
intelectuais que, mesmo mantendo internamente suas convicções, em público
mostram apenas o que não resulta desagradável ao regime, até identificar-se
cada vez mais com o personagem interpretado. Arte perigosa essa do mascaramento
constante, uma teatralidade quotidiana de atores conscientes de sê-lo,
apaixonados pelas barreiras erguidas ao seu redor. O que resulta daí é o livro
comovente de um poeta, um relato inusitadamente próximo de nós, um ensaio
capital sobre a capacidade que o totalitarismo tem de ocupar a mente,
desfigurando-a, e um convite à lembrança de que “a rebelião interna às vezes é necessária
para a saúde e pode ser um tipo especial de felicidade”. Mente cativa é publicado
pela editora Âyiné. Você pode comprar o livro aqui.
Um frasco com todas as pequenas
pílulas de Augusto Monterroso.
Nestes contos, Monterroso recorre
a fábulas, alegorias e ao fantástico, constrói histórias aparentemente simples
para sintetizar sistemas de opressão e discriminação, neuroses contemporâneas e
questões filosóficas. Em “Um em cada três”, solidão e ânsia por atenção
encontram uma solução digna das atuais redes sociais, e com monetização; “O
eclipse” expõe os pés de barro da colonização em pouco mais de meia página; “Sinfonia
acabada” reúne periferia cultural e os limites da superação artística; “Leopoldo
e seus trabalhos” e “Primeira-Dama” mostram visões e deturpações do trabalho
artístico. Contudo, talvez o que melhor represente sua obra seja o exíguo conto
“O dinossauro”, um achado da concisão formal, inversamente proporcional às
possíveis interpretações que engendra, e que há décadas seduz leitores e
críticos. Com tradução de Silvia Naschenveng, Obras completas (e outros
contos) é publicado pela editora Mundaréu. Você pode comprar o livro aqui.
Livro que galgou importância no
projeto de abolição do tráfico negreiro ganha edição no Brasil.
Nascido em 1745 na região do
antigo reino do Benim, na atual Nigéria, Olaudah Equiano foi raptado aos onze
anos de idade por um grupo étnico rival. Após algum tempo servindo a senhores
locais, ainda no continente africano, o menino cumpriu aquele que seria o
destino de milhões de seus conterrâneos: foi levado para a costa e embarcado,
como mercadoria, num navio de tráfico negreiro que partia para as Américas.
Assim principia a autobiografia absolutamente espantosa deste africano, cuja
vida, sob o regime da escravatura, o levaria, entre outros lugares, ao Caribe,
aos Estados Unidos e à Inglaterra, configurando-se, como observa Carlos da
Silva Jr. (autor do roteiro de leitura e das notas adicionais desta edição),
como um verdadeiro “sujeito afro-atlântico”. Relato verídico de desastres e
sofrimentos inimagináveis, A interessante narrativa traz não só a primeira
descrição, com testemunho direto, da travessia atlântica a bordo de um
tumbeiro, como também registra os horrores das plantations nas Américas, a
perversidade dos negociantes de negros escravizados, a vida difícil nos navios
que então singravam o globo, o estatuto incerto — constantemente ameaçado — dos
africanos libertos, bem como os próprios desafios e contradições de um nativo
da África que adotou modos de vida europeus. Publicada em 1789, A
interessante narrativa da vida de Olaudah Equiano teve influência enorme em
seu tempo, contribuindo para a abolição do tráfico negreiro para as colônias
britânicas, e é considerada um dos mais importantes documentos da história da
escravidão. A presente edição segue o texto estabelecido por Vincent Carretta,
professor emérito da Universidade de Maryland e autor do posfácio a este
volume. O livro é publicado pela Editora 34. Você pode comprar o livro aqui.
A Assírio & Alvim lança no
Brasil a única obra de poesia finalista em 2021 do prêmio Oceanos.
Vencedor do Prêmio Literário
António Cabral e também finalista do Prêmio Pen Clube Português de Poesia, Inferno
é o livro de estreia em poesia do professor de Literatura Portuguesa na
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Pedro Eiras, autor também de
obras de ficção e ensaios. Assim como Dante Alighieri revisita Virgílio em A
Divina Comédia, um dos maiores clássicos da literatura universal, Eiras
revisita o próprio Dante, sob uma perspectiva e com preocupações
contemporâneas. Este é o primeiro volume de um tríptico que se completa com
Purgatório e Paraíso. Em Inferno, o poeta oferece uma visita às almas
danadas do mundo atual, trazendo à poesia elementos sociológicos e, como ele
mesmo afirma, do seu “inferno pessoal”. Eiras nos leva a refletir sobre a
sociedade de hoje, com seus grandes desafios, a começar pelo resgate da empatia
e da tolerância. Seguindo os passos de Fernando Pessoa, renova uma temática
clássica com inspiração moderna, refinada e capaz de produzir um retrato humano
de hoje e de sempre, tanto nas nossas pequenezas e medos quanto na nossa mais
bela e grandiosa dimensão.
Uma edição de luxo com mais de
160 ilustrações de Letícia Lopes e tradução inédita de Rogerio Galindo para o
principal romance de Herman Melville.
Narrado pelo tripulante Ismael,
este livro conta a história do capitão Ahab, um misterioso e vingativo marujo
que tem uma missão pessoal para a qual está disposto a arrastar toda a
população de seu navio: capturar Moby Dick. Tomado por esta ideia fixa, Ahab
vai à caça da lendária baleia que devorou sua perna e que, embora cravejada de
arpões, segue nadando em liberdade e intimidando até os marinheiros mais
bravos. Tão grandioso e inacreditável quanto a missão de Ahab, este romance é
um marco da literatura, com sua ousada mistura de estilos, como o teatro, o
ensaio e a aventura. Publicado pela primeira vez em 1851, a obra-prima de
Herman Melville tornou-se uma das mais importantes, reverenciada e reverberando
na cultura pop até os dias de hoje. A edição de Moby Dick publicada pela
editora Antofágica traz posfácios de Vinicius Duarte Figueira, Luiz Ruffato,
Rita Isadora Pessoa, e do tradutor Caetano Galindo. Você pode comprar o livro aqui.
O segundo volume da Coleção
Multiclássicos.
Apresentado em 2 tomos, a edição
dedica-se ao romance naturalista brasileiro. O volume apresenta o texto
integral de algumas das mais importantes obras desse gênero publicadas no final
do século XIX. No primeiro reúnem-se os romances O Ateneu, de Raul
Pompéia, O homem, de Aluísio Azevedo, e A carne, de Júlio
Ribeiro; e no segundo tomo O cortiço, de Aluísio Azevedo, Bom-Crioulo,
de Adolfo Caminha e O missionário, de Inglês de Souza. Os romances são
acompanhados de análises de especialistas — do organizador Ivan Teixeira, e de
Sergio Paulo Rouanet, Luís Bueno, Orna Messer Levin, Tâmis Parron e Marcelo
Bulhões —, convidados a discorrer sobre a obra no momento de sua publicação e
ao longo da história da leitura, além da contribuição de Paulo Franchetti que
assina o estudo introdutório sobre o movimento naturalista no Brasil.
Augusto de Campos e Cid Campos
num livro para ser ouvido e um disco para ser lido.
O livro e CD Entredados
registram leituras de Augusto de Campos, com música de Cid Campos, divulgadas
esparsamente, ou inéditas. É este um trabalho que reafirma a parceria dois
criadores no tratamento de estruturas musicais que enfatizam os poemas com
ambientações e texturas envolventes, em diálogo com a oralização do texto. Na primeira faixa, a rara e extraordinária
gravação feita por Décio Pignatari, Haroldo e Augusto de Campos, da obra
seminal da poética moderna “Um Lance de Dados”, de Mallarmé, registrada por
Dante Pignatari, na Rádio Cultura em 1977. As traduções de Augusto, feitas em épocas
diversas, contemplando linguagens poéticas muito especiais, têm a unificá-las o
fato de se referirem a autores notabilizados pela radicalidade, inovadores
idiomáticos. Com a orelha escrita por
Carlos Adriano, texto de apresentação por Augusto e projeto gráfico concebido
por ele e André Vallias, o LIVRO-CD finaliza com a faixa, “da antologia
clássica chinesa”, cujo texto passa pelas autorias de Confúcio e Joyce até
chegar à tradução de Augusto, sendo a composição uma parceria com Cid com o
músico Roberto Sion, com destaque para a melodia executada por ele em saxofone.
O livro é publicado pela editora Laranja
Original.
O livro póstumo de Cesare
Pavese organizado por Italo Calvino e Massimo Mila em nova tradução no Brasil.
Na filigrana da experiência
poética proporcionada por Virá a morte e terá os teus olhos, de Cesare Pavese,
nos deparamos com momentos diferentes da história, particular e coletiva: duas
camadas que se sobrepõem e que por vezes se tornam uma só. O fim da segunda
guerra mundial, as vivências e as crises do autor, seus amores trágicos, uma
Itália em reconstrução e dividida entre o lamento pelos destroços físicos,
políticos e sociais do período fascista e o otimismo em relação ao futuro são
alguns dos subentendidos que percorrem o subsolo dos versos. Virá a morte e
terá os teus olhos fora organizado por Italo Calvino e Massimo Mila e
publicado postumamente, em 1951. Nesta tradução apresentada ao público
brasileiro, os poemas da coletânea ganham ainda a companhia de outros poemas
esparsos deixados pelo poeta e algumas cartas. Assim, na intersecção entre vida
e morte, entre a experiência de amores fulminantes, entre a autoria de Pavese,
a organização dos companheiros da editora Einaudi e a organização aqui
proposta, a obra se apresenta, trazendo à superfície uma série de tensões e
rupturas consequentes desses entrelugares. Com tradução de Cláudia Tavares
Alves e Elena Santi, a publicação é das Edições Jabuticaba.
Os papéis de um testamento
sobre um dos períodos caros da história brasileira.
Pasquins eram papéis manuscritos,
anônimos, que apareciam nas primeiras horas do dia afixados em lugares de
grande circulação. Sofriam uma perseguição implacável, e por isso poucos foram
conservados. A Chão Editora traz o único exemplar que restou das três cópias de
um pasquim veiculado no pequeno arraial de Calambau, no interior de Minas
Gerais, no ano de 1798. O “pasquim do Calambau” veio à
luz seis anos depois da condenação dos réus da Conjuração Mineira, e relata de
maneira satírica a má conduta de um morador local, ao mesmo tempo que apresenta
uma visão incomum do movimento libertário, atacando-o com ferocidade. Conforme
se percorre o texto, descortina-se aos poucos um universo de sentidos: o
vocabulário é rústico e a linguagem, impregnada de oralidade, tem a função de
cativar a gente simples da rua, os trabalhadores da roça, oficiais mecânicos,
homens e mulheres escravizados, vizinhos. O pasquim do Calambau: infâmia,
sátira e o reverso da Inconfidência Mineira, organizado por Álvaro de
Araujo Antunes e Luciano Figueiredo, traz o pasquim, a devassa — na qual se
coletaram dezenas de depoimentos dos moradores locais — e trechos do processo
judicial que julgou o caso. Lidos em sequência, esses textos não apenas formam
um vasto painel dos conflitos e acontecimentos do período, mas oferecem também
um raro retrato da oralidade e das ideias políticas e religiosas populares do
período. Você pode comprar o livro aqui.
As diatribes ou o avesso do
fato.
Tudo começa quando a revista Harper’s
encomenda, no início dos anos 2000, um texto sobre suicídio em Las Vegas ao
escritor John D’Agata e desiste de publicá-lo por causa de imprecisões
factuais. Em seguida, outra revista, chamada The Believer, assume o
texto, mas, antes de encaminhar para publicação, submete o trabalho ao checador
Jim Fingal. Como uma espécie de making of literário, A vida curta de
um fato mostra a correspondência entre o autor e o checador ao longo sete
anos (entre 2003 e 2010), até a publicação do texto “As coisas que acontecem
lá”. O livro quebra o ensaio de D’Agata em trechos que aparecem no alto de cada
página. Abaixo deles, Fingal indica as informações que procedem e é implacável
ao apontar erros factuais e liberdades tomadas pelo escritor, que responde a
(quase) todas as contestações do checador. No texto, fontes tipográficas
diferentes indicam quando um fato é confirmado ou contestado. Como bônus, a
edição brasileira inclui o texto final, editado e publicado em 2010 no site da Believer.
Assim é possível ver as decisões tomadas pelo editor ao fim do processo de
checagem. Em síntese, A vida curta de um fato permite ao leitor
acompanhar um embate feroz entre duas pessoas inteligentes com pontos de vista
absolutamente distintos. Uma disputa que, ao falar sobre os limites de um texto
literário baseado em fatos, analisa também a relação que escritores e leitores
têm com a literatura — de ficção e de não ficção. A tradução de Irinêo B. Netto
é publicada pela editora Arte & Letra. Você pode comprar o livro aqui.
A chegada ao Brasil do poeta
português Paulo Tavares.
O livro Minimal existencial
é assim apresentado por Daniel Francoy: “O resgate da linguagem — e, no
limite, da poesia – fica evidente na resposta dada pelo poeta à pergunta que
ele próprio formula no poema ‘Fôlego Híbrido’, ao se indagar ‘quanto vale a
visão de um futuro ou toda a duração/ de um poema, se já pouco resta da
inocência,/ e se nada preserva o fôlego híbrido dessas crianças/ que correm — e
gritam — pelas cidades queimadas/ antes de extinguirem’, e a resposta é: ‘um
valor simbólico’. Um valor simbólico, reconhecemos, é uma potente definição da
poesia. Se há linguagem, por mais escassa e gasta que se apresente, ainda há
símbolos; e, se há símbolos, há literatura – a possibilidade do gesto literário
não apenas como uma reação, mas também uma afirmação, algo que por um momento
afasta a morte ao passar de coração em coração.” O livro é publicado pelas
Edições Jabuticaba.
REEDIÇÕES
O romance que destacou Nara
Vidal entre os escritores contemporâneos na literatura brasileira ganha nova
edição pela editora Faria e Silva.
Brasil (ou Hy-Brasil) é uma ilha
mítica na costa irlandesa onde o mar tem cor de chumbo. Misteriosamente, quem
insiste em explorar Brasil, acaba enfeitiçado e olhos coloridos aparecem na
família de quem tentou desvendar a ilha. Brasil é também para onde segue a
família de Margareth Cunningham, fugida da fome da batata na Irlanda em 1827,
aportando no Rio de Janeiro em plena Guerra da Cisplatina e Primeiro Reinado. A
opressão católica em comum nos dois países, força a narradora das duas
primeiras partes da história a deixar, grávida, a família e a amizade com a escrava
Mariava para se abrigar numa casa, na serra fluminense, comandada por freiras
que vendem os bebês das “mulheres caídas” que carregam vergonhas nas barrigas.
A imprevisibilidade de um ato da escrava Mariava nos leva a testemunhar a vida
de dois filhos, irmãos em amizade, um branco e um negro que seguem sua sorte,
seu destino por sertões de Minas Gerais, na beira do Rio Pomba. Ciço e Mané
levam adiante o mito da terra mítica, feita de mentiras e ilusão: Brasil. Sorte
fora publicado antes pela Editora Moinhos e alcançou a lista dos premiados com Oceanos
em 2019. Você pode comprar o livro aqui.
O terceiro volume da série
Tragédia burguesa, de Octávio de Faria ganha reedição.
Originariamente puro, o coração
humano jamais poderá viver num mundo de impureza. Fracos e covardes, por demais
sensíveis e por demais livres sem sermos fortes, cedo nosso coração se envenena
e a vida foge de nós, apavorada. Morremos aos poucos pelo acúmulo do lodo que
se produz nas ruas, nas casas, na nossa existência. O que nos mata é o lodo das
ruas, é o coração contaminado. Marcados por essa força subterrânea, os membros
da família Paiva veem o que havia de melhor na sua natureza humana ser
sufocado. Cada um vive o próprio destino particular, sem qualquer comunicação
íntima com os outros. A distância estabelecida entre o Coronel Paiva e Dona
Laura passa para os filhos como um legado. Uns se dirigem para a morte ou para
a degradação, encontrando seu refúgio último apenas no suicídio ou substituindo
o sentimento do amor pela exacerbação do sexo, enquanto outros se colocam
violentamente fora de seu meio enxovalhado, procurando lutar para a salvação do
que possa subsistir desse espantoso naufrágio. O lodo das ruas é
publicado pela editora Sétimo Selo. Você pode comprar o livro aqui.
RARIDADES
Um livro de Charlotte Brontë de
quando ela tinha 13 anos foi leiloado por US$ 1,2 milhão no Reino Unido.
A rara peça foi arrematada pela
Friends of National Libraries, uma associação literária britânica, para doar ao
museu dedicado à escritora situado em Haworth, norte da Inglaterra, onde ela
nasceu. O livro menor que uma carta de baralho tem suas peculiaridades, além da
concepção precoce. A Book of Ryhmes by Charlotte Brontë nunca foi editado
e feito por ela mesma; manuscrito e costurado à mão, o arquivo contém uma
quinzena de páginas e dez poemas inéditos. Este é o segundo trabalho do tipo
leiloado mais recentemente; um outro foi vendido em novembro de 2019. Até agora, sete miniaturas da escritora já foram compradas pela organização britânica que
trabalha para preservar a herança literária do país.
RAPIDINHAS
Literatura australiana. George Egerton, era o pseudônimo
de Mary Elizabeth Annie Dunne. Considerada uma das autoras mais importantes do
final século XIX está fora de catálogo no Brasil. A editora Arte & Letra promete suprir a lacuna no segundo
semestre com a publicação de Keynotes, primeiro livro de contos da
autora.
Ciclo da cana-de-açúcar. É o nome do conjunto de romances de José Lins do Rego que tratam um Brasil em transição, da vida dos engenhos de açúcar para a vida urbana dos grandes centros. Menino de engenho, Doidinho, Banguê, Usina e Fogo morto já ganharam reedição da Global Editora. A casa reúne agora os cinco romances numa caixa.
Otto Lara Resende, centenário. No próximo 1.º de maio de 2022, alcançamos o centenário de nascimento de Otto Lara Resende e
várias homenagens celebram o jornalista e escritor. Helena Lara Resende e Marcos Ribeiro finalizam o
documentário Otto, de trás para diante; Elvia Bezerra, do Instituto Moreira Salles (IMS), instituição que guarda o arquivo de Resende, organiza uma
coletânea de cartas a seis amigos; e Amir Labaki prepara o monólogo Eu,
Otto.
DICAS DE LEITURA
No próximo domingo, feriado pelo
Dia do Trabalho, passa-se no Brasil outra data importante, não ao ponto de merecer
uma marca vermelha no calendário mas assinalada na folhinha dos leitores mais
atentos: o Dia da Literatura Brasileira. O dia celebrativo coincide com o
aniversário do escritor José de Alencar. Bom, sem considerar os sempre questionáveis
nacionalismos em torno de celebrações dessa natureza — embora num país
demasiadamente aberto ao estrangeiro isso cumpra ainda que alguma lembrança
sobre o nosso próprio umbigo — e sem recomendar algum livro do autor-fonte para
o marco no calendário, estas dicas apresentam três obras de escritores brasileiros
publicadas recentemente e que merecem alguma atenção. Na aquisição de
qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e
ainda ajuda a manter o Letras.
1. Cancún, de Miguel Del
Castillo. Dissemos acima sobre a incômoda posição limitadora do
nacional e no tempo corrente é cada vez mais visível na literatura uma ruptura
com esse ideal pelo interesse no entrecruzamento de sujeitos em trânsito. De alguma maneira, este romance dialoga com essa possibilidade ao se organizar com uma narrativa
entre a Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, e o balneário mexicano de Cancún; uma
história que acompanha os passos do adolescente Joel que, precisará passar pelas
primeiras etapas do amadurecimento a partir do conflito com o pai e depois com
sua ausência, numa viagem que perfaz os caminhos num modo quase predestinado desses
dois homens. O livro está publicado pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
2. Cavalo de terra, de
Otavio Linhares. A poética do escritor se determinou de alguma maneira pelos
interesses temáticos da degradação e por tipos de consciências em crise aparecidos ainda nos livros anteriores. Neste
romance, o escritor regressa ao plano da família em ruína pelo ponto de vista do filho mais novo;
é a própria consciência deste jovem que perscruta os vários lugares problemáticos do seu agrupamento:
os irmãos, o pai alcoólatra, a mãe submetida, entre outras figuras. Embora seja
este um núcleo de interesses dos mais recorrentes na literatura vigente,
interessa atentar como o escritor tateia na busca por modo de narrar que se
destaque e encontre proximidade aos de outros grandes narradores da nossa
literatura, como, para citar um exemplo, as vozes erguidas por Raduan Nassar e que
se fizeram notável no curso dos recentes criadores. Você pode comprar o livro aqui.
3. Eva, de Nara Vidal. Este
é um romance que assinala o retorno da escritora a esta forma narrativa e agora
a ela investiga os impasses de uma mulher que parece carregar todas as
marcas impostas com a condena feminina, nesse caso, pelo menos duplamente, tendo
em vista que falamos sobre uma personagem que tem como marca identitária distintiva
o mesmo nome da figura do pecado original na mitologia cristã. Soma-se as essas
marcas o conflito entre sua semelhante, uma vez que a Eva de Nara Vidal é
inteiramente dependente dos caprichos de uma mãe que, igualmente marcada por
esse mundo que colocou nas mulheres toda a responsabilidade do mal, se
faz sua controladora. O livro saiu recentemente pela Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. E por falar sobre o novo
romance de Nara Vidal, vale assistir uma entrevista conduzida pela Tamy, do canal
LiteraTamy, justamente em torno de Eva. Pode ir por aqui.
BAÚ DE LETRAS
À maneira da edição n.476, retiramos
do Baú de Letras um conjunto variado de listas, desta vez, assinalando o Dia da
Literatura Brasileira. São caminhos diversos para os leitores que se interessem
por ampliar algum conhecimento sobre nossos criadores, além dos referidos na seção
Dicas de Leitura.
a) Começamos com uma lista divulgada
primeiramente em 2005, quando o Museu da Língua Portuguesa pediu ao professor
Alfredo Bosi uma lista de grandes obras da literatura brasileira. Ele respondeu
com 120 títulos que, se lidos, constituirão um curso bastante interessante
sobre a nossa literatura. Reproduzimos o conteúdo nesta post três anos mais
tarde.
b) Em maio do ano seguinte,
publicamos esta lista com quinze escritoras da literatura brasileira. De Júlia
Lopes de Almeida a Rachel de Queirós, de Clarice Lispector a Lygia Fagundes
Telles, passando por nomes como Hilda Hilst, Nélida Piñon, Maria Valéria
Rezende e outras.
c) Há outras listas que tomam como
escopo a literatura brasileira, por aqui. Mas, encerramos o baú com esta para os apreciadores da narrativa breve, uma vez que até agora prevaleceu, de alguma
maneira, a poesia e o romance. São 21 livros de contos da nossa literatura indispensáveis.
DUAS PALAVRINHAS
Toda leitura é um reencontro. O
leitor lê a si mesmo, desenrola-se como uma bobina. A cada página que passa,
você fica mais perto de você - e de um segredo que só a leitura sabe.
— Otto Lara Resende
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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.
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