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Mostrando postagens de janeiro, 2022

O centenário de Ulysses

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Por Andreu Jaume James Joyce. Foto: Berenice Abbott O próprio James Joyce disse em mais de uma ocasião que havia escrito seu trabalho para manter os especialistas entretidos por trezentos anos. Agora que Ulysses , publicado pela primeira vez em 1922, tem um século, podemos confirmar que esta profecia continua a se realizar, ainda que residualmente, na indústria dos estudos acadêmicos, mas ao mesmo tempo devemos reconhecer que a misteriosa aura que acompanha o romance desde seu surgimento acabou prejudicando sua posteridade, transformando-o em uma obra que todos conhecem e poucos leem. Por outro lado, ninguém ignora que neste aniversário daquele annus mirabilis da literatura europeia, o que até pouco tempo chamávamos de “cânone ocidental” tem sofrido um descrédito que seria inimaginável para a geração de Joyce, T.S. Eliot ou Ezra Pound . O modernism constituiu uma repulsiva estética muito virulenta, mas, longe de contestar o cânone, preocupou-se sobretudo em esticar a tradição, sa...

Seis poemas de Rabindranath Tagore

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Por Pedro Belo Clara Rabindranath Tagore. Foto: Curatorial Assistance Inc. / E.O. Hoppé Estate Collection   O PRIMEIRO BEIJO   O céu ficou silencioso e de olhos baixos, Os pássaros calaram todos os seus cantos; O vento emudeceu; a música das águas acabou De repente; o murmúrio da floresta Morreu lentamente no coração da floresta. Na margem deserta do rio tranquilo, Nas sombras do anoitecer desceu silenciosamente O horizonte sobre a terra muda. Nesse momento no silencioso e solitário alpendre Beijámo-nos pela primeira vez. Nesse momento exacto, ao longe e perto Repicaram os sinos e soaram os búzios Nos templos dos deuses apelando ao culto. Um estremecimento percorreu o infinito mundo das estrelas E os nossos olhos encheram-se de lágrimas.     INTERMINÁVEL AMOR   Parece-me que te amei de inúmeras maneiras, inúmeras vezes, Na vida após vida, em eras após eras eternamente. O meu coração enfeitiçado fez e voltou a fazer o colar das canções Que tomaste como uma pre...

Boletim Letras 360º #467

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    DO EDITOR   1. Caro leitor, as publicações diárias nesta página retornaram e com o início do nosso 15.º ano regressam também as edições completas deste Boletim.   2. Aproveito para recordar sobre o nosso próximo sorteio entre os apoiadores do Letras . Até o final do dia deste 29 de janeiro de 2022 é possível realizar sua inscrição. Saiba tudo sobre como participar por aqui .   3.Vamos que vamos! Obrigado pela companhia e pelo apoio ao trabalho do Letras ! Flannery O’Connor. Foto: Joe McTyre. Stuart A Rose Library, Emory University   LANÇAMENTOS   Saudado pela crítica como um romance revelador de uma ficcionista com todos os atributos para tornar-se tão forte quanto outros escritores do sul dos Estados Unidos, a exemplo de William Faulkner e Carson McCullres, o primeiro romance de Flannery O’Connor ganha nova tradução .   Primeiro romance da autora,  Sangue sábio  narra a história de Hazel Motes, um jovem de 22 anos que, após a guer...

Desconservar o masculino: eis a questão (1)

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Diálogo com Seis balas num buraco só: a crise do masculino , de João Silvério Trevisan  Por Marcelo Moraes Caetano    “Um dia, vivi a ilusão de que ser homem bastaria”  (Gilberto Gil, “Super-homem”) Colagem: Loui Jover / Reprodução   Há muitas décadas o feminismo vem denunciando a sociedade patriarcal e machista em que vivemos. Os sofrimentos para as mulheres com esse modelo social são inumeráveis: violências físicas, mentais, psicológicas, feminicídios, assédios morais, sexuais, desvalorização, misoginia, discriminação. Este é um tema que vem a cada dia se tornando mais e mais evidente até aos conservadores aguerridos. Levá-lo adiante é essencial, e já se tornou há muito tempo uma questão de vida ou morte. Sem nenhuma dúvida, as mulheres, por todas as desrazões do mundo, são as que mais sofrem nas teias desse arranjo cultural que tanto as cerceia e tolhe. O lugar de fala das mulheres precisa ser cada vez mais respeitado. Ninguém melhor do que elas para falarem,...