Boletim Letras 360º #445
DO EDITOR
1. Caro leitor, em nome do Letras
reitero os agradecimentos pelas ajudas enviadas durante todo o período de nossa
campanha de arrecadação dos custos de pagamento do domínio e hospedagem. Graças
ao empenho de todos — de uma simples partilha das chamadas de divulgação nas
redes ao menor valor doado, de uma aquisição no nosso bazar à doação de livros
— conseguimos a maior parte do que precisávamos.
2. Para os próximos dias, sairá a
divulgação do prometido sorteio entre os nossos apoiadores. As possibilidades
de ajudas ficarão permanentes; em breve, também saberão melhor sobre. Por enquanto, para saber mais sobre como ajudar pode ir aqui no Facebook ou aqui no Instagram.
3. Eis as notícias que passaram pela página do blog no Facebook durante a
semana e as demais dicas nas outras seções deste Boletim — com especial
interesse aos sete séculos sobre a morte de Dante Alighieri marcados no último
dia 14 de setembro. Muito obrigado pela companhia. Boas leituras!
Dante Alighieri por Sandro Botticelli. No Brasil, uma série de publicações do e sobre o poeta italiano, incluindo uma nova tradução da Commedia. |
LANÇAMENTOS
Publicado na França em 2019 e
agora no Brasil pela Estação Liberdade, Os carregadores de água é o mais novo
romance do premiado autor afegão Atiq Rahimi.
Escrito com uma prosa poética e
com muitas surpresas no enredo, o livro toca em questões como o exílio, a
liberdade, a afeganidade, a memória e a destruição dela. Em 11 de março de
2001, as duas grandes estátuas dos Budas de Bâmiyân, no Afeganistão, são
destruídas pelo Talibã, e em torno deste acontecimento são narradas as vidas de
dois afegãos. Um deles, Tamim, que ocidentaliza seu nome para Tom, vive exilado
em Paris e decide abandonar esposa e filha para ir de carro a Amsterdã se
encontrar com outra mulher. O outro afegão chama-se Yûsef e trabalha carregando
água em Cabul, sendo obrigado a conviver com as misérias de seu país e com a
crueldade dos soldados do regime talibã. Os destinos dos dois jamais se cruzam.
Mas, com esses relatos, Atiq Rahimi conta aos leitores dois modos de ser afegão
estando neste mundo que se transforma tão rápida e violentamente. As tragédias
são inevitáveis neste comovente romance, mas inevitáveis são também as buscas
de si, as revelações e o amor. A tradução é de Jennifer Queen.
Publica-se o primeiro volume da
nova tradução brasileira da Commedia, de Dante Alighieri.
“Inferno” é uma viagem guiada às
profundezas. Ao adentrarmos os versos, somos recebidos pelo poeta Virgílio, que
nos guiará durante o trajeto. Criado quando o anjo Lúcifer caiu do Céu, o
Inferno é composto por nove círculos, e o leitor é levado a cada um deles nos
34 cantos do épico dantesco. Tendo como tema a história de uma alma cristã que
parte da consciência do pecado (“Inferno”), passa pela purificação interior (“Purgatório”)
e chega à visão de Deus (“Paraíso”), Dante encontra seu ponto de referência
numa escrita de estilo “humilde”: a iluminação espiritual das Sagradas
Escrituras serve de orientação para o poema, escrito de forma pioneira na
língua vulgar, e não em latim. Por isso, a nova e primorosa tradução dos
professores Emanuel França de Brito (UFF), Maurício Santana Dias (USP) e Pedro
Falleiros Heise (UFSC) busca trazer ao leitor brasileiro um texto fluído e
envolvente, respeitando os ideais do autor de uma linguagem acessível. Esta
edição, publicada pela Companhia das Letras, conta também com gravuras de
Evandro Carlos Jardim, artista que brinda o leitor com imagens impactantes que
trazem aos olhos o melhor da narrativa.
Um novo romance de Colson
Whitehead.
Nova York, anos 1960. Para seus
clientes e vizinhos da rua 125, Ray Carney é um comerciante que vende móveis
usados por um preço razoável e está construindo uma vida decente para a
família. Ele e a esposa, Elizabeth, estão esperando o segundo filho e, mesmo
que os pais dela não aprovem o apartamento pequeno deles do outro lado dos
trilhos do metrô, ambos o consideram um lar. Mas poucos sabem que Ray vem de
uma família de criminosos e que sua fachada de normalidade tem mais do que
algumas rachaduras — e elas estão ficando cada vez maiores. Principalmente
quando Freddie, seu primo, se vê envolvido com um grande assalto ao Hotel
Theresa e oferece os serviços de Ray como receptador. Quando o crime não ocorre
como planejado, ele precisa encontrar uma nova clientela, formada por policiais
corruptos, gângsteres violentos, produtores de pornografia barata e outros
delinquentes do Harlem. De Colson Whitehead, duas vezes
vencedor do prêmio Pulitzer e conhecido por suas narrativas com protagonismo
negro, Trapaça no Harlem é um romance policial eletrizante e bem-humorado
recheado de personagens com múltiplas camadas e absolutamente emocionantes. A
tradução de Trapaça foi realizada por Rogério W. Galindo e se publica
pela HarperCollins Brasil.
A primeira biografia de Dante
Alighieri.
Fundamental para a compreensão do
mito de Dante Alighieri, esta biografia não só mostra a influência que o poeta
teve na vida do autor de Decameron, mas também é um brilhante estudo
historiográfico da Idade Média. Escrito por volta de 1350, este tratado marca
um dos momentos mais importantes do culto a Dante: a profunda admiração de
Boccaccio pelo criador da Comédia, que permeou praticamente toda a sua
obra. A princípio concebida como um prefácio à compilação das obras do poeta
florentino, esta Vida de Dante foi revisitada por Boccaccio três vezes —
e a versão que o leitor brasileiro tem agora em mãos é a mais extensa e
provavelmente a mais conhecida. Mais do que uma biografia, esta defesa da
poesia é peça fundamental para a compreensão do mito de Dante, além de servir
ao rico estudo historiográfico do período. A tradução, introdução e notas são
de Pedro Falleiros Heise. O livro é publicado pelo selo Penguin / Companhia das
Letras.
Um perfil de Elke Maravilha por
Chico Felitti.
Elke Grünupp nasceu na Alemanha em
1945. Tinha quatro anos ao desembarcar no Brasil, onde sua família se fixou no
interior de Minas Gerais, para depois morar em São Paulo e no Rio Grande do
Sul. A futura Mulher Maravilha da televisão começou a trabalhar muito jovem,
compelida pelo rigor paterno. Alta e loira, esplendorosamente destoante das
belezas locais, Elke encontrou sua vocação na adolescência, ao vencer um
concurso de misses em Belo Horizonte — de onde saiu para as passarelas das
capitais da moda. A carreira meteórica de modelo, condimentada pela
irreverência teatral com que vestia peças de alta-costura, abriu-lhe as portas
da TV, que acabava de ganhar cores. Trabalhou como atriz e jurada nos programas
do Chacrinha e de Silvio Santos, em quatro emissoras diferentes. Se tornou uma
das pessoas mais famosas do Brasil. Gravou um disco e nos anos 1990 teve um
programa solo, entrevistando numerosas personalidades. Sobreveio uma fase de
ostracismo e empreendimentos fracassados, mas sua esfuziante joie de vivre
entre as plumas, os bordados e os paetês seguiu inabalável. Até morrer, em
2016, Elke foi dionisíaca e livre como os personagens que encarnou. Estudou
medicina, filosofia e letras. Nos anos 1970, revoltada com a ditadura militar,
chegou a ser presa por rasgar um cartaz com fotos de procurados pelo regime.
Colecionou casamentos e namoros nem sempre felizes, como a união com um fã que
não tardou a se revelar violento. Originalmente concebido como um audiolivro,
este perfil biográfico reúne a agilidade da reportagem e a argúcia do ensaio
para retratar a santa padroeira da alegria na TV nacional e musa eterna do
glamour para seus admiradores. Elke Mulher Maravilha é publicado pela
editora Todavia.
Sete contos sobre o desejo. Ou
sobre como lidamos com o desejo dentro dos limites da nossa cultura. J. M.
Coetzee nos apresenta um conjunto de narrativas de brilho perturbador.
Num dos textos deste livro, uma
mulher se sente diariamente ameaçada por um cão. Em outro, uma escritora só
encontra conforto ao cuidar de gatos abandonados. Também há passagens
envolvendo bodes, galinhas, insetos. O título Contos morais, nesse
sentido, poderia remeter a um diálogo com uma convenção da fábula clássica: o
uso de bichos em histórias que enfatizam aspectos virtuosos da conduta humana.
Como se trata de J. M. Coetzee, no entanto, nada é tão previsível. Para quem
conhece a obra deste autor, a um só tempo fácil e difícil, moderna e
pós-moderna, não é surpresa que a ideia de moralidade seja subvertida por uma
ironia constante, feita de contradições presentes inclusive no estilo da
escrita. Assim, se a linguagem é transparente e direta, a complexidade das
ideias que expressa gera um curto-circuito nas certezas de quem lê. Os contos
aqui não oferecem nenhuma lição. Das contradições entre natureza e cultura,
Coetzee faz brotar uma obra loquaz sobre todos nós. A tradução é de José Rubens
Siqueira e é publicada pela Companhia das Letras.
O primeiro romance de Yara
Nakahanda Monteiro, escritora angolana radicada em Portugal.
Vitória nasceu em Angola, mas foi
criada em Portugal. A infância, que está longe de idílica (por causa do racismo
e da condição de exilada), esconde um trauma: ela nunca conheceu a mãe, uma
revolucionária angolana. Narrado com eletricidade, o romance embaralha
saudavelmente as formas e as expectativas: é uma história de amor e de guerra,
um conto contemporâneo que lida com o passado, um chamado à independência das
mulheres como seres políticos. Essa dama bate bué é publicado no Brasil
pela Editora Todavia.
Uma discussão sobre cultura
fundamental para os nossos dias.
Quando se é obrigado a escrever
entre aspas a palavra “cultura”, isso quer dizer que a cultura está realmente
em mal estado. Quando a diferença entre a propaganda turística, midiática,
festiva e a cultura não é mais claramente percebida, isso quer dizer que a
“cultura” triunfa. Quando não se fala mais de um livro, de uma mostra, de um
concerto para dizer aquilo que respectivamente são, mas somente para discutir
quanto público atraíram e de que maneira, significa que o sentido dos livros,
da arte e da música se dissipa em uma névoa indefinida. Isso acontece todos os
dias debaixo dos nossos olhos. E às vezes — como hoje na França — é o próprio
estado quem o fomenta e administra, transformando-se em um empresário que
compete em suntuosidade e inventividade com o empresário do setor privado, com
um gesto de aparente devoção à cultura e uma vontade velada de manipulá-la, de
utilizá-la para seus próprios fins. Em resumo, tudo parece conspirar para que
seja esquecida a impecável intuição de Jacob Burkhardt, segundo a qual o estado
e a cultura são potências naturalmente inimigas e assim devem permanecer, para
o bem de ambos. Para avaliar esse fenômeno, que é planetário mas assume formas
diferentes em cada país (e obviamente bem diferente da francesa é a questão na
Itália, onde o estado revelou-se incapaz até mesmo de garantir a sobrevivência
física da memória cultural), é preciso um olhar capaz de abraçar vastos
conjuntos, de reconhecer tanto o que é a cultura quanto o que é a “cultura”.
Marc Fumaroli conseguiu isso, com apaixonada verve polêmica, com sólido juízo
histórico, com feliz impaciência. A sua análise se concentra na França,
remontando às origens de um fenômeno que se manifestou de modo flagrante
durante os anos de Mitterrand, mesmo estando já entrevisto nos anos de Malraux.
Mas o discurso vai muito além e se aplica a todo o sutil e onipresente
invólucro de plástico que nos envolve e tenta nos sufocar com as melhores das
intenções. Esse invólucro se chama “cultura”. O estado cultural apareceu
pela primeira vez em 1991 e é publicado no Brasil pela editora Âyiné.
A estreia de Chico Buarque na
forma breve.
Uma jovem e seu tio. Um grande
artista sabotado. Um desatino familiar. Uma moradora de rua solitária. Um
passeio por Copacabana. Um fã fervoroso de Clarice Lispector. Um casal em sua
primeira viagem. Um lar em guerra. Imersos na elogiada atmosfera da ficção de
Chico Buarque, caracterizada pela agudeza da observação e a oposição frequente
entre o poético e o cômico, os oito contos que formam este volume conduzem o
leitor pela sordidez e o patético da condição humana. Com alusões ocasionais à
barbárie do presente, o autor ergue um labirinto de surpresas, em que o sexo, a
perversidade, o desalento e o delírio são elementos constitutivos da trama. Em Anos
de chumbo, Chico Buarque põe seu conhecido domínio da linguagem a serviço
da concisão da forma. O livro é publicado pela Companhia das Letras.
Um livro que aborda o
envelhecimento e a solidão de um homem gay com uma crueza lírica e necessária.
Entre marés de tristeza e raiva,
George, um professor inglês de meia-idade, tenta se adaptar à rotina na
ensolarada Califórnia dos anos 1960 após a morte trágica de seu jovem parceiro.
Por trás de seu jeito reservado, existe um homem que observa a vida com olhos
desejosos. Os corpos masculinos o atraem; a beleza acalenta seu coração
dilacerado. Contudo, a sociedade repressora da época inibe a realização de seus
sonhos. Ao ser publicado pela primeira vez em 1964, Um homem só chocou
muitos leitores com seu retrato franco de um homem gay na maturidade.
Considerado hoje um clássico moderno, este livro é uma narrativa comovente
sobre amor e solidão. Esta edição tem tradução de Débora Landsberg e conta com
posfácio de João Silvério Trevisan. O livro é publicado pela Companhia das
Letras.
A biografia de Dante Alighieri,
escrita por um dos mais importantes historiadores italianos.
Nascido em Florença no século
XIII, Dante Alighieri é uma das figuras mais importantes — e enigmáticas — da
literatura ocidental. Político, escritor, exilado: foi um intelectual de
diversas facetas que não só moldou a língua italiana como também a forma
clássica como muitos entendem os conceitos de paraíso, purgatório e inferno.
Desde sua relação com a família, passando por sua ampla formação intelectual
até a composição de sua obra-prima, a viagem alucinante conhecida como A divina
comédia, Barbero lança luz sobre capítulos essenciais da vida do
escritor — mostrando-o como gênio absoluto, mas também como um homem do seu
tempo. Por meio de exaustiva pesquisa e com uma habilidade narrativa ímpar,
Alessandro Barbero reconstitui a época e vida do poeta, preenchendo lacunas há
muito sentidas. A tradução para Dante é de Federico Carotti.
Pensar a figura da Virgem com
seu menino.
A figura da Virgem com seu menino
desempenhou um papel extraordinário na civilização europeia. Por meio dessa
imagem, que assume formas muito diversas e que é chamada e invocada com nomes
até contrastantes, essa civilização não pensou apenas em sua relação com o
divino — a relação de Deus com a história humana — mas a própria essência de
Deus. Por que Deus é gerado por uma mulher? Pensar essa Mulher constitui uma
forma necessária de apreender tal essência. E os grandes ícones daquela Mulher,
como a Madona Poldi Pezzoli de Mantegna, não são ilustrações de ideias já
definidas em si, mas vestígios de nossa caminhada em direção ao problema que
sua presença encarna. Gerar Deus, de Massimo Cacciari, é publicado pela
editora Âyiné.
Um suspense que tem início com
o fim de um casamento. Uma narradora que observa tudo e todos com uma frieza
incomum. Uma paisagem árida, um hotel de luxo vazio e um desaparecimento.
Quando seu casamento termina,
Christopher pede à ex-mulher que a separação fique em segredo. A parte jurídica
pode ser resolvida depois, mas, por ora, ele deseja que o fim seja mantido
apenas entre os dois. Enquanto procura compreender como organizar a vida dali
em diante, a protagonista recebe um telefonema aflito da sogra, Isabella, à
procura do filho. Nenhuma das duas sabe o paradeiro de Christopher, até que
Isabella descobre que ele está numa remota ilha grega e compra uma passagem
para a nora ir buscá-lo no dia seguinte. Determinada a não deixar escapar
nenhuma pista sobre o término de seu relacionamento, a narradora embarca em uma
jornada à procura de alguém que ela mesma não sabe se faz questão de encontrar.
Num hotel grande e luxuoso — porém vazio, em baixa temporada —, ela será
apresentada a uma paisagem desoladora: a área tem sofrido queimadas nas últimas
semanas e há fogo e cinzas por todos os lados. Com estilo árido, austero e
preciso, que já foi comparado ao de nomes como Ernest Hemingway, Nadine
Gordimer, Elena Ferrante e J. M. Coetzee, Katie Kitamura surpreende o leitor
neste thriller psicológico que acompanha os pensamentos de uma mulher num
momento de profunda solidão. A contenção, a racionalidade e a obsessão com que
a protagonista observa a si mesma e aos outros, sem espaço para
sentimentalismo, são as marcas deste romance eletrizante, que entrelaça
intimidade, silêncio e mistérios. Uma separação, de Katie Kitamura, tem
tradução de Sonia Moreira e é publicado pela Companhia das Letras.
REEDIÇÕES
A Editora 34 reúne a biblioteca de
Dostoiévski numa caixa com 24 títulos.
Trazendo a prosa completa de
Fiódor Mikháilovitch Dostoiévski (1821-1881) na comemoração dos 200 anos de seu
nascimento, esta coleção reúne 24 volumes, do primeiro romance do autor, Gente
pobre (1846), ao último, Os irmãos Karamázov (1880), incluindo seus
contos e os textos literários de "Diário de um escritor" (compilados
no volume Contos reunidos), além das Crônicas de Petersburgo. O conjunto
registra toda a evolução da obra desse gênio da literatura, sempre em traduções
diretas do russo — um trabalho grandioso da Editora 34, iniciado em 2000 com a
publicação de Memórias do subsolo.
Edição sublinha os cinquenta anos de
Sargento Getúlio.
João Ubaldo Ribeiro tinha trinta
anos quando lançou Sargento Getúlio, em 1971. Admirado pela crítica, mas
ainda pouco conhecido pelo público, foi com este romance que o escritor
conquistou prestígio internacional e consagrou-se como um dos maiores autores
de literatura em língua portuguesa. Ambientado no Nordeste dos anos 1950, a
obra narra a história de Getúlio Santos Bezerra, homem de confiança de um
poderoso coronel de Sergipe, que precisa levar um preso político de Paulo
Afonso até Aracaju. No meio do trajeto, uma reviravolta política faz com que as
ordens se alterem, impedindo Getúlio de prosseguir com a missão. Desconfiado e
determinado a cumprir à risca o serviço que lhe fora dado, o sargento parte em
uma jornada que não terá outro destino a não ser o da violência e da morte. A
nova edição publicada pela Alfaguara traz texto de Jorge Amado e prefácio de
Juva Batella.
Edição comemorativa de 30 anos
do primeiro romance de Chico Buarque.
Estorvo foi lançado
pela primeira vez em 1991. Recepcionado pela crítica de forma praticamente
unânime, a estreia de Chico Buarque no romance foi um acontecimento nas mais
diferentes esferas da cultura e deu início à longa carreira literária do autor.
Em 2021, trinta anos depois, a Companhia das Letras relança este que é um de
seus maiores sucessos, em uma edição especial com textos de Roberto Schwarz,
Sérgio Sant’Anna, Marisa Lajolo e Augusto Massi. No livro, o leitor é
mergulhado em um universo de delírio e digressões — característica que viria a
ser reconhecida como recorrente na ficção buarquiana, assim como o cenário
carioca — ao acompanhar o narrador em um nebuloso vagar pela cidade, após se
deparar com um desconhecido em sua porta. A fuga do que não reconhece leva o
homem a um incessante ziguezaguear por locais já conhecidos, como o sítio da
família, a boutique da ex-mulher e o edifício de um velho amigo. Uma metáfora
ao Brasil da época, Estorvo é um marco para a literatura brasileira e, passadas
três décadas, se mantém atual, assim como a obra de Chico Buarque.
Nova edição de uma das obras
mais importantes de Alberto Manguel.
Leitor voraz e ciumento, um
grão-vizir da Pérsia carregava sua biblioteca toda vez que viajava,
acomodando-a em quatrocentos camelos treinados para andar em ordem alfabética.
Em 1536, a Lista de preços das prostitutas de Veneza anunciava uma profissional
que se dizia amante da poesia e tinha sempre à mão algum livrete de Petrarca,
Virgílio ou Homero. Na segunda metade do século XIX, em Cuba, os operários de
algumas fábricas de charuto pagavam a um lector, alguém que se sentava
junto às bancadas de trabalho e lia alto enquanto eles manuseavam o fumo. Anos
mais tarde, a ditadura de Pinochet baniu Dom Quixote, identificando ali
apelo à liberdade individual e ataques à autoridade instituída. Reunindo
experiências de todo tipo de leitor ao longo do tempo, Uma história da
leitura é uma homenagem fascinante a esta arte fundamental. Com introdução
inédita no Brasil, esta nova edição recupera uma das obras-primas de Alberto
Manguel. A tradução de Pedro Maia Soares é reeditada pelo selo Companhia das
Bolso da Companhia das Letras.
DICAS DE LEITURA
Na segunda-feira, dia 13 de setembro,
iniciamos uma série de postagens que sublinham, por ocasião da efeméride dos setecentos
anos sobre a morte de Dante Alighieri, a obra e o poeta italiano. Até o final do
mês editaremos seis textos, além de material diverso nas redes sociais nas
quais o blog mantém alguma presença. Também nesta seção do Boletim Letras 360.º
editaremos algumas dicas de leitura da obra e sobre. Neste e nos dois próximos
números. A chegada de uma nova tradução da principal obra Dante, A Divina
Comédia, sempre reabre nossas dúvidas sobre qual a melhor — se a
atual ou a mais antiga — e se vale acrescentar mais um livro do mesmo à nossa biblioteca. Existe
uma variedade de traduções em circulação no Brasil. Citamos três edições e
justificamos o motivo da escolha. Mas antes três coisas: toda tradução tem sua
particularidade e é sempre discutível a noção de fidelidade, sobretudo para um texto com tantas particularidades como o da Commedia; depois, uma obra clássica
como esta é sempre válido ter diferentes traduções, porque cada uma nos oferece
uma experiência singular de leitura, além de, sendo um clássico, é uma obra a qual
sempre retornamos. Das edições consultadas para as recomendações ficou fora a nova
tradução que começou a ser apresentada pela Companhia das Letras agora em 2021.
1. Divina comédia (tr. de João
Trentino Ziller). Há muito fora de catálogo, esta tradução foi reeditada para
sublinhar a efeméride que nos motiva agora falar sobre Dante Alighieri. É, sem
dúvidas, o trabalho editorial de maior brilho que esta obra já recebeu entre
nós. Marco Lucchesi, presidente da Academia Brasileira de Letras, sublinha que
Ziller seguiu em Dante “uma espécie de princípio Horus, ou seja, uma trama luminosa,
que tece o princípio arquitetônico da obra ou o flatus poético que os
pulmões do tradutor não podem deixar de respirar.” E acrescenta: “O que Ziller
sentiu foi o ritmo, o batimento cardíaco do poema.” Publicada pela Ateliê, esta edição traz algumas outras
peculiaridades: as ilustrações de Sandro Botticelli perdidas durante séculos e
encontradas na década de 1980; um projeto gráfico que reproduz no papel os movimentos
interiores do poema, notas do tradutor e um texto de apresentação de João
Adolfo Hansen, um dos nossos mais interessantes leitores da literatura antiga
no Brasil.
2. A divina comédia (tr. de
Italo Eugenio Mauro). Os elogios à tradução de João Ziller são praticamente
unânimes; a este trabalho que foi publicado pela editora 34, nem sempre. Reclama-se
da irregularidade no tom e funcionamento do poema, do apego excessivo à literariedade
matando a musicalidade e algumas especificidades do texto original, por
exemplo. Ainda assim, parece um trabalho interessante porque é um dos raros que
peca por buscar não a repetição dos modelos, digamos, institucionalizados para
o poema, abrindo-se para o merecimento do designativo de nova tradução. Talvez
por isso tenha merecido o Prêmio Jabuti quando foi publicada em 2017. A edição traz
uma série do que chamaríamos de organogramas de funcionamento de cada uma das partes
do poema e um ensaio de Otto Maria Carpeaux.
3. A divina comédia (tr. de
Vasco Graça Moura). Dos três projetos editoriais este é o mais simples; não encontramos
notas, textos de apoio, ilustrações e a edição brasileira da Landmark é cheia
de problemas — erros gráficos da mais variada forma. O que faz sua presença nesta
lista é o excepcional trabalho de recriação do poema original em língua portuguesa,
buscando-se zelar pelo mesmo apelo rítmico do primeiro texto, respeitando suas
ambiguidades e polissemias. O perigo que sempre corre é, como reparado pela
crítica certo desalinhamento semântico. Com este trabalho, o poeta português
recebeu, em 2007, o Prêmio de Tradução do Ministério da Cultura da Itália. Se o primeiro caso, a recomendação inclui também a edição, no caso aqui, a recomendação é apenas da tradução. Ou seja, fica a ressalva de buscar a edição portuguesa e não a brasileira.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. No nosso Tumblr, reunimos na
terça-feira, 14 de setembro, a exata data dos 700 anos sem Dante Alighieri,
nove curiosidades acerca do autor e sua obra. Esta é a primeira de uma sequência
de posts que editaremos nesta rede. Veja aqui.
2. O blog da parceira Revista
7faces reuniu um conjunto de poemas de Dante Alighieri coletados de La Vita
Nuova, um livro anterior à Commedia dedicado a decantar o amor pela
musa Beatriz, figura essencial no seu grande poema.
BAÚ DE LETRAS
1. Mais adiante poderemos lembrar aqui
as entradas para a sequência de textos sobre Dante Alighieri e sua obra. Por
enquanto, vale recordar algumas publicações anteriores as que começamos agora em
setembro. Em abril, nosso colunista André Cupone Gatti escreveu sobre a
representação do real nos cantos X e XII do “Purgatório” — leia aqui. Sobre o
trabalho de ilustração para A divina comédia, encontram estas duas
posts: esta sobre o trabalho de Alberto Martini; e esta sobre o de Salvador Dalí.
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