Boletim Letras 360º #443

 
 
DO EDITOR
 
1. Caro leitor, esta é a última semana da campanha para arrecadar fundos a fim de cobrir nossas despesas com o domínio e a hospedagem do Letras na web — há informações aqui no Facebook e aqui no  Instagram. Ainda faltam alguns dólares, mas vamos nos virar com o que temos e a possibilidade de ajudar ficará aberta continuamente.  
 
2. A todos que ajudaram até aqui — e não foram poucos —, não importa como, reitero em nome do blog todos os agradecimentos externalizados pessoalmente, aqui, nos contatos e nas redes. Aguardamos a chegada de alguns livros prometidos por algumas editoras para organizar uma promoção entre os contribuintes; será outra maneira de dizer obrigado.
 
3. Abaixo, as notícias que passaram pela página do blog no Facebook durante a semana e as demais dicas nas outras seções deste Boletim. Boas leituras!

Enzo Maqueira. Foto: Pedro Montero


 
LANÇAMENTOS
 
Noir argentino de Enzo Maqueira chega ao Brasil pela PontoEdita.
 
Com um narrador denso e realista e uma prosa árida na tradição de Raduan Nassar e Cormac McCarthy, Faça-se você mesmo, de Enzo Maqueira, é uma jornada em busca da literatura que há no real, uma crônica da felicidade perdida. O livro, um noir rural com elementos de ensaio filosófico, foi finalista do Prêmio Silverio Cañada da Semana Negra de Gijón, na Espanha (2019). A edição da PontoEdita, com intervenção do escritor e cineasta J. P. Cuenca e capa com fotografia do premiado diretor de arte e publicitário carioca Bernardo Cople, marca a estreia de Maqueira no Brasil. Considerado pela crítica argentina uma das vozes mais proeminentes da literatura latino-americana (La Nación, Clarín), Maqueira transcende o círculo literário portenho e aborda temas fundamentais como a religião, as drogas e a heteronorma, de modo a evidenciar que toda forma de arte é uma enunciação eminentemente política. Solilóquio de um personagem atormentado pela possibilidade de estar doente e pela necessidade não apenas de ser outra pessoa, mas sobretudo de imaginar como deverá ser (para ele, a felicidade está em transformar-se em artista), Faça-se você mesmo acompanha alguns dias na vida de um homem sem nome e sem convicções que foge de Buenos Aires para a casa dos avós onde passava os verões de sua infância. A casa — um território sagrado no meio da Patagônia desértica — fica em San Benito, um vilarejo fictício, quase mítico, que não é apenas uma encarnação narrativa de Comodoro Rivadavia (cidade em que o autor de fato costumava, assim como seu protagonista, passar a infância na casa dos avós), mas também uma homenagem a Coronel Vallejos de Manuel Puig e Macondo de Gabriel García Márquez. Nesse lugar cheio de fantasmas do passado, entre as memórias agradáveis de verões ao lado dos avós, agora mortos, e de amigos, agora ausentes, o protagonista ganha consciência de sua covardia a partir de uma sequência de frustrações. A expectativa de futuro o impede de fazer qualquer coisa no presente, de concluir qualquer tarefa, e se traduz em procrastinação e insatisfação contínuas. A partir de referências aos grandes mestres da Nouvelle Vague e à banda de rock inglesa Queen, o livro extrapola os limites do gênero e ganha contornos cinematográficos à medida que o protagonista se torna, ele mesmo, personagem da própria ficção. Mas a beleza da prosa de Maqueira está na desconfiança dos limites da palavra (na epígrafe que abre o livro, tirada do filme Adeus à linguagem, de Jean-Luc Godard, lemos: “As palavras — não quero voltar a saber delas”) e isso pode causar nos leitores certo nervosismo ou ansiedade por símbolos e interpretações. Pois se a narrativa começa com um tom quase idílico de busca da felicidade perdida na infância, ela vai aos poucos se transformando em outra coisa, ficando mais sombria. A maior homenagem, porém, é a Fellini, em especial ao filme Oito e meio (há inclusive um capítulo com esse título). Em certo momento, o narrador declara: “Fellini tinha razão: as únicas memórias que valem a pena estão na infância.” Entretanto, se, como em Fellini, o romance de Maqueira de fato tem um ponto de partida autobiográfico, sua prosa não cai na autoficção, pois se abre às exigências da narrativa e propõe uma reflexão profunda sobre como a sociedade criou, mediante múltiplas ficções, uma idealização da obrigação de ser feliz. Essa obrigação (o último bastião do neoliberalismo) é equacionada no discurso vazio da autoajuda que ressoa na ironia fina presente no título (que torce a fórmula americana “do it yourself”) e dá o tom do estilo que a linguagem de Maqueira coloca em cena: um sarcasmo fellinesco que transita entre realidade, sonho ou suprarrealidade. Essas fronteiras fluidas ganham forma na figura de um vizinho parecido com Freddie Mercury, ídolo de sua infância. A imagem do líder do Queen, que representa uma nova masculinidade, entra em conflito com a imagem do avô, símbolo de um patriarcado falido, e obriga o protagonista a enfrentar seus próprios demônios. Mas, conforme pergunta J. P. Cuenca em sua intervenção, como seria o solilóquio de um personagem-macho em tempos de queda do capital simbólico do homem branco, intelectual, heteronormativo no mercado das ideias e da cultura? São perguntas como essa que, entre canções do Queen e referências a Truffaut, Godard e Varda, Maqueira elabora narrativamente.
 
Primeira obra de Liudmila Ulítskaia publicada no Brasil.
 
Meninas reúne seis contos que formam um ciclo de histórias perfeitamente arquitetado pela autora. Ambientados em Moscou no período próximo à morte de Stálin, em 1953, os contos são protagonizados por meninas de 9 a 11 anos de idade, que aparecem e reaparecem na peculiar sequência das narrativas. Coincidindo com a época da infância da escritora, a atmosfera destas histórias é alimentada por reminiscências autobiográficas, enriquecidas pela criatividade e pelo talento narrativo desta que é uma das maiores prosadoras russas em atividade, vencedora do Prêmio Simone de Beauvoir, do Russian Booker Prize e recorrentemente cotada para o Prêmio Nobel de Literatura. Reconhecida também como uma das vozes mais importantes da sociedade russa atual na defesa das liberdades civis, Liudmila Ulítskaia explora com graça e sensibilidade as refrações da grande história no mundo interior e nas relações sociais das personagens pré-adolescentes, compondo um painel vívido e complexo da vida na União Soviética na década de 1950. Meninas tem tradução e notas de Irineu Franco Perpetuo e posfácio de Danilo Hora. É publicada pela Editora 34.
 
Um romance em que as mulheres precisam reaprender a liberdade absoluta.
 
Quarenta mulheres estão presas em uma jaula coletiva em um porão, sob a vigilância de guardas que permanecem sempre em silêncio. Um dia, misteriosamente, uma sirene soa, os guardas fogem e as grades se abrem. Entre as prisioneiras, está uma menina sem nome que só conhece a vida lá fora através de lembranças que as outras mulheres aceitam compartilhar. É ela que conduz as demais prisioneiras em fuga, apenas para encontrarem um lugar inóspito e desconhecido. Agora, contando apenas umas com as outras, elas terão que reaprender a viver e enfrentar outro desafio: a liberdade absoluta. Eu que nunca conheci os homens, da escritora belga Jacqueline Harpman é publicado pela editora Dublinense.
 
O retorno aos leitores brasileiros do escritor italiano Davide Enia.
 
Ao acompanhar a rotina em Lampedusa, a ilha italiana mais perto da África, Davide Enia criou um livro potente, transformador, que abre nossos olhos (e nosso coração) para histórias de vida incríveis, narradas com profundidade e afeto. Notas para um naufrágio tem tradução de Wander Melo Miranda e é publicado pela editora Âyiné.
 
Também a coleção A arte da novela, editada pela Grua, tem agora sua edição de Animal Farm, de George Orwell.
 
Depois de o sr. Jones trancar os galinheiros e se recolher na sede da Fazenda Herdade, os animais se reúnem em volta do velho Major, um porco de doze anos respeitado por todos. Chegam os cavalos Boxer e Clover, a bela égua branca Mollie, a cabra Muriel, o burro Benjamin, o animal mais velho da fazenda, os porcos Napoleão, Bola de Neve e Guincho, as galinhas, os patinhos que Clover protege para não serem pisoteados. Camaradas, começa o Major, e todos o escutam hipnotizados. Ele fala das injustiças, de quanto trabalham e tão pouco recebem, da vida miserável que levam, que o homem “é a única criatura que consome sem produzir. Ele não dá leite, não bota ovos, é fraco demais para puxar o arado, não consegue correr rápido o bastante para pegar coelhos. No entanto, ele é senhor de todos os animais.” E, numa catarse coletiva, convida todos a entoar a canção Animais da Inglaterra, cuja letra evoca um mundo melhor. Das palavras do Major, que morre pouco tempo depois, é gestada a Rebelião, sob a liderança dos porcos. Sr. Jones é expulso e a fazenda passa a se chamar FAZENDA DOS ANIMAIS. Bola de Neve, das lideranças mais ativas, escreve na parede do celeiro Os Sete Mandamentos, um resumo do Animalismo, um sistema completo de pensamento que os três porcos líderes elaboraram a partir dos ensinamentos do Major. O último deles e o mais importante é: Todos os animais são iguais. As relações de poder entre os animais, a invenção do passado como forma dominação, o uso da força, a usurpação de pequenos privilégios transfiguram o sonho que vai se esvanecendo dando lugar a uma realidade dura para grande parte dos animais. Das obras mais populares e poderosas do século XX, a fábula de fundo antitotalitarista de Orwell ganha nova tradução, desta vez, por Bruno Gambarotto.
 
Novo romance de Álvaro Cardoso Gomes testemunha um Brasil distópico.
 
Nesse momento trágico de pandemia da Covid-19, vem à luz Panarquia, um romance apocalíptico, absolutamente inovador, a tratar de um Brasil distópico. Utilizando-se da ironia e montando um enredo, na aparência, caótico, onde vozes surgem para logo se perder, em Panarquia, Álvaro Cardoso Gomes conduz o leitor com maestria nos meandros de um mundo afetado por um dos mais dramáticos episódios da humanidade, a pandemia da Covid-19, responsável no romance pela transformação das cidades em locais desérticos, em que circulam seres sem rumo ou esperança. Constituído de módulos, o leitor é apresentado a histórias perturbadoras de personagens de diferentes estratos sociais — prostitutas, vigaristas,   bandidos, professores, voyeurs, policiais, pastores, donas de casa, domésticas, drogados, profetas — cada um, com sua voz peculiar, tentando construir e afirmar seu enredo. O romance reflete um tempo de trevas e desesperanças ao criar um labirinto narrativo, onde os personagens emergem à tona da massa indistinta, para logo depois voltarem a se imiscuir nela, pois nada há que aponte para um porto seguro ou para a luz do final de um túnel. Por meio deste estado apocalíptico temperado pela sátira e pela comicidade, o autor traça um retrato do Brasil contemporâneo, sem identidade definida e ainda apostando em valores retrógrados que visam manter o status quo de uma sociedade elitista e preconceituosa. Uma obra nem tão fictícia que levará o leitor a refletir sobre a realidade do Brasil de hoje. O livro é publicado pelo selo Minotauro.
 
Crítico inglês, dos mais proeminentes no mundo anglófono, traz considerações sobre como o prazer estético e a mudança levam à substituição, condenação e revisão de textos considerados canônicos.
 
O que define o cânone? Ou melhor, quem define o cânone e as mudanças que ocorrem nele ao longo dos tempos? O que faz um texto outrora julgado vulgar ou inadequado ser posteriormente promovido ao status de canônico? O presente livro discute como o prazer estético pode definir o que se acredita ser valioso, ou não, na consideração das obras literárias e o quanto esses parâmetros são alterados com o passar dos anos. Organizado por Robert Alter, Prazer e mudança. A estética do cânone tem tradução de Luiz Antônio Oliveira de Araújo e é publicado pela Editora da Unesp.
 
O primeiro romance de Raimundo Neto.
 
Nasci sem um caminho de volta é a jornada de um filho para se libertar da casa/útero da mãe. Mas também é a história íntima de um menino sobre sua homossexualidade demonizada, do corpo/ casa como espaço de pertencimento, resistência e perdição, da violência soturna das relações familiares. Numa casa dominada pela presença feminina, construída para servir aos homens distantes e brutos, nasce o anti-herói, personagem e narrador do romance, para existir como um corpo estranho no corpo da casa. Em seu romance de estreia, Raimundo Neto não pede licença para tocar com mãos ásperas a pele do leitor. Sua prosa lírica, sensorial, vigorosa e simbólica é fruto de labor com a linguagem. Não há uma só palavra que não seja sentida e experimentada. Cada frase contém um mundo submerso nas entrelinhas. Este é um romance que pode ser lido em voz alta, tanto pelo apuro rítmico e melódico de sua escrita quanto pelo que nele existe de corpos e gritos reprimidos. A casa é personagem fundamental e nela há secura e umidade, dor e gozo, chão e teto, território vasto e devastado. Há uma ruína que paira sobre o livro e que é a sua força poética: a casa é o corpo de tudo e de todos. Sintoma, doença e cura. Raimundo Neto chega ao romance em grande estilo. Um livro que não termina tão cedo dentro da gente. O livro é publicado pela Editora Moinhos.
 
A editora Todavia apresenta aos leitores brasileiros o Hermann Hesse contista.
 
Hermann Hesse não foi apenas um romancista extraordinário. Se em seus romances mais célebres — como Sidarta, O lobo da estepe ou Demian — gerações de leitores se viram retratadas, são nos textos curtos que podemos melhor enxergar o próprio Hesse. O lobo e outros contos, antologia inédita no Brasil, tem seleção e posfácio de Volker Michels, especialista no autor, e tradução de Sonali Bertuol. A edição reúne vinte textos que, segundo Michels, compõem a lista de melhores contos do ficcionista alemão. Organizadas cronologicamente, as histórias abarcam um longo período produtivo — de 1903 a 1948 —, acompanhando não somente o amadurecimento do homem Hesse, mas também sua constituição como um dos maiores criadores do século XX. Em O lobo e outros contos, as referências autobiográficas são abundantes, e a ambivalência do ser humano, os duelos internos entre instinto e espírito, liberdade e piedade, estão em todas as narrativas e em seus conflituosos personagens, apresentando, enfim, um Hesse em toda sua genialidade. A edição especial — em capa dura — de O lobo e outros contos tem projeto assinado por Luciana Facchini, designer da capa, e pelo ilustrador Fabio Zimbres.
 
A tradução definitiva do poema pseudo-heroico The Dunciad.
 
Como um poeta genial e amargurado gastou uma década e meia de sua vida escrevendo um poema satírico contra um editor bem mais competente do que ele e vários outros desafetos seus, imortalizando assim todas as pessoas incultas que ele pretendia sepultar no esquecimento. Esta edição traz o texto traduzido para o português da versão definitiva em quatro livros do poema narrativo pseudo-heroico The Dunciad, incluindo todas as notas, prefácios e apêndices do original. O que prova que, enquanto houver pessoas, a guerra contra a idiotice nunca terá fim! A tradução é de José Ignacio Mendes e o livro é publicado pela Faria e Silva.
 
Três textos inéditos de Walter Benjamin pela primeira vez traduzidos e publicados integralmente no Brasil.
 
Com tradução e organização de Helano Ribeiro Agesilaus Santander reúne três textos inéditos de Walter Benjamin pela primeira vez traduzidos e publicados integralmente no Brasil: as duas versões de “Agesilaus Santander” e o “Anúncio da revista: Angelus Novus”, escrito em 1922. A edição bilíngue traz ainda o posfácio “Sob o signo do Anjo”, de Ernani Chaves, que contextualiza esses textos autobiográficos dentro da obra benjaminiana. Como bem apresenta Amon Pinho: “Na obra de grandes autores, pequenos textos não raro desempenham papéis cruciais. E tanto mais se se trata de Walter Benjamin, autor de repercussão mundial cujo pensar consiste, já se disse, num fragmentarismo construtivo. No presente livro, o teórico da literatura e tradutor Helano Ribeiro dá provas cabais de que não só apreendeu a importância dessa lição, como a apreendeu com engenhosidade hermenêutica e tradutibilidade precisa”. O livro é publicado pela editora 7Letras.
 
Um livro reúne parte dos últimos poemas de E. M. de Melo e Castro.
 
Um dos expoentes da literatura portuguesa, autor de mais 25 livros de poesia e 18 de ensaios de crítica e teoria literária ganha a primeira peça de um fecho da sua trajetória poética encerrada quando da morte do poeta em agosto de 2020. No convívio com o poeta Edson Cruz, E. M. de Melo Castro lhe confiou um conjunto de textos que agora ganha edição na antologia Poemas tardios, editada pela editora Patuá.
 
OS LIVROS POR VIR
 
Uma série de obras relacionadas à Semana de Arte Moderna de São Paulo.
 
O ano de 2022 é o do primeiro centenário da Semana de Arte Moderna de São Paulo; é o ano, portanto, de outra enxurrada de publicações relacionadas a este acontecimento, como tem sido de costume a cada efeméride. A Companhia das Letras prepara uma série de títulos. Detentora dos direitos de publicação da obra de Oswald de Andrade, é do modernista pelo menos duas novidades: o inédito Diário confessional com textos escritos nos seus últimos anos de vida e a reedição de Serafim Ponte Grande. Na sequência estão outras três obras: o romance proletário de Pagu Parque industrial; um livro sobre o modernismo e a moda; e Modernidade em preto e branco, do historiador de arte Rafael Cardoso.
 
OBITUÁRIO
 
Morreu a escritora Isabel da Nóbrega.
 
Isabel da Nóbrega nasceu em Lisboa a 26 de junho de 1925. Com a escrita esteve no rádio, na televisão, no teatro e no jornal, atuando em meios como A capital, revista na qual trabalhou como uma das fundadoras, Diário de Lisboa, Diário de Notícias, entre outros. Autora de textos fundamentais para a literatura portuguesa do século XX como Os anjos e os homens, livro que marcou sua estreia como romancista em 1952, e Viver com os outros, seu mais importante romance, publicado em 1964. Também escreveu contos — Solo para gravador (1973), As magas (2010) — e crônicas — Quadratim (1976); ainda na ficção breve, publicou a novela Já não há Salomão (1966). Para o teatro, deixou títulos como O filho pródigo, ou, o amor difícil, (1954), peça que chegou a ser representada no Teatro D. Maria II. Seu trabalho foi premiado reiteradas vezes e nos últimos anos a escritora foi condecorada duas vezes, com a Grande-Oficial da Ordem do Mérito (2000) e a Grande-Oficial da Ordem da Liberdade (2011). Isabel da Nóbrega morreu em Lisboa a 2 de setembro de 2021.
 
DICAS DE LEITURA
 
Por mais prestigiado que seja, prêmio literário nenhum canoniza definitivamente se um livro é bom — quando é atribuído a um livro especificamente; atualmente, principalmente, quando as motivações são mais das vezes ideológicas ou de parentesco entre o premiado, a editora e o júri. Mas se é a premiação um selo que de alguma maneira determina a escolha de alguém pela próxima leitura, bom, é questionável o gesto, mas ficamos com a importância do ler. Na extensa lista dos semifinalistas do Prêmio Oceanos de 2021, elegemos três livros que estão no nosso radar de interesse. Os critérios? Dois apenas: o valor literário de obras anteriores e a premissa que sugere qualquer coisa de curiosidade para a leitura. Você, claro, pode fazer sua própria lista a partir dos indicados aqui.
 
1. Além do Rio dos Sinos, de Menalton Braff. O nome do escritor poderá parecer novidade para muitos, mas é vasta a lista dos livros que assina: novela, conto e vários romances, aparecidos quase todos a partir dos anos 2000, ainda que o início de tudo esteja em meado dos anos oitenta. O título faz menção ao espaço onde se desenvolve a história contada neste romance: a dos caminhos e percalços desbravados por Nicanor e Florinda — a criação dos filhos, as agruras da natureza, o contato diário com os animais. Amor, ódio, traição, vingança e morte são os temas que se articulam trágica e poeticamente. O livro foi publicado pela editora Reformatório.
 
2. O osso do meio, de Gonçalo M. Tavares. Quando este prêmio ainda era Portugal Telecom, o escritor português o recebeu em 2007; é difícil, portanto, repetir outra vez o feito. Não pelo escritor, é claro, mas pelas conveniências que quase sempre, em nome da oportunidade para todos, prefere entregar o reconhecimento para um fulano ainda não premiado. Este romance integra o círculo intitulado O reino, ao qual pertencem alguns dos melhores livros de Tavares, como Jerusalém. Situado no período de pós-guerra, a narrativa avança sobre temas caros a este lugar da literatura do escritor: o mal, a violência, a submissão. A edição portuguesa é da editora Relógio.
 
3. Opulência, de Luis S. Krausz. Há qualquer coisa de Thomas Mann ou mesmo de Dinah Silveira de Queiroz — nessa sequência, claro — na premissa deste livro do escritor brasileiro. Situado em plena ebulição da Ditadura Militar, um grupo de figuras se refugia num mundo pré-concebido pelo convívio com arte e alta cultura em meio à paisagem esplêndida da Serra da Mantiqueira. Sem se decidir pela lógica salvação ou suicídio, mas equilibrado na tensão desses dois limites, o romance é testemunha de um universo em dupla degradação: natural e ideológica. A publicação é da Cepe Editora.
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
1. No dia 1.º de setembro celebramos o aniversário do escritor mais importante para a literatura portuguesa do entre-séculos: António Lobo Antunes. Além do romance e da crônica, formas por ele revolucionadas, trabalhou alguns exercícios de poesia. Um destes, lido por ator Pedro Lamares, e um dos vídeos mais vistos na nossa galeria
 
BAÚ DE LETRAS
 
1. Sobre Gonçalo M. Tavares, duas recomendações dentre as várias publicações registradas no blog: em 2010, registramos aqui algumas informações biobibliográficas sobre M. Tavares; e Jerusalém foi comentado por Pedro Fernandes nesta entrada.

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