Boletim Letras 360º #423
DO EDITOR
1. Saudações, caro leitor! As vendas de alguns livros da
biblioteca do Letras para cobrir as despesas de hospedagem do blog online estão
abertas. Fazemos isso anualmente através de um bazar no nosso Facebook. Veja se
é possível a ajudar. A simples partilha e divulgação é já muito importante.
2. A seguir, as notícias apresentadas
durante a semana na página do blog no Facebook e o conteúdo das demais seções
de leitura criadas em momento posterior à existência deste Boletim.
3. Reitero os agradecimentos pela
companhia do nosso trabalho. Espero que você esteja, dentro do possível são e
seguro. Boas leituras!
Franz Kafka com cachorro. Foto, 1906/1908. Arquivo Biblioteca Nacional da Áustria. |
LANÇAMENTOS
Nova edição dos Diários,
de Franz Kafka segue as edições mais completas dos registros pessoais do autor.
“Tudo que não é literatura me
entedia e eu detesto”, anota Franz Kafka em certo dia de 1913. A essa altura, o
advogado judeu era funcionário de um instituto de seguros trabalhistas e
começava a receber uma modesta atenção como o autor da novela O veredicto.
Mas a glória nas letras seria póstuma e por obra de seu amigo Max Brod. E tudo
para Kafka era metabolizado em literatura. A prova disso são estes Diários,
um dos monumentos literários do século XX traduzido integralmente pela primeira
vez no Brasil por Sergio Tellaroli. São páginas assombrosas. Constituem aquilo
que o escritor argentino Ricardo Piglia qualificou como o “laboratório do
escritor”: o espaço em que o autor de A metamorfose experimentava e
afiava a sua escrita em meio a comentários sobre sua época, suas leituras, suas
decepções amorosas, rascunhos de cartas, relatos de sonhos, começos
encantadores de obras literárias jamais concluídas, bem como diversas histórias
acabadas. Datados de 1909 a 1923, os Diários abrem uma porta não apenas
para o homem de carne e osso que foi Franz Kafka. Apresentam também o percurso
através da mente brilhante e algo torturada de um artista sem rivais. Este
volume, que segue as edições mais completas dos registros pessoais do autor,
disponibiliza pela primeira vez uma reconstrução abrangente das entradas dos Diários
e fornece novo conteúdo substancial, incluindo detalhes, nomes, obras
literárias e passagens de natureza sexual que foram omitidas nas primeiras
edições. Das caminhadas por Praga às idas ao teatro, da relação tempestuosa com
sua herança religiosa à sua visão da Primeira Guerra — passando pelas mulheres,
a família, a doença e a vida literária. Cada página destes Diários
oferece uma jornada pela luta pessoal de um homem em busca de si mesmo. A nova
edição é publicada pela editora Todavia.
Num livro que radicaliza o
caráter especulativo de sua ficção, o premiado escritor americano Don DeLillo
nos traz notícias de um mundo perplexo diante da velocidade das mudanças que
nos fazem questionar certezas sobre cultura, tecnologia e identidade.
Num dia de 2022, ao sofrer as
consequências de um evento misterioso que causou pane em aviões, apagou telas
de celulares e tornou inviável a civilização como a conhecemos, os personagens
de O silêncio — um casal que escapou de um desastre aéreo, um jovem
professor de física, a ex-professora dele e seu marido fã de apostas — refletem
sobre morte e sobrevivência, verdade e representação, tempo e segurança. No
passo lento e vertiginoso de sua prosa, um realismo tão acurado quanto distorcido
no qual os ambientes não são bem ambientes, os diálogos não são bem diálogos,
os sentidos da história parecem às vezes tão claros e às vezes tão distantes,
impalpáveis, Don DeLillo dá ao romance o poder de dizer o indizível — e assim,
quem sabe, reverter a impressão de que “o mundo é tudo, o indivíduo, nada”. A
tradução de Paulo Henriques Britto é publicada pela Companhia das Letras.
Livro de contos da escritora
equatoriana ganha tradução no Brasil.
Rinha de galos, de María
Fernanda Ampuero, narra, com o uso de diferentes vozes literárias, o espaço que
constrói — ou destrói — as pessoas, o espaço chamado casa. Trata das relações
familiares e seus códigos secretos, lutas pelo poder, afeto, silêncios,
solidariedade, abuso e todo o horror e a beleza encerrados dentro das paredes
de uma casa: o terror e o paraíso de nossa vida cotidiana. Uma senhora que
encontra uma boneca de vodu no quarto da empregada, uma menina que é testemunha
de abusos e este facto estilhaça a sua infância em mil pedaços, a esposa
perfeita que verifica o seu carrinho de compras e o seu casamento, um casal
encerrado um labirinto, as histórias da Bíblia contadas por Maria Madalena, um
exercício macabro de leiloar pessoas realizado entre criminosos. Rinha de
galos reúne criaturas inocentes que tentam seguir em frente com qualquer
coisa além de sua vontade. Criaturas que se corrompem, pessoas doentes de amor,
de solidão, afogadas em perdas. Pessoas que lutam à sua maneira particular
contra a clara crueldade de estar vivo. A tradução de Silvia Massimini Félix é
publicada pela Editora Moinhos.
A partir do convívio próximo
fruído e com um olhar sempre afetuoso, a crítica literária Leyla Perrone-Moisés
nos apresenta perfis de grandes figuras das letras e das artes, algumas mais célebres
que outras, mas todas à sua maneira essenciais para a sua formação.
“Eu não tenho nada de especial
para contar a meu respeito, mas tenho muito a contar sobre pessoas que conheci”,
diz Leyla Perrone-Moisés. Se a negativa no início da citação é bastante
questionável, a segunda oração é de uma verdade acachapante. Nesta singela
reverência ao convívio, ao diálogo e ao intercâmbio de ideias, a autora nos
conduz por aventuras intelectuais mas também por aspectos mais mundanos de
figuras como Samsor Flexor, Décio de Almeida Prado, Antonio Candido, Roland
Barthes, Haroldo de Campos, Cortázar, Leminski, Saramago, Derrida,
Lévi-Strauss, entre muitos outros, por um ângulo original e inusitado. Ao
leitor trata-se de rara oportunidade: de vislumbrar essas vidas em contextos
muitas vezes inéditos (em que se destacam a intimidade ou saborosas anedotas do
cotidiano), sem prejuízo da fina análise e da verve narrativa pelas quais se
tornou conhecida a grande crítica. Vivos na memória é publicado pela
Companhia das Letras.
Novo livro da poeta Maria
Esther Maciel.
Marias, joões, viúvas e seres
híbridos, tanto reais quanto imaginários, protagonizam os verbetes deste
breviário de Maria Esther Maciel ilustrado por Julia Panadés. Uma mistura, em
igual medida, de biologia e poesia. Um livro em que a criação literária corre
de mãos dadas com os antigos manuais naturalistas. Um passeio ― literário,
ecológico, fantástico ― pela sensibilidade de uma das mais engenhosas
escritoras brasileiras contemporâneas. A Pequena enciclopédia de seres
comuns é publicada pela editora Todavia.
Nova tradução de Anna
Kariênina.
William Faulkner, perguntado sobre
quais eram os três maiores romances de todos os tempos, respondeu: “Anna
Kariênina, Anna Kariênina, Anna Kariênina”. Para Vladímir Nabókov, a obra é
“uma das maiores histórias de amor da literatura mundial”. E Thomas Mann, no
prefácio incluído neste volume, o considera “o romance social mais poderoso” já
escrito. Seja qual for o aspecto privilegiado na leitura, esta obra-prima de
Tolstói fatalmente está entre as mais importantes criações literárias da
humanidade. Rico panorama da agitada Rússia de fins do século XIX, a obra —
publicada entre 1875 e 1877 na revista Mensageiro russo, e em 1878 em
livro —, narra, por um lado, o drama da bela e impetuosa Anna Kariênina, que,
infeliz no casamento, enfrenta o julgamento cruel da alta sociedade de Moscou
ao assumir sua paixão pelo conde Vrônski. Por outro lado, acompanhamos o
proprietário de terras Lióvin — que incorpora a persona do autor — em sua busca
pelo ideal de uma vida feliz no campo ao lado da jovem Kitty, bem como seus
dilemas intelectuais em torno da fé e da justiça social. Vertido diretamente do russo por
Irineu Franco Perpetuo, que também assina o posfácio, esta nova tradução
acompanha todas as nuances do imortal romance de Tolstói, seja na exuberante
riqueza de detalhes da narrativa, seja na fascinante profundidade psicológica
das personagens, para recriar uma obra em que, ainda segundo Thomas Mann, “a
arte raramente se aproximou tanto da natureza”. Anna Kariênina amplia a
coleção Leste editada pela Editora 34.
Escrito por uma das maiores
vozes da literatura contemporânea, esse livro é um relato não apenas sobre a
morte de um pai amado, mas também sobre a memória e a esperança que permanecem
com aqueles que ficam.
Escrito após a morte do pai de
Chimamanda Ngozi Adichie em junho de 2020, durante a pandemia de Covid-19 que
mantinha distante a família Adichie, Notas sobre o luto é um poderoso
relato sobre a imensurável dor da perda e as lembranças e resiliência trazidas
por ela. Consciente de ser uma entre milhões de pessoas sofrendo naquele
momento, a autora se debruça não só sobre as dimensões familiares e culturais
do luto, mas também sobre a solidão e a raiva inerentes a ele. Com uma
linguagem precisa e detalhes devastadores em cada capítulo, Chimamanda junta a
própria experiência com a morte de seu pai às lembranças da vida de um homem
forte e honrado, sobrevivente da Guerra de Biafra, professor de longa carreira,
marido leal e pai exemplar. Em poucas páginas, Notas sobre o luto é um livro
imprescindível, que nos conecta com o mundo atual e investiga uma das
experiências mais universais do ser humano. “Era tão próxima do meu pai que
sabia sem querer saber, sem saber inteiramente o que sabia. Uma coisa dessas,
temida durante tanto tempo, finalmente chega, e na avalanche de emoções vem
também um alívio amargo e insuportável. Esse alívio se torna uma forma de
agressão, e traz consigo pensamentos estranhamente insistentes. Inimigos,
atenção: o pior aconteceu. Meu pai se foi. Minha loucura agora vai se revelar.”
A tradução de Fernanda Abreu é publicada pela Companhia das Letras.
Itinerários pela poesia
brasileira a partir dos anos 1970 compõem o novo livro de Viviana Bosi.
Com visão abrangente de conjunto e
sensibilidade aguda para penetrar em cada poema e nele identificar tanto a
contribuição individual como as marcas de época, Viviana Bosi, professora de
Teoria Literária da Universidade de São Paulo, se debruça em Poesia em risco
sobre a obra de Augusto de Campos, Ferreira Gullar, Torquato Neto, Armando
Freitas Filho, Ana Cristina Cesar, Francisco Alvim, Rubens Rodrigues Torres
Filho, Sebastião Uchoa Leite e boa parte da poesia marginal da década de 1970,
para produzir uma análise madura, que traz à tona as tensões, os impasses e as
possibilidades crítico-criativas de um período pouco estudado na literatura
brasileira. Fruto de extensa pesquisa, Poesia em risco não se limita à
poesia registrada nos livros, mas reconstitui minuciosamente o circuito das
publicações alternativas, revistas, jornaizinhos e fanzines por meio dos quais,
em vários lugares do Brasil, as correntes do concretismo vieram se chocar e se
misturar com as águas da poesia marginal. Simultaneamente, Viviana Bosi
apresenta as trocas, os atritos e as intersecções que se dão entre poesia e
artes visuais, comenta as diferentes perspectivas de vários grupos de artistas
e suas modalidades de rebeldia — comportamental, estética e política —,
compondo um quadro vivo das forças em jogo nesse período marcante que antecede
o contemporâneo, nele ainda pulsa e instiga à reflexão. O livro é publicado
pela Editora 34.
O premiado autor de A resistência faz uma revisão crítica da trajetória
do gênero romance ao longo de seus supostos quatro séculos de existência.
Para abarcar algo tão vago e tão
vasto quanto a história de um gênero literário, Julián Fuks definiu como objeto
deste livro ensaístico não o romance em si, mas a ideia abstrata de romance,
tal como proposta por uma série de romancistas canônicos em ensaios, prefácios,
cartas, biografias, testemunhos, entrevistas e em algumas passagens de suas
ficções. Defoe, Prévost, Fielding, Goethe, Flaubert, Dostoiévski, Proust,
Joyce, Woolf, Beckett, Macedonio Fernández, Cortázar, García Márquez, Vargas
Llosa, Coetzee e Sebald são alguns dos nomes revisitados. A obra se estrutura
numa sequência de ensaios que passam pela duvidosa ascensão do gênero, em um
tempo exato e espaço restrito, pelo seu questionável apogeu, seguido da tão
falada crise do romance, para, enfim, chegar nas marcas já perceptíveis de uma
reascensão. Fuks não pretende aqui escrever a (impossível) história do romance,
mas sim a fazer “o comentário possível sobre uma história que outros já
tentaram contar algumas vezes”. Romance. História de uma ideia é
publicado pela Companhia das Letras.
Romance de Miguel de Unamuno.
O cientista Dom Avito Carrascal
incorpora o entusiasmo do racionalismo e do positivismo de sua época. Para provar
que os avanços da ciência são exatos e infalíveis, o protagonista concebe o
plano de ter um filho e de educá-lo — ou melhor, moldá-lo — de acordo com os
princípios da pedagogia. A sua crença é a de que os todos os seres humanos,
assim como as abelhas, nascem com um potencial idêntico para qualquer
atividade. Assim, para que um indivíduo se destaque, basta que ao infante — ou
à abelha — sejam dispensados um “trato especial e regime de distinção”, uma
“acertada pedagogia”, e que seja alimentado com “geleia real”. Apoiado pelos
métodos científicos mais modernos, o resultado projetado é evidente para Dom
Avito: seu filho fatalmente será um gênio e servirá como prova de suas
convicções e como modelo para as futuras gerações. O primogênito nasce e recebe
o nome de Apolodoro. Apesar da aplicação de seus métodos pedagógicos, o
empreendimento não avança conforme o planejado. Este romance de Miguel de
Unamuno descreve um relato satírico de um experimento fracassado e elabora
indagações existenciais através de seus personagens de forma única, tragicômica
e brilhante. Amor e pedagogia tem tradução de Lucas Lazzaretti e é
publicado pela editora 7Letras.
Um suspense de tirar o fôlego
sobre intimidade, segredos, violência e falsas aparências.
Ao se dar conta do sumiço da irmã,
Lucinda não vai medir esforços para descobrir seu paradeiro. Mas, nessa busca
atribulada, ela vai encontrar muito mais do que estava procurando. É uma
sexta-feira como outra qualquer. Até o instante em que Lucinda recebe uma
mensagem misteriosa perguntando se sabe onde está Viviana, sua irmã. Deve ser
alarme falso, pensa. Contudo, o insistente silêncio da caçula desperta um
pressentimento, e pouco a pouco a preocupação se revela legítima. Lucinda dá
início a uma desesperada busca por pistas. Quando ela mergulha na intimidade da
irmã, descobre muito mais do que poderia supor. Neste romance eletrizante, Simone
Campos nos apresenta a duas personagens que, durante toda a vida, dividiram a
mesma casa, o mesmo gosto musical, o mesmo humor e até certa inadequação
social. Em algum momento, no entanto, a cumplicidade foi deixada de lado e suas
vidas seguiram rumos diferentes. Nada vai acontecer com você é um
suspense psicológico sobre como um segredo é capaz de transformar a relação
entre duas irmãs. O livro é publicado pela Companhia das Letras.
Neste romance vertiginoso,
acompanhamos um trio de amigos que planeja destronar o tirano de um paraíso
distópico, tão pleno de belezas quanto de desmandos e injustiças.
Ira, Ossi e Aurora são três jovens
amigos que se unem num pacto: fazer uma revolução em Alendabar, o paraíso
tropical que habitam, assim que o verão terminar. No primeiro dia do outono,
uma mulher do outro lado do mundo chegará com as cinzas do marido, trazendo seu
filho, e o Rei, o dono de todas as terras em volta, recebe um convidado de
muito longe. O destino de todos irá se cruzar na contagem regressiva das doze
horas de luz do equinócio. Neste romance que se lê de um
fôlego, a escritora portuguesa Alexandra Lucas Coelho cria um lugar com sua
fauna, flora e o que sobra de uma língua perdida. Não faltam deuses antigos,
servos e pirâmides — nem máquinas modernas, crimes em série e inteligência
artificial. O ano e a localização da história são incertos, mas há a certeza de
que o mal está em Alendabar, e há sérios riscos de que se espalhe — mas Ira,
Ossi e Aurora não deixarão. A nossa alegria chegou é publicado pela
Companhia das Letras.
Do alto dos seus 80 anos,
Aguilar consegue mais uma vez se superar e nos surpreender, como tem feito
desde os anos 60 na pintura, escultura, performance, música, vídeo-arte e
literatura — de onde brota agora O Salvador do Mundo, seu sexto livro,
como uma cápsula de otimismo nesses tempos duros de pandemia e destruição; um
bem-vindo happy-end ao filme de terror.
Com uma linguagem direta e ágil,
de frases curtas, que lembra o estilo dos romances modernistas de Oswald e
Mario de Andrade, Aguilar tece a trajetória de um personagem que se desdobra em
vários, descobrindo-se e autotransformando-se sucessivamente, numa saga
iniciática que flui como um filme de ação, pontuado por referências culturais —
dos clássicos ao pop, da filosofia ao cinema, da música erudita à popular, dos
antigos aos modernos, do ocidente ao oriente — que irrompem como portas no
corredor do enredo. Inicialmente impermeável a qualquer emoção (incluindo
cores, olfato, tato ou prazer sexual), o protagonista passa a representar a si
mesmo para os outros, aparentando normalidade. O impressionante é ele ter
consciência de sua condição (“eu simplesmente não tenho nenhum sentimento
dentro de mim”), ao contrário de Truman (do filme The Truman Show), por
exemplo, onde o protagonista era o único a não saber que vivia um grande
simulacro. Misto de fábula, aventura, romance
policial, reflexão filosófica e ficção científica, O Salvador do
Mundo realiza a proeza felina de narrar sete vidas em uma — Zé da Merda,
José de Almeida Silva, José Lourenço Pinheiro, Parakê, Zé das Flores e O
Salvador do Mundo (habitante do lixão, contrabandista, aluno de filosofia,
advogado e contador, ator, ecólogo indigenista, inovador tecnológico) —
percurso que metaforiza uma espécie de caminho da iluminação — do vazio
interior ao aprendizado das emoções (através da natureza), do sentir ao ser
(através do feminino) e do ser ao ser outro (através da tecnologia). A passagem
de Zé da Merda para Zé das Flores, como um avesso da equação de João Cabral em
sua Antiode (“poesia te escrevia: / flor! conhecendo / que és fezes”),
faz a transição da representação para o ser — o que nos remete à experiência de
Aguilar com a linguagem da performance, que não se propõe a representar de um
papel, como no teatro, mas a assumir a presença integral, com toda a
intensidade possível, nas situações inusitadas vividas em público. Não à toa,
quando começa a desabrochar para sensações e sentimentos reais, o protagonista
abandona o sucesso que vinha obtendo como ator num grupo de teatro, onde
aperfeiçoara a dissimulação da vida interior que lhe faltava. Os nomes que o
pajé da aldeia indígena que ele então visita dá a suas duas metades (a que está
presente e a que lhe falta) — Parakê e Ionusé — formam um verdadeiro haicai
metafísico, no qual se relacionam pergunta e resposta, razão e sensação,
cultura e natureza: “— para quê? / — yo no sé”. A partir dessa revelação a
linguagem parece encarnar a busca do personagem, em digressões como a conversa
com o boto, os pensamentos dele em primeira pessoa, a viagem virtual com a
máquina de indução neural, até a surpreendente salvação do mundo. Ao substituir
“pátria” (da expressão-clichê “salvador da pátria”) por “mundo” no título de
seu livro, Aguilar lança sua flecha para além dos nacionalismos
anti-imigratórios, negacionistas e neonazistas que empesteiam a humanidade. Num tempo em que assistimos a uma
inversão radical de valores, tempo de fake news e cultura do ódio,
quando os atos mais sórdidos são naturalizados, onde o execrável é aplaudido e
o que era motivo de vergonha se torna razão de orgulho, Aguilar nos presenteia
com esse triunfo da improvável empatia contra a crescente insensibilidade. O
livro é publicado pela editora Iluminuras.
O novo romance de Joca Reiners
Terron.
Nesta epopeia sobre a obsessão, um
homem acometido por uma doença fatal promete vingar a filha da brutalidade de
que foi alvo. No entanto, o agressor está fora de alcance, assim como a própria
filha desaparecida, e o mundo que o homem conhecia não existe mais. Desse modo,
ele mergulhará num inferno de violência, no qual as lembranças e o absurdo vão
se sobrepor aos horrores da realidade e da existência. Um romance sem
precedentes na literatura brasileira. O riso dos ratos é publicado pela
editora Todavia.
O caro mito literário do Don
Juan pela pena reinventiva de Ramón María del Valle-Inclán.
Neste romance, o excêntrico
Marquês de Bradomín relata os mais memoráveis fatos da sua vida, sempre
marcados por aventuras pelo mundo e múltiplas conquistas amorosas. O
protagonista representa uma espécie de Don Juan desvirtuado, “feio, católico e
sentimental” — estes são alguns dos traços atribuídos ao personagem clássico
retrabalhado pelas ideias modernistas de Ramón María del Valle-Inclán. A obra
está organizada em quatro sonatas que tematizam as estações do ano — Primavera,
Verão, Outono e Inverno — em clara alegoria às fases da vida do marquês. Tão
admirado quanto desprezado, sua reputação o precede aonde quer que vá, seja
Itália, México, País Basco ou Galícia — e o desfecho de suas aparições costuma
ser inesquecível. A excelente tradução e notas de Lucas Lazzaretti
potencializam este provocador e inquietante Sonatas: memórias do Marquês de
Bradomín, uma das maiores obras-primas espanholas do século XX. O livro é
publicado pela editora 7Letras.
O morro dos ventos
uivantes é o próximo título da Antofágica.
Ainda que contada por diversos
narradores e muitos pontos de vista, nenhum ângulo é capaz de deixar a história
do Morro dos Ventos Uivantes menos sórdida. Lá, não há santos ou demônios:
todos são repletos de virtudes e pecados. E não podemos garantir que não haverá
um ou outro fantasma vagando pela charneca... Ao voltar de uma viagem, o pai da
família Earnshaw não traz consigo os presentes que os filhos lhe pediram — em
vez disso, traz um garotinho perdido de pele escura, que encontrou vagando no
porto. O menino ganha um nome — Heathcliff —, mas jamais um sobrenome, o
primeiro dos atributos da família a que ele não terá acesso. Catherine é a
única a acolhê-lo, e essa relação, repleta de amor, obsessão e vingança,
atravessa gerações e não é detida nem mesmo pela morte. Publicado pela primeira
vez em 1847, O morro dos ventos uivantes é um romance de igual beleza e
brutalidade. Com múltiplas perspectivas narrativas, o livro toca em temas
primordiais para a sociedade, como questões de alteridade, empatia, comunicação
e preconceitos. Reconhecido como uma das grandes obras da literatura mundial, o
livro já teve mais de 10 adaptações cinematográficas, influenciando também a
música pop com a canção de Kate Bush no final da década de 1970. A nova edição conta com
ilustrações de Janaina Tokitaka e nova tradução de Stephanie Fernandes, que
também assina um ensaio sobre sua experiência com a obra. O livro traz ainda
apresentação de Ju Cirqueira e posfácios das acadêmicas Sofia Nestrovski e
Daise Lilian, doutora em Letras (UFPB) e professora da Universidade Federal de
Campina Grande. Ao fazer a leitura do QR Code da
cinta com seu smartphone, você tem acesso a duas videoaulas da acadêmica Sofia
Nestrovski para enriquecer sua leitura. A primeira aula apresenta conteúdo
pré-leitura, e a segunda, uma abordagem pós-leitura.
Uma segunda biografia da
arquiteta italiana Lina Bo Bardi.
Poucas figuras públicas foram mais
brasileiras do que a arquiteta italiana Lina Bo Bardi. Chegando ao Brasil logo
após a Segunda Guerra, ela se afeiçoou à cultura brasileira de tal maneira que
se tornou uma de suas principais intérpretes, capaz de uma leitura das
tradições locais ao mesmo tempo rigorosa e abrangente. Crítico de arquitetura e
ensaísta de mão-cheia, Francesco Perrotta-Bosch examina a trajetória dessa
artista brilhante à luz da seguinte questão: como uma estrangeira foi capaz de
enxergar tanto de um país que não era o seu, a ponto de traduzi-lo para os
próprios brasileiros? Para Lina Bo Bardi, tudo poderia ser projetado, da
arquitetura às páginas de revistas, de instituições culturais aos cardápios,
dos acontecimentos às recordações. Tudo ela quis decidir — até mesmo seu país.
Lina tinha horror à oficialidade e aos ritos sociais da vida burguesa. Foi
comunista, teve papel importante no combate ao regime militar, mas era também a
senhora de uma majestosa casa modernista no Morumbi e esposa de Pietro Maria
Bardi, o todo-poderoso escolhido por Assis Chateaubriand para criar e gerir o
Museu de Arte de São Paulo. Com base em pesquisa extensa, minucioso
levantamento de fontes inéditas, calcado em dezenas de entrevistas,
bibliografia brasileira e italiana, mas sobretudo narrado com leveza e numa
estrutura temporal engenhosa, este livro leva ao limite as possibilidades do
gênero biográfico. Como a obra de Lina, é denso, alegre e sedutor. Lina. Uma
biografia é publicada pela editora Todavia.
Novo título na coleção Fábula,
editada pela Editora 34.
Quem não conhece o senhor Sommer?
Na Vila de Baixo como na Vila de Cima, às margens do lago ou pelos campos ao
redor, todos já viram a figura magra que, sempre de mochila às costas e cajado
em punho, anda por toda parte, o tempo todo, sem descanso — e sem propósito
aparente. Qual o segredo por trás dessas andanças sem fim do velho esquisitão?
Ninguém sabe, talvez ninguém mais se importe — ninguém, a não ser o jovem
narrador de A história do senhor Sommer. Ambientada na Alemanha dos anos
seguintes à II Guerra Mundial, esta novela de Patrick Süskind acompanha com
muito humor e igual delicadeza os anos de formação do rapaz, marcados pelas
aparições acidentais — e decisivas — do enigmático andarilho. Aos poucos e ao sabor
desses encontros, vai se revelando para o jovem algo do segredo do senhor
Sommer — e alguma coisa das maravilhas e das agruras que a vida reserva para
cada um de nós. A tradução é de Samuel Titan Jr.
Um livro que volta ao levante
estudantil de Maio de 1980 na Coreia do Sul.
Em maio de 1980, na cidade
sul-coreana Gwangju, o exército reprimiu um levante estudantil, causando
milhares de mortes. O evento de trágicas consequências foi transfigurado nesta
ficção extraordinária, poética, violenta e repleta de humanidade. Construindo
um mosaico de vozes e pontos de vista daqueles que foram afetados, Atos humanos
é a demonstração dos poderosos recursos literários de Han Kang, uma das autoras
mais importantes da cena contemporânea. A tradução de Ji Yun Kim para o livro
de Han Kang, Atos humanos, é publicada pela editora Todavia.
REEDIÇÕES
Noites do sertão é o novo
título do projeto de reedição da obra de João Guimarães Rosa pela Global
Editora.
A primeira edição da obra foi em
1956 e 65 anos depois é lançada novamente, agora com projeto gráfico de Victor
Burton e Anderson Junqueira, que desenvolveram a capa a partir da fotografia de
Araquém Alcântara. As novelas “Dão-Lalalão” e “Buriti”, inicialmente, fizeram
parte da obra Corpo de baile, mas foram, posteriormente, desmembradas, para
integrar um novo volume, que recebeu do autor o título Noites do sertão.
Em “Dão-Lalalão”, o leitor acompanha o redemoinho de sentimentos de Soropita,
homem rural que, em meio às suas aventuras na noite de sua cidade, acaba se
apaixonando e conquistando o coração de uma prostituta, Doralda, com quem
decide se casar. Já a novela “Buriti”, por sua vez, traz as relações que se
estabelecem entre membros de uma mesma família que residem na fazenda Buriti
Bom.
Nova edição da obra de Yves
Bonnefoy.
A presente edição traz para o
leitor a poesia de Yves Bonnefoy, visto pela crítica e pelo público como o
poeta francês de maior destaque na segunda metade deste século. Os dois volumes
que compõem esta edição, em apresentação bilíngue, incluem a sua produção até
1993, um poema inédito e um prefácio redigido especialmente pelo autor para a
edição brasileira de sua obra. O conceituado crítico Jean Starobinski diz, no
prefácio que escreveu para a reedição de Poèmes, pela Editora Gallimard:
“Talvez Bonnefoy (autor de admiráveis narrativas de sonho) chegue, finalmente,
a uma trégua armada. Talvez, sem perder a sua esperança do ‘lugar verdadeiro’,
chegue a aceitar que o espaço da palavra seja o entre-dois-mundos, e mesmo numa
dupla aceitação: entre o mundo árido de nosso exílio e o jardim de presença’.
Talvez seja necessário aceitar a imagem, a forma, as estruturas das línguas
(que são o exílio conceptual) para aceder à presença, que não é uma
transcendência segunda, mas um retorno consentido à verdade precária das
aparências. A imagem pode conduzir-nos a isso, em que pese o seu ‘frio’, se
evitarmos solidificá-la, se soubermos arrancar-lhe a confissão de sua própria
precariedade”. A obra poética de Yves Bonnefoy já
foi traduzida para mais de vinte idiomas e é reconhecida pela crítica como
comparável ao que de melhor se produziu na França em todos os tempos. A
presente publicação da Editora Iluminuras está em sintonia com uma longa
tradição que se remonta, no Brasil, aos tempos coloniais, atravessa o século
XIX e vai até a primeira metade do século XX, quando os intelectuais,
escritores e poetas brasileiros frequentavam regularmente as letras francesas.
Note-se que os brasileiros medianamente cultos liam, em geral, os textos
franceses no original. Desde a Segunda Guerra Mundial, entretanto, a hegemonia
militar, política e econômica dos Estados Unidos da América no mundo trouxe em
seu bojo a predominância da literatura de língua inglesa e relegou para um
lugar secundário todas as demais literaturas, incluindo a francesa. Isso fez
com que a grande maioria dos brasileiros deixasse de dominar a língua francesa,
e a produção intelectual, literária e poética da França, ainda que de altíssimo
nível, só fosse acessível pela via da tradução. Eis o que justifica a presente
edição da obra poética de Yves Bonnefoy em edição bilíngue. A tradução
brasileira é de Mário Laranjeira.
Nova edição para Invenção:
de Arnaut e Raimbaut a Dante e Cavalcanti, de Augusto de Campos.
A obra aborda os poemas inventivos
dos trovadores Arnaut Daniel e Raimbaut d’Aurenga, e os cantos e canções de
Dante Alighieri e Guido Cavalcanti, apresentados por Augusto de Campos.
Dividido em duas partes, o livro traz textos que introduzem o leitor no
universo translinguístico que o autor propõe, colocando lado a lado o texto
original e a tradução correspondente, além da breve biografia de seus
criadores. Na primeira parte, Campos fala de Arnaut Daniel e Raimbaut
d’Aurenga, considerados duas das maiores expressões da arte provençal. Na
segunda, há seis cantos da Divina comédia, de Dante Alighieri, completamente
traduzidos, e canções de Guido Cavalcanti, sempre levando-se em conta as rimas,
aliterações, metáforas e todos os outros valores formais. Lançado em 2003, Invenção:
de Arnaut e Raimbaut a Dante e Cavalcanti, com traduções de Augusto de
Campos, retorna em nova edição, publicada pela Laranja Original.
Nova edição de Ada ou ardor,
de Vladimir Nabokov.
Este é um dos romances mais
ambiciosos de Vladimir Nabokov. Com uma narrativa de fôlego, carregada de
lirismo, o autor arquiteta uma história complexa e fluida, que nos leva através
das lembranças de Van Veen em sua tentativa de reconstruir a história de amor
que viveu com a prima, Ada. Em Ada ou ardor se reconta a duradoura
relação de amor entre dois primos, Ada e Van, desde o primeiro encontro na
Mansão de Ardis, em uma “América de sonho”, e ao longo de oitenta anos de
arrebatamento, viagens através de continentes, separações e recomeços. Ao
narrar essa história trágica e idílica, Nabokov reinventa a própria vida. Não
estamos mais na Terra, mas na Antiterra, uma espécie de espelho distorcido de
nossa realidade. No mundo nabokoviano, entre outras coisas, fala-se russo nos
Estados Unidos, e os telefones são movidos a água, depois de o uso da
eletricidade ter sido proibido. Nessa realidade recriada, Nabokov mescla uma
série de referências e estilos para narrar uma história de amor interdita,
emocional, que foge a todos os padrões convencionais. A tradução de Jorio
Dauster é reeditada em novo projeto editorial pela editora Alfaguara.
L&PM Editores reedita
Pulp, o último livro de um Bukowski puro-sangue.
Alguém pode até dizer. “Já vi pulps
melhores”. Mas uma coisa é certa. Você não sai incólume desta história. A saga
de Nick Belame poderia até ser igual a de tantos detetives de segunda categoria
que rolam pelas largas ruas de Los Angeles. Mas aqui, as mulheres
inacreditáveis cruzam pernas compridas, sussurram e você diz: Ei gostosa, toma
alguma coisa? Aí ela diz: Está pagando, babaca? Aí você sente nas costas um aço
gelado... É sempre assim. Como nos velhos livrinhos policiais de papel
vagabundo. Algo assim como subliteratura, a quem Charles Bukowski dedica solenemente
este livro. Mas com o velho Charles é sempre diferente. Ele desfia sua história
com habilidade de mestre. Um Rabelais percorrendo o mundo noir? A divina
sujeira? A maravilhosa sordidez? Um acerto de contas com a arte? Uma homenagem?
Uma reflexão sobre a morte? E tomara ela estivesse linda, gostosa e sexy — como
está nesta história — quando encontrou o velho Charles poucos meses depois de
ter posto ponto final nesta pequena obra-prima. A tradução de Marcos Santarrita
é reeditada pela L&PM Editores.
A Editora Nova Aguilar, reúne a
obra completa de Edgar Allan Poe.
Ficção completa, poesia &
ensaios, em um único volume, apresenta os escritos do contista, poeta e
crítico literário estadunidense. O suspense que singulariza a obra de Poe está presente em contos como “Os
crimes da rua Morgue”, “O gato preto”, entre outros textos do célebre autor.
Os contos humorísticos também estão presentes nessa obra, dada a variedade de
situações cômicas construídas magistralmente pelo inventivo ficcionista. Suas
criações poéticas também marcam a edição, contudo “O corvo” é o destaque. A
tradução dos escritos de Poe é de autoria de Oscar Mendes, com colaboração de
Milton Amado. O volume traz ainda textos sobre a vida e a obra do autor,
concebidos pelos escritores Hervey Allen e Charles Baudelaire. Em sintonia com
a atmosfera misteriosa que marca as histórias de Edgar Allan Poe, a coletânea traz
ilustrações de Eugênio Hirsch e Augusto Iriarte Gironaz.
Polêmico, subversivo e
implacável da primeira à última página, este livro deu início à fase obscena de
Hilda Hilst.
Aos sessenta anos de idade, quatro
décadas depois de estrear como poeta e inconformada com a tímida recepção de
sua obra, Hilda Hilst tomou uma atitude radical. Em 1990, com O caderno rosa
de Lori Lamby, resolveu se despedir da “literatura séria” e se dedicar a
escrever “adoráveis bandalheiras”. A narradora, Lori, é uma menina de oito anos
que decide se prostituir, com o consentimento dos pais, e registrar tudo — tudo
mesmo — em seu diário. Com humor ácido e autoconsciência brutal, ela relata os
desenlaces da sedução e o prazer que o dinheiro lhe traz. Não à toa, a premissa
escandalosa rendeu as mais diversas e enfáticas interpretações dos críticos e
continua despertando a ávida curiosidade dos leitores. No posfácio a esta edição, a
psicanalista Vera Iaconelli destaca como Hilda Hilst, ao questionar nossas
certezas e ultrapassar o limite da razão, escreveu uma obra que impressiona
pela ousadia e atualidade. O caderno rosa de Lori Lamby é reeditado pela
Companhia das Letras.
Reedição do livro de estreia de
Angélica Freitas.
“salta um rilke shake/ com amor
& ovomaltine/ quando passo a noite insone/ e não há nada que ilumine.” Primeiro
livro de Angélica Freitas, lançado originalmente em 2007 pela coleção Ás de
Colete (7Letras e Cosac Naify), Rilke shake traz o humor, a inteligência
e a imaginação de uma das vozes mais talentosas da atualidade. No
liquidificador, a poeta despeja o que lhe vem à mente: Keats deprimido,
Gertrude Stein na banheira, Bishop entre cajus, o calor em São Paulo, o pavor
de frequentar festinhas. Nessa lírica antilírica, sem medo de rir de si mesma,
Angélica Freitas mistura o erudito e o popular em uma poesia surpreendente e
perspicaz.
Lançado em 1934, Banguê é a
continuação direta dos eventos ocorridos em Doidinho.
O
livro é o terceiro do que se convencionou denominar, dentro da obra de José
Lins do Rego, o Ciclo da Cana-de-açúcar, série iniciada pelo romance Menino de engenho, de 1932. Na obra, Carlos aparece já adulto,
formado em direito e volta para o engenho Santa Rosa. Ao longo da história, a
narrativa todas as dificuldades da personagem em administrar o engenho, além de
ter que lidar com um avô já debilitado, e o surgimento de uma paixão
inesperada. Contudo, o antigo Carlinhos ainda precisa gerenciar o declínio dos
engenhos e a pressão pela compra das terras. Do ponto de vista econômico e
social, Banguê retrata outra fase importante desse ciclo da
tradição rural nordestina, conhecido popularmente como ciclo da cana-de-açúcar.
A edição de Banguê publicada pela Global traz texto de apresentação
de Carlos Newton Junior, Doutor em literatura brasileira pela Universidade
Federal de Pernambuco. A análise destaca a posição do livro adquirida na
história da literatura brasileira.
Nova edição do clássico de
Cornel West, Questão de raça, se reafirma como uma das mais influentes
e originais obras sobre o debate racial nos Estados Unidos.
Publicada no Brasil pela primeira
vez em 1994, esta coletânea de ensaios logo se tornou um clássico. Nela, o
sociólogo norte-americano Cornel West, referência nos estudos de raça nos Estados
Unidos, reflete sobre temas como a crise de liderança na comunidade negra, os
mitos sobre a sexualidade dos negros e o legado de Malcolm X. Passados mais de
vinte anos, as ideias de West continuam relevantes e provocadoras, e são um
chamado à luta por todo o mundo. Com um novo prefácio e uma nova introdução,
que destacam, entre outros pontos, a importância dos movimentos que têm tomado
as ruas nos últimos anos, Questão de raça encontra esperança na resistência
coletiva e nos convida a construir uma democracia multirracial para este
milênio. A tradução de Laura Teixeira Motta é publicada na edição de bolso da
Companhia das Letras.
DICAS DE LEITURA
No dia 7 de abril de 2021 ficamos
sem o crítico literário e professor Alfredo Bosi. Nas dicas de leitura desta
edição do Boletim Letras 360.º, sublinhamos alguns livros para leitores comuns
que guardam interesse em conhecer mais sobre a nossa literatura e sobre o pensamento
e trabalho de Bosi.
1. História concisa da
Literatura Brasileira. Possivelmente este é um dos manuais sobre nossa
literatura dos mais conhecidos entre os estudantes de Letras por aqui. A prova
disso pode se medir pela quantidade de edições — a mais recente, ainda revista
pelo autor, data de 2015 e é 44.ª. Agora, este não é um livro fundamental
apenas para alunos dos cursos de Letras. Trata-se de um daqueles livros fundamentais
a qualquer leitor pelo didatismo e completo panorama acerca da nossa literatura
desde o período colonial às tendências contemporâneas. Isso significa um manancial, ótimo para consulta e apoio ao saber sobre autores e obras brasileiras, o que pode se
mostrar ainda como excelente guia de leitura. O livro está publicado pela editora
Cultrix.
2. Literatura e resistência.
É uma pena que a Companhia das Letras, casa editorial que publicou este livro
em 2002, tenha se descuidado em não o manter no catálogo. De toda maneira, a
recomendação fica posta e, pintando uma nova edição, em qual tempo for, valerá
a leitura. Neste livro, Alfredo Bosi transita por algumas das obras que mais
foram motivo de suas intervenções, como a do sermonista padre António Vieira,
sobre quem chegou a organizar uma antologia com os melhores sermões para a Penguin
/ Companhia. Aqui, o elo que une os escritos está no título: obras de escritores
que de alguma maneira significaram pela ruptura que introduziram aos lugares-comuns
do nosso cânone literário: Euclides da Cunha, Graciliano Ramos, João Antônio, Basílio
da Gama são alguns deles. Um livro motivador a conhecermos que a literatura
nunca foi puro passatempo, mas atividade de intervenção.
3. Arte e conhecimento de
Leonardo Da Vinci. Este foi o último livro que Alfredo Bosi publicou em
vida. Marca um retorno ao ponto onde tudo começou: seu interesse pela cultura e
literatura italianas. Trata-se de um ensaio feito da paixão e do acurado e
elegante tratamento textual dado a matérias neste gênero, tal como provam, por
exemplo, O ser e o tempo da poesia. O breve e profundo texto publicado pela
Edusp em 2019 reflete sobre o processo criativo do mestre florentino,
oferecendo-nos um perfil pelo ponto de vista do trabalho intelectual e
artístico. A edição é da Edusp.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. A Biblioteca Nacional do Brasil
tem disponibilizado arquivos de grande valia para a cultura literária na sua
conta no Twitter. Destacamos como exemplo dois deles: um fac-símile com um depoimento por
escrito de Carlos Drummond de Andrade sobre Eu, do poeta Augusto dos
Anjos; e este outro com reprodução de manuscrito de Machado de Assis para o
capítulo CLII de Memórias póstumas de Brás Cubas. Em 2012, nós falamos aqui sobre o primeiro arquivo.
2. No rol dos aniversários, nesta
semana que passou, celebramos o dia de Samuel Beckett: 13 de abril. Recordamos,
da galeria de vídeos do Letras no Facebook, este registro dos anos sessenta que
acompanha o grande dramaturgo em passeios por uma cidade que amava, Berlim.
BAÚ DE LETRAS
1. Foi no dia 17 de abril de 1885
que nasceu, em Rungstedlund, a escritora Karen Blixen. Uma de suas obras mais destacadas
é A fazenda africana, produto de sua vivência no grande continente a
partir de 1914, quando se casou com o barão Blixen-Finecke. Nesta post, breves
notas para um perfil biográfico da escritora dinamarquesa.
2. Ainda Samuel Beckett. É possível
acessar a partir deste endereço uma série de entradas sobre o dramaturgo e sua
obra já publicada aqui no blog; entre elas, um perfil biográfico, matéria sobre
sua vivência com o cinema e texto sobre o inédito Ossos de eco.
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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidades das referidas casas.
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