Boletim Letras 360º #422
DO EDITOR
1. Saudações, caro leitor! Estas
foram as notícias apresentadas durante a semana na página do blog Letras
in.verso e re.verso no Facebook e o conteúdo das demais seções de leitura
criadas em momento posterior à existência deste Boletim. Reitero os
agradecimentos pela companhia do nosso trabalho. Espero que você esteja, dentro
do possível são e seguro. Boas leituras!
Clarice Lispector. As celebrações pelo centenário ainda. Editora começa edição de luxo com obra da escritora. |
LANÇAMENTOS
James Wood, o romancista.
Upstate é um romance perspicaz e intensamente comovente.
Alan Querry, um investidor
imobiliário bem-sucedido do norte da Inglaterra, tem duas filhas: Vanessa, uma
filósofa que vive e leciona em Saratoga Springs, NY, e Helen, executiva de uma
gravadora com sede em Londres. As irmãs nunca se recuperaram do divórcio amargo
dos pais e da morte precoce da mãe — particularmente com Vanessa, que desde a
adolescência era atormentada por crises de depressão. Quando sofre uma nova
crise, Alan e Helen viajam para Saratoga Springs. Ao longo de seis dias de
inverno no norte de Nova York, a família Querry começa a enfrentar os problemas
que impulsionam este romance profundo e penetrante. Por que algumas pessoas
consideram a vida muito mais difícil do que outras? A felicidade é uma
habilidade que pode ser desenvolvida, ou é um feliz acaso do nascimento? A
reflexão é útil à felicidade, ou dificulta a sua conquista? Se, como diz o
filósofo favorito de Vanessa, “o único empreendimento sério é viver”, como
devemos viver? Com uma visão humana rica e sutil, repleto de retratos pungentes
e muitas vezes engraçados, vívido e com um senso de lugar, Upstate é um
romance perspicaz e intensamente comovente. A tradução de Leonardo Fróes é
publicada pela Sesi-SP Editora.
Ensaio passa em revista a obra de Charles Baudelaire.
Escrito entre 2014 e 2019, Baudelaire
e os limites da poesia reúne ensaios do professor Eduardo Veras, da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro. O livro é fruto de uma convivência
acadêmica de quase vinte anos com a obra de Charles Baudelaire. O fio condutor
que atravessa a seleção dos sete textos, aparentemente heterogêneos, é a
questão dos limites da poesia. Três das maiores preocupações baudelairianas se
insinuam aqui, dando forma, em alguma medida, à questão: a religião, a música e
a prosa. As relações com o sagrado, o canto e o chão do real. No prefácio à
obra, o professor Marcos Siscar assinala que “Eduardo Veras é um ‘especialista’
de Baudelaire, no sentido forte dessa palavra. A especialização aqui não evoca
o traço restritivo, mas a seriedade com a qual o leitor aborda seu objeto de
estudo. É notável seu conhecimento da fortuna crítica, inclusive do ponto de
vista histórico, e sua familiaridade com as relações que a obra de Baudelaire entretém
com questões teológicas, filosóficas e artísticas. Veras, que já escreveu uma
tese sobre o poeta (A encenação tediosa do imortal pecado: Baudelaire e o
mito da Queda, de 2013), apresenta agora, a despeito da característica do
presente livro (de reunião de pequenos ensaios), um estágio mais maduro de
reflexão sobre o poeta. Aqui, como em outros trabalhos seus, Baudelaire é bem
mais do que o autor em torno do qual orbitam questões particulares: Baudelaire
lhe serve também como porta de entrada para outras discussões relevantes dos
estudos sobre literatura. É um pivô a partir do qual questões históricas e
teóricas da poesia moderna podem ser tratadas com maior pertinência e rigor. O
livro inaugura a coleção de ensaios da editora Corsário-Satã.
Novo romance de Aline Bei,
Pequena coreografia do adeus, é publicado pela Companhia das Letras.
Julia é filha de pais separados:
sua mãe não suporta a ideia de ter sido abandonada pelo marido, enquanto seu
pai não suporta a ideia de ter sido casado. Sufocada por uma atmosfera de
brigas constantes e falta de afeto, a jovem escritora tenta reconhecer sua
individualidade e dar sentido à sua história, tentando se desvencilhar dos
traumas familiares. Entre lembranças da infância e da adolescência, e sonhos
para o futuro, Julia encontra personagens essenciais para enfrentar a solidão
ao mesmo tempo que ensaia sua própria coreografia, numa sequência de movimentos
de aproximação e afastamento de seus pais que lhe traz marcas indeléveis. Escrito com a prosa original que
fez de Aline Bei uma das grandes revelações da literatura brasileira
contemporânea, Pequena coreografia do adeus é um romance emocionante que
mostra como nossas relações moldam quem somos.
Joan Didion reflete sobre o
absurdo e a paranoia que marcaram os anos 1960 e 1970, que nos apresentaram a
cultura de massa como a conhecemos hoje.
Examinando grandes eventos, personalidades
e tendências de uma era ― como as jornadas obscuras da família Manson, o
surgimento dos shoppings e a fundação dos Panteras Negras ― através das lentes
de sua própria ebulição cultural, Joan Didion reflete sobre o absurdo e a
paranoia que marcaram os anos 1960 e 1970, que nos apresentaram a cultura de
massa como a conhecemos hoje. Escrito com uma voz única, O álbum branco
é um mosaico jornalístico e ensaístico do cotidiano americano de uma época
fundamental para os Estados Unidos e o mundo. Um dos maiores clássicos do
gênero, seu poder de surpreender e informar o leitor se mantém igual mesmo após
décadas de sua publicação original. A tradução de Camila von Holdefer é
publicada pela HarperCollins.
REEDIÇÕES
Um dos grandes clássicos da história
cultural ganha nova edição revisada e com aparatos críticos escritos por
especialistas. Um dos maiores livros já escritos sobre a Idade Média.
Publicado em 1919, O outono da
Idade Média é um dos grandes clássicos da história cultural. Aqui, o medievo
é visto na plenitude de seus contrastes, distante do lugar-comum segundo o qual
não passaria de uma transição letárgica entre a Antiguidade e o Renascimento. Neste estudo, o historiador
holandês Johan Huizinga utilizou métodos e fontes pouco usuais em sua época
para mostrar a vida medieval em sua expressão cultural, artística e religiosa,
assim como seus modos de sentir felicidade, sofrimento e afeto. Entre o passado
e o futuro de uma ciência fundada sobre alicerces vacilantes, Huizinga trabalha
com as tensões permanentes associadas ao desejo simultâneo de compreender e
narrar um período tão rico de nossa história. A tradução de Francis Petra
Janssen, então publicada pela extinta Cosac Naify, é publicada em maio pela
Penguin/ Companhia com introdução de Naiara Damas e posfácio de Anton van Der
Lem.
Clarice Lispector de luxo. A
edição em capa dura com acabamento em tecido de Perto do coração selvagem inaugura
a série “100 + 1” dá continuidade às comemorações do centenário de Clarice
Lispector.
Assim como toda a obra de Clarice
reeditada em 2021 seu, essa nova edição também conta com projeto gráfico do
consagrado designer Victor Burton e o desenho de capa é um retrato de Alfredo
Ceschiatti, reconhecido por sua colaboração com Oscar Niemeyer na realização de
diversos monumentos públicos de Brasília! O posfácio é de Nádia Battella
Gotlib, considerada por Paulo Gurgel Valente, como a maior especialista
brasileira na obra de Clarice. Perto do coração selvagem foi a estreia
literária de Clarice Lispector, quando a autora tinha apenas 22 anos de idade,
e causou grande impacto, suscitando artigos elogiosos de críticos e escritores.
Esse foi um ano fundamental na vida de Clarice, além de publicar o primeiro
livro, ela obteve a cidadania brasileira, casou-se e diplomou-se em Direito. A
leitura é caleidoscópica. A protagonista ora tem uma cor, ora outra, conforme o
momento (“real” ou onírico). As cores dançam no enredo misturado ao cenário e
às sensações da menina-mulher-amante. Joana desfila na vida dos outros personagens,
destilando o veneno de víbora, instilado com ironia e respostas cruéis diante
dos fatos. A leitura também é lúdica, quando o leitor tenta adivinhar o que a
autora preparou páginas adiante e se surpreende com o que presencia. O livro é
publicado pela editora Rocco.
Após 52 anos da primeira
edição, Global Editora relança de Darcy Ribeiro As Américas e civilização.
Livro que compõe os “Estudos de
Antropologia da Civilização”, a obra As Américas e a civilização,
escrito pelo antropólogo Darcy Ribeiro, apresenta reflexões surgidas durante o
período em que o intelectual esteve no exílio, além de tratar de uma profunda
análise dos processos histórico-culturais vividos pelos povos da América, a
partir da perspectiva inovadora abordada pelo autor, a qual buscou evitar o
tradicionalismo marcado pela visão eurocêntrica. A obra faz parte de um ciclo de
análises, como citado acima, e integra uma linha de pensamento que contempla
temas importantes, como “O processo civilizatório”, “O dilema da América Latina”,
“As Américas e a civilização” e “Os brasileiros”, assunto que apresenta os
subtemas “Teoria do Brasil” e “Os índios e a civilização”. “É importante
ressaltar que nesse livro Darcy coloca como desafio temáticas espinhosas, que
vão desde os percursos que marcaram as diferentes populações esse vasto
continente americano, até os descaminhos dos habitantes da América do Norte,
central e do Sul”, explica Saulo Pessoa, graduado em história. Essa sétima edição, publicada pela
Global Editora, traz projeto gráfico desenvolvido por Victor Burton, designer
na área editorial há 44 anos e ganhou prêmios, como Jabuti de Capa em 2005. O
livro também traz dados de extremo conhecimento do antropólogo que, ao longo de
566 páginas, reúne estudos de anos e toca em questões pouco conhecidas, com uma
propriedade de quem não apenas foi a campo pesquisar, mas que também percorreu
boa parte das terras americanas.
LITERATURA E INTERSEMIOSES
Série documental repassa a vida
e obra de Ernest Hemingway.
Hemingway é assinada por Ken
Burns e Lynn Novick e promete retratar de forma inédita o trabalho e a vida
turbulenta de um dos maiores e mais influentes escritores estadunidenses. O
documentário se toma como modelo o processo criativo de Hemingway e se
aprofunda em certas nuances que constituem a condição mítica do escritor. Sua
história é contada com a ajuda de entrevistas com estudiosos da literatura,
escritores famosos, incluindo Edna O’Brien, Mario Vargas Llosa, Abraham
Verghese e Tobias Wolff, e o filho de Hemingway, Patrick. O trabalho levou seis
anos para ser produzido e traz fotografias raramente vistas, imagens de arquivo
e o acesso sem precedentes a manuscritos originais que mostram o processo
meticuloso pelo qual o escritor criou algumas das mais importantes obras como O
sol também se levanta, O velho e o mar, Up in Michigan, As
neves do Kilimanjaro, entre outras. A série que ainda não tem previsão de
ser exibida no Brasil será mostrada no canal PBS de 5 a 7 de abril, nos Estados
Unidos.
OBITUÁRIO
Morreu o crítico literário
Alfredo Bosi.
Alfredo Bosi nasceu a 26 de agosto
de 1936, em São Paulo. Formou-se em Letras pela Universidade de São Paulo com
bolsa de estudos por um ano em Florença, na Itália. Cedo assumiu os cursos de
língua e literatura italiana na USP e esteve à frente de vários trabalhos de
divulgação de escritores italianos no Brasil; no “Suplemento Literário” do
Estadão escreveu sobre Leopardi, Pirandello, Manzoni, Buzzati, Ungaretti,
Pasolini, Montale, entre outros. Mas foi sobre a literatura brasileira, área na
qual se torna titular em 1985, que se estabeleceu alguns dos seus mais
importantes trabalhos como História concisa da literatura brasileira e Dialética da colonização. A sua obra é vasta e inclui estudos específicos
sobre Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade — Machado de Assis. O
enigma do olhar, Brás Cubas em três versões e Três leituras: Machado,
Drummond, Carpeaux — ou sobre Padre António Vieira, Ferreira Gullar, Cecília
Meireles, Gregório de Matos, José de Alencar, entre outros. Como teórico, se interessou
pelas relações literatura e sociedade, literatura e história, literatura e
ideologia, literatura e política, o fenômeno poético; aqui se destaca por
títulos como Entre a literatura e a história, Céu, inferno, Ideologia e
contra-ideologia, Literatura e resistência e O ser e o tempo da poesia.
Vários desses títulos receberam honrarias e premiações, entre eles o Prêmio
Jabuti, recebido duas vezes, em 1993 e 2000. Em março de 2003 foi eleito para
Academia Brasileira de Letras. Alfredo Bosi morreu em decorrência de Covid-19.
DICAS DE LEITURA
Na edição n.416 do Boletim Letras
360.º aparece nesta seção a recomendação de O spleen de Paris, de
Charles Baudelaire. O livro recebeu uma nova tradução e foi publicado
recentemente pela Editora 34. Aproveitando a célebre data deste 9 de abril de
2021 — o bicentenário do poeta francês — dedicamos estas dicas aos leitores que
se interessem por conhecer melhor sua variada obra que inclui além da poesia,
textos em prosa.
1. As flores do mal. Mas, é
de bom tom começar pela obra que consagrou o poeta e se instituiu como um marco
definitivo na poesia simbolista e moderna. Publicada pela primeira vez em 1857,
o livro também representou a condena de Baudelaire depois de ser levado aos
tribunais e censurado. Por aqui, podemos afirmar, pelas nossas múltiplas
dificuldades de acesso a algumas obras clássicas, sobretudo de poesia, que
estamos bem servidos. Não há muito, o selo Penguin / Companhia das Letras trouxe
uma das edições mais completas desse livro; com tradução de Júlio Castañon
Guimarães, em formato bilíngue, a publicação reúne a versão original do livro
depois da censura e os poemas que foram acrescentados na edição póstuma de
1868. A editora 7Letras também colocou em circulação, recentemente, a tradução
de Margarida Patriota. Já a Editora 34 dispõe da antologia Flores das Flores
do mal de Baudelaire, que reúne 21 poemas do famoso livro do poeta na
tradução de Guilherme de Almeida; em formato bilíngue, a obra tem texto de
prefácio de Manuel Bandeira, notas do tradutor, posfácio de Marcelo Tápia e as
ilustrações compostas por Henri Matisse inspiradas na clássica obra.
2. Escritos sobre arte.
“Todo o universo não é senão um depósito de imagens e sinais aos quais a
imaginação dará um lugar e um valor relativo; é uma espécie de alimento que a imaginação
deve digerir e transformar. Todas as faculdades da alma humana devem estar
subordinadas à imaginação que as requisita todas ao mesmo tempo”. O excerto é
parte num dos quatros ensaios reunidos e traduzidos por Plínio Augusto Coêlho e
publicados pela editora Hedra. São eles: “Da essência do riso” (Le Portefeuille,
1855); “Alguns caricaturistas estrangeiros” (Le Présent, 1857); “A arte
filosófica” — texto encontrado entre os papéis do arquivo de Baudelaire e publicado
postumamente em Arte romântica; e “A obra e a vida de Eugène Delacroix (L’Opinion
Nationale, 1863). Este é um dos raros trabalhos editados no Brasil com uma
mostra significativa da ensaística de Charles Baudelaire. À parte, o leitor
encontra o famoso “O pintor da vida moderna” (Figaro, 1863) em tradução
de Tomaz Tadeu e publicado pela editora Autêntica; “Ensaios sobre Edgar Allan
Poe”, traduzidos por Lúcia Santana Martins e publicados pela Editoria Ícone (2003);
e Paraísos artificiais, que reúne dois textos escritos sob dupla
influência — da obra Confissões de um comedor de ópio, de Thomas Quincey
— e a das experiências com o ópio e o haxixe. A edição deste último título está
publicada pela L&PM Editores com tradução de Alexandre Ribondi, Vera Nóbrea
e Lúcia Nagib.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. Há outra data redonda a ser
celebrada neste dia 10 de abril de 2021, o cinquentenário de Daniel Faria, lido
por alguns companheiros de ofício, como José Tolentino Mendonça, como um dos
mais importantes nomes da poesia portuguesa do século XX. No blog da revista 7faces,
o leitor encontra seis poemas do poeta português.
2. Uma das figuras importantes que
traduziram Charles Baudelaire para a língua portuguesa foi José Saramago. Do poeta
francês, o escritor Prêmio Nobel de Literatura verteu Les paradis
artificiels, publicado em Portugal pela Editorial Estampa em 1971. Leia
aqui a tradução de Saramago para o famoso poema “Embriagai-vos”, incluído na
referida edição.
BAÚ DE LETRAS
1. Algumas das publicações neste blog
sobre a obra e o poeta Charles Baudelaire foram lembradas ao longo do dia 9 de
abril de 2021 em nossa conta no Twitter. Mas, aproveitamos a ocasião para acrescentar
outras recordações: a) este texto sobre a estreita relação literária entre o poeta
francês e Edgar Allan Poe; b) este que apresenta um testamento de Baudelaire como
o poeta do século XXI; c) e este sobre sua obsessão pela revisão, contando
sobre uma década de reescrita até que desse a conhecer publicamente As flores
do mal.
2. Em 2005, o Museu da Língua Portuguesa pediu ao professor
e acadêmico Alfredo Bosi uma lista de 120 grandes obras da Literatura
Brasileira. Quatro anos depois, com esse material que muitas vezes é uma guia
para as leituras apresentadas no blog, reproduzimos nesta post o arquivo
apresentado pela instituição.
* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidades das referidas casas.
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