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Mostrando postagens de abril, 2021

Marcas de uma terra queimada: notas sobre o Caderno de memórias coloniais de Isabela Figueiredo

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Por Flaviana Silva   Pertencer a algo é mais do que estar, é a ousada decisão de ser. A sensação que fica após concluir a leitura do Caderno de memórias coloniais de Isabela Figueiredo é de que as palavras da leitora serão apenas um leve ruído, nada traduz a experiência de sentir essa narrativa “em carne e osso”. A obra captura a atenção e traz consigo temas fortes e caros para a Literatura portuguesa contemporânea, a narradora é filha de colonos e enuncia a sua experiência como observadora da relação entre os portugueses e os pretos de Moçambique, o que narra é muito mais do que a mera descrição dos fatos, ela expõe as feridas escondidas do colonialismo e não se recusa a se colocar como questionadora do seu contexto. O que não pode ser ignorado é que a narrativa é um espelho que elucida experiências da vida de Isabela Figueiredo, o que não define a totalidade da experiência já que a própria criadora afirma que entre o pai da narradora e o seu, prefere ficar com a imagem do seu pai,

O mulato, de Aluísio Azevedo

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Por Pedro Fernandes Aluísio Azevedo.   São pelo menos dois os lugares de recepção da obra de Aluísio Azevedo no Brasil. Primeiro, existe o escritor bem reconhecido, o autor de um romance que integra a literatura brasileira ao rol do naturalismo. Este é o lugar mínimo, se olharmos a quantidade de romances que nos legou; além de O cortiço , o livro desse primeiro autor, há pelo menos, só nesta forma literária, o romance, uma dezena a mais de títulos. Mas estes, por sua vez, pertencem ao escritor por se conhecer. E é, muito provável, que se fossem conhecidos os dois, mudaríamos ― ou pelo menos questionaríamos ― o lugar destinado na historiografia da nossa literatura, um dos mais intrincados capítulos da nossa memória cultural ainda por ser resolvido. É que, se no romance que levou o escritor a um lugar entre os naturalistas é feito das cores que assim o justificam, o romance agora tomado em questão, apesar de ser mostrado como um dos introdutores do naturalismo mais tem de romantismo e d

Truman Capote. Lições para escritores

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Por Aloma Rodríguez Truman Capote. Foto: Otto Stupakoff   Em 1998, George Plimpton publicou Truman Capote: In Which Various Friends, Enemies, Acquaintences and Detractors Recall His Turbulent Career (Truman Capote: Onde vários amigos, inimigos, conhecidos e detratores relembram sua turbulenta trajetória, em tradução livre), uma tentativa de retratar o escritor a partir de conversas e entrevistas com quem o conheceu. Para escrevê-lo, Plimpton gravou quase quarenta fitas de conversas, daí o título do documentário The Capote Tapes . Ebs Burnough — que faz sua estreia com este filme — acrescenta novas vozes e entrevistas, destacando a de Kathy Harrington, filha de um dos amantes de Capote que o escritor praticamente adotou.   O filme talvez se concentre demais nos amigos ricos de Capote, os cisnes, e em como eles pararam de falar com ele depois que uma prévia de seu romance inacabado, Answered Prayers (Preces atendidas, em tradução livre), apareceu na Esquire em 1975, no qual contava mu

A América Latina de Milan Kundera

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Por Massimo Rizzante Gabriel García Márquez e Milan Kundera. O GRANDE ENCONTRO Tudo começou, aparentemente, em dezembro de 1968. Três meses depois que o exército soviético ocupou a Tchecoslováquia, três escritores latino-americanos – Gabriel García Márquez, Carlos Fuentes e Julio Cortázar – caminham trêmulos sob a neve de Praga para encontrar-se com alguns colegas. Entre estes últimos se encontra Milan Kundera, que acaba de publicar com êxito seu primeiro romance, A brincadeira (1967). Nesse momento, é possível que nenhum dos três latino-americanos tenha lido ainda o romance do tcheco, publicado na França poucos meses antes. Kundera, por sua vez, tampouco havia lido Cem anos de solidão (1967), cujas provas da tradução tcheca poderá ler depois de se despedir de seus companheiros de passeio. Tampouco havia lido O jogo da amarelinha (1963), o único grande romance de Cortázar, que a Gallimard havia publicado em 1967. Teria lido, no entanto, La región más transparente (1958) e A morte de

Quando Tchekhov saiu à procura do inferno

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Por Andrea Calamari Anton Tchekhov, no ano quando partiu em viagem para Sacalina, 1890. Anton Tchekhov tinha trinta anos, uma credencial de jornalista, popularidade como escritor e os pulmões em parte destruídos pela tuberculose quando partiu para uma viagem à Ilha de Sacalina, uma colônia penitenciária situada no lugar mais inóspito e hostil da Rússia.   “Fazia muito tempo que não bebia champanhe.” As últimas palavras de Anton Tchekhov são famosas, sua penúltima frase teria sido pronunciada em alemão: Ich sterbe , “Estou morrendo”. Cada biógrafo conta a cena de uma maneira diferente, o mesmo acontece com Olga Knipper em suas memórias, a atriz com quem ele se casou há três anos e o médico que chegou já tarde ao quarto de um hotel alemão. A versão que mais gosto é a de Raymond Carver, porque não é verdade. Carver era um admirador de Tchekhov e, num livro de contos, escreveu um — “Três rosas amarelas” — que traz o russo como protagonista e conta sobre essa noite. Com a literatura acontec

Cinco poemas de W. B. Yeats

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Por Pedro Belo Clara (seleção, tradução e notas) William Butler Yeats. Foto: Howard Coster.     AS AVES BRANCAS   Desejava que fôssemos, amada, aves brancas na espuma do mar! Fatiga-nos a flama do meteoro, antes que se apague e possa escapar; E a chama da estrela do crepúsculo, anil, na baixa linha do céu a tremer, Despertou nos corações, amada, uma tristeza que talvez não possa morrer.   Um cansaço nasce desses dois sonhadores orvalhados, o lírio e a rosa; Ah, com eles não sonhes, amada, com a chama do meteoro, fogosa, Ou a chama da estrela anil do crepúsculo, cintilando baixa quando o rocio cai: Pois desejaria que fôssemos aves brancas sobre a espuma que errante vai.   Incontáveis ilhas me encantam, como Danaan¹ e suas margens sem fim, Onde o Tempo decerto nos esqueceria e a Dor em paz nos deixaria enfim; Em breve, longe da rosa e do lírio, libertos das chamas iríamos estar, Apenas se brancas aves fôssemos, amada, flutuando na espuma do mar!     OS CISNES SELVAGENS DE COOLE   As ár