O teatro de Gógol
Por Joaquim Serra Ao ler O inspetor geral devemos sempre ter em mente a epígrafe da peça: a culpa não é do espelho se a cara é torta. Tudo começa da pior maneira possível. O prefeito recebe uma carta dizendo que um inspetor fará uma visita à cidadezinha a fim de fiscalizar os serviços. Diz a carta do amigo que lhe informa o fato inesperado: “como sei que você, como todo mundo, tem lá os seus pecadilhos, pois você é um homem inteligente e não gosta de deixar passar o que lhe cai nas mãos... então aconselho tomar precauções”. Para o leitor acostumado com as personagens do universo gogoliano, os pecadilhos do prefeito e do alto escalão reunido daquela cidade muito provavelmente não é algo tão delicado como a palavra sugere. Todos se acusam já nas primeiras páginas. O leitor sabe logo o que precisam maquiar – quase todo o dia a dia – daquela cidade para receber a visita ilustre. Como disse Shakespeare sobre a consciência culpada: o ladrão vê em cada sombra um policial. Bób