Os pilares da quadra, a poesia de Renan Peres

 Por Wagner Silva Gomes



 
Dividido em duas partes, a primeira girando em torno da liberdade, a segunda tomando como base o amor, sintomas (Pedregulho, 2020), livro de estreia de Renan Peres (Vitória – ES, 1997), tem como ponto de partida o horizonte, espaço. Mas esse não é nada sem o amor, construção. É sobre até onde vai o amor, se:
 
xiii.
 
no seu mundo jamais serei pedestre
 suas ruas me foram interditadas
está proibido nos cruzarmos. 
(p. 93).
 
Com versos livres, ora com rimas sólidas toantes, como as paredes em /S/, da interdição de cruzar com o outro – últimos dois versos – o eu lírico quer ir além do limite imposto. Peres, por isso, faz uso da heterometria (as duas paredes de decassílabos com uma de nove sílabas que poderia ser de dez, contando com o indivíduo, mas se trata de um terceto, não de uma quadra – espanto, as quadras, como são chamados os quarteirões de ruas, bairros, não são quadras, pois têm dois lados, lados que dividem sujeitos, subjetividades, etnias, classes sociais). A única quadra possível para quem mira o horizonte e quer construir o seu espaço com amor é a quadra do poema, que para o poeta se faz de:
 
vi.
 
comprimir um espaço
ocupar o mínimo possível
estar no máximo só
nomeá-lo território. 
(p. 92).
 
Só então, mesmo sem o festejo próprio das quadras de roda, combinando “” com “território” e esse com “espaço”, pode-se tornar um meio “possível”.

Como a banda Sepultura, no seu álbum Quadra (2020), Renan questiona a voga do “Quadrívio, forma de estudo civilizacional eurocêntrico desenvolvido na antiguidade por Marciano Capela (360 - 428) que ainda impera nos dias de hoje e dá nome as quatro disciplinas estudadas nas universidades helênicas, sendo elas a aritmética, a geometria, a astronomia e a música.

Sob o efeito do “Quadrívio” na realidade de hoje sente o poeta que não é fácil viver nessa voga de prédios como alienação espacial (cabeças mais na lua objetivamente que na terra humanisticamente), de cálculos como alienação da vida (dinheiro subtraindo gente, espaço acumulando mortos). Essas coisas Peres enxerga de sua quadra livro como:
 
xii.
 
sintomas de amor pelas ruas
ouvir no tumulto da cidade um réquiem
fazer habitar a solidão nos cômodos
transformar em morte cada substância de asfalto. 
(p. 93).
 
Para elas o poeta faz sua última prece poética, em seu último poema do livro, “”, como uma “Quadra” do Sepultura onde se pergunta quantas construções de horizontes pode guardar nessa matéria livro, em sua forma quadrada ou retangular.
 

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