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Mostrando postagens de julho, 2020

O universo de Breaking Bad e a ambiguidade do ser

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Por Rafael Kafka Fiquei muito impressionado há alguns anos quando decidi ver Breaking Bad depois de superar um preconceito terrível com sua premissa. Até então, um professor frustrado que decide usar seus saberes para iniciar uma vida como produtor e traficante de drogas não me parecia algo apetecível para meu gosto poético. Todavia, um dia lembrei que mais jovem eu fora formado em cineclubes vendo por demais filmes de gângster e o mundo do crime organizado é um ótimo convite à reflexão sobre a condição humana, seus discursos e outros elementos simbólicos que guiam os passos por essa existência caótica. A premissa mencionada acima se revelou um convite a várias reflexões provocadas pela série, a qual diz muito sem muito dizer, usando longos planos e cortes de câmera perfeitos que se tornam um verdadeiro caleidoscópio existencial a revelar subjetividades em formação e conflitos enquanto práticas ilícitas são cometidas. Tudo isso é criado também com um processo de narrat

Anacrusa, de Ricardo Daunt

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Por Pedro Fernandes A passagem mais recordada toda vez que se quer designar a linguagem como o princípio original e enformador do mundo está no primeiro capítulo do livro de João; é o versículo no qual o autor do Evangelho retoma o episódio genesíaco da ordem do mundo: “No princípio era o Verbo”. Toma-se, assim, o sentido quase imediato do último termo como designativo da palavra ou ainda na categoria gramatical para o qual se volta ― o termo que denota ação, estado. Este, por sua vez, sabemos constitui o complexo de atividades desempenhadas; mas nele se contém ainda toda a dimensão essencial para a existência, o tempo. Assim é que tempo e linguagem se designam como dois princípios de irrupção simultânea do acaso. A palavra, conforme, dissemos antes, não é ainda a materialidade feita com letras, por mais que o papel figurativo que a favorece enquanto enformante das coisas esteja ativo. O mito cristão não deixa de esclarecer que o mundo se formava à medida que o seu criado

Matthias e Maxime, de Xavier Dolan

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Por Pedro Fernandes Há um tópico recorrente na filmografia de Xavier Dolan que está na base da narrativa de Matthias e Maxime :   o conflito entre gerações e as consequências disso na formação e futura vida individual dos envolvidos. Em dois dos filmes que antecedem esta produção de 2019 ― Eu matei minha mãe , o primeiro trabalho do canadense como diretor e roteirista, premiado no ano de estreia no Festival de Cannes, em 2009, e Mommy (2014) ― o conflito entre filhos e mães funciona como determinante do drama. Aqui, se não diretamente, é uma questão latente, e mesmo não sendo o único elemento problemático, um dos principais. São os três filmes um ensaio acerca do dilema complexo dilema de soltura dos laços de posse que une as crias às suas criações.   Neste filme, em que próprio Dolan, além de tudo, assume um dos papéis principais ― por sinal, o melhor e mais acabado personagem pela carga dramática com a qual se distingue e se impõe na cena ― é o impasse entre mã

A autópsia de Pinóquio

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Por Julio Ocampo Ilustração de Alex Cerveny para a edição de As aventuras de Pinóquio (Cosac Naify, 2011). As aventuras de Pinóquio não é um livro qualquer. Tampouco é um conto de fadas feito para colocar crianças para dormir, mas uma fábula para acordar adultos. O midiático boneco de madeira, segundo conta o escritor Pino Corati em seu livro Pinocchio, fratello mio , poderia ser Dante, Jesus ou Ulisses. Heróis épicos redimidos depois de superar o caminho da dor, a vulnerabilidade às tentações, os pecados capitais e os demônios aninhados na mente... Tão difícil, complexo e ao mesmo tempo necessário para transcender a uma esfera superior. A autópsia desse clássico da literatura universal passa por aqui. “Carlo Collodi não era maçom, mas um defensor da cultura maçônica. Em sua obra é frequente o uso da numerologia, da psicanálise, da alquimia, do simbolismo e do esoterismo”, explica Bernardino Fioravanti, histórico bibliotecário do Grande Leste da Itália, a mai

Os felizes anos 20 de Virginia Woolf

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Por Nuria Azancot A segunda metade da década de 1920 foi a mais alegre para Virginia Woolf (1882-1941), a mais proveitosa e satisfatória, que a fez escrever no seu Diário , em 8 de abril de 1925, que estava superando sua depressão e não se sentia mais “inclinada a tirar meu chapéu diante da morte”. Dias depois, insistiria em sua felicidade: “L. [Leonard, seu companheiro] e eu estávamos tão, tão felizes que, como dizem, se eu tivesse que morrer naquele momento etc. ... Ninguém será capaz de dizer de mim que não havia conhecido a perfeita felicidade”. No entanto, ninguém procure o segredo dessa exaltação em algo complicado ou valioso. Como a própria Virginia detalha, ela amava “a vida de Londres no começo do verão: andar despreocupadamente e rondar pelas praças e, além disso, se meus livros [...] tiveram sucesso”. Ele também sabia que haveria dias sombrios, de profunda melancolia, críticas negativas e invejosas, mas havia descoberto que com algo tão simples como “ter 3

Boletim Letras 360º #385

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DO EDITOR 1. Amigo leitor, registra-se a seguir as notícias que passaram, ou não, pelo mural de nossa página no Facebook. Além delas, as demais seções com novos conteúdos, sempre com o interesse de enriquecer e ampliar sua experiência cultural e literária. Fique bem. Boas leituras! Clarice Lispector. Dois novos livros ganham reedição no projeto para o centenário da escritora.   LANÇAMENTOS A alegria de enxergar novos mundo através dos olhos dos outros . C.S. Lewis, grande escritor de ficção e livros teológicos, como As crônicas de Nárnia , a Trilogia Cósmica e Cartas de um diabo a seu aprendiz , continua envolvendo os leitores graças não apenas às suas ideias intelectuais, mas também por ser um amante incorrigível de livros e um leitor ávido. Essas características fizeram com que conseguisse produzir suas maravilhosas obras criativas por meio de reflexões profundas sobre a literatura que impactou sua vida. Em Como cultivar uma vida de leitura ― coletânea enc

Juan Marsé, um romancista de ferro

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Por Julio José Ordovás Juan Marsé foi testemunha de uma sociedade e de uma época que não queria testemunhas. E foi até o fim, justo como o Coyote de José Mallorquí, sem dar a mínima para as consequências, satirizando os intelectuais orgânicos da Catalunha nacionalista como antes havia caricaturado muitos dos membros da gauche divine radicada em Bocaccio. Marsé também fazia parte da intelligentsia que frequentava aquela boîte onde abundavam os filhinhos e filhinhas de papai, mas nunca esqueceu que aí era apenas um clandestino, como Jim Hawkins, em La Hispaniola . Marsé não tinha ninguém para lhe calar a boca. Zombador e valentão, leal tanto a seus amigos quanto a seus inimigos, riu ferozmente da prosa desarticulada e servil com o pujolismo de Baltasar Porcel, dos sermões insuportáveis ​​de Juan Goytisolo e a careca iluminada de Lluís Llach. Havia uma caricatura de desafio permanente no seu rosto de pistoleiro do western clássico, mas também uma sombra de ternur