Pela noite, de Caio Fernando Abreu
Por Pedro
Fernandes
Caio Fernando Abreu. Foto: Louis Monier |
A eterna
solidão de um romântico fora do tempo. Esta frase bem poderia ser lida como uma
síntese mais ou menos coerente sobre a obra de Caio Fernando Abreu e, por
extensão, constituir um designativo da natureza do próprio escritor. Se
fôssemos em busca de uma arqueologia de sua formação, certamente encontraríamos
em sua base, entre outras influências evidentes (algumas delas inscritas vivamente
ou disfarçadas na sua obra), Clarice Lispector e Hilda Hilst. Da primeira, emulou
a lida com o interior e as consciências em estágio de perturbação pelo passado
ou pelo iminente; da segunda, certo apelo para o corporal, os fluxos do desejo
e das liberdades de sentir. A apropriação dessas duas escritoras se perde no embuço
que vestiu para trazer ao centro do literário situações e figuras condenadas ao
silenciamento e, se apresentadas, tomadas pelo risível ou pela degradação punitiva
de uma ordem que apesar de abrigá-las não permitia que saíssem à luz de todos. Ao
dizer isso, pensamos que a criatividade desse escritor foi profundamente
alimentada de sua própria condição e das próprias vivências – como acontece, em
menor ou maior grau, com toda literaturas.
Se as
figuras e as situações que constituíram o centro de interesse da literatura de
Caio Fernando Abreu eram impossibilidades para os limites determinados, vê-las
enquanto ordens eram uma forma de agravo ainda pior. Nisso, o leitor saberá que
está diante de um escritor astucioso; àquilo que parece ter nascido de uma
admiração irrestrita logo é manipulado para a construção de um universo radicalmente
diferente, original e, por isso, totalmente novo no interior da literatura
brasileira, um universo que apenas o escritor poderia construir. Mas isso não
faz da obra do escritor um grande marco na literatura brasileira. Uma visita
aos principais títulos que constituem sua breve obra é suficiente para
compreender que esteve, continuamente, entretido em reescrever a mesma
situação: a possibilidade de apagamento da solidão pela realização plena do
amor e seu ajustamento aos estamentos sociais. O problema não está obviamente
na reescritura. Assim como todo escritor é um emulador, é pela continuidade da
repetição que constrói sua obra. Muitos, entretanto, conseguem avançar ao ponto
de encontrar um zênite, uma epifania, para pensar claricianamente; notamos isso
na obra das escritoras que elege imitar. No caso de Caio, é notável que a
construção formal se complexifica gradativamente, mas as obra é empobrecida
quando logo revemos sempre o mesmo drama do sujeito envolto na condição de
desajustado do mundo e de si, às vezes por sua própria vontade, como se
atravessasse uma crise existencial da qual não pode fugir porque se autocondenou
seduzido pela impossibilidade da plenitude do amor, entre o desengano e as
limitações sociais – a lista não chega para mais que isso, por mais que se encontre
múltiplas abordagens como se designam as várias leituras acadêmicas que se faz
sobre obra.
Nada disso
quer servir a um menosprezo pela literatura de Caio Fernando Abreu, quer apenas
amainar as exageradas exaltações, as emotivas paixões, certa moda que alguns leitores
têm incorporado desde quando os temas sociais e políticos começaram a sobrepor
a validade – nunca vencida – estética da obra. Toda obra deve ser lida
distinguindo-se da paixão ideológica, sob o risco de celebrar ou rebaixar
indevidamente as criações. O mérito do escritor gaúcho reside em tornar visível
uma realidade que nunca esteve ao alcance da ordem e conseguir, com isso, alterar
o curso dos limites impostos às representações literárias. O curso do literário
não foi alterado por sua própria obra, mas por um movimento coletivo que se
forma entre os escritores de sua geração e se aperfeiçoa continuamente desde a
liberalização dos costumes no Brasil. Mas, toda atitude do escritor reside no que
não hesitaríamos de chamar por um certo romantismo tardio: seu gesto é regido pela
individualidade. Frente a isso, é autor de uma literatura que se realiza por um
impulso passional, aquela distinção do homem movido pelas suas ideias. A esse
mesmo rol, valeria acrescentar, que a busca angustiada de seus homens é
igualmente romântica: como as mocinhas da outra era, eles sonham com príncipes
encantados, com o homem capaz de fazê-los preenchidos, plenos, desafogados de
sua condição marginal e, como isso ainda é insuficiente, que tudo seja bendito
entre a sociedade, esse entidade que tantos de seus homens odeiam com todas as
forças porque só conseguem vê-las enquanto arquétipo sustentado por uma
hipocrisia burguesa incapaz de resistir ao peso da verdade que se diz possuir.
Dizíamos acima
sobre a reescritura. No caso de Caio Fernando Abreu, ela se deu em duas
frentes: na remontagem dos materiais visando, por acréscimo, constituir as
múltiplas camadas dos revestimentos textuais tão necessários ao literário e na
própria revisão continuada de seus textos. Pela noite é um exemplo
ilustrativo disso. A edição definitiva do texto guarda duas datas. A primeira,
1980, parece designar quando o texto concebido pela primeira vez – em São
Paulo; a segunda, quando foi revisado e publicado na coletânea Triângulo das
águas em 1983; no prefácio que acrescenta a este livro, em 1991, o escritor
esclarece que “foi preciso abandonar temporariamente São Paulo para viver um
ano num quarto de hotel em Santa Teresa, no Rio de Janeiro” a fim de conseguir colocar
o ponto final na obra. Com ela, recebeu, no ano seguinte, o Prêmio Jabuti.
Primeira edição de Triângulo das águas. |
Esta novela
resulta num dos melhores textos do escritor. É que, em parte, sua personagem principal
não patina no drama mas alcança – ao menos para si – uma ruptura, certa
restauração da totalidade perdida, uma vez que o reencontro com sua primeira
paixão o permite abrir-se para o mundo que lhe foi negado, mesmo na cidade
grande onde pensava consegui-lo. O que assistimos é uma contínua transmutação
do amor: do maternal ao carnal, passando pelo intervalo do impeditivo entre uma
forma e outra. Isso se observa perfeitamente na maneira como Pérsio, primeiro
desacredita do amor entre dois homens pela aversão pessoal que guarda do sexo
anal, mas sonha com o limpo e puro amor, e, por fim, encontra em Santiago a possibilidade
dessa ruptura. Esse trânsito psicanalítico encontra várias determinações
simbólicas que esclarecem a mobilidade dos processos psíquicos dessa
personagem, embora, o tratamento mais interessante desse texto é como o escritor
engendra uma compreensão do destino: este, qual na tragédia grega (tantas vezes
citada na esfera narrativa), é uma determinação que acompanha o sujeito aonde
for. É justamente em São Paulo, a cidade que permite a Pérsio exercitar toda
sua liberdade sexual, onde reencontra Santiago, o homem do passado que há tanto
quis silenciar ou negar. A possibilidade do amor se instaura da companhia das
duas solidões, a do homem que não se encontrou com a do homem viúvo, o
adolescente do primeiro beijo na cidade deixada pelos dois. Mas, o fator coincidência
é apenas um dentre os matizes que determinam a qualidade da novela.
Pela noite
abre-se com a descrição passional da personagem principal de uma peça executada
pelo bandoneonista e compositor argentino Astor Piazzolla e o jazzista e saxofonista
Gerry Mulligan, “Years of solitude” (Anos de solidão). A música que segundo o
escritor acompanha o ritmo da novela, oferece assim o tema da narrativa: esse
encontro de solidões sobre o qual falamos acima. A descrição pela personagem
imprime, qual a música executada uma atmosfera melancólica, intimista e
contemplativa, elementos que formam um tom dramático, um indício que depois se
revela: estamos diante de um crítico de teatro. E este não apenas interpreta um
papel para esse homem reencontrado há uma semana entre as nuvens de vapor de
uma sauna, como lhe seduz a cair na mesma ribalta. A cena dirigida exige que as
personagens se revelem, isso, entretanto, não se fará. O homem que descreve as
impressões sobre “Yeares of solitude” estabelece que suas identidades se justifiquem
em nome do papel que interpretarão no trânsito da noite: o reencontrado
Santiago, nome induzido pelo gosto literário que ele revela ao seu preceptor
– entre Os prêmios, de Julio Cortázar, Conversa no catedral, de
Mário Vargas Llosa e Crônica de uma morte anunciada, de Gabriel García
Márquez, se diz predileto deste último, livro cuja personagem principal é Santiago
Nasar; e o diretor da cena, Pérsio, o de Os prêmios. Isto é, a narrativa
lida integralmente com a fabricação de um eu que se revela ficção dentro da
ficção e diverso e disperso.
Mas esses
dois nomes, como tudo nessa novela, não deixam de imprimir uma variedade de
representações. O romance de Gabriel García Márquez reconstrói o último dia da
vida de Santiago, assassinado pelos irmãos Vicario, Pedro e Paulo (nomes que
aparecem sugeridos por Pérsio como nomes possíveis para as duas personagens da
sua ribalta). Santiago, a personagem de Crônica de uma morte anunciada,
é filho de um imigrante árabe e descrito como culto, sedutor, apreciador da
caça, qualidades que, à medida que narrativa progride, reencontramos acentuar-se
no perfil físico e psicológico do Santiago de Caio Fernando Abreu. As coincidências
não findam aí: a personagem de Pela noite traz consigo a sombra
da morte, afinal, o homem que amou durante dez anos pode ter morrido num
acidente de carro como revela para o amigo; mas, antes disso, a própria
condição melancólica de Pérsio sempre é inclinada para o suicídio, entrevisto
na cena em que se corta enquanto se barbeia e, claro no desfecho da narrativa que
se inclina para dois princípios: a realização amorosa e a morte dos amantes, o
que, entre uma fronteira e outra, quase não resulta distinção – ao menos se
formos aos limites do erótico em Roland Barthes, pensador, aliás, que
acompanha a música de Astor Piazzolla e Gerry Mulligan na entrada da novela. E,
de qual obra do pensador francês? Fragmentos do discurso amoroso.
E Pérsio? A
personagem se justifica dizendo que, enquanto existe uma infinidade de
possíveis para Santiago, não existem correspondentes fora desse autodesignativo,
exceto a proximidade com Pérsia, um país que não está mais no mapa, e certa
figura interessada em estrelas. Note o leitor a perspicácia de Caio Fernando Abreu:
enquanto revela vários dos segredos da narrativa ao longo dela, trata de
esconder outros. É que Pérsio, herdado de Os prêmios, de Cortázar não é
assim revelado, apenas induzido pelo gostar de estrelas e pela navegação. Mas,
além dessa evidência, o nome leva a pelo menos três outros: Perseu, o filho de
Zeus que corta a cabeça de Medusa; Pérsio Traurig, um jornalista gaúcho que
nasceu numa colônia alemã no início da década de 1940 e correu o mundo em
aventuras e desventuras; e Persio, do
par Persio & Giovenali, dois literatos que revolucionaram a sátira, gênero popular
na Roma do principado. E as três figuras consubstanciam a realização da
personagem de Pela noite: é ela que é vista por Santiago como Quimera, o
ser híbrido da mitologia que encarna simultaneamente o animal de estima do rei
de Cária e o que se revolta contra ele; na conotação popular, quimera alude a
qualquer coisa de absurdo, fantasioso, algo que designa o caráter dessa
personagem. Pérsio conduzirá Santiago para a morte; Pérsio é o homem que
arrasta Santiago para as aventuras pela noite chuvosa de sábado em São Paulo
ainda que o desejo dos dois se inclinem para outras possibilidades; e Pérsio é
quem transforma essa noite numa grande sátira desse fim trágico para o qual
arrasta seu Santiago.
O conto de
Julio Cortázar, qual o conto de Caio Fernando Abreu, lida com o sugerido, o que
não está à primeira superfície, além de perfazer o típico gosto do escritor pelo
onírico e pelo fantástico qualidades recuperadas no texto agora lido; Pérsio é
o que devaneia sobre a realidade caótica na qual são metidas personagens que a
bordo do navio Malcom precisam lidar com o descaso total que as assolam. Enquanto
isso, a personagem de Pela noite, sendo a inventora das
circunstâncias para as quais é arrastada com Santiago, ou condutora da
noite, é regida por esse principal particular: detém a chave, conduz tudo, e
aparece envolvida pela vontade entre realizar ou não essa noite com Santiago. Verborrágico,
tudo passa por sua vista, incluindo sua elevada capacidade para a invenção. Todos
esses elementos supõem ler essa personagem como alterego do próprio escritor. A
leitura mais audaciosa (mas totalmente possível) é que estamos ante um suicida,
incapaz de lidar com sua condição solitária e perturbada pela chegada do passado
repentinamente à sua porta trata de encenar sobre si a última noite, o instante
final em que poderá deixar esse mundo imprestável qual o escaninha
quando se encontra na pizzaria com Santiago. Essa possibilidade talvez não seja
tão óbvia, mas à extensão da narrativa de Julio Cortázar, é uma leitura que
justifica o ponto alto do texto de Caio Fernando Abreu.
A sombra da
morte que ronda essas duas personagens se apresenta noutros indícios da narrativa,
como no diálogo que mantém com a fábula popular copiada por Hans Christian
Andersen, “Os sapatinhos vermelhos”; nessa narrativa, Catarina, só é possível
se livrar da condenação de dançar eternamente, mesmo depois de ser amputada por
um carrasco, com a morte. Embora o texto encerre uma dimensão trágica, também
sugere, como a narrativa de Pela noite, um final sugestivo de redenção
pela realização amorosa. Parece indispensável, quando nos referimos à presença
reiterada da morte na novela, não deixar de citar a menção à AIDS. Isso se faz
necessário para desfazer certa leitura que adiciona Pérsio entre a lista de pacientes
ficcionais da doença. Essa interpretação, embora continuamente reiterada desde
que se afirmou¹ que este foi provavelmente um dos primeiros textos da
literatura brasileira que menciona o tema da AIDS, carece de uma releitura. Primeiro:
a constatação original ao assinalar a menção não significa afirmar como
ingenuamente as leituras embarcaram na leitura rápida da crítica, sem atentar
para o conteúdo textual; segundo: a novela, de fato, não traz a AIDS como tema.
O termo aparece duas vezes: interposto entre as reflexões aleatórias sobre as
desculpas possíveis que Pérsio poderia inventar para não aceitar se encontrar
com Santiago; depois, sobre os seus medos principais. Destaquemos,
propositalmente, as duas passagens:
― E
de repente eu ia dizer não, não posso, não quero, não devo, estou doente,
descobri que estou com AIDS, tenho um compromisso, tentei pular da janela.
Quando vi tinha dito te espero às oito, não foi? E de repente eram só sete e
meia quando a campainha tocou e eu não pensei que fosse você. Oh, Deus, tudo
tão típico. Eu queria ter tomado um banho antes e feito a barba, uns cheiros,
uns charmes, essas coisas. Eu queria dar uma boa. Sei lá, troço mais babaca,
impressão. Eu queria que você gostasse de mim.
―
Eu sei, eu sei. Mas você não sente medo?
―
Sinto, sinto. Claro que sinto. Tenho milhões de medos. Alguns até mais graves.
Medo de ficar só, medo de não encontrar, medo de AIDS. Medo de que tudo esteja
no fim, de que não exista mais tempo para nada. E da grande peste. Mas hoje
não, agora não. Agora só tenho vontade de galinhar um pouco. Portanto nós vamos
estacionar este batmóvel, se os orixás ajudarem. Depois vamos descer e tomar
uns bons drinques ali no Deer’s, conhece o Deer’s?
Não dá para forçar o que o texto não diz. Sequer sugere. Há quem encontre no
estado de Pérsio a resposta para a doença interdita. Nem isso é possível
confirmar, visto que deste o início até o fim da narrativa esses dois encontram-se
movidos pela bebida – Pérsio mais ainda – pela maconha e pela cocaína.
Por fim, não
é possível deixar de ler essa novela como se um noturno, não o gênero
textual com o qual o escritor denominou as novelas de Triângulo das águas,
mas a composição musical que evoca e-ou é inspirada pela noite, cultivada
durante o século XIX como uma peça para piano solo, em ocasiões, feitas para ser
executadas à noite. Novamente voltamos aquele sopro romântico que
dissemos tingir a literatura de Caio Fernando Abreu; os noturnos de John Field,
considerado criador desse tipo de composição, recebiam também a designação de romance.
Pela noite é designada como uma novela, mas seu tom, bem sabemos, é o do
romance – nas várias acepções mais correntes desse termo: o drama de
implicações profundas e reflexivas; a história de amor impossível. Embora,
sejamos envolvidos por dimensões tranquilas e melancólicas (na percepção da
noite chuvosa de um sábado de julho na cidade que nunca dorme, no trânsito de
luto de Santiago, este que satirizado em três momentos da narrativa ou
quando os dois se entregam ao som piano quando escutam a sonata “Moonlight”, de
Beethoven), o noturno de Pela noite não é o popularizado por Chopin e
sim orquestral de Claude Debussy, pelo caráter bastante agitado que contrapõe
esses instantes de certa paz na narrativa.
As
referências de Pela noite são mais que essas. Muitas. Um território rico
que só uma leitura hermenêutica do texto é capaz de evidenciar seus
desdobramentos: as presenças das artes plásticas, como a reprodução francesa de
O beijo, de Gustav Klimt, o identificável “quadro com faunos e bacantes
nuas esmagando cachos de uvas sob os pés dentro do barril de madeira”; de
outras obras da literatura, como Peter Pan, de J. M. Barrie, Perto do
coração selvagem, de Clarice Lispector, Poeira, de Rosamond Lehman, Corações
solitários, de Rubem Fonseca, a poesia de Cesar Vallejo e de Ferreira Gullar;
outras referências musicais como Billy Holliday, James Taylor; etc. Além disso,
as implicações simbólicas, principalmente, a continuidade da água: na chuva que
segue os dois nesse périplo pela noite de São Paulo; no banho de Pérsio que se
prepara para receber verdadeiramente Santiago; no imaginário de Pérsio em seu
retorno ao repouso limpo e maternal. Ou seja, tudo será possível dizer sobre
Caio Fernando Abreu – mas, impossível negar sua vivaz capacidade criativa. O
que aqui se evidenciou foi tão somente uma amostra disso e o que justifica esta
novela entre os principais textos da sua obra.
Notas:
¹ O texto
sempre citado nos trabalhos que consultei sobre o tema na obra de Caio Fernando
Abreu é o de Marcelo Secron Bessa, Histórias positivas: a literatura
(des)construindo a AIDS (Record, 1997). Embora, nesse texto se afirme categoricamente
que a novela tematiza a AIDS, toda a argumentação do pensador não aponta para
essa afirmação, mas pela suspeição do discurso atribuído aos gays do início do
boom da doença, que a eles, e só a eles, resulta a culpa do novo mal. “O que
‘Pela noite’ faz é apresentar, na metrópole de São Paulo, essa atmosfera de
paranóia e acusação através de duas personagens inseridas em um jogo de
sedução, presidido por uma delas. E é justamente através de encontro casual de
duas pessoas entre muitas, perdidas na noite de um enorme centro urbano, que o
discurso normatizador e classificador da sexualidade é questionado e também
desconstruído.” A afirmativa de Bessa esclarece assim o mal-entendido que
transformou um argumento bem mais complexo numa determinante rasa e improvável
pela narrativa literária.
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