Boletim Letras 360º #371
DO EDITOR
1. Esta foi
uma daquelas semanas ainda mais pesada; não foi apenas o contínuo cenário de morte
que se tornou recorrência nos nossos dias pela COVID19 com cifras cada vez mais
elevadas, desprezando-se, no caso do Brasil, país entregue à própria sorte, os
números de subnotificações.
2. A semana
foi mais pesada pela morte de três escritores que produziram, cada um à sua
maneira, obras de significativa importância para a literatura: os brasileiros Luiz
Alfredo Garcia-Rosa e Rubem Fonseca e o chileno Luís Sepúlveda – este em
decorrência de complicações do Coronavírus. Saiba mais sobre eles nas notas
seguintes.
3. Ante tais
perdas, os leitores órfãos devem sempre se guiar por duas certezas: restou a obra
e para nós a responsabilidade de lê-la, comentá-la e levá-la adiante. Por isso,
foi estendida a lista na seção Dicas de Leituras. Não deixe de vê-la. É nossa
maneira de não deixar que essa página se sobreponha com notícias tristes.
4. Aqui seguimos.
Com o conteúdo diário tradicional do blog e nas redes sociais. Reforçamos o
pedido que se tornou universal: se puder, fique em casa. E estar em casa é
sempre uma oportunidade de ouro para ler. Este BO Letras 360º é uma publicação
semanal que reúne informações disponibilizadas (ou não) na página do Letras no
Facebook. Obrigado pela companhia e, boas leituras!
Herberto Helder, Vale de Figueira, Santarém, anos 1960. Arquivo: Casa Museu Frederico de Freitas. Plaquete reúne pela primeira vez no Brasil uma amostra com poemas traduzidos pelo poeta português. |
LANÇAMENTOS
Livro perfaz
a vida de Nora Rónai.
Ainda
criança, Nora Tausz experimentou a furiosa hostilidade nazista. Fugindo da
perseguição e da morte, deixou a Europa com seus pais e irmão e desembarcou no
Rio de Janeiro em 1941. Em terras brasileiras, precisou vencer inúmeros
desafios para a construção de uma nova vida. Com determinação e muitos
talentos, Nora faz a sua parte: ajudou a família, aprendeu a nova língua,
conciliou os estudos com uma bem-sucedida experiência como atleta
de saltos ornamentais. Mas a vida, como Nora mostra nestas memórias, é de
altos e baixos. Forma-se em arquitetura na Universidade do Brasil (hoje UFRJ),
em 1950, mesmo ano em que morre sua mãe, Iolanda. Perde também o único irmão,
Giorgio. Com o pai Edoardo, segue a vida de forma determinada e resiliente.
Torna-se professora da instituição em que estudou e trabalha como arquiteta em
empresas de construção civil. Em 1951 conhece o filólogo, crítico e tradutor
húngaro Paulo Rónai, também refugiado de guerra, com quem se casa no ano
seguinte. Fazem livros, duas filhas, constroem uma casa. Em 1964, retornam, em
visita, à Europa. Mais de vinte anos depois da fuga, empreendem, juntos, uma
viagem de redescobertas e reparação. Toda essa trajetória é descrita a partir
de lembranças e diários de viagem, em uma narrativa envolvente com os episódios
mais marcantes de uma vida singular. Como quem conta histórias em uma conversa
íntima, familiar, Nora Rónai compartilha experiências e visões de mundo com a
marca de sua personalidade altiva, finamente inteligente, espirituosa,
fascinante. Hoje, aos 96 anos, Nora Rónai, que após os 60 anos voltou às
piscinas como nadadora, continua a participar de campeonatos e é detentora dos
recordes mundiais de sua categoria. O desenho do tempo, de Nora Rónai é
publicado pela Bazar do Tempo.
Monteiro
Lobato tradutor e adaptador
O
livro de ouro dos contos de fada é uma antologia dos mais admiráveis
contos de fadas, consagrados pelos mestres Charles Perrault, irmãos Grimm e
Hans Christian Andersen. Todos selecionados e traduzidos por ninguém menos do
que Monteiro Lobato. Esta reunião de peso é coroada pelo trabalho de três
grandes ilustradores de nosso tempo: Alexandre Camanho, Renato Moriconi e
Lelis. Um tesouro da literatura para se ter em casa e na biblioteca; para ser lido
em voz alta e também quietinho, aproveitando o silêncio da hora de dormir. O
livro é publicado pela Nova Fronteira.
O trabalho
de Herbeto Helder como tradutor selecionado numa pequena e rica antologia.
As traduções
realizadas pelo poeta português Herberto Helder são bastante expressivas e
diversificadas. Contudo, esse exercício demonstra uma visão particular do
fenômeno tradutório, sem nunca estabelecer uma “teoria” propriamente dita,
pois era um autor que evitava teorias, academicismos, discursos
institucionalizados. Com seu norteamento habitual, subvertia as condicionantes,
mantendo a absoluta independência. Desde a publicação de O Bebedor Nocturno
(1968), Herberto Helder esquivou-se de classificar suas versões como “tradução”,
batizando-as de “poemas mudados”. Além de reafirmar a expressividade
insurrecta, o poeta desterritorializava o horizonte da poesia do Ocidente,
apontando o foco dos seus interesses em direção à poesia de povos
desconhecidos, de cosmogonias, mitos e tradições orais autóctones, como se
procurasse ressignificar o território poético, seguindo uma estratégia
pessoal e genésica. De Ezra Pound a Augusto de Campos, de Fernando Pessoa a Jerome
Rothenberg, grandes poetas sempre buscaram companhias que explicassem um pouco
de si mesmos, suscetíveis de fortalecer a própria voz, ou simplesmente expor
sua admiração através do diálogo atemporal. Herberto Helder procurou se
cercar de autores com os quais parecia manter uma contínua transfusão de forças
e inquietações. Dir-se-ia que o poeta, sem jamais se assumir como mentor ou
oráculo, captura poemas dissonantes, mas que produzem um efeito singular,
abrem janelas extraordinárias. Ou seja, todos os autores são determinantes,
todos os poemas são mudáveis, independente da língua, cultura ou civilização
a que pertencem. O que se torna imperativo é o aspecto genuíno, as
plasticidades renovadoras, a força motriz do poema que faz mudar o leitor. Estas são observações de Jorge Henrique Bastos para edição de Dez poemas mudados para o português publicada pelo Selo Demônio Negro.
OBITUÁRIO
Morreu Luiz
Alfredo Garcia-Roza
Luiz Alfredo
Garcia-Roza escreveu, além de romances e contos. O escritor nascido no Rio de Janeiro
em 1936, foi criado no bairro de Copacabana, onde se passa a maioria de suas
histórias. Formado em Filosofia e Psicologia, fez carreira acadêmica na
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Sua estreia na literatura acontece em
1996 com a novela policial O silêncio da chuva, na qual apresenta a
personagem detetive Espinosa, que protagoniza uma série de sequências do
gênero. Com a obra, vence os prêmios Nestlé e Jabuti. Nos últimos 20 anos,
Garcia-Roza se consolidou como um dos principais autores do gênero noir no
Brasil. Parte do sucesso é baseado na popularidade de Espinosa, personagem
culta, metódica e ética que já foi vivida pelo ator Domingos Montagner
(1962-2016) na série Romance policial: Espinosa, da GNT; no cinema,
é interpretado por Lazaro Ramos na adaptação, ainda inédita, do diretor Daniel
Filho para O silêncio da chuva. Entre o ano de estreia e 2014,
Garcia-Roza escreveu 11 romances, todos publicados pela Companhia das Letras.
Alguns dos mais conhecidos são Achados e perdidos (1998), Uma
janela em Copacabana (2001), Espinosa sem saída (2006), Céu de origamis (2009) e Um lugar perigoso (2014). Seu
último romance A última mulher, também com Espinosa como
protagonista, que investiga um homicídio na Lapa carioca. foi publicado em
2019. Internado há um ano por complicações neurológicas, o escritor morreu na
manhã de 16 de abril de 2020.
Morreu em
decorrência da COVID19, o escritor Luís Sepúlveda.
Luís
Sepúlveda nasceu em Ovalle, no Chile, a 4 de outubro de 1949. Autor de
prolífica obra, escreveu poesia, romances, contos e crônicas; trabalhou como
roteirista e jornalista; e esteve continuamente engajado na história política
de seu país. No golpe militar de 11 de setembro de 1973, que levou ao poder o
ditador general Augusto Pinochet, Luís Sepúlveda encontrava-se no Palácio de La
Moneda a fazer guarda ao Presidente Allende. A escalada do horror ditatorial o
levou a longo exílio, primeiro em Paris, depois na Espanha, onde vivia. Nesse
período, viajou e trabalhou no Brasil, Uruguai, Paraguai, Peru e no Equador
entre os índios Shuar, participando numa missão de estudo da UNESCO. Sepúlveda
era, na altura, amigo de Chico Mendes, resistente na defesa da Amazônia
assassinado em 1988. A ele dedicou O velho que lia romances de amor,
seu livro mais conhecido. Além deste, no Brasil publicou-se outros títulos como História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar (Companhia
das Letras, 2006), Mundo no fim do mundo (Relume Dumará, 1997), Diário de um killer sentimental (Relume Dumará, 2006) e A
sombra do que fomos (Nova Fronteira, 2012). Luís Sepúlveda recebeu vários
prêmios, entre eles, o Prêmio Casa das Américas (1970), o Prêmio Gabriela
Mistral de poesia (1976) e o Prêmio Eduardo Lourenço (2016). A 29 de fevereiro
de 2020, foi diagnosticado com COVID19, logo depois de participar do festival
literário Correntes d' Escritas, em Póvoa de Varzim, Portugal. O
escritor morreu neste 16 de abril de 2020 em Oviedo, na Espanha.
Morreu Rubem
Fonseca.
Rubem
Fonseca nasceu em Juiz de Fora, Minas Gerais, a 11 de maio de 1925. Formado em
Direito, exerceu várias atividades antes de se dedicar inteiramente à
literatura. Destas, destaca-se a vivência na polícia, como comissário, no 16º
Distrito Policial, em São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Em julho de 1954
recebeu uma licença para estudar e depois dar aulas de Psicologia na Fundação
Getúlio Vargas, também no Rio de Janeiro. Escolhido, com mais nove policiais
cariocas, para se aperfeiçoar nos Estados Unidos, entre setembro de 1953 e
março de 1954, aproveitou a oportunidade para estudar administração de empresas
na New York University. Controverso, foi um dos apoiadores do golpe militar de
1964; mais tarde, foi censurado pelo próprio regime. Autor de extensa obra com
forte interesse pela violência urbana, a solidão e as idiossincrasias íntimas
dos sujeitos, sua maior atuação foi na escrita de contos; a antologia mais
recente, Carne crua, foi publicada em 2018, e neste gênero estão
várias obras de destaque, como A coleira do cão (1965), Feliz
ano novo (1975), e O cobrador (1979). Como romancista,
destaca-se com Agosto, de 1990, em que retrata as conspirações que
resultaram no suicídio de Getúlio Vargas. Por diversas vezes recebeu o Prêmio
Jabuti (em 1969, 1983, 1996, 2002, 2003 e 2014). Em 2003 recebeu o Prêmio
Camões e em 2015 o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto da obra. Rubem Fonseca
sofreu um infarto no dia 15 de abril de 2020, perto da hora do almoço, em seu
apartamento, no Leblon.
DICAS DE
LEITURA
1. Três
livros para entrar na obra de Luiz Alfredo Garcia-Rosa
O silêncio da chuva. Uma das personagens principais criadas pelo mestre
do romance policial no Brasil é o inspetor Espinosa. E é neste romance de
estreia de Garcia-Rosa, com o qual recebeu os prêmios Jabuti e Nestlé de
Literatura (os dois em 1997) que o protagonista de outras de suas obras aparece
pela primeira vez. Este homem que costuma refletir sobre a vida (e a morte)
olhando o mar sentado em um banco da praça Mauá terá que desvendar um crime
acontecido no centro do Rio de Janeiro, onde um executivo é encontrado morto
com um tiro, sentado ao volante de seu carro. Além do tiro, único e definitivo,
não há outros sinais de violência. É um morto de indiscutível compostura. Mas
isso não ajuda: ninguém viu nada, ninguém ouviu nada. Vê-se que esse momento o
levará a muito o que refletir. De um lado, um morto surgido num
edifício-garagem; de outro, a incessante multiplicação de protagonistas do
drama. Tudo se complica quando ocorre outro assassinato e pessoas começam a
sumir.
Uma
janela em Copacabana. Dois policiais são executados em curto espaço de
tempo. Suas mortes têm muito em comum. Ambas as vítimas eram tiras de segundo
escalão, com carreiras medíocres. Foram eliminados pelo mesmo homem, um
assassino que dispara à queima-roupa e não deixa rastro. O mundo policial entra
imediatamente em rebuliço. Quem estaria disposto a correr o risco de sair
matando tiras, ainda que inexpressivos? Gente ligada ao tráfico? À própria
polícia? Em meio às confusões de seu cotidiano de livros sem estantes e
mulheres fugidias, o delegado Espinosa tem poucos elementos para desvendar o
caso, mas sabe que quem cometeu os crimes tem uma motivação forte. Se matar um
tira não costuma nunca ser um bom negócio, alguém deve ter concluído que
eliminar esses dois era uma questão de estrita necessidade – dos riscos, o
menor. Percorrendo as ruas de sua geografia predileta, entre os bairros do Leme
e de Copacabana, o delegado vai se deparar com outras mortes e com uma mulher
enigmática e insinuante, casada com um figurão da área econômica do governo
federal.
Um lugar
perigoso. São muitos os lugares perigosos deste livro. O primeiro é o
próprio Rio de Janeiro, onde a história se desenrola. Como de costume nos
romances de Garcia-Roza, a cidade é protagonista e sua geografia se torna parte
indissociável da trama. Outro lugar de perigos insondáveis é a memória do
professor Vicente, figura central neste enredo. Afastado da universidade em
razão de problemas de saúde, ele passa os dias em casa e ganha a vida como
tradutor, numa rotina aparentemente tranquila. Até que se depara com uma lista
cheia de nomes de mulheres. Quem são elas? Foram suas colegas na universidade?
Alunas? Por que ele as reuniu numa lista e que relação manteve com elas? São
questões que ele não tem como desvendar, pois sofre de uma síndrome em que as
lembranças se apagam e a imaginação toma o lugar dos fatos. Vicente busca a
ajuda do delegado Espinosa para descobrir o paradeiro das mulheres listadas.
Mas a investigação traz à tona os cantos obscuros de sua mente e pode revelar a
origem de crimes que nada têm de imaginários.
2. Três
livros para entrar na obra de Luís Sepúlveda
Um velho
que lia romances de amor. Este é o primeiro e mais premiado romance do
escritor chileno; ele se baseia em sua experiência na Amazônia para contar a
história de Antonio José Bolívar Proaño, um homem que vai viver com a mulher na
maior floresta tropical do mundo (num lugar remoto chamado El Idilio) e aprende
que a vida na selva não é para qualquer um. Ao sentir necessidade de se
transportar para um universo idílico, longe da cruel realidade da vida, o
protagonista passa a se interessar por romances de amor. Com os índios shuar
aprende a conhecer a selva e as suas leis, a respeitar os animais que a povoam,
mas também a caçar e descobrir os trilhos mais indecifráveis. Rubicundo
Loachamín é o “contrabandista” dos livros que passam a ocupar as solitárias
noites equatoriais da sua velhice anunciada. Com eles, procura alhear-se da
fanfarronice estúpida dos gringos e garimpeiros que julgam dominar a selva
porque chegam armados até aos dentes, mas que não sabem enfrentar uma fera a
quem mataram as crias. Descrito numa linguagem cristalina e enxuta, as
aventuras e emoções do velho Bolívar Proaño faz desse romance de Luis Sepúlveda
num clássico da literatura latino-americana. A tradução brasileira é de Josely
Baptista Vianna. E há várias edições dela por aqui.
História
de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar. Este é talvez o livro mais
conhecido do escritor que um dia prometeu aos filhos escrever uma história
sobre o mal que nós, humanos, fazemos ao nosso ambiente, prejudicando a
natureza e a nós mesmos. Assim nasceu este livro, que conta as aventuras de Zorbas,
um gato “grande, preto e gordo”, cujo elevado senso de honra faz com que se
comprometa a criar um filhote de gaivota. Kengah, uma bonita gaivota, é pega
por uma mancha de petróleo no mar do Norte quando mergulha atrás de um cardume.
Com a vida comprometida, ela ainda consegue voar até Hamburgo a tempo de botar
um ovo, que deixa aos cuidados de Zorbas, pouco antes de morrer. Zorbas é um
gato de palavra e cumprirá suas promessas: cuidar do ovo, criar o filhote e o
ensinar a voar. Os amigos de Zorbas – Secretário, Sabetudo, Barlavento e
Colonello – o ajudarão numa missão que não é tão fácil quanto parece, menos
ainda para uma turma de gatos mais acostumados a enfrentar a vida dura de um
porto como o de Hamburgo do que a servir de pais para um filhotinho de gaivota.
A tradução de Eduardo Brandão foi publicada pela Companhia das Letras.
Mundo do
fim do mundo. Este livro é uma grande homenagem aos escritores de aventura,
como Jack London, Robert Louis Stevenson e Julio Verne, mas, principalmente ao Moby
Dick, de Herman Melville. A narrativa se passa em dois planos: o das
lembranças de um adolescente, fascinado pela leitura do romance do
escritor estadunidense, aproveita as férias de verão para embarcar num baleeiro
e conhecer, nos confins austrais do continente americano, as terras onde o
mundo termina; e do presente, quando já adulto, jornalista e membro ativo dos
movimentos ecologistas, o acaso fá-lo regressar a essas paragens distantes por
uma razão distinta mas talvez igualmente romântica: a fauna marítima que habita
as águas gélidas e impolutas desse mundo do fim do mundo está a ser destruída
pela ação criminosa de navios piratas. Partindo de um exercício ficcional de
evocação da memória juvenil, impregnado de aventura e deslumbramento, Luis
Sepúlveda traça um belíssimo roteiro do Chile Austral. Simultaneamente, põe a
descoberto os obscuros interesses internacionais que sustentam a caça ilegal de
espécies protegidas, aqueles que a praticam e aqueles que corajosamente a
combatem, transformando a narrativa numa demanda pela salvação da vida do seu
mar. Esta é uma obra algo ambígua quanto à classificação do gênero literário,
já que se trata de uma fusão entre o romance e o relato ou narrativa, podendo
ser também incluída na categoria de literatura de viagens. A trama é empolgante
e cheia de peripécias, descrevendo uma verdadeira odisseia que atravessa a
Terra do Fogo de trem e o extremo sul da costa da Patagônia até ao Cabo Horn, a
bordo de um velho baleeiro: uma história que denuncia uma inesgotável sede de
aventuras. Uma viagem sentimental, carregada de emoção e suspense, através do
tempo e dos mares do sul. Está publicado no Brasil pela Relume Dumará em parceria
com a Garamond. A tradução é de Paulina
Wacht e Ari Roitman.
3. Três
livros para entrar na obra de Rubem Fonseca
Feliz ano
novo. Este é talvez um dos principais livros de contos da literatura
brasileira. Foi publicado em 1975 e com ele o escritor, apoiador e funcionário
do regime ditatorial de 1964, sentiu o que era a censura: foi recolhido pelo
Departamento de Polícia Federal por despacho do ministro da justiça
Armando Falcão dois meses depois de estar em circulação sob a acusação de
“exteriorizar matéria contrária à moral e os bons costumes”. O livro só foi
reeditado no final de 1989, quando o escritor finalmente ganhou uma batalha de
mais de década na justiça. Esta reunião de contos repletos de violência
com uma linguagem precisa e contundente apresenta ao leitor o melhor de um
estilo que veio se repetir livro a livro até se tornar gasto, mas único na
literatura brasileira contemporânea.
Agosto.
Este é o romance mais conhecido de Rubem Fonseca e rivaliza com alguns outros
títulos do gênero numa obra que foi sempre mais inclinada para o conto, como A
grande arte ou Bufo & Spallanzani. Parte da fama se deve
a adaptação realizada pela TV Globo para uma minissérie. O livro revisita
agosto de 1954, mês em que o Brasil assistiu uma escalada de crimes, atentados
e manifestações em meio a um dos períodos mais turbulentos da nossa curta e
frágil história política, mês que encerra com a morte de Getúlio de Vargas. É,
como disse Paulo de Francis, um livro que revive toda uma época das mais
intrigantes e com a sutileza de quem teve a experiência de ser cérebro das
ideologias que moldaram os tristes anos de ditadura no Brasil. É um livro que
nos questiona em que medida a história de uma pessoa e a história de um país se
determinam, se diferenciam e se assemelham.
O romance
morreu. Dificilmente este livro aparecerá nas listas de recomendações principais
de obras do autor, mas, como o interesse aqui é revelar ao leitor as mais diversas
faces que constituíram sua literatura, a recomendação é necessária. Porque aqui
se reúne uma parte das crônicas de Rubem Fonseca que versam sobre os assuntos
mais diversos: da queda do muro de Berlim, presenciada in loco por ele,
às relações entre cinema e pipoca, da masturbação ao Botox, de Michael Jackson
a Jack, o Estripador, isto é, assuntos e figuras das mais variadas que povoam o
universo da ficção de Rubem Fonseca: as viagens, o futebol, a pornografia, a mecânica
do crime, as astúcias da linguagem e o nonsense. Aqui se observa o escritor
num exercício escritural descontraído e despido da tensão com a qual modela sua
prosa ficcional.
VÍDEOS,
VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. Os
leitores que acompanham o blog já sabem sobre a publicação do novo trabalho de
fôlego do tradutor Trajano Vieira. Muitos anos depois de apresentar sua
tradução – uma das mais eruditas e recomendadas – da Odisseia, chega-nos
pela mesma casa editorial, a Editora 34, a Ilíada. Dos bastidores
da edição até agora, Trajano tem assumido o perfil do professor e nos oferecido
o que é praticamente um curso sobre essa epopeia em vídeos curtos e muito didáticos
disponíveis em sua conta no Instagram. Já recomendamos uma vez nos históricos de
nossas redes sociais, mas fica a registro de uma ótima companhia para os longos
dias de reclusão.
2. Quando a presente
seção era uma coluna aqui no blog, replicamos um vídeo que se tornou viral
entre os leitores portugueses e brasileiros de Rubem Fonseca. Data de uma época
quando o escritor começou por romper com o longo silêncio e as raras aparições
públicas. Isso foi de março de 2012, quando participou do festival português
Correntes d’Escritas. Pode voltar a rever sempre aqui.
BAÚ DE
LETRAS
1. Até o
presente (o que não é para sempre assim o tempo permita) ainda não editamos nenhum
texto sobre Luiz Alfredo Garcia-Roza, mas podemos recomentar, do nosso baú, algumas
outras entradas sobre os outros dois escritores:
a) Pedro
Belo Clara escreveu sobre História de uma gaivota e do gato que a ensinou a
voar, de Luís Sepúlveda. O texto dele pode ser lido aqui.
b) Na ocasião
dos noventa anos da primeira edição de A coleira do cão, de Rubem
Fonseca, quando o livro foi reeditado, Alfredo Monte escreveu sobre aqui.
c) Muito antes,
nosso editor Pedro Fernandes escreveu uma crônica sobre suas diferenças com a
obra de Rubem de Fonseca. O texto está disponível aqui.
2. Neste dia
18 de abril nasceu o escritor brasileiro Monteiro Lobato; pela sua inteira dedicação
à construção de um imaginário infantil com traços e cores do Brasil, a data foi
escolhida para celebrar o Dia Nacional do Livro Infantil. Recordamos sobre o
escritor três textos editados no blog:
a) Esta crônica
que apresenta alguns traços sobre / para um perfil de Monteiro Lobato e cuja
atenção se volta para ressaltar o papel do escritor noutras frentes de criação
literária que não apenas a literatura infantil pela qual ficou reconhecido.
b) Este texto
de Cesar Kiraly que examina atentamente as acusações de racismo contra Monteiro
Lobato, reabrindo outras interrogações sobre os itinerários das ideologias,
sobretudo as do politicamente correto.
c) E este texto de Antonella Flavia Catinari sobre a troca de correspondências entre Monteiro
Lobato e Lima Barreto. Os dois escritores, contemporâneos em seu tempo, estão
entre os principais nomes do que se designa de período pré-modernista no Brasil.
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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidades das referidas casas.
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