A viúva, de Pierre Granier-Deferre
Por Maria Louzada
Simone Signoret tinha 50 anos na
época. Alain Delon estava com 36. Duas lendas do cinema francês se encontram em La Veuve Couderc, de 1971, filme baseado em livro de uma lenda literária: Georges
Simenon. Simone vinha de outro sucesso, também baseado em Simenon, Le chat, ao
lado de Jean Gabin, dirigida pelo mesmo Pierre Granier-Deferre deste aqui.
La Veuve Couderc foi escrito por
Georges Simenon, aos 35 anos, em abril de 1940. Outro famoso escritor, o
francês Andre Gide, considerava este livro de Simenon como o “ápice da arte”;
achava que possuía semelhança com: L’étranger (O estrangeiro), de Albert Camus
(publicado em 1942).
Um canal, barcaças, uma ponte levadiça, um rio com altas e velhas casas de
cada lado contracenam com Alain Delon e Simone Signoret. Ela é uma mulher do
campo, amadurecida pela vida e sofrimentos passados, amarga, cabelos grisalhos
à vista e um corpo longe dos dias de sua juventude. Mas ainda desejável a ponto
de atrair o viajante sem rumo que por ali aparece num dia qualquer (Alain
Delon) e que é contratado por ela.
A viúva Couderc vive na fazenda onde no passado, trabalhando como empregada, foi abusada sexualmente pelo pai e pelo filho,
casando-se depois com este último, de quem acabou herdando a propriedade. Ela é
perseguida pelo ódio da família vizinha, a do falecido marido, que quer
lhe tomar a fazenda a qualquer custo.
Entre olhares intensos trocados devagar
pelos protagonistas, pouco a pouco nasce um envolvimento; a viúva e o jovem,
belo e ambíguo contratado, o que leva a mais perseguição familiar. É a época da
extrema direita francesa, 1934.
A viúva, vestida como as outras viúvas da
região, sapatos pretos, meias pretas, casaco preto, luvas pretas, bolsa preta e
chapéu preto, entrega seu coração e corpo ao forasteiro, ao desconhecido, não questionando
nem quando a polícia aparece procurando-o. Por ele, ela compra um chambre de
cetim e renda na cidade e por ele ela o veste a noite, olhando-se no espelho,
por ele espera, enquanto ele se deita com a beleza e juventude da filha (Ottavia
Piccolo) de sua cunhada que a odeia.
A cena do baile no vilarejo é lindamente construída com toda sua
rusticidade, a música de acordeão tocada em discos, enquanto as cinturas
femininas enlaçadas pelas mãos masculinas, com vestidos de diferentes cores,
sendo rodopiadas com rapidez e acompanhadas nesse bailado louco pela câmera.
Depois, quase no desfecho, a viúva fica alguns segundos olhando o amante
dormindo no catre do sótão, onde acabou de dormir com ele, e quando ele acorda, ela lhe diz: “Eles não entenderiam, não é?” E a resposta dele: “Eles
nunca entendem”... Sem necessidade de maiores explicações, é o mundo contra o
último amor da viúva Couderc.
O cineasta Pierre Granier-Deferre (1927–2007) confessou certa vez que:
“O que me interessa é a loucura ordinária dos homens, aquela que cada um traz
em si e que aflora ao menor acontecimento. Eu não desprezo a ação, mas eu tenho
uma propensão para a psicologia”.
Após La Veuve Couderc, Simone Signoret e Alain Delon ainda farão um segundo
filme juntos: Les granges brûlées (O crime das granjas queimadas, 1973), dirigido
por Jean Chapot, mais uma vez baseado num livro de Georges Simenon, e
conseguem repetir o sucesso de bilheteria deste anterior.
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