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Mostrando postagens de fevereiro, 2020

Boletim Letras 360º #364

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DO EDITOR 1. Na semana seguinte, o leitor passará a encontrar textos de novos colaboradores aqui no Letras in.verso e re.verso. É a semana de estreia dos nomes selecionados da última chamada realizada em janeiro de 2020. Esteja atento. Leia, comente, compartilhe – é sua maneira de ajudar o trabalho desses autores. 2. Este boletim de Carnaval chega radicalmente light pela data em questão. Os embalos da vida pessoal, incluindo viagens, me levou (coisa que agora consigo sem culpa ou remorso) a não conseguir redigir tudo antecipadamente. Muito do material recolhido nesta edição foi copiado e revisado no celular – o que é duas vezes mais trabalhoso. Não deixo, entretanto, de honrar o compromisso. Obrigado pela companhia e, boas leituras! Publica-se pela primeira vez edição definitiva do único romance de Otto Lara Resende. LANÇAMENTOS Conjunto de textos escritos por Goethe ganha tradução integral pela primeira vez no Brasil . Divã ocidento-oriental é o resul

Pequenas notas críticas das memórias de Raymond Aron

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Por Rafael Kafka “As ideias matam, falei, mas a beleza e fragilidade do liberalismo está no fato de não abafar as vozes, mesmo as perigosas”, diz Raymond Aron em suas Memórias , na página 780. Na frase em destaque, percebe-se bem o clima da guerra fria, com a visão da chamada democracia liberal sendo garantidora da liberdade política plena. Aron se refere nela a uma “nova direita” que já nos fins da década de 1970 visava à tomada de poder com seu discurso autoritário e repleto de xenofobia, percebida mais especificamente na figura de Benny Levy. Dentro da lógica de um liberal, as visões aronianas são coerentes igualando os posicionamentos de tal nova direita com os regimes totalitários fascistas e comunistas. A democracia liberal é vista por esse teórico como uma espécie de terceira via diante desses dois tipos de totalitarismo e uma forma de regime que permite melhorias sociais e liberdade concomitantemente. Desse modo, cai por terra certo argumento de que a dire

Breve romance de sonho, de Arthur Schnitzler

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Por Pedro Fernandes Depois da leitura de uma manchete no jornal sobre o suicídio de uma tal baronesa D. (de Dubieski), Fridolin parte em disparada, primeiro para o suposto hotel onde ela havia sido levada pelas quatro horas da manhã e em seguida para o necrotério, a fim de confirmar se a morta era a misteriosa figura que se oferecera em sacrifício numa orgia na noite anterior para protegê-lo do mesmo fim ao qual foi condenada. Esse episódio se desenvolve tarde da noite – aliás, esse é período preferido de Arthur Schnitzler na composição desse romance – e, ao reencontrar o legista amigo, este, curioso com o interesse àquela altura, o questiona indiretamente ante a justificativa primeira que se tratava de um trabalho: “Eu já estava pensando”, diz Adler, “que tinha sido algum peso na consciência que o tivesse trazido até aqui no meio de uma noite de sono”. Fridolin assente: “É, tem a ver com consciência pesada, ou, ao menos, com uma questão de consciência”. A retomada de

Pablo Picasso, o poeta

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“Se fosse chinês não seria pintor mas escritor, escreveria minhas pinturas.” “No final de contas, todas as artes são apenas uma. É possível escrever uma pintura com palavras como é possível pintar sensações num poema.” (Pablo Picasso) Pablo Picasso. Foto: Gjon Mili A inclinação de Pablo Picasso para as palavras, a literatura, a poesia remontam aos tempos de infância e juventude, quando redigia pequenos jornais em forma de cartas e enviava aos seus pais. Mas, só se revela como escritor a partir de 1935, quando se viu imerso numa crise sentimental e criativa, ocasião que chegou a confessar para o seu amigo Jaume Sabartés que queria mesmo largar tudo, a pintura, a escultura e a poesia, para se dedicar exclusivamente ao canto. Sabe-se que isso não aconteceu, mas no mesmo ano de sua revelação poética, André Breton o consagrava através do seu texto “Picasso poète”, publicado no Cahiers d’Art . Mais tarde, em 1954, ele organizou e publicou Poèmes et Litographies (ver

Zelda Fitzgerald

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Bailarina, pintora e escritora, Zelda foi um pouco de tudo. Mas, para sua má sorte, casou-se com um homem que a fez entrar para a história como sua musa. E, pior, ele, um dos mais brilhantes escritores estadunidenses do século XX, era um possessivo e usou de todas as artimanhas para impedir que a companheira desenvolvesse quaisquer dos seus talentos. Os designativos de posse estão impressos na sua biografia, nos tristes episódios da vida conturbada, mas desde seu nome. Conhecemo-la como Zelda Fitzgerald e não por Zelda Sayre, a mulher nascida a 24 de julho de 1900 em Asheville, na Carolina do Norte. A família dela descendia dos primeiros colonizadores de Long Island, que haviam se mudado para o Alabama antes da Guerra Civil. Na época do nascimento de Zelda, os Sayre eram reconhecidos na região. Seu tio-avô, John Tyler Morgan, integrou o Senado dos Estados Unidos durante seis legislaturas; o avô paterno editava o principal jornal de Montgomery; e a avó materna era Willis Ben

O contista Jean-Paul Sartre

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Por Joaquim Serra Jean-Paul Sartre, Veneza, 1967. Jean-Paul Sartre acreditava que sua filosofia podia falar por meio de sua literatura. Nos contos de O muro (1939) isso fica evidente. Ao contrário da primeira versão de A náusea (1938) que mais parecia um tratado filosófico que um romance, uma boa dose de ação – em poucos espaços, isso é certo – não deixa de existir em alguns dos contos. Muito ainda no ritmo narrativo de A náusea (1938), Sartre prefere uma voz vinda dos motivos interiores do sujeito que olha para fora de si para tomar decisões e perceber – ou não – o acaso da vida, do que um narrador oitocentista, aquele que buscaria o apolínio ligado a um todo mais ou menos coeso. Em “O quarto”, dividido em duas partes, o narrador segue primeiro o pai que irá visitar a filha que mora com o marido que está louco. O narrador é contaminado por ele e por seus preconceitos e visão de mundo para, depois da visita frustrada do pai, permanecer com a filha Ève e penetrar no

Carnaval de engenho

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Por José Lins do Rego Ilustração de Santa Rosa para texto de José Lins do Rego. O Cruzeiro , 1941. O mestre Paizinho chegara para falar com meu avô. Era o mestre de música do Pilar e o presidente do clube “Os filhos da Candinha”. A conversa era curta. Ele dava a lista, o velho assinava os cem mil réis e falava mal dessa história de vadiação de carnaval. Deviam acabar com aquilo. Homem de respeito não devia andar metido com danças, em brincadeiras de entrudo. O Chico Xavier precisava abrir os olhos, tomar providências. Havia gente na vila que só pensava em carnaval, que andava perturbando o sossego dos outros.   O mestre Paizinho ouviu tudo calado. Depois o velho entrava e voltava com os cem mil réis.   — Tome lá, dizia ele, mas não apareçam aqui no engenho. Não quero saber de patifarias. O ano passado vocês foram abusar do Lula de Holanda. Se souber de coisa semelhante, mando o Chico Xavier metê-los na cadeia.   Depois o mestre Paizinho vinha conversar com as minhas tias. E falava do

Boletim Letras 360º #363

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DO EDITOR 1. Não posso deixar de comentar na abertura deste Boletim sobre o incidente registrado no último dia 18 de fevereiro e notificado em todas as redes sociais do Letras; um anônimo – com expressões ideológicas, entretanto, muito claras – escreveu um comentário na caixa do blog no texto-resenha publicado aqui no início de janeiro de 2020 sobre o romance Essa gente , de Chico Buarque (Companhia das Letras, 2019). O episódio de grosseria não é o primeiro. Mas, com o rigor do ódio, sim. Quando divulguei a nota em nome do blog foi, primeiro, para mostrar o posicionamento meu em relação ao caso e, claro, registrar publicamente a violência, além de me colocar em defesa dos inúmeros leitores, fixos ou en passant que guardam profundo zelo pelas expressões artístico-literárias. 2. Agradeço pelas mensagens recebidas dos que acompanham a materialização de um projeto conduzido voluntariamente há treze anos. Saiba que guardo profundo carinho, e o sentimento de todos os colaborad