Boletim Letras 360º #359
Regressamos
com a programação quase normal. Desde segunda-feira, 20, estamos outra
vez com os textos diários no blog e a inserção preciosa dos nossos colunistas. E
voltamos a lembrar sobre a chamada aberta até o próximo dia 31 para seleção de
novos colaboradores com o Letras in.verso e re.verso. Então, se você escreve
sobre literatura e cinema e gostaria de fazer circular suas leituras – ou conhece
alguém com esse perfil – não deixe de conhecer nossa proposta. Informe-se
diretamente aqui ou enviando uma mensagem para nós através do e-mail blogletras@yahoo.com.br;
sua participação, direta ou indiretamente, é a propulsora da continuidade do nosso
trabalho. A seguir tem à vista as notícias da semana que circularam pela nossa
página no Facebook e retorno das seções de costume deste Boletim.
Projeto revisita em várias frentes a obra de Hilda Hilst. |
Segunda-feira,
20 de janeiro
Nova edição
de Alexandre e outros heróis, de Graciliano Ramos.
O escritor
une o real ao imaginário, cabendo ao leitor demarcar a fronteira entre outros
territórios nesta nova edição de sua obra clássica.Alexandre e outros heróis
traz histórias folclóricas sobre heróis e grandezas – todas elas inverossímeis.
“De certa forma, a obra representa uma rendição de Graciliano Ramos, que
resolveu dar trégua à contundência com que procurava revelar as condições
inóspitas da região em que nasceu. O leitor sai das páginas com a
impressão de que o autor tenha por momentos interrompido a sua disposição de
combatividade e procurado conviver com a realidade que tanto desejou
transformar. Depois de perseguir o enredo imaginoso nos seus textos, o
ficcionista aceitaria agora até mesmo a anedota. O drama cedeu o passo ao humor
e ao exótico. A personalidade de Alexandre, bem trabalhada, é a viga mestra que
sustenta o todo da narrativa”, como escreveu Rui Mourão no Posfácio da obra.
Nova edição
do romance escrito por Aldous Huxley durante a Segunda Guerra Mundial
O
tempo deve parar percorre sobre os dilemas de um jovem na Europa do
início do século XX, a ascensão do fascismo e os conflitos ideológicos
emergentes. O livro narra a história de Sebastian Barnack, um jovem inglês
aspirante a poeta que vai passar as férias de verão com seu tio em Florença. Ao
entrar em contato com um novo universo. Seu aprendizado neste período passa
pelos ensinamentos de dois mestres bem distintos: Eustace, seu tio, um ateu
convicto que o apresenta aos prazeres profanos da vida; e Bruno Rontini, um
vendedor de livros italiano que o introduz ao caminho da espiritualidade e o
ajuda a resolver um crime. Entre duas visões diferentes de mundo, o jovem
Sebastian vai enfrentar um dilema ético, tendo como pano de fundo os conflitos
ideológicos do início do século XX e o crescimento de um regime totalitário. A
tradução de Maria Luísa Alba sai pelo selo Biblioteca Azul, da Globo Livros.
Terça-feira,
21 de janeiro
Os contos de
D. H. Lawrence que continuam a explorar um tema que lhe foi caro: a vida feminina.
Poucos
escritores penetraram tão fundo na alma feminina quanto D.H. Lawrence
(1885-1930). Com uma franqueza tida como escandalosa em seu tempo, foi Lawrence
o primeiro grande autor a abordar o desejo sexual das mulheres e sua realização
– muitas vezes desafiando o domínio masculino – em romances fundamentais do
modernismo inglês como O arco-íris, Mulheres
apaixonadas e O amante de Lady Chatterley. Voltando-se para a
não menos importante produção de contos, a editora Caramabaia lança a antologia
As mulheres contam, com sete textos escritos entre 1910 e 1927,
organizados e traduzidos pela primeira vez no Brasil por Patrícia Freitas,
autora também do posfácio. Em todos os contos, é central a presença das
personagens femininas – inquietas, complexas e quase sempre insubmissas. Dois
deles costumam frequentar as antologias de melhores histórias curtas em língua
inglesa do século XX: “Odor de crisântemos” e “Você me tocou”. O primeiro trata
da tomada de consciência de uma mulher sobre o lugar de sua afeição no mundo
medíocre em que vive, e o segundo descreve o jogo de dominação entre duas
irmãs, seu pai e o irmão adotivo. Embora o lugar de Lawrence no cânone
literário esteja mais do que assegurado, sua vida e obra nunca foram consenso,
em parte pelas ambiguidades expressas por ele próprio. Sua obra prima, o
romance O amante de Lady Chatterley, foi condenada por feministas
dos anos 1970, pela dominância conferida à virilidade. Nos contos de As
mulheres contam, no entanto, Lawrence soa como um pioneiro da luta pelos
direitos da mulher, sobretudo ao próprio corpo e à vontade individual. Uma das
poucas certezas sobre as ideias do autor, porque ele a afirmou repetidamente, é
que considerava a repressão sexual a principal inimiga da civilização europeia.
É exatamente nessa perspectiva que estes contos estão agora reunidos. A
história que abre o volume, “Bilhetes, por favor”, narra a vingança de um grupo
de funcionárias de uma ferrovia contra um colega metido a conquistador. “O
batizado” fala do estigma da gravidez anterior ao casamento. “Nada disso” trata
dos reveses sofridos por uma mulher independente. “Fanny e Annie” trata da
covardia de um homem que engravidou uma mulher. E “Festa do Ganso” enfoca o
envolvimento amoroso entre diferentes classes sociais. A maioria das histórias
se passa nas Midlands, região de minas de carvão na Inglaterra onde trabalhava
o pai do escritor e que será cenário da maior parte das obras de Lawrence. No
projeto gráfico de As mulheres contam, de Tereza Bettinardi, foi
adotada uma tipografia que remete à usada nos cartazes do movimento sufragista
inglês (luta das mulheres por direito a voto, alcançado em 1918), contemporâneo
aos contos de Lawrence.
Quarta-feira,
22 de janeiro
Os discos de
poesia que podem chegar ao Youtube.
Aleatoriamente
é possível encontrá-los na rede de vídeos. Mas, um trabalho em andamento pode
apresentar em breve esse material online. É o recuperação do selo Festa, que
publicou entre 1955 e 1971 mais de meia centena de discos com nomes da
literatura brasileira moderna. Dessas produções a mais interessante são as que
reúnem autores na leitura de seus próprios textos; num deles, pode-se ouvir o
poeta Manuel Bandeira entre a récita e cantarolando ritmos, algo que não deixou
de ser exercitado por figuras como Carlos Drummond de Andrade – trabalhos que
acrescentam novas nuances à obra desses escritores. Com esses dois é possível
encontrar João Cabral de Melo, Cecília Meireles, Murilo Mendes, Paulo Mendes
Campos, Vinicius de Moraes, Guilherme de Almeida, Mario Quintana, Erico
Verissimo e a lista expande-se. Aguardemos.
Projeto
“Revelando Hilda Hilst”.
O Museu da
Imagem e do Som — MIS de São Paulo celebra a vida e obra da escritora, poeta e
dramaturga Hilda Hilst (1930-2004) no ano em que se comemora 90 anos do seu
nascimento. Com curadoria do artista visual e jornalista Jurandy Valença e
co-realização da Caboclas Produções, o projeto apresenta uma exposição de
retratos de Hilda, alguns deles inéditos, desenhos de sua autoria nunca antes
exibidos em público, além de quinze edições originais dos livros de Hilda. A
mostra se completa com a instalação sonora Rede Telefonia, de Gabriela Greeb e
Mario Ramiro, na qual é possível ouvir a voz da autora por intermédio de
gravações originais realizadas na década de 1970, quando ela tentava se
comunicar com o além. Já a programação paralela traz leituras de seus poemas,
com convidados como Cida Moreira, Marina de La Riva e Dudu Bertholini, entre
outros, além da exibição dos filmes Hilda Hilst pede contato (dir. Gabriela
Greeb, 2018) e O unicórnio (dir. Eduardo Nunes, 2018), e a leitura dramática
de uma de suas peças, “O visitante”, escrita em 1968 em plena ditadura militar.
Tudo começa a partir de 1º de fevereiro e segue até 15 de março de 2020.
Quinta-feira,
23 de janeiro
Novo título
na reedição da obra de Graham Green.
Graham
Greene viajou ao México em 1938 para observar de perto a campanha
antirreligiosa imposta pelo governo local e os efeitos desta prática sobre a
população da província de Tabasco. Anos depois, viria a afirmar que sua
conversão ao catolicismo se iniciara ali, ao testemunhar a fidelidade das
pessoas à religião perseguida, e como isto o comoveu profundamente. O
poder e a glória é o relato ficcional que surge dessa experiência ― o
livro foi publicado dois anos depois de sua viagem, e ganhou esta tradução para
o português em 1953, pelas mãos de Mario Quintana. Uma narrativa sobre razão e
fé, materialismo e espiritualismo; que provocou controvérsias com a Igreja
Católica e é considerada a obra-prima de Greene. A nova edição, publicada pelo
selo Biblioteca Azul / Globo Livros traz um texto inédito de John Updike.
Sexta-feira,
24 de janeiro
Os livros
por vir. Sai em março no Brasil um novo livro do escritor e pensador italiano
Umberto Eco.
Trata-se do
título Migração e intolerância, que traz dois ensaios inéditos por aqui e
conta com nota de apresentação de Stefano Eco, filho do autor. O livro é
composto de quatro ensaios curtos. Os ensaios “Um novo tratado de Nijmegen” e
“Experiências de antropologia recíproca” foram extraídos, respectivamente, de
um discurso proferido em 2012, na Universidade de Nimegue, na Holanda, e
da introdução a uma antologia de texto sobre antropologia recíproca, publicada
na França em 2011. Os textos foram escolhidos por sua relação com os temas das
imigrações e da intolerância, que têm obrigado o mundo, em especial os países da
Europa, a defrontar-se com a própria história e os próprios valores. Com base
nos argumentos válidos e eficazes propostos por Eco, o leitor é convidado a
pensar sobre temas hoje ainda mais atuais e urgentes do que na época em que os
ensaios foram redigidos. Os outros dois ensaios do livro foram originalmente
publicados no livro Cinco escritos morais, lançado no Brasil pela
Record em 1998 e que, atualmente, está em sua 9ª edição, somando mais de 14 mil
exemplares vendidos.
Três novos
títulos da coleção Bibliofilia, preparada pela Ateliê Editorial / Edições
SESC-SP com projeto gráfico de Gustavo Piqueira & Samia Jacintho – Casa Rex.
1. O que é um livro, de João Adolfo Hansen.
Neste volume
o autor nos convida a refletir sobre os múltiplos significados do livro,
palavra que se converte em uma ideia; ideia que se materializa em um objeto. Os
caminhos de exploração são abertos e se tornam tanto mais ricos quanto maior a
erudição do autor. Tal perspectiva sugere imagens e situações diversas, até o
momento em que o leitor descobre que ele também faz parte dessa construção.
2. Da argila à nuvem, de Yann Sordet.
Desde o seu
aparecimento, no segundo milênio a.C., o catálogo acompanha o desenvolvimento
da cultura escrita, testemunhando uma ambição fundamental, ligada à própria
origem da ciência e da cultura: nomear, descrever e classificar o universo. Das
tabuinhas de argila aos catálogos hoje desmaterializados nas “nuvens”, essas
ferramentas revelam uma tipologia complexa. Não obstante, elas foram concebidas
com funções tão diversas quanto contraditórias: a busca de textos, a
conservação da memória, o transporte de uma coleção, a censura aos livros, a
disseminação de um fundo, o comércio e a circulação da escrita.
3. A sabedoria do bibliotecário, de Michel Melot.
Neste livro,
o autor presta uma homenagem ao bibliotecário. A importância desse profissional
se revela em diversas situações: ao auxiliar o leitor perdido em uma infosfera
atordoante; no embate entre comunicação e preservação, considerando que a
saciedade do leitor coloca em risco a própria integridade do objeto lido ou
consumido; na condição de sujeito anônimo, destinado a servir sem ser visto e a
acolher sem ser notado. Tudo isso porque o bibliotecário está imerso em um
mundo muito particular, “em um lugar indispensável, onde o saber decanta”.
DICAS DE
LEITURA
Retomamos essa
seção do Boletim Letras 360º recomendando alguns títulos que começaram a
circular neste início de 2020. São três obras que, aos olhos do editor do blog,
guardam aquela chama que nos leva à curiosidade pela leitura.
1. As pequenas
virtudes, de Natalia Ginzburg. Quando a Cosac Naify, casa editorial que
iniciara o trabalho de nos recolocar em contato com a obra da escritora
italiana, fechou, este livro se tornou uma espécie de produto cobiçado entre os
leitores. E os livreiros movidos pelo lucro não deixaram de carregar nos valores
de venda. Ao que parece isso – fenômeno não isolado em relação aos livros
publicados pela extinta editora – ganha um freio quando, enfim, a Companhia das
Letras, que tem assumido a reedição de Natalia Ginzburg entre nós, apresenta uma
nova edição. É provável que muitos leitores tenham guardado a ansiedade de ler
este livro buscando esperar por esse momento que melhor abre o ano de 2020. Os textos
reunidos nesta pequena joia foram escritos entre 1944 e 1962; são onze relatos
situados entre o ensaio e a autobiografia divididos em duas partes: na
primeira, figura o período em que a autora morou em Londres e a personagens
centrais na sua vida, como o poeta Cesare Pavese e seu segundo companheiro
Gabriele Baldini; na segunda, estão textos como “O filho do homem”, uma
avaliação sobre as sequelas da guerra, e “O meu ofício”, em que a escritora
examina suas relações com a literatura. Descrito por Italo Calvino como “Uma
lição de literatura”, este é, portanto, entre os leitores que ainda não leram, um
bom livro para o começo de ano.
2. As
mulheres contam, de D. H. Lawrence. Esta é uma antologia organizada por
Patrícia Freitas para a Editora Carambaia, cf. as informações apresentadas na
primeira parte deste Boletim. O livro traz sete textos escritos entre 1910 e
1927 e é uma excelente oportunidade de conhecermos outra das múltiplas facetas
do escritor fundamental para o modernismo inglês. Sabe-se que Lawrence foi o
primeiro a abordar o desejo sexual das mulheres e sua realização e em nas
várias recorrências ao tema é o próprio domínio masculino o que se coloca em
questão; exemplo notável se oferece em O amante de Lady Chatterley,
apresentado em edições diversas por aqui e renovadas vezes censurado em seu país
de origem. O leitor tem, agora, a primeira oportunidade de continuar a
investigar esse tema principal na chamada prosa curta de Lawrence, uma vez que
este constitui a dorsal para a realização da antologia recomendada.
3. Ensaios
sobre a jukebox / Ensaios sobre o louco por cogumelos, de Peter
Handke. Os dois breves livros apresentados pela Estação Liberdade são ao
mesmo tempo uma das maneiras de entrar no universo criativo do escritor que
recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 2019 e de conhecer outra de sua face
mais prolífica. O primeiro título é apresentado como um trabalho que foge
completamente de qualquer cronologia linear e de processos narrativos
convencionais, compondo uma rica metafísica sobre o cotidiano ou sua revelação
à luz da criação handkeana. O segundo se mostra um complexo e duvidoso autorretrato
do próprio escritor que se olha em confronto com ele próprio, recompondo-se
parodisticamente no trabalho com a escrita e outra vez a irrupção do tempo em
curso.
VÍDEOS
VERSOS E OUTRAS PROSAS
Durante todo
o ano de 2020, dois nomes não faltarão nas rodas literárias – Clarice Lispector
e João Cabral de Melo Neto. Nesta ocasião passam-se os cem anos dos dois. O do
poeta pernambucano principiou no último dia 6 de janeiro cf. lembramos em todas
as redes sociais do Letras. Aproveitamos a ocasião para citar.
1. Este vídeo compila com uma variedade de passagens de entrevistas concedidas por
João Cabral e que constitui um rico tecido sobre sua obra e a relação do
criador com o poético e a poesia.
2. A edição
de janeiro do Suplemento Pernambuco traz um especial sobre a obra de
João Cabral de Melo Neto. O material está disponível em PDF, aqui.
BAÚ DE
LETRAS
1. E neste endereço
é possível re-visitar as várias publicações realizadas pelo blog Letras
in.verso e re.verso sobre o poeta de Morte e vida severina.
.........................
* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidades das referidas casas.
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