Morangos mofados, 2019
Por Amanda Lins © David Salle “Eu era apenas um corpo que por acaso era de homem gostando de outro corpo, o dele, que por acaso era de homem também”, pensa o personagem de Caio, tranquilamente, numa terça-feira de carnaval. Como poderíamos pensar eu, ou você. A humanidade e absoluta simplicidade da frase assim, solta, me engancha ao conto. Há algo de não-estou-dizendo-aqui-nada-de-extraordinário e ao mesmo tempo de deveria-ser-simples-assim-mas-não-é nesse mundo arquitetado que lembra demais o nosso para que passe despercebido, sem desencadear uma espécie de comichão nas entranhas. Continuo a ler, já transmutada para uma festa de carnaval, uma matinê no Rio, um bloco em Olinda um trio em Salvador, lança-perfume espalhado no ar e dois - por acaso - homens, fantasiados. Por acaso, flertando. Algo me angustia nessa troca de olhares, na proximidade da carne. Algo que ainda não sei racionalizar de onde vem e por que está ali. É o mesmo comichão. A narrativa anda. O sa