Os melhores de 2019


 Por Pedro Fernandes

Ilustração: Rachel Gannon


O ano que agora termina foi de árduo trabalho. Mas, a melhor das sensações para momentos como esse, de retrospectiva com sublinhado para o marcante, é a de dever cumprido. Não que tenha estabelecido metas de leitura. Não. Tenho verdadeiro pavor ao termo quando me refiro a escolhas de livros, filmes e quaisquer outros objetos artísticos. Não deixo de imaginariamente construir minhas listas. Agora, metas nesse sentido, quase sempre resultam em frustração e angústia, porque não se é possível obedecer a um ritmo mecânico, puramente. Bom, talvez esse motivo se justifique pela minha própria vivência com a leitura: sempre dividida entre a liberdade e a obrigação de ler. É que, quando o assunto é ler para estudar, o ritmo nunca se impõe como espontâneo.

Muito do que li e gostaria de recomendar nas listas, sobretudo na prosa, não aparece aqui. É que, diferentemente das listas anteriores, em 2019, utilizei com um critério, depois de formada a sequência final de todas as leituras realizadas, naqueles livros que estão mais acessíveis aos leitores. Levo em consideração esse aspecto, porque sei que, mais que a curiosidade em equiparação aos gostos, essas eleições findam, por vezes, a oferecer roteiros futuros para outros leitores. Assim é que não se apresentam aqui livros como Eliete, a primeira parte da trilogia em execução ainda da Dulce Maria Cardoso, Sinais de fogo, de Jorge de Sena, Uma abelha na chuva, de Carlos de Oliveira ou Autobiografia, de José Luís Peixoto. Obras, como veem, majoritariamente da literatura portuguesa, devido aos meus interesses de atuação como pesquisador e professor.

Nas duas listas de leitura, olhando-as depois de concluídas, chama atenção que as determinações casuais e o interesse por conhecer novas dicções poéticas continuam sendo guia nas escolhas. São raras as leituras dos mesmos escritores e, no campo da poesia, é grande a recorrência de poetas que estão em seus momentos de produção. Na sequência dos livros de poesia, sobre poucos escrevi e alguns não cheguei à finalização da leitura. Leio com muito vagar, embora diariamente, este gênero. A poesia exige-nos, bem sabemos, um ritmo peculiar em relação à prosa. Sobre alguns desse livros espero poder pensar mais e escrever, sem compromisso, notas e observações que poderão ou não se apresentar neste blog.

A intensidade do convívio com os livros me colocou mais distante do visual. A lista de filmes que é apresentada é quase tudo o que vi em 2019. Sempre estamos perdendo coisas e outra vez perdi meu computador com quantidade bastante elevada de produções cinematográficas que gostaria de ter visto e comentado. Isso, mais que o convívio com os produtos verbais e os afazeres editoriais e acadêmicos, me causou certo bloqueio para o ritmo comum que aplico entre livros e filmes. Que eu possa superar esse trauma no ano vindoura.

Bom, e sobre o blog, que interessará mais ao leitor saber que as confissões pessoais, tudo continuará com praticamente o time conhecido – é dele o melhor do trabalho apresentado diariamente nas páginas do Letras: 3510 em 13 anos online. Com quem aqui escreve tudo fica sempre melhor. Para o Letras, não foi um ano simples, mas acredito que a força de o fazer diferente é sempre nossa e não alheia. Tem sido essa a aposta mais ou menos in-consciente. Que isso nos sirva de lição para os tempos de cruel tempestade que atravessamos. Essa atitude deve ser uma urgência – ou pereceremos todos. Em 2020, por exemplo, um ano marcado por duas grandes efemérides, sobretudo na literatura brasileira – é centenário de João Cabral de Melo Neto logo à entrada e, na saída, centenário também de Clarice Lispector – sonhemos ler mais a obra desses dois excepcionais criadores e reconhecer melhor nossa frágil literatura.

Dito isso, estão postas as listas. Não foi interesse estabelecer nenhum ranqueamento como poderá sugerir a sequência de sua organização. Minhas escolhas, embora motivadas para um público leitor e para uma heterogeneidade de criadores, criações e grupos editoriais, visam sempre revelar o que me pegou pela mão e levou a outro lugar diferente do meu, isto é, o que chamou atenção, me provocou com novas reflexões, saídas do lugar-comum e aprendizagens variadas.



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