Opinião de uma leitora que não gostou da Valderez
Por Flaviana Silva
Ler uma obra da Elvira Vigna é sempre um prazer,
primeiramente porque sua escrita é construída nas bases de um riso irônico, o
que agrada bastante, e porque é importante considerar que as questões sociais envolvendo
suas personagens saltam aos olhos do leitor. Em Por escrito, a narradora
Valderez fala sobre os acontecimentos banais do seu dia para o amante; todo o
romance é um relato direcionado para esse homem que nunca foi capaz de
satisfazer suas vontades e sempre mantém com ela uma relação de distância.
A personagem, apesar de ser a protagonista da história, não
tem muita ação diante da sua própria vida: ela trabalha em uma empresa que não
gosta, participa de encontros sociais que não a deixam confortável; vive, enfim,
uma rotina cheia de obrigações que não a agradam e a todo tempo busca uma razão
para ser e não encontra. Apesar de tudo, ela apenas segue, narrando detalhes
dos seus dias vazios sem nenhuma intensidade.
Se tem algo que não se encontra nesse romance é
interioridade nas relações, tudo é muito frio e fragmentado, algo que é
perceptível também noutro romance da autora; em Como se estivéssemos em palimpsesto
de putas encontramos outra vez uma personagem que não tem noção diante das
suas decisões diárias e leva os dias sem muita motivação.
Em Por escrito a narrativa é engraçada em vários
pontos. O pensamento da Valderez permite ao leitor encarar de frente a
hipocrisia existente nas amizades profissionais, sem esquecer que ela se coloca
no lugar da mulher de seu amante e ironiza essa questão do casar por amor, que se
configura como algo convencionado para alguns grupos sociais. Acredito que
essas questões são fundamentais para considerarmos essa leitura interessante.
Ao levar em consideração que o narrador é aquele que dá
forma a narrativa, é possível considerar que a escolha dessa personagem que
narra para o amante é proposital, tendo como principal objetivo causar um
desconforto no leitor, mostrando que a realidade é de certa forma, similar ao
enredo dessa história, dias vazios, com relações efêmeras, sem grandes
realizações. É devido a esse recurso que em vários momentos da leitura ficamos
chateados com a Valderez: ela observa e narra a vida de suas amigas, tece um
mistério em torno dessas histórias, ama e admira algumas delas, mas não tem
pretensão em agir sobre seus desconfortos. Ela foge do assunto que queremos
descobrir e nos engana através de descrições banais.
O ato de escrever um modelo de diário sobre suas viagens de
negócios explica esse título do romance, na verdade a própria noção de registro
é algo familiar ao mundo da metalinguagem, uma leitura atenta e desprovida de
premissas é essencial para compreender que a narradora atingiu seu principal
objetivo: enfadar o leitor e rir de suas rotinas.
Comentários