Boletim Letras 360º #340
Iniciamos em nossa conta no Instagram uma nova campanha de divulgação: sim, é podemos designar assim as promoções. Desta vez, vamos sorteamos entre os leitores que acompanham o blog naquela rede social um exemplar de O quarto de Jacob, de Virginia Woolf. O livro em questão é a recente tradução realizada pelo Tomaz Tadeu para a coleção com a obra da escritora inglesa editada pela Autêntica Editora. Você pode saber mais sobre os livros que integram essas publicações aqui. A edição colocada em sorteio saiu entre nós em junho de 2019, cf. foi notícia numa dessas edições do Boletim Letras 360º. Para se inscrever no sorteio é muito simples: basta seguir o Letras através do IG @Letrasinverso; aí encontrará uma publicação que traz todas as informações sobre como participar. Há ainda vários links aqui pelo blog, incluindo no rodapé desta post, que permitem acesso a essa e outras redes sociais. Antes disso, pode visitar as notícias que passaram por outra página do Letras nas redes sociais, o Facebook; já curte e segue o blog? Boas leituras!
Dois livros de Patti Smith ganham tradução no Brasil. Mais detalhes ao longo deste Boletim. |
Segunda-feira,
09 de setembro
As livrarias
portuguesas receberão uma edição com cartas inéditas de Agustina Bessa-Luís e a
continuidade de reedição de seus romances.
São as
missivas trocadas entre a escritora e Juan Rodolfo Wilcock, dois escritores
“com afinidades”, que relata “as suas viagens” e em que se fala da vida e da
literatura. Além deste volume, com prefácio de Ernesto Montequin, sai uma nova
edição do romance O sermão de fogo, publicado originalmente em
1963. Este conta a história de Amélia, uma criada de servir, filha de
camponeses, que conhece um “destino surpreendente”. Através dela, são
apresentadas “uma série de personagens e destinos arrastados na sua órbita”. Os
livros saem neste mês de setembro, pela Relógio d’Água; a casa editorial tem
vindo reeditar a obra completa da escritora portuguesa que morreu a 3 de junho
de 2019. Ainda este ano, em novembro, deve sair uma nova edição do romance
Prazer e glória (1988).
Nova edição
e nova tradução para os contos de As mil e uma noites.
Depois da
traição de sua esposa, o sultão Shahriar decide se casar com uma jovem
diferente todas as noites para, na manhã seguinte, matá-la. A resoluta filha do
grão-vizir, Sherazade, se oferece em casamento ao sultão visando acabar com
esse castigo e salvar a vida de centenas de mulheres. Durante mil e uma noites,
ela o transporta para o extraordinário mundo das histórias, envolvendo Shahriar
e o leitor em narrativas mágicas sobre mercadores, gênios e ladrões, o que
garante a ela mais uma noite de vida, e, ao leitor, outro fantástico conto. Os
dois volumes em capa dura são reunidos numa caixa especial pela Harper Collins
Brasil. A tradução dos textos é de Alberto Diniz.
Terça-feira,
10 de setembro
O
assunto do céu é o novo título na coleção de que compila textos críticos
de C. S. Lewis.
Uma das
características que notabilizaram o acadêmico, escritor e crítico C.S. Lewis
foi sua extraordinária capacidade de abordar qualquer tema com perspicácia,
fosse em seus escritos ou suas palestras. Tal habilidade se mostrava ainda mais
peculiar pelo fato de boa parte das observações, dos comentários e das análises
que fazia serem fundamentadas em sua estrutura de valores cristã. Assim, deliberadamente
ou por acaso, disponibilizou vasto material com evidente teor devocional e
moral ao longo da extensão de sua obra. Fazendo as vezes de um garimpeiro, o
consultor literário estadunidense Walter Hooper se dispôs a selecionar trechos
especialmente inspirativos dos escritos de Lewis ― tarefa que não poderia ter
sido cumprida por melhores mãos, já que Hooper foi secretário particular do
autor de As crônicas de Nárnia em seus últimos anos de vida. O
resultado de sua pesquisa foi uma compilação de mensagens inspirativas para os
365 dias do ano reunidas em O assunto do céu. A tradução de
Giuliana Niedhardt, Francisco Nunes, Estevan Kirschner, Carlos Caldas e,
Gabrielle Greggersen sai pela editora Thomas Nelson Brasil.
As histórias
de fantasma escritas por Charles Dickens.
Charles
Dickens não escrevia apenas sobre crianças vitimadas pelas crueldades da
Inglaterra vitoriana. Ele também era um primoroso criador de histórias de
fantasmas. Essas histórias, conhecidas como ghost stories no mundo
anglo-saxônico, são uma joia na obra de Dickens. Compostas com o colorido, a
precisão e a concisão de um grande artista da narrativa, elas cumprem seu papel
de provocar medo no leitor, na medida em que mesclam o sobrenatural com a realidade
cotidiana, reconhecível para todos nós. Contos de fantasmas, sem
Natal que sai pela editora Nova Alexandria com tradução de Antonio Carlos
Olivieri, Maria Regina de Almeida e George Schlesinger reúne alguns desses
contos.
Reedição de
livro que reúne textos de Bartolomeu Campos de Queirós sobre a literatura.
A antologia
Sobre ler, escrever e outros diálogos, organizada por Júlio Abreu
volta às livrarias pela Global
Editora. O livro reúne textos de Bartolomeu Campos de Queirós de diferentes
épocas, publicados em revistas, suplementos pedagógicos e proferidos em
palestras. São textos que trazem o escritor em sua essência, como um filósofo da escrita e
da leitura, que relatam suas críticas e experiências em educação, na família e
na escola, e apresentam reflexões em torno do poder da palavra, da literatura e
do processo de sua escrita, tão poéticas e profundas quanto sua própria obra
literária. Obra essencial para quem já conhece e aprecia Bartolomeu, assim como
para quem não o conhece e se interessa pela arte de ler, escrever e estabelecer
os tantos diálogos possíveis e necessários à existência humana.
Quarta-feira,
11 de setembro
Segundo
volume da trilogia de Milton Hatoum, que entrelaça o período da ditadura
militar brasileira aos anos de formação de um grupo de jovens acossados pelo
golpe e pelos sonhos de liberdade.
A empreitada
literária “O lugar mais sombrio”, trilogia que acompanha a formação
sentimental, cultural e política do jovem Martim durante a ditadura militar
brasileira, teve início com o romance A noite da espera (2017), que se
desenrola nos anos 1960 na recém-construída capital do país. Neste segundo
volume, o protagonista deixa Brasília e retorna a São Paulo, sua cidade, onde
ingressa na faculdade de arquitetura da USP e passa a morar numa república de
estudantes no bairro da Vila Madalena ― um grupo que lhe trará novas vivências
e grandes companheiros para a vida. Agora distante do pai opressor e dos amigos
de Brasília, e sobretudo afastado de Dinah, a atriz militante com quem sua
relação ficou estremecida, ele acompanha o endurecimento do regime autoritário
no país, ao mesmo tempo que experimenta as agruras e adversidades da vida
adulta, sempre assombrado pela incógnita do desaparecimento de sua mãe. Um dos maiores nomes da literatura brasileira contemporânea, Milton Hatoum
volta a mostrar em Pontos de fuga a força de seus personagens e a incrível
capacidade de reencenar a história com sua ficção magistral.
A Companhia das Letras apresenta dois novos títulos da Patti Simth.
1. O ano do
Macaco acompanha uma Patti Smith prestes a completar setenta anos e precisando
lidar com a perda de dois amigos queridos ― seu mentor, o músico Sandy
Pearlman, e seu referencial artístico da vida toda, o escritor e dramaturgo Sam
Shepard. O ano é 2016. Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos e
Patti, na estrada, atravessa o país fazendo shows, deixando-se levar por sonhos
e delírios, adentrando a bruma de uma espécie de mundo das maravilhas muito
particular, onde a lógica do tempo não existe e os mortos podem falar. Nessas
memórias, a autora do aclamado Só garotos nos leva por uma delicada e surreal
jornada ao coração de um dos períodos mais turbulentos de sua trajetória. A
tradução é de Camila von Holdefer.
2. Devoção reflete sobre literatura e escrita. Neste livro
breve e delicado, Patti Smith, a lendária autora do disco Horses e do aclamado
livro de memórias Só garotos, oferece um relato íntimo de seu processo
criativo ― e uma reflexão poderosa sobre os mecanismos da escrita. Por que
escrevemos? De onde vêm as ideias para uma história? Como funcionam as
engrenagens da inspiração e da literatura? Dividido em três partes, o livro reflete sobre questões como essas. O relato se inicia com uma viagem da autora
a Paris. Percorrendo as “ruas abstratas de Patrick Modiano” e lendo uma
biografia de Simone Weil, Patti Smith começa a esboçar um conto, que vai se
materializar no segundo capítulo do livro ― a história de uma jovem patinadora,
sua jornada em busca de si mesma e de suas origens. Ao fim, Patti volta à cena
e narra uma visita à casa de Albert Camus, na cidade de Lourmarin, onde depara
com o manuscrito de O primeiro homem, romance inacabado do escritor argelino.
“Por que alguém se sente compelido a escrever?”, é a pergunta que nos acompanha
até o fim. “Para dar voz ao futuro, revisitar a infância. Para dar rédea curta
às loucuras e aos horrores da imaginação”, Patti diz. E porque, afinal, “não podemos
apenas viver”. A tradução é de Caetano W. Galindo.
A Companhia
das Letras continua reedição da obra de Caio Fernando Abreu.
Em sua obra
mais célebre, publicada em 1982, quando tinha trinta e quatro anos, Caio
Fernando Abreu faz transbordar de cada página a angústia, o desassossego e o
estilo confessional que o consolidaram como uma das vozes mais combativas e
radicais de sua época. A prosa visceral dos dezoito contos de Morangos
mofados ― potencializada pela hesitação coletiva de um país que vislumbrava a
redemocratização ante a falência incipiente do regime militar ― traduziu as
inconstâncias humanas mais profundas e continua, ainda hoje, arrebatando
leitores de todas as gerações. Para José Castello, que assina o posfácio
inédito desta edição, embora seja um livro de narrativas curtas, “a obra mantém
uma férrea unidade, em torno da coragem de se despir, da fidelidade aos sentimentos
mais íntimos e mesmo os mais terríveis, e ainda à dificuldade de ser”.
Um homem
sem profissão é o novo título da coleção Oswald Andrade.
Neste
primeiro tomo de suas memórias ― e o único que chegou a ser concluído ―, Oswald
de Andrade rememora sua infância, adolescência e juventude, entrelaçando as
lembranças familiares às transformações da cidade de São Paulo, que fervilhava
com a belle époque do final do século XIX e das primeiras décadas dos anos
1900. Esse registro também passa por sua formação intelectual e pelos primeiros
encontros com figuras que eram ― ou viriam a ser, como ele ― definidoras na
história cultural do país. Mais do que testemunho pessoal, essas páginas
revelam um trabalho literário ímpar, ao melhor estilo oswaldiano. Como afirma Antonio
Candido em seu “Prefácio inútil”, na produção do autor do Manifesto da Poesia
Pau Brasil, vida e romance “nunca estiveram separados, e a única maneira
correta de entender a sua vida, a sua obra e estas Memórias, é considerá-las
deste modo”. Além do prefácio à primeira edição, de 1954, este livro inclui um
texto inédito de Antonio Candido sobre Oswald de Andrade e um depoimento de
Jorge Schwartz sobre a visita que possibilitou o acesso ao último texto do
grande intelectual brasileiro.
A Companhia das
Letras publicará a obra de H. P. Lovecraft e este é o primeiro volume do
projeto.
Nascido em
1890, Lovecraft revolucionou o gênero literário do horror ao inserir em suas
histórias elementos típicos da fantasia e da ficção científica. Com um estilo
de escrita único, por vezes de vocabulário e ortografia conservadores,
Lovecraft elevou o terror a um patamar literário poucas vezes visto. Assim como
Edgar Allan Poe no século XIX, Lovecraft é visto por autores como Neil
Gaiman, Joyce Carol Oates e Stephen King como um dos principais autores de
terror do século XX. Neste primeiro volume da série “Biblioteca Lovecraft”,
traduzida e organizada por Guilherme da Silva Braga, encontramos textos
clássicos como “O chamado de Cthulhu” e “A sombra de Innsmouth”, e também
textos menos conhecidos como “Dagon” (espécie de breve preâmbulo aos mitos de
Cthulhu).
Romance de
grande humanidade, Francisco J.C. Dantas o constrói com um lirismo delicado e
tocante, o que aprofunda a ironia diante da crueza das vicissitudes, mas que,
por isso mesmo, lança um bote certeiro, a ponto de desarranjar a memória
coletiva e pedir respostas.
Durante os
preparativos para a Festa da Padroeira num lugarejo do interior do Sergipe,
Madrinha se acidenta na igreja e desencaminha a gravidez do quarto filho. Sinhá Amália, parteira titular da região, é buscada às pressas, mas mãe e criança
precisam de cuidados urgentes, quem sabe disponíveis na cidade mais próxima, ou
só em Aracaju. O ano é 1954. A condição das estradas é deficiente e são escassos os meios de
transporte. Resta apenas a Teodoro, o devotado marido, contar com os préstimos
de Zé Carreiro para transportar, até lá, a gestante no seu carro-de-boi. A peregrinação dá à luz um saber sobre um mundo ainda ignorado, que se abre e
fecha em armadilhas, em trancos, em pequenas lindezas. E em árdua lição para
Valdomiro ― o menino que, a cavalo, acompanha o carro-de-boi e que relata, com
toda a inocência, os terríveis percalços da jornada. Ao seguir a comitiva, o
leitor conhece o quanto esse universo é, em verdade, distante do seu. Mas
apenas em aparência. Uma jornada como tantas sai pela Editora
Alfaguara.
Quinta-feira,
12 de setembro
Nova edição
de O Senhor dos Anéis.
Apesar de
ter sido publicado em três volumes – A sociedade do anel, As
duas torres e O retorno do rei – desde os anos 1950, O
Senhor dos Anéis não é exatamente uma trilogia, mas um único grande
romance que só pode ser compreendido em seu conjunto, segundo a concepção de
seu autor, J.R.R. Tolkien. Com design cuidadosamente pensado para refletir a
unidade da obra e os desenhos originais feitos por Tolkien para as capas de
cada volume, uma caixa reúne os três livros da saga e oferece aos leitores uma
nova oportunidade de mergulhar no notável mundo da Terra-média. A tradução da
trilogia é de Ronald Kyrmse e a edição integra parte do projeto editorial
da HarperCollins
Brasil de publicação integral da obra de Tolkien.
Matéria
de poesia é o novo título reeditado pela Editora
Alfaguara para o projeto da obra completa de Manoel de Barros.
“Todas as
coisas cujos valores podem ser / disputados no cuspe à distância / servem para
poesia.” Assim começa Matéria de poesia, livro publicado originalmente em 1974
em que Manoel de Barros explicita do que é “feita” sua arte. Pois ela é
composta de versos que são frases ritmadas ao rés do chão, nascidas da atenta
observação do que não é importante. A matéria da poesia une palavras e coisas.
Quase um manifesto que reflete o projeto de escrita de Manoel, os poemas
reunidos neste volume unem seres e objetos aparentemente inconciliáveis. Nesta
que é uma de suas obras mais importantes, se destacam também o apurado trabalho
com a linguagem e o olhar para as coisas miúdas da natureza, nomeadas como se
estivessem sendo vistas pela primeira vez. Afinal, nas palavras do próprio
poeta: “As coisas jogadas fora/ têm grande importância”. A nova edição inclui
prefácio de Mia Couto e imagens do acervo pessoal de Manoel de Barros.
O Grupo
Editorial Record anuncia nova edição de O mundo do sexo.
Publicada
antes na Coleção Sabor Literário, a obra de Henry Miller ganha nova roupagem.
Neste ensaio o autor de Trópico de câncer e Trópico de capricórnio, sem
abrir mão do estilo narrativo e do caráter autobiográfico que o consagraram,
trata da sexualidade — tanto no dia-a-dia quanto na literatura. Escrito em 1940
e retrabalhado em 1957, este ainda é um dos livros pouco conhecidos do autor
estadunidense que volta às livrarias pela José Olympio.
Sexta-feira,
13 de setembro
Nova edição
de um clássico da literatura de Gertrude Stein.
Mais moderna
do que todos os modernos, mais vanguardista do que os cubistas cujos quadros
forravam as paredes de sua casa, Gertrude Stein – mulher de opiniões
inusitadas, estadunidense autoexilada na Europa – embebeu sua literatura com o
caráter experimental de sua vida. Em A autobiografia de Alice B. Toklas,
redigiu a autobiografia da sua companheira, apenas para nela aparecer como
personagem e narrar suas próprias experiências na terceira pessoa. O conteúdo é
apaixonante: um mergulho nos ambientes avant-garde da Paris anterior à Segunda Guerra
Mundial, onde reinavam a flexibilização dos costumes e a radicalização das
ideias. A valorização do dólar permitia que artistas americanos levassem na
França uma vida confortável, com uma liberdade impossível na América.
Gertrude, criadora do epíteto lost generation, fazia do seu apartamento da Rue
de Fleurus a embaixada de todos estes americanos – Hemingway, Scott Fitzgerald,
Ezra Pound – assim como um local de reunião para modernistas como Jean Cocteau,
Juan Gris, Picasso, Matisse e Henri Rousseau. Lançado em 1933, A autobiografia
de Alice B. Toklas transformou a influente escritora, crítica e colecionadora
de arte Gertrude Stein em um dos célebres nomes da literatura norte-americana
da primeira metade do século XX. Autobiografia é o seu livro mais conhecido
e um dos mais coloridos painéis já realizados sobre a efervescente vida
intelectual e artística de Paris. A tradução de Milton Persson é reeditada pela
L&PM Editores.
Em seu
segundo romance, Luanda, Lisboa, Paraíso, Djaimilia Pereira de Almeida narra
a saga de Cartola e Aquiles, pai e filho que deixam Angola em busca de um
tratamento médico em Portugal nos anos 1980.
Luanda,
Angola, anos 1970. Fruto de um parto com complicações graves, Aquiles nasce com
uma má-formação que lhe dita o destino e o nome. A promessa de cura reside em
uma cirurgia que somente pode ser realizada em Portugal, e até que ele complete
quinze anos. Com o fatídico aniversário em vista, Aquiles e o pai, Cartola,
partem para Lisboa, crentes de que será uma viagem passageira e de que eles
serão recebidos como verdadeiros cidadãos portugueses. Na capital, sentem na
pele o preconceito de serem imigrantes da ex-colônia enquanto o regresso a
Angola torna-se cada vez mais distante. A autora de Esse cabelo constrói com
estilo e sensibilidade ímpares uma narrativa ― ora triste, ora esperançosa ―
sobre a diáspora, as relações entre pais e filhos e a constante busca por afeto
humano.
DICAS DE
LEITURA
Na semana
que passou, nós do literário atravessamos mais um dos muitos ataques de censura
impetrados por parte dos governos em vigência no Brasil: a prefeitura do Rio de
Janeiro, numa ação arbitrária, invadiu o pavilhão onde se realizava a Bienal do
Livro para uma varredura em materiais classificados como impróprios ao público
infantil e, nesse ínterim, uma HQ que figurava um beijo entre homens foi
censurada. O episódio viralizou, foi motivo de algum debate, de algumas ações
virtuais e da brilhante iniciativa do youtuber Felipe Neto que, num ato
de mecenas, recolheu ele próprio os materiais LBGTI+ e distribuiu-os aos
leitores gratuitamente um dia depois.
À beira desse
furacão, o blog, enquanto tuitava textos editados por aqui sobre obras com tais
temas, chegou a redigir uma lista de leitura com livros impróprios para
pessoas atrasadas, retrógradas e preconceituosas, para utilizar os dizeres divulgados
em autocolantes nos livros distribuídos na ação do youtuber. Mas, por uma
razão inexplicável, talvez o calor da hora, o arquivo não ficou por salvar e
daí restou divulgar não a lista em questão, mas a que estava prevista para este
boletim. Aqueles que nos acompanham no Twitter e noutras redes sociais sabem o
quanto repudiamos a censura e o quanto nos posicionamos contra atos desse tipo.
Reiteramos por aqui nossa opinião de que o lugar de censuradores é a cadeia e não
a vida pública.
Agora, sim,
podem ler a recomendação dos livros; são quatro títulos e não três conforme é
costume desde que iniciamos esta seção no Boletim Letras 360º.
1. Tudo o que tenho levo comigo, de Herta Müller. Para quem
ainda não conhece a obra da escritora que recebeu o Prêmio Nobel de Literatura
em 2009, aqui pode encontrar um bom começo. Este livro integra algumas das suas
obras publicadas pela Companhia das Letras; saiu no Brasil em 2011 com tradução
de Carola Saavedra. Nele, encontrará um episódio pouco conhecido história
recente: a perseguição de Stálin às minorias alemãs na Romênia, enviadas a
campos de trabalhos forçados sob a acusação de haver colaborado com Hitler. Trata-se
da história de Leo Auberg, um jovem de dezessete anos, gay, que é internado num
campo soviético. Ali ele convive com a fome, trabalhos forçados, doenças,
solidão e morte. Cinco anos depois, a personagem volta para casa, mas percebe
que tal retorno é impossível. O fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945,
significou para muitos, como a minoria alemã na Romênia, o início de um longo
período de horror e opressão: nos cinco anos seguintes, por volta de 30 mil
saxões residentes na Transilvânia foram deportados para campos de trabalhos
forçados. Segundo Stálin, os povos de origem alemã deveriam pagar pelos crimes
da guerra e trabalhar na reconstrução da União Soviética. Os campos
caracterizaram-se por condições desumanas e insalubres, e os ex-internos
preferiram esquecer o que aconteceu ali. O romance de Herta Müller foi construído
a partir do relato verdadeiro de um amigo, o poeta Oscar Pastior; os dois
trabalhariam nessa obra se ele tivesse sobrevivido até o final do projeto de
escrita.
2. Devassos no paraíso, de João Silvério Trevisan. O respeitado
escritor brasileiro dispensa apresentações. Recentemente seu pungente romance
acerca da relação com pai e sua descoberta sobre o filho gay comoveu muitos
leitores envolvidos com a causa sobre as liberdades individuais. A quem se
interessar: Pai, pai (Alfaguara Editora). Mas, João Silvério Trevisan
ficou reconhecido por este livro que ensaia em diálogo com diversos campos de
conhecimento e expressões de nossa cultura – o cinema, o teatro, a política, a
história, a medicina, a psicologia, o direito, a literatura, as artes plásticas
– um estudo que é indispensável e pioneiro sobre a homoafetividade no Brasil. Este
é um livro para se despir de muitos dos preconceitos correntes e uma visita,
sobretudo para as novas gerações, de como as liberdades só se constituem pela
luta e o embate político.
3. Odes a
Maximin, de Ricardo Domeneck. Já sabemos que o poeta brasileiro está com outro
livro marcado pelo tema engendrado na obra aqui recomendada; chama-se Doze
cartas (também publicado pela Garupa Edições). Aliás, este é um livro que teve uma tiragem
especial aquando da publicação das Odes e cada edição destas últimas
traziam uma das cartas agora reunidas. A experiência de leitura da obra
aqui recomendada é de farto gozo: o poeta aguça nossos sentidos, ousada e delicadamente
(ou nem tanto) para uma poética do desejo entre homens. Maximin, espécie de
sedutor despudorado, capaz de arrastar o seduzido para os lugares mais inóspitos,
entre pulsões e fulgurações do corpo, é cantado num conjunto de textos que
conduzem o leitor a uma intensa vivência dessas forças das quais ninguém é capaz
de fugir. Entre os poemas da lírica homoerótica no Brasil, os desse livro são
fundamentais. Estão repletos de pura liberdade, captada esta pelo traço de David
Schiesser, autor das ilustrações que acompanham os textos. O livro fora indicado noutra edição deste Boletim, mas o momento tem agora outro significado.
4. O amor
dos homens avulsos, de Victor Heringer. Este é um romance perfeitamente
delicado. Lida com o florescimento do amor proibido, as consequências dos silenciamentos
e a transformação do sentimento para ordens um tanto obscuras. No texto de
Pedro Fernandes sobre a obra, publicado setembro de 2016 no blog, afirma-se que:
“Exercício de memória, a narrativa de O amor dos homens avulsos combina
duas linhas temporais, entre a distensão praticada pelo narrador: ora é o
passado, os anos entre a infância e a adolescência vividos na década de 1970 no
interior de uma tradicional família do subúrbio carioca, cujo pai presta
serviços obscuros – certamente para o regime militar, ora é o presente, de
homem sozinho, num aparamento, entregue à rotina – condição e lugar a partir
dos quais olha esse passado numa circunstância em que as arestas do vivido
teimam em aparecer, como se uma peça solta que lhe arranha constantemente a
alma. [...] O traço que une um tempo e outro é a chegada e o convívio com
Cosme, um menino trazido, sem explicações pelo pai de Camilo para o interior da
família. Por isso, este é um romance não apenas sobre o primeiro amor mas sobre
as descobertas do outro, de si, do corpo, do desejo. Se há uma fixação pelo
comezinho, há uma extensa voltagem erótica, em parte ainda toda envelopada pela
inocência da infância, que aos poucos começa a circundar as situações em que
estão envolvidas essas duas personagens; isso, claro, visto sempre pela ótica
desse homem que teve a vida toda dedicada a trazer essa memória guardada na
melhor e mais marcante passagem de sua existência.” Pelo jeito, indispensável,
não é?
VÍDEOS,
VERSOS E OUTRAS PROSAS
1. Pai, pai, o livro de João Silvério
Trevisan citado na seção anterior foi tema de uma excelente entrevista
realizada pela Tamy do canal Litera Tamy. Podem conferir aqui.
2. No canal
da Editora Garupa, no Youtube, podem ver o poeta Ricardo Domeneck numa leitura do
poema “A nutrição de Maximin”: aqui. O texto é
parte do livro Odes a Maximin recomendado na seção anterior.
3. Em tempos
de virtualidades matamos as saudades das figuras queridas revisitando suas
imagens na web. Quando O amor dos homens avulsos foi publicado
ainda tínhamos em vida o seu autor e a autora dessa entrevista, Roberta Carmona.
No seu canal Literatórios, Carmona conversou com Victor Heringer sobre o
romance em questão. Recorde aqui.
BAÚ DE
LETRAS
1. Em junho
de 2017, publicamos uma lista que reuniu treze livros para celebrar o Orgulho
Gay. Você pode encontrá-la aqui.“Entre
a interdição e a plenitude”.
2. A censura
contra obras da literatura não repousa apenas sobre textos com temas e questões
LGBTI+; aqueles que tratam sobre tabus do corpo ou colocam em xeque certos
discursos deterministas, também são cortados pelo crivo da ignorância. Por isso,
vale uma visita a alguns elementos de um universo criativo de um escritor que
sofreu na pele reiteradas vezes o abuso de autoridade dos hipócritas. Trata-se
do aniversariante da semana, D. H. Lawrence.
2.1 Nós
falamos aqui sobre a atividade de Lawrence como pintor; repleta de sugestões do corpo viril.
2.2 E aqui sobre o romance de Lawrence que foi censurado reiteradas vezes pelas descrições
de sexo, O amante de Lady Chatterley.
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