Seis livros de Primo Levi que são antídotos contra o esquecimento

Primo Levi. Foto: Basso Cannarsa.



O escritor italiano Primo Levi retratou como poucos o horror dos campos de concentração nazista, depois de ter sido refém num deles durante quase um ano, uma experiência dramática que marcou sua vida definitivamente até sua morte em 1987. Nascido há cem anos em Turim, no dia 31 de julho de 1919, Levi, de origem judia, foi deportado para Auschwitz em 1944 depois de ser preso por militar junto à resistência antifascista. Naquela prisão cercada por arame farpado se tornou testemunha excepcional sobre os horrores e os crimes do nazismo, e, depois da sua liberdade pelo Exército Vermelho, seus escritos fizeram uma volta ao mundo; alguns deles ainda hoje são recorrentes nas escolas italianas como um exemplo de memória histórica. Os livros aqui apresentados são aqueles que permitem aproximar-se da figura e da visão de mundo de um dos escritores mais importantes do século XX.

1. É isto um homem?
É a obra-prima de Primo Levi. Foi escrita depois de retornar à Itália depois de passar onze meses nos campos de Monowitz, anexo ao de Auschwitz-Birkenau, próximo à Cracóvia. O escritor sustenta em seu prefácio que o objetivo deste livro não é outro que manter viva a memória daqueles crimes, pois a mera existência dos campos “deveria ser entendida como um sinistro sinal de perigo” para as gerações futuras. Levi narra com clareza, precisão e sem disfarces o roteiro de humilhações e violações que passaram as vítimas do Holocausto, homens, mulheres, velhos e crianças tratados como mercadoria pelo regime criminoso de Adolf Hitler, e as duríssimas condições de vida nos campos de concentração.

2. A trégua
É a continuação da obra de 1947 e o segundo livro de Primo Levi. Em suas páginas, rememora a verdadeira odisseia que, como milhões de pessoas, precisou viver para regressar à casa natal depois da libertação de Auschwitz pelas tropas soviéticas. Começa com a chegada de quatro soldados do Exército Vermelho e com a paulatina compreensão dos reféns sobre a verdadeira dimensão de Auschwitz, do “grande campo” que dependia de Buna / Monowitz. E continua relatando passo a passo o penoso périplo de oito meses de trem que precisou percorrer até o seu regresso a Turim, não como herói sobrevivente do horror nazista, mas ante a indiferença de uma sociedade, a europeia, ainda traumatizada pela guerra.

3. 71 contos de Primo Levi
Este título exclusivo nas traduções da obra de Primo Levi no Brasil trata-se, na verdade, de uma seleção de textos organizada pelo tradutor Maurício Santana Dias. Depois da publicação dos livros que o fizeram reconhecido mundialmente, o escritor italiano surpreendeu seus leitores ao apresentar, em 1966, uma antologia de contos intitulada Histórias naturais. Sob o pseudônimo de Damiano Malabaila, ele passava da literatura de testemunho para a ficção científica e fantástica. Cinco anos mais tarde, Levi apresentou uma nova coletânea – agora sem o pseudônimo – Vício de forma. A obra veio confirmá-lo como um dos principais escritores do século XX. E, em 1981, ele publicou seu terceiro livro de contos, Lilith; este entremeando narrativas fantásticas e relatos autobiográficos.

4. A tabela periódica
Primo Levi conjuga episódios de sua vida com seus conhecimentos de Química e seus experimentos no laboratório vinculando cada um dos vinte e um capítulos a um elemento da tabela periódica. Mas não é apenas a autobiografia de um químico, mas a “história de uma geração”; reconstrói “uma formação civil surgida nos anos do fascismo, os dramáticos episódios da guerra ou da luta revolucionaria”, como destacou o editor Giulio Einaudi. Começa pelo Argônio para descrever os usos, costumes e tradições de seus antepassados, judeus emigrados da Espanha no século XVI e que se mostravam excêntricos e de hábitos ociosos. E conclui com a curiosa explicação sobre como um átomo de carbono se transforma e acaba no cérebro de uma pessoa, permitindo-lhe escrever o ponto que coloca no fim do livro.

5. Os afogados e os sobreviventes
Este é o último livro escrito por Primo Levi; o escritor morreu um ano depois. É a primeira vez que suas reflexões sobre o Holocausto se apresentam com os tons de uma violência brutal quarenta anos depois do fim de Auschwitz. Levi abre o que chama de “zona gris”, o espaço entre as vítimas e os verdugos povoado pelos colaboracionistas, figuras “patéticas” que recebiam privilégios nos campos de concentração por seus serviços e é preciso conhecê-los para “conhecer o ser humano”, dizia. “Os prisioneiros privilegiados eram uma minoria entre a população dos campos, mas representavam a grande maioria dos sobreviventes”, expõe o escritor.

6. Mil sóis
Primo Levi, num dos períodos mais fervorosos de criatividade, escreveu poesia. Pouca gente sabe, mas o primeiro texto que o escritor italiano publicou foi um poema que apareceu em junho de 1946 num semanário comunista editado pelo amigo Silvio Ortona. Sua lírica errática o acompanhou por toda vida – entre 1950 e 1970 alguns de seus poemas chegaram através de revistas literárias de prestígio – e atravessou fases distintas e em todas elas, temas como a sobrevivência em meio às catástrofes e a desumanização se unem a um registro delicado que parece buscar a claridade, a comunhão e o amor por todos os seres vivos. No final da década de setenta chegou a publicar numa tiragem limitadíssima, apenas trezentos exemplares, parte desse material; o livro anônimo trazia 23 poemas, mais da metade inéditos. Só nos anos oitenta é que se publica uma edição bem cuidada dessa obra que trazia mais de seis dezenas de textos e uma dezena de traduções. A antologia preparada por Maurício Santana Dias nos leva a conhecer pela primeira vez na nossa língua o trabalho de um escritor que transformou o compromisso moral em alta literatura, e a força da memória, num verdadeiro ofício.

* Orientações oferecidas pelas sinopses apresentadas das edições publicadas no Brasil. 

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