“Por favor, ajuda-me, meu bom Deus, a ser uma boa escritora”
Por Cristina Sánchez-Andrade Em 1958, depois de Flannery O’Connor mergulhar no manancial com propriedades curativas do Santuário de Lurdes, disse – parafraseando uma amiga e com o sarcasmo que a caracterizava – que “o verdadeiro milagre era não contagiar-se por uma epidemia através dessa água suja”. Mesmo relutantemente, havia ido ali como parte de um grupo – “mulheres católicas levadas em manada de um lugar a outro”, como ela própria explicou – de peregrinação à Lurdes, viagem promovida pela diocese de Savannah. A escritora, afetada pelo lúpus, era consciente de que não lhe restavam muitos anos de vida e nessa viagem pela Europa quis tentar de um tudo; entre outras coisas, uma audiência com o papa Pio XII na Basílica de São Pedro. Morreria seis anos depois, mas em todo caso o acontecimento ilustra perfeitamente duas importantes chaves de sua escrita: a ironia e sua dimensão religiosa. O primeiro aspecto é algo que salta à vista numa primeira leitura de sua obra. O