James Baldwin: indispensável
Por Sofía Viramontes
James
Baldwin soube que ia ser escritor quando seu pai morreu. Antes disso pensou que
talvez podia se dedicar a outra coisa: “queria ser músico, pensei em ser
pintor, pensei em ser ator”, disse em 1984 numa entrevista a Paris Review.
Seu pai, David
Baldwin, foi pregador. James, o mais velho de nove filhos, também chegou a ser da
mesma profissão durante três anos. Dedicou-se a isso entre os catorze e os
dezessete anos e assegura que foi nesse tempo que, ainda sem saber, se tornou
escritor. Quando seu pai adotivo (nunca conheceu o biológico) morreu, o quase-escritor
tinha dezenove anos.
Segundo Baldwin,
ser pregador e escritor requer personalidades contrárias. “Ambos trabalhos são completamente
distintos. Quando você está no púlpito deve soar como quem sabe o que
diz. Quando está escrevendo, está tentando averiguar algo que não sabe. A linguagem
da literatura para mim é descobrir o que não sabe, o que não quer descobrir”.
James
Baldwin nasceu no dia 2 de agosto de 1924 em Harlem, Nova York. Tinha os olhos
muito grandes e redondos, apenas contidos pela pele das pálpebras. Seus lábios,
com o superior formando uma marcada letra m,
estavam delineados naturalmente por um tom mais claro que o do resto da escura cor
da pele.
Este tom acinzelado,
amarronzado, comumente definido apenas como negro e seu lugar de origem, foram
as bandeiras que marcaram a vida de James Baldwin, insígnias que carregou todos
os dias de sua vida, embora nem sempre com gosto.
Sua carreira
literária começou nos últimos anos da segregação legalizada. Isto é, quando nos
Estados Unidos estava permitido separar as pessoas pela cor da sua pele. Go Tell It on the Mountain (Vá à
montanha e fale, em tradução livre) – uma sensação literária – foi seu primeiro livro publicado. Antes
disso, vivendo em Greenwich Village, em Nova York, publicava ensaios, críticas
e contos em jornais e revistas.
Para escrever
seu primeiro livro precisou viajar à França, porque nos Estados Unidos, como
disse uma vez em 1962, “minha cor da pele é uma barreira entre meu ser e eu”. Embora
a maior parte de sua literatura sempre foi um grito contra os abusos e as
desigualdades que vitimizava os afro-americanos, pessoalmente a cor de sua pele
casou-lhe um conflito interno. Enquanto sua raça o definia em seu país natal, quando
se mudou dele encontrou-se sem definição: havia caído na armadilha do homem
branco.
“Acredito
que não vale a pena viver uma vida sem autoconsciência e o escritor definitivamente
não pode se permitir a nenhum autoengano, pois seu sujeito é si próprio e o
mundo onde está”, explicou Baldwin ao jornalista W. J. Weatherby pouco antes de
seu primeiro livro de ensaios, Notes of a
Native Son sair à venda, em 1955.
A introspecção
de que fala Baldwin é a razão porque este filho de uma família afro-americana
de Harlem se tornaria um símbolo na luta pelos Direitos Civis que definiu a
história dos Estados Unidos. Ele, em sua contemplação interna, em seu processo
de resolução de conflitos, questionou sua cor da pele, e a dos brancos (Notes of a Native Son), sua
homossexualidade (O quarto de Giovanni)
e a religião que o condenava por ser ele mesmo, mas também ajudou a convertê-lo
no homem que foi (Go Tell It on the
Mountain). Baldwin questionou como nenhum outro o sonho americano que só
podia se realizar se os descendentes daqueles sonhadores proviessem da Europa e
não da África (Da próxima vez, o fogo).
Exilou-se na
França por quase duas décadas: oito anos em Paris e os outros dez em
Saint-Paul-de-Vence, uma comuna francesa na região da Provença Alpes Costa Azul.
Regressou várias vezes a Nova York, embora nos Estados Unidos não pudesse examinar-se
tão profundamente uma vez que corria o perigo de ser assassinado, como seus
amigos Martin Luther King Jr., Malcolm X e Medgar Evers. “O que a gente branca não
sabe dos negros revela, precisa e inexoravelmente, o que não sabem sobre eles próprios”,
escreveu em 1962. Assassinavam por ignorância.
James
Baldwin morreu no dia 1º de dezembro de 1987 em decorrência de um câncer no
estomago. Mas deixou um dos legados mais importantes na história dos Estados
Unidos. Seus postulados e relatos têm sido utilizados para compreender, desde
as políticas racistas de Donald Trump, até o movimento Black Lives Matter. Ele foi capaz de articular o que significava
ser estadunidense e afro-americano com a eloquência rara de nenhum outro.
Para o crítico
de arte Benjamin DeMott, Baldwin “tem um lugar num grupo muito seleto: composto
pelos poucos, genuinamente indispensáveis, escritores estadunidenses”.
Ligações a esta post:
* Este texto é uma tradução de "James Baldwin: indispensable" publicado na revista Gatopardo.
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