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Mostrando postagens de maio, 2018

Kyra, Kyralina, de Panaït Istrati

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Por Pedro Fernandes Quanto mais buscarmos a liberdade mais estaremos distantes dela. Esta é uma síntese possível sobre Kyra Kyralina , de Panaït Istrati, se nos for dada a oportunidade de desviar o olhar desse título. Aliás, se permanecermos presos às palavras que nomeiam o romance, conseguiremos cair na cilada armada pelo escritor romeno quando prefere esta e não outra possibilidade de chamar sua obra. A artimanha não é gratuita. Ela participa da criação da atmosfera da narrativa; tem a ver com a própria condição da personagem principal – que não é, primeiro engano, a designada Kyra Kyralina. É Stavro / Dragomir a figura central da trama que se caracteriza basicamente por uma única linha: o seu relato dividido em três ocasiões distintas – uma delas quando já velho – de como caiu em desventura e tornou-se a figura repulsiva que tenta seduzir seu parente, o adolescente Adrien. Criado sob todos os bons auspícios maternos, essa personagem que ocupa o papel de ser interlo

O ornitólogo, de João Pedro Rodrigues

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Por Pedro Fernandes O ornitólogo é um filme de rara sensibilidade, visual e simbólica, e de ricos jogos intersemióticos e intertextuais; apoia-se, sobretudo por este último motivo, no elemento do duplo que figura na compreensão da personagem, das situações narradas e na própria estruturação da obra. O duplo ainda vigora na relação estreita assumida entre a personagem principal e a natureza da qual Fernando é um vivaz observador, pela profissão que exerce, esta que nomeia o filme e em parte o próprio herói da narrativa. Tratamos a personagem de herói porque esta preenche em todos os aspectos esse caráter:   encantado pela observação dos pássaros numa baía fluvial, Fernando é, sem perceber, arrastado por uma correnteza e muito depois encontrado por duas chinesas que pensam fazer fervorosamente o caminho de São Tiago de Compostela; a fuga desse duplo que almeja, numa releitura secular do imaginário império feminista, castrá-lo, servirá de transformação espiritual e pess

Manual de instruções para ler Lolita

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Por Tereixa Constenla Diz Vladimir Nabokov: “Lolita não é uma menina perversa. É uma pobre menina que a corrompem (...) É muito interessante se considerar, como fazem vocês jornalistas, o problema da tonta degradação que a personagem da ninfeta que eu inventei em 1955 tem sofrido entre o grande público. Não apenas a perversidade da pobre criatura foi grotescamente exagerada mas o seu aspecto físico, a idade, tudo foi modificado por ilustrações em publicações estrangeiras. (...) Representam-na como uma jovem de contornos opulentos, como se dizia antigamente, com cabeleira loira, imaginada por idiotas que nunca leram o livro”. Em 1975, durante uma entrevista com Bernard Pivot no programa Apostrophes em que respondeu as perguntas por escrito e com uma garrafa de uísque, Nabokov foi um apóstata da Lolita tratada desde há mais de uma década pelo cinema e pelas revistas. A versão de Stanley Kubrick estreada em 1962, com Sue Lyon como protagonista, se impôs no imaginário univer

Elena Ferrante, a leitora

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Ilustração: Sarah Wilkins “Os livros são organismos complexos, as linhas que nos perturbaram profundamente são o momento mais intenso de um terremoto interno que o texto provocou em nós, como leitores, desde as primeiras páginas”. A obra de Elena Ferrante tem sido esse terremoto. Reinaugurou uma expectativa pelo romance capaz de combinar uma escrita de grande fôlego e uma leveza narrativa, isto é, unindo duas polarizações estabelecidas pela academia e pela crítica desde o advento da literatura de massa. Não é o caso de uma unanimidade, afinal, qual é será mesmo o sentido desta palavra numa conjuntura de fragmentação e esvaziamento das unidades. Mas, a recepção da literatura da escritora italiana entre os leitores que leem livremente e entre os chamados leitores formados para a crítica diz alguma coisa sobre o que mídia tem simplificado usando o termo fenômeno . Os romances de Elena Ferrante têm demonstrado não pertencer apenas ao rol do entretenimento; além da escrita

Boletim Letras 360º #272

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Entramos na última semana de inscrições na promoção que sorteia um exemplar de Na outra margem, o leviatã , de Cristhiano Aguiar (Lote 42). O sorteio é realizado no Instagram do blog Letras in.verso e re.verso . Recado passado, vamos às notícias de uma semana marcada por perdas marcantes para nossa comunidade: Júlio Pomar e Philip Roth. Essas notícias e outras que passaram pelo mural do Letras no Facebook estão disponíveis a seguir.  A morte de Philip Roth e a publicação de obra inédita do escritor no Brasil. Mais detalhes ao longo deste Boletim. Segunda-feira, 21/05 >>> Brasil: Uma homenagem ao poeta alheio a homenagens Foi disponibilizada online o n. 16 da Revista 7faces​; organizada pelo poeta Leonardo Chioda e os editores do periódico, Pedro Fernandes e Cesar Kiraly, a edição reúne alguns dos principais estudiosos da obra do recluso poeta português Herberto Helder como Eduardo Quina, António Fournier, Rafael Lovisi Prado, Maria Lúcia Dal Farra, Cl

Donnie Darko, de Richard Kelly

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Por Rafael Kafka Donnie Darko  mexe com nossa noção de leitura. O enredo do filme é cheio de brechas que nos convidam, como um bom filme de autor, a mergulhar no universo desenvolvido por Richard Kelly e sua equipe. Impossível assistir ao drama existencial e psíquico de Donnie de forma passiva esperando a ocorrência de algo que feche tudo em algo pronto e acabado. Ou ainda uma cena de ação que funcione como catarse para uma percepção conformada. Darko vive um drama cuja escrita por si só já é provocativa por nos exigir rompimento com velhas estruturas cognitivas que limitam nossas leituras ao lugar comum da linearidade. Algo aprendido por mim estudando sobre tradução há alguns anos é justamente o poder dos significantes em provocar por si sós reações na subjetividade dos sujeitos. O arranjo e rearranjo deles causa efeitos interessantes, gerando um estranhamento que provoca nas mentes inquietas um desejo de desvendar essas obras. A grande questão é que muitas vezes simples

O Leopardo, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa

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Por Pedro Fernandes Dentre as questões fundamentais de interesse da literatura está o dilema do homem com o tempo. Nesse interior, figura a tentativa de compreender acerca da nossa degeneração – a rapidez com que tudo é tragado por uma força impossível de ser contida. Compreender aqui não significa determinar causas ou oferecer uma resposta ao maior dos enigmas da existência, mas testemunhar tais transitoriedades. Embora, a literatura se apresente como uma das muitas tentativas de eternidade, ela própria sabe-se que numa hecatombe futura, a que sempre estivemos expostos, pouco ou nada resulte de sua passagem pela Terra. O romance único de Giuseppe Tomasi di Lampedusa se filia a esse grupo dileto de obras que tematizam a decadência, a luta do homem contra a indelével transformação das coisas com a passagem do tempo, afinal, tal força não deixa sobrar nem mesmo a mais secular das tradições. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, para recuperar uma frase de José