Boletim Letras 360º #250
E, como anunciamos no nosso Twitter, chegou o nosso recesso de final de ano; também, como repetimos todos os anos: não se trata de uma parada definitiva, só desaceleramos; estes boletins, por exemplo, continuam a sair nos sábados. Vale lembrar ainda que no dia 29 de dezembro divulgaremos as listas de melhores do ano; o dia comum dessas publicações é o último dia do ano, mas em 2017, se repete algo do ano anterior: a data cai num final de semana. Por isso remanejamos para a sexta-feira. No mais, vamos ao que viemos: eis as notícias desta semana que circularam no nosso Facebook.
Fernando Pessoa, a história de um novo amor. Mais detalhes ao longo deste Boletim. |
Segunda-feira,
18/12
>>> França: Os 120 dias de Sodoma como patrimônio nacional a fim de
evitar o leilão do célebre manuscrito do marquês de Sade
O mesmo
gesto já havia sido realizado em relação aos Manifestos do
Surrealismo, de André Breton. Os dois textos fazem parte de uma venda de
documentos históricos pertencentes ao fundo Aristophil, objeto de liquidação
judicial e investigado por haver enganado supostamente seus investidores
mediante a compra de manuscritos prestigiados. O valor de Os 120 dias de
Sodoma estava estimado entre 4 e 6 milhões de Euros; os
Manifestos, em 4 milhões, junto com outros textos de Breton. A novela
de Sade foi escrita em 1785 durante a estadia do escritor na prisão, mas só
saiu da clandestinidade em 1957. No início da década de noventa a obra passou a
integrar a prestigiada coleção francesa da Plêiade.
>>> Brasil: Uma
nova editora interessada apenas em poesia
Pedra Papel
Tesoura foi aberta com o livro do designer e poeta mineiro Bruno Brum; ele é o
proprietário da nova casa editorial ao lado da artista Tatiana Perdigão. O foco
é a publicação de poesia contemporânea e seus diálogos com outras linguagens
artísticas. Estão previstos para 2018 um livro de Marcelino Freire, um volume
com a produção de Douglas Diegues, que escreve em portunhol e publicou a
maioria de seus livros artesanalmente, e Opa!lavra, infantojuvenil
de Ana Elisa Ribeiro. A lista continua com poetas latino-americanos pouco
conhecidos por aqui como Fabián Casas; Joca Reiners Terron, trabalha
na tradução da obra do argentino.
Terça-feira,
19/12
>>> Em 2018,
a Biblioteca
Azul apresenta o volume B da obra completa de Adolfo Bioy Casares
O escritor
argentino, assim como o parceiro e conterrâneo Jorge Luis Borges, transitou livremente
pela fantasia, ficção científica e pelo realismo. Depois do volume A das suas
obras completas publicado no Brasil no ano de seu centenário ficou-se a
expectativa para quando sairia a continuidade do trabalho anunciado em três
volumes. Em 2018, chega às livrarias o segundo livro; organizado por por Daniel
Martino, compreende um romance – Diário da guerra do porco (1969) –
e três antologias de contos – Grinalda com amores (1959), O
lado da sombra (1963) e O Grão-serafim (1967) –, além de
memórias, ensaios e artigos publicados entre 1959 e 1971.
>>> Brasil: O primeiro
livro de Patricio Pron deste lado da América Latina
O
protagonista deste romance é um escritor jovem que retorna à Argentina porque
seu pai, um jornalista, está morrendo. O retorno à cidade pequena no pampa se mostra
intenso: lembranças familiares, traumas políticos, a memória da infância em
meio à angústia dos adultos diante do regime de terror instaurado pela ditadura
no país durante os anos 1970. Revolvendo a biblioteca doméstica, enquanto tenta
retomar o contato com a memória paterna, o protagonista se depara com uma
série de recortes e mapas que dão conta do desaparecimento recente de um
habitante da cidade. O mesmo homem teve uma irmã raptada e assassinada pelas
forças oficiais em 1977. Começa então uma espécie de busca detetivesca. Ele
leva essa tarefa a cabo com afinco enquanto tenta descobrir porque o homem
desapareceu e igualmente as razões que levaram seu pai a empreender uma busca
tão obstinada dessa história – que tipo de sentimento o motivou, afinal? Os
propósitos, o leitor irá descobrir a partir de um jogo cuidadoso de simetrias,
podem estar ligados aos anos terríveis da Ditadura. O espírito de meus
pais continua a subir na chuva é traduzido por Gustavo Pacheco e publicado pela
Editora Todavia.
Quarta-feira,
20/12
>>> Estados Unidos: Uma antologia
de contos de Lucia Berlin e as memórias da escritora
Lucia Berlin
passou escandalosamente despercebida – apesar de seus brilhantes olhos verdes.
Não era atriz, nem modelo, mas foi uma escritora incrível. Foi em 2015 quando
aconteceu sua descoberta; já havia se passado uma década de sua morte quando a
antologia de seus contos com introdução de Lydia Davis, Manual da
faxineira chegou às livrarias estadunidenses; e já ganhou o mundo: está em 23 países. Em 2018, um novo livro: com
21 dos 34 contos que ficaram de fora da primeira antologia. De sua estreia aos
24 anos nas páginas da revista do escritor Saul Bellow, The Noble
Savage, Berlin publicou 77 histórias que apareceram depois em outras
revistas e foram reunidas em meia dezena de livros com baixas tiragens. Além da
nova antologia, as livrarias se preparam para receber com ajuda do filho da
escritora Jeff Berlin Welcome Home, obra que recolhe um inacabado
livro autobiográfico e que será editado com cartas e fotografias da escritora.
As duas edições serão publicadas juntas nos Estados Unidos. No Brasil, Manual da faxineira foi publicado pela Companhia das
Letras.
>>> Brasil: Mais Franz
Kafka
A Editora
Todavia já havia anunciado que publicará os diários de Franz Kafka no Brasil;
mas, há mais do escritor tcheco. Organizado e traduzido por Marcelo Backes, Blumfeld: um solteirão de mais idade e outras histórias reúne 36 narrativas de Kafka, desde as mais conhecidas do público brasileiro,
como "Um artista da fome", até textos inéditos em português, como
"O guarda da cripta". Este livro é publicado pela editora Record.
>>> Espanha: O legado de Federico García Lorca regressa, enfim, a Granada
Foram dois
anos de embates jurídicos. O centro García Lorca havia sido inaugurado na terra
natal do poeta, mas sem nenhum conteúdo. Agora, depois de um acordo entre a
fundação criada para zelar pelo arquivo do poeta e vários outros setores
administrativos, será possível, toda vez que for ao centro encontrar materiais
referentes à obra e à vida de Lorca. A mudança só findará em 2020 quando a
fundação andaluza poderá enfim assumir integralmente a posse da fundação. O
arquivo de Federico García Lorca é composto por 19 mil documentos que incluem
manuscritos diversos – correspondência, poesia, prosa ou teatro –, desenhos,
fotos, obras de arte, móveis (seus e de amigos). Entre as raridades, 46
desenhos originais do poeta, 2.343 cadernetas com anotações manuscritas e, só
de fotos, mais de nove centenas de imagens catalogadas, além de material
musical que inclui partituras autógrafas do poeta e outras de sua coleção.
Nesse material acrescenta-se ainda o manuscrito do importante Poeta em
Nova York comprado pela fundação em 2003 por mais de 200 mil Euros.
Quinta-feira,
21/12
>>> Brasil: Uma
antologia com contos de horror e a obra do romeno Panaït Strati
São mais
duas apostas da Editora Carambaia para 2018. O livro de contos reunirá textos
de escritores como Virginia Woolf, Émile Zola, E.T.A. Hoffmann, Ivan Turguêniev
e Guy de Maupassant; chama-se em Contos de assombro. Agora, a obra
de Panaït Strati, escritor apelidado de "Górki dos Bálcãs" e um dos primeiros
intelectuais mais à esquerda a manifestar críticas ao stalinismo, antes de
George Orwell e André Gide, será Kyra Kyralina, de 1924; o livro é
um de seus romances picarescos protagonizados por Adrien Zograffi, importante
personagem homossexual do início do século XX.
>>>> Brasil: O anunciado
livro de John Williams pela Rádio
Londres chega às livrarias em janeiro de 2018
Augustus é o terceiro grande romance de John Williams; acompanha a trajetória de Caio
Otávio, conhecido mais tarde como Augustus, fundador do império romano e figura
fascinante e quase indefinível. Sua história é contada por meio de um complexo
enredo de cartas, fragmentos de diários, anotações pessoais e documentos, todos
fictícios, mas com autoria atribuída a personagens históricos reais. À primeira
vista, Augustus é uma personagem distante de William Stoner ou do jovem
bostoniano protagonista de Butcher’s Crossing, porém, com ele, o autor volta a
propor, com grande força e imensa habilidade, seu tema clássico, ou seja, o
fato de que, independentemente de nosso caráter, a vida que acabamos vivendo é
o resultado não previsível das circunstâncias e do acaso, da fricção entre as
imposições do mundo e nossos desejos mais íntimos. A aceitação estoica dessa
verdade por parte dos protagonistas dos romances de John Williams é o que os
deixa tão relevantes e tocantes para todos nós.
>>> Brasil: Fernando
Pessoa inédito e — um novo amor? não entrou para a história como o protagonista
das maiores aventuras amorosas
Um conjunto
de cartas inéditas do poeta português foi encontrado por José Barreto,
pesquisador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa; é delas
que se levanta a hipótese consistente de que o poeta morreu apaixonado por uma
escocesa chamada Madge Anderson, cunhada de seu meio irmão. A revelação está
num artigo da nova edição da revista Pessoa Plural, publicada
pela Universidade Brown, nos Estados Unidos. Curioso notar que, nas cartas de
Ofélia, a datilógrafa até então apresentada como única namorada de Pessoa, já
mostrava ciúmes de "uma inglesa"; Madge vivia em Londres. Na Segunda
Guerra Mundial, Madge trabalhava para o serviço secreto britânico traduzindo
mensagens interceptadas dos alemães. São três cartas e um cartão postal
escritos em inglês, de 1935. A documentação revela ainda que pelo menos uma
carta se perdeu e que Madge esteve algumas vezes em Portugal para visitá-lo —
na primeira delas, ele pede desculpas por ter desaparecido, por conta de um
"afundamento"; depois, envia o poema em inglês "Delirium
Tremens" para Madge: "Não, nada é certo./ O teu amor poderia/
Tornar-me melhor do que eu/ Posso ser ou tentar". Na carta em que vão
esses versos, Pessoa diz que eles foram escritos em abril, o que segundo ele
seria um mês antes da chegada de Madge a Portugal — talvez tentando afastar a
possibilidade de ser ela a motivadora da escrita. A nova edição da revista traz
outra descoberta; esta realizada pelo colombiano Jerónimo Pizarro: o poema
"No Horizonte Solemne", e listas de poemas que permitiram encontrar
outros inéditos na Biblioteca Nacional lusitana.
Sexta-feira,
22/12
>>> Brasil: A obra de
Alejandro Zambra ganha novas edições por aqui e um inédito
Depois do
fechamento da Cosac Naify, casa editorial através da qual o chileno ficou
conhecido no Brasil pela publicação de três obras — Bonsai, A
vida secreta das árvores, Meus documentos e Voltar para
casa —, sua obra passou a ser editada pelo selo Tusquets / Planeta de
Livros Brasil. Em 2017, saiu o inédito Múltipla escolha e a
promessa de que outras obras de Alejandro Zambra seriam publicadas. A ideia
permanece entre os objetivos da casa editorial para o ano seguinte, que além do
inédito Não ler promete a reedição dos dois primeiros títulos
citados da bibliografia da Cosac.
>>> Brasil: Em
2018 sairá uma edição revista de O galo de ouro, de Juan Rulfo
Escrito
entre 1956 e 1958, este texto do escritor mexicano só foi publicado em 1980, e
ganhou uma edição revisada em 2010. A tradução mais recente da obra no Brasil
saiu em 1999; a de agora sairá pela José Olympio.
Apresentada por alguns como novela, pelo próprio Rulfo como conto, O galo
de ouro descreve a vertigem do jogo, do amor e da sorte a partir da
história de Dionísio, um treinador de galos de luta surgido do nada que se
torna uma figura incontornável do submundo. Pelo meio há políticos e domadoras
de feras, numa história que é uma metáfora sobre os trajetos incomuns que pode
levar a vida humana. A obra já foi adaptada para o cinema várias vezes, a
primeira das quais logo em 1964 num filme de Roberto Gavaldón com o roteiro
preparado por Carlos Fuentes e Gabriel García Márquez.
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