Boletim Letras 360º #217
Duas novidades aos leitores sempre atentos ao Letras: (1) em poucos dias iremos disponibilizar o sorteio do exemplar de Contos reunidos, de Dostoiévski. Esta promoção é exclusiva para os leitores que estão reunidos no Grupo do Letras no Facebook. E a promoção depois desta (todas no âmbito das celebrações dos 10 anos do blog) será um kit com os quatro livros da série napolitana, da Elena Ferrante (Globo Livros / Biblioteca Azul). Então, a recomendação: esperar, que vem coisa boa! Enquanto isso, a seguir estão as notícias publicadas em mais uma semana de atividades em nossa página no Facebook.
Ernest Hemingway: dois conjuntos de cartas revelam outras facetas do escritor. Mais detalhes ao longo deste Boletim. |
Segunda-feira,
01/05
>>> Portugal: Mais
próximos de um Mário de Sá-Carneiro total? Chegou às livrarias Poesia completa, uma edição crítica de Ricardo Vasconcelos pela editora
Tinta-da-China
O livro surge
dois anos depois de ter sido publicada uma edição, também ela crítica, das
cartas por ele enviadas a Fernando Pessoa. Com quase 700 páginas e um extenso
aparato crítico (a seção final de notas tem perto de 100 páginas), a presente
edição inclui, além dos livros Dispersão e Indícios de
Oiro, um conjunto de versos dispersos da infância e juventude (os
primeiros que Sá-Carneiro escreveu), uma seleção de fac-símiles e seis cartas
inéditas enviadas a Fernando Pessoa depois da morte do amigo Mário, que revelam
novos pormenores sobre o desaparecimento dos manuscritos que estavam em Paris.
Esta não é, naturalmente, a primeira edição dos poemas de Sá-Carneiro. A
diferença é que é a primeira edição crítica da poesia completa. Antes desta,
foram publicadas duas edições críticas — uma de Fernanda Toriello, "La
Rierca Infinita: Omaggio a Mário de Sá-Carneiro (1987)", focada nos poemas
que Sá-Carneiro publicou ou que indicou para publicar (como aqueles que mandou
em carta a Fernando Pessoa), e outra de Giorgio de Marchis, O silêncio do dândi e a morte da Esfinge (2007), uma edição crítico-genética do
primeiro livro de poemas do escritor, Dispersão. Poesia completa de Mário de Sá-Carneiro reúne, portanto, o melhor de dois
mundos: todos os poemas que Sá-Carneiro publicou ou que deixou por preparados
para publicação, numa edição com extenso aparato crítico, ainda poemas
dispersos, compostos durante a idade adulta e de amadurecimento literário. E
não só: a edição inclui ainda textos da juventude, os primeiros versos do
poeta.
>>> Estados Unidos: Um conjunto
de correspondências de Ernest Hemingway para a atriz Marlene Dietrich vai a
leilão em Nova York
Os dois se
conheceram em 1934 a bordo de um transatlântico francês. O escritor voltava de
um safári na África e a atriz deixava a Alemanha nazista depois de fazer um
seguro de suas pernas no valor de 1 milhão de dólares. Segundo Hemingway, os
dois foram vítimas de “um amor não-sincronizado”. Os dois mantiveram uma
relação por correspondência que durou entre 1949 a 1961. Nelas o escritor
deixa a linguagem de corsário para cortejá-la com frases engenhosas: “És tão
bonita que vão necessitar para teu passaporte que te façam fotografias de três
metros”. Numa das cartas que vai a leilão pela Swann Galleries, pede que ela vá
visitá-lo em Finca de Vigia: “Por favor, sei que te amei sempre e te esqueço às
vezes como esqueço que meu coração bate. Mas bate sempre”, diz numa missiva de
12 de agosto de 1953. Noutra carta, escrita em quatro folhas com logomarca do
hotel onde estava hospedado em San Francisco, Hemingway fala do conto que havia
acabado de escrever “O velho e o mar”, sem imaginar que esta talvez fosse a
última carta a ser enviada a sua “little Kraut” (assim ele a chamava). Qualquer
reflexão sobre esse material agora revelado sempre mostra o escritor preso à
sua armadura de conquistador. Hemingway se permite a uma fantasia meramente
cinematográfica: abrir juntos um clube noturno, onde ela seria a cantora da
noite. Em todas as cartas se despede sempre com um “carinhoso” “Love, Mister
Papa”.
>>> Estados Unidos: Morreu
a escritora Jean Stein
A Companhia das Letras acaba
de apresentar no Brasil seu mais recente livro, A oeste do Éden. A
escritora estadunidense tinha 83 anos e se jogou do 15.º andar de um prédio no
Upper East Side e foi encontrada às 10h30 de domingo no terraço do oitavo andar
do edifício, na praça Gracie, em Nova York. Filha de Jules C. Stein
(1896-1981), magnata da indústria que fundou a Music Corporation of America
(MCA), Stein estudou nos melhores colégios dos EEUU e também em Lausanne, na
Suíça, além de ter passado pela Sorbonne, em Paris. Nasceu em Los Angeles,
Califórnia, em 1934, foi editora da Paris Review, e já aos 19
entrevistou o escritor William Faulkner, então com 56, com o qual teve um
affair; foi assistente do diretor Elia Kazan numa montagem teatral de
"Gata em teto de zinco quente", a premiada peça de Tennessee
Williams. Pioneira ao usar a história oral como técnica literária, escreveu
três livros. Em A oeste do Éden, Stein sobrevoa a cidade de sua
infância por meio da história oral de suas cinco famílias mais poderosas. Pelos
saborosos relatos que a autora compila e mescla com outras fontes históricas,
no intuito de revelar as engrenagens de uma máquina movida pela fama, ambição,
poder e fantasia.
Terça-feira,
02/05
>>> Brasil: Os dois
títulos que concluem o grande empreendimento memorialístico de Carlos Drummond
de Andrade voltam às livrarias
Esquecer
para lembrar e Menino antigo concluem uma quadrilogia formada
também por Boitempo e A falta que ama. No primeiro
título, Drummond rememora mais do que o próprio passado, dando a conhecer a
herança escravagista de Minas Gerais e do Brasil. Quando conta sua estadia no
colégio Friburgo, explora também sua relação com a religião. Seus anos de
"mocidade solta" narram uma Belo Horizonte que é progresso e
periferia, como nota o poeta, entre espanto e melancolia: "Aqui ninguém
bate palmas. Toca-se campainha." Já em "Menino antigo", ponto
mais alto da lírica memorialística do poeta mineiro, é marcado pelo esforço de
resgate e reconstrução da infância perdida, e com ela da mítica Itabira do Mato
Dentro. Em um movimento próprio à rememoração, que desobedece a qualquer
linearidade do tempo presente, sobrepõem-se animais e frutas da roça, móveis da
casa patriarcal, figuras familiares, temores noturnos, causos de figuras
célebres na cidade e histórias de forasteiros, muitas delas proibidas ao garoto
que a tudo observa com olhos e ouvidos atentos. Em estilo antissentimental, Drummond
transita, com a curiosidade que o acompanhou por toda vida, pela vila de sua
infância, a Belo Horizonte da mocidade e o vasto mundo que chega apenas pelo
jornal, "ilustrado e longínquo". As obras integram a reedição da obra
do poeta pela Companhia
das Letras.
>>> Brasil: Dois novos
títulos da coleção Estudos Árabes ganha edição
Editada pela Ateliê Editorial, a
coleção já tinha publicado quatro volumes. Os títulos de agora são Leão,
o africano, de Murilo Sebe Bon Meihy e Arabia Brasilica, de
Alberto Sismondini. O primeiro parte da comum pergunta se pode o destino de um
homem mudar os rumos de toda uma geração para responder com a história de vida
um exilado granadino chamado Leão, o Africano, que mostra outro lado da
modernidade: a arte de enganar para sobreviver, de traduzir culturas para
negociar e de se fazer o comércio para dominar o conhecimento sobre certos
povos. Leão mudou o curso do Renascimento e está entre alquimistas, artistas,
matemáticos, nobres e Papas da África e do Islã que reivindicam seus lugares na
História Cultural do Ocidente no século XVI. Arabia Brasilica é um
estudo dedicado a alguns autores brasileiros de origem libanesa, como Salim
Miguel, jornalista e escritor, que transforma em romance (Nur na
escuridão) a história de sua família, marcada pela diáspora, Milton
Hatoum, nascido na Amazônia e autor de uma Manaus com Relato de um certo
Oriente e Dois Irmãos e Raduan Nassar, autor de poucos
livros, mas de grande destaque na literatura brasileira dos últimos trinta
anos, aqui presente com Lavoura arcaica e Copo de
cólera.
Quarta-feira,
03/05
>>> Brasil: O romance
mais recente de José
Luís Peixoto, Em teu ventre chega às livrarias brasileira
As aparições
de Nossa Senhora a três crianças em Fátima, interior de Portugal, entre maio e
outubro de 1917, são o pano de fundo de um delicado romance no qual José Luís
Peixoto lança um olhar inusitado sobre um dos episódios mais emblemáticos do
século XX no país. Tomando como protagonista a mãe de Lúcia, a mais velha dos
três pastorinhos que teriam presenciado o milagre, o autor investiga questões
profundas de fé e de ruralidade, mas sobretudo a relação entre mães e filhos. A
maternidade, como bem indica o título, é o ponto fundamental deste livro. Com
rigor histórico e extrema beleza ficcional, esta é uma história permeada de assombro,
milagre e poesia. A edição é da Companhia das Letras.
>>> Brasil: Cenas londrinas, de Virginia Woolf ganha nova edição
Publicadas
no âmbito da coleção Sabor Literário, da José Olympio, as seis
crônicas escritas entre 1931 e 1932 da integram agora uma nova edição; um livro
cujo intuito é traduzir o espírito da década de então e dar ao leitor uma visão
representativa desse tempo. Entre os textos está um descoberto somente em 2005,
na biblioteca da Universidade de Sussex. Nestas crônicas Virginia Woolf
oferece, a partir da perspectiva tanto de grandes homens quanto de cidadãos
comuns, uma visão original, clara e atraente do movimento orgânico das ruas.
Quinta-feira,
04/05
>>> Estados Unidos: Descobertas
novas cartas que revelam uma paixão platônica de Hemingway na juventude e sobra
sua estadia em campo na Primeira Guerra Mundial
Frances
Elizabeth Coates foi colega de turma de Ernest Hemingway. O escritor, mais
tarde, usou o nome Liz Coates para a personagem de uma história publicada em
1923 – “Up in Michigan”. A história dessa paixão platônica é nova na biografia
dos amores (e foram muitas) do escritor. As descobertas das cartas é ainda uma
maneira de compreender sobre o um período da vida do escritor que ainda é
desconhecido para os biógrafos, sobretudo, porque datam de quando Hemingway foi
servir como motorista voluntário de ambulância, em 1918, pouco depois de se
formar. Depois de ferido, o escritor passou uma temporada no hospital de Milão,
de onde partiu as correspondências para Coates. Tinha 19 anos e numa das cartas,
enviadas à irmã da jovem, faz drama dizendo que estava à beira da morte e
precisava do endereço para escrevê-la. Noutra carta, de 15 de outubro de 1918,
Hemingway escreve sobre artigos de papelaria da Cruz Vermelha e sobre a
possibilidade de agora poder se dedicar à leitura e escrita em italiano. Nos
documentos estão fotografias de quando Hemingway esteve ferido e dos dois numa
viagem de barco em 1916 ao longo do Rio Des Plaines próximo e recortes de
jornais guardados por Coates que atestam à subida do escritor ao panteão. Os
materiais também expõem novos mistérios sobre a vida de Hemingway porque
refere-se, nas cartas, a outras missivas enviadas a partir de Kansas City, onde
trabalho como repórter no Estrela de Kansas City, antes de se inscrever como
voluntário da Cruz Vermelha – cartas que nunca foram recuperadas pela família
de Coates. Da troca de correspondência entre os dois a última data de janeiro
de 1927 quando o primeiro filho de Hemingway, John, tinha três anos e – sem o
conhecimento de Coates – o primeiro casamento já havia sido desfeito. Relata
sobre a conclusão de O sol também se levanta, romance que chama de
“doloroso”. Também não se sabe se ela respondeu a esta carta ou existiram
outras trocas de correspondências entre os dois depois disso.
>>> Brasil: Ganha edição
integral um clássico da literatura inglesa, considerado o primeiro romance
feminista
A
senhora de Widfell Hall foi escrito pela filha mais nova da família
Brontë, Anne era irmã de Emily Brontë, autora de O morro dos ventos
uivantes, e de Charlotte Brontë, autora de Jane Eyre —
considerados clássicos da literatura inglesa. Neste livro, a escritora desafia
as convenções sociais do século XIX: a protagonista da obra quebra os paradigmas
de seu tempo como uma mulher forte e independente, que passa a comandar a
própria vida. Ao chegar à propriedade de Wildfell Hall, a Sra. Helen Graham
gera especulação e comentários por parte dos vizinhos. O jovem fazendeiro
Gilbert Markham, por sua vez, desperta um grande interesse pela moça e, aos
poucos, vai criando uma amizade com ela e com seu filho. Porém, os segredos do
passado da suposta viúva e seu comportamento arredio impedem que o sentimento
nutrido pelos dois se concretize, fazendo com que Gilbert tenha dúvidas sobre a
conduta da moça. Quando a Sra. Graham permite que ele leia seu diário a fim de
esclarecer os fantasmas do passado, o rapaz compreende os tormentos enfrentados
por aquela mulher e as razões de suas atitudes. Ela narra sua história até
então, desde a relação com um marido alcoólatra e de conduta abominável até a
decisão de abandonar tudo em nome da proteção do filho. A edição sai pela Editora Record com
tradução de Júlia Romeu.
Sexta-feira,
05/05
>>> Brasil: Novas
incursões do poeta Demetrios Galvão saem em novo livro apresentado na coleção
de poesia editada pela Editora
Moinhos
O livro
chama-se o avesso da lâmpada e é apresentado como "uma
reafirmação, sempre ampliada, de uma poética que já está lá, nos livros
anteriores, e segue em sua sempre 'nova geografia de ideias', na qual o sonho e
a visão imagética são matéria-prima, mas não só. Ainda que as imagens
(oníricas, tão caras aos surrealistas) prevaleçam nos poemas mais prosaicos, é
visível também uma preocupação formal com a concisão, o que o distancia (ainda
que o diálogo com a tradição permaneça) daquele movimento e o distingue pela
construção de uma linguagem própria e uma sintaxe singular, sabendo tratar-se
de um trabalho árduo, esse da "arte com espinhos'." Demetrios é
poeta, professor e historiador, com Mestrado em História do Brasil. Autor dos
livros de poemas Fractais semióticos (2005), Insólito (2011), Bifurcações (2014) e do Objeto poético capsular (2015). Abaixo um poema do livro:
DE ONDE VÊM
AS PALAVRAS?
ser feiticeiro da palavra
estudar a alquimia do coração humano.
João Guimarães Rosa
dizem que nasceram em um ninho de pássaros e
ganharam sentido no voo.
algumas apareceram em um continente distante e
foram trazidas em pequenas mudas, por marinheiros,
na forma de especiarias mágicas.
outras, brotaram no alto das montanhas e
se espalharam feito pólen, levadas pelo vento.
mas há quem diga que as palavras são líquidas e
têm parentesco com os peixes.
os antigos acreditam que elas caíram do céu e
brotaram em forma de árvores por toda a terra.
os índios falam que têm a mesma variedade das frutas,
cada uma com o seu sabor.
os poetas aprenderam sobre o cultivo das palavras.
eles plantam pequenas porções em seus jardins e regam com cuidado.
>>> Brasil: A Ubu Editora apresenta um livro que ata duas pontas para oferecer o em comum entre duas as artes: a da fotografia e a da poesia
Fotografia & poesia (afinidades eletivas), de Adolfo Montejo Navas, parte da relação entre esses dois universos estéticos distantes, que são conectados no livro pela sensibilidade e erudição do poeta, crítico e curador Adolfo Montejo Navas. Com uma análise refinada, o autor traça afinidades eletivas, alianças e reverberações, evidenciando diálogos, conceitos e referências poéticas entre esses dois universos. De um lado, a fotografia, linguagem que influenciou e influencia de maneira marcante a contemporaneidade; de outro, a poesia, em certo sentido uma “relíquia” em nossos tempos, mas que continua a inspirar a humanidade desde a Antiguidade. Nessa cartografia fronteiriça a imagem se destaca como matriz comum, uma defesa expandida da poiesis como linguagem da criação inaugural. Esta obra mereceu pelo ensaio o prêmio Marc Ferrez de Fotografia em 2015, na categoria Reflexão Crítica.
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