Boletim Letras 360º #196
Esta semana é a última para o recesso de final de ano do Letras. Os leitores que nos acompanham há alguns anos conhecem como esse intervalo de descanso funciona: as redes sociais diminuem o fluxo de postagens e por aqui, no blog, apenas estes boletins circulam a cada sábado, mas as matérias também ganham outro ritmo — e o ano só termina quando, no dia 31, entram online as listas com livros e filmes, uma das últimas da web brasileira, pensando que muitos blogs e páginas já soltaram suas preferências ou soltarão nas duas próximas semanas. Ficamos assim por entre trinta e quarenta dias; é, como costumamos dizer, uma pausa para ganhar fôlego para mais um ano de atividades. Recado passado, vamos saber das notícias que compuseram o mural do Letras no Facebook em mais uma semana online.
Ferreira Gullar. Foto: Márcio Vasconcellos |
Domingo,
04/12
Morreu
Ferreira Gullar
O poeta
participou de todos os acontecimentos mais importantes da poesia brasileira.
Quarto dos 11 filhos do casal Newton Ferreira e Alzira Ribeiro Goulart, ele
nasceu José Ribamar Ferreira no dia 10 de setembro de 1930 em São Luís, no
Maranhão. No início da década de 1950, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde, em
1956, participou da exposição concretista que é considerada o marco oficial do
início da poesia concreta. Três anos depois, criou com Lígia Clark e Hélio
Oiticica o neoconcretismo, que valoriza a expressão e a subjetividade em
oposição ao concretismo ortodoxo. Militante do Partido Comunista, exilou-se na
década de 1970, durante a ditadura militar, e viveu na União Soviética,
Argentina e Chile. Retornou ao país em 1977 e foi preso por agentes do Departamento
de Polícia Política e Social no dia seguinte ao desembarque, no Rio. Foi
libertado depois de 72 horas de interrogatório graças à intervenção de amigos
junto a autoridades do regime. Depois disso, retornou aos poucos às atividades
de critico, escritor e jornalista. Eleito em 2014 para a Academia Brasileira de
Letras, coleciona uma vasta lista de prêmios. Em 2007, seu livro
Resmungos ganhou o Prêmio Jabuti de melhor livro de ficção do ano.
Em 2010, foi agraciado com o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário
da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Um ano depois ganhou o Prêmio
Jabuti com o livro de poesia Em alguma parte alguma.
Segunda-feira,
05/12
>>> Brasil: Ferreira
Gullar trabalhava em duas novas edições de suas obras. Os livros serão
publicados em 2017
Saem pela Autêntica Editora. O
primeiro é uma reedição do livro infantil Dr. Urubu e outras fábulas, com
ilustrações de Cláudio Martins e publicado originalmente em 2005. O segundo,
uma coletânea de textos sobre crítica de arte publicados pelo poeta ao longo da
vida em jornais. Segundo a editora e amiga
Maria Amélia Mello, que cuida da obra de Gullar há três décadas, os projetos
eram encaminhados pelo próprio poeta e ele deu a última palavra sobre os mais
de cem ensaios selecionados para o livro. A mesma editora publicou, do poeta,
em 2015, a Autobiografia poética.
>>> Brasil: Agora, quase
toda obra do romeno Max Blecher está publicada por aqui; sai uma edição que reúne poemas
do escritor romeno.
A extinta
Cosac Naify havia publicado Acontecimentos na irrealidade imediata;
depois, a Editora Carambaia editou Corações cicatrizados. Ambos de
prosa. Agora, a Editora
Benfazeja publica uma edição bilíngue (português/romeno) com a poesia
de Max Blecher. Para Caio Russo, quem assina o prefácio da obra, "há em
Blecher uma revolução das sutilezas, seu vanguardismo está em apagar o
histriônico da sensação, em desfazer a medição valorativa entre superfície e
profundidade, recordando-nos que mesmo o peixe-diabo-negro nadando a cinco mil
metros de fundura carrega consigo a pequena luz diuturna encapsulada em seu
corpo". A tradução é de Fernando Klabin.
Terça-feira,
06/12
>>> Brasil: Euclides da
Cunha inédito. Quatro textos e um novo pseudônimo para o autor de Os
sertões
Até agora,
acreditava-se que era a crônica "Em Viagem", de 1884, o primeiro texto
em prosa de Euclides da Cunha; até agora não se sabia que um texto sobre
Gonçalves Dias publicado no jornal Evolucionista, em 1883, e
assinado por Penseroso e Ícaro era do autor de Os sertões. O
primeiro nome refere-se ao poeta amigo Boaventura Pinto e o segundo de
Euclides. A descoberta também está edição da revista Livro,
assinada pelo professor Leopoldo Bernucci, da Universidade da Califórnia em
Davis, e de Felipe Rissato, quem encontrou os textos inéditos de Machado Assis.
Os dois pesquisadores já haviam revelado, em 2015, uma carta inédita que
provava que Euclides havia conseguido uma vaga na escola naval para o irmão de
Dilermando, amante de sua mulher e seu assassino, um ano antes de ser morto.
Mas, até então, os únicos pseudônimos de Euclides conhecidos eram Proudhon e
José Dávila, que ele usou para assinar artigos no jornal O Estado de S.
Paulo. A prova da autoria é uma carta a Boaventura publicada em outro
jornal, o Espectador, assinada por Ícaro. Em 1909, no
Annuario Illustrado do Jornal do Brasil, o mesmo texto é publicado
– dessa vez com a assinatura real do autor. Foram localizados quatro textos de
Euclides. Também no Evolucionista, há um poema – assinado como E.
Cunha– sobre o inconfidente Cláudio Manuel da Costa. Em outro jornal, o
Espectador, Penseroso e Ícaro fizeram outra parceria e escrevem 40
versos do poema "A Infância e o Gênio", que tinha 156 no total. O
texto é também em 1883.
>>> Brasil: Inédito de
Roberto Bolãno estará nas livrarias brasileiras em fevereiro de 2017
O livro foi publicado no México em novembro durante a
Feira Internacional do Livro de Guadalajara. Agora sabe-se que o romance O espírito da ficção
científica, sai em fevereiro pela Companhia das Letras. Trata-se de uma narrativa sobre a trajetória de dois jovens que se iniciam mutuamente na
literatura, no amor e no sexo. Os protagonistas, Remo Morán e Jan Schrella,
dividem um sótão onde escrevem cartas aos seus escritores de ficção científica
favoritos. Amos sonham viver apenas de suas produções literárias. Em outubro, o Letras comentou sobre aqui.
>>> Brasil: O romance Galveias, do escritor português José Luís Peixoto, foi o
grande vencedor do Oceanos — Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa, antigo
Portugal Telecom.
Outro
romance, A resistência, de Julián Fuks, que acabou de ganhar o Prêmio Jabuti
como Livro do Ano na categoria ficção, ficou em segundo lugar. A coletânea de
poemas O livro das semelhanças, de Ana Martins Marques, ficou em terceiro
lugar, e o escritor Arthur Dapieve ficou em quarto com o livro de contos
Maracanazo e outras histórias. Desde o ano passado o prêmio vem sendo
viabilizado pelo Itaú Cultural.
Quarta-feira,
07/12
>>> Brasil: Parque
cultural, romance de Serguei Dovlátov, um dos nomes mais significativos
da literatura russa do século 20, ganha edição por aqui.
A narrativa
de Parque cultural conduz a um estranho lugar no qual “tudo vive e
respira Púchkin”. Nesse parque-museu dedicado a Aleksándr Púchkin, uma espécie
de "Pushkinland", o narrador em primeira pessoa, alter ego do
escritor, desconstrói o mito soviético de Púchkin e cria, ao mesmo tempo, “um
paralelo entre dois mitos”, o próprio e o do maior poeta russo. Toca ainda
em questões da estagnação da era Brejnev, nos anos 1970, como o alcoolismo, a
censura, o antissemitismo e a emigração. E tudo vem permeado por um humor ferino
e inconfundível, numa escrita concisa e poética: ele “era, acima de tudo, um
estilista fabuloso. Seus contos se baseiam, principalmente, no ritmo da frase,
na cadência do discurso do autor. Eles são escritos como um poema”, como notou
seu amigo Joseph Brodsky. Um misto de Gógol e Hemingway, Serguei Dovlátov, cuja
literatura fica num limiar curioso entre a realidade e a invenção, cria em
Parque cultural, uma de suas prosas mais notáveis, um cenário triste e hilário,
grotesco e lírico. Um texto profundamente russo mas repleto de questões gerais,
como o amor e a literatura. A tradução é de Yulia Mikaelyan e edição da Editora
Kalinka.
>>> Brasil: A reedição
da obra de Campos de Carvalho inclui inéditos que serão publicados em 2017.
O primeiro
livro, cf. noticiamos aqui foi o mais conhecido do escritor, A lua vem da
Ásia. Na fila, estão "Vaca do nariz sutil", A chuva
imóvel" e O púcaro búlgaro. A Autêntica, responsável pelo novo
projeto editorial diz que não editará aqueles títulos renegados pelo escritor: Banda forra, com ensaios fazendo piada dos textos sobre a
identidade brasileira, e o romance Tribo. Em 2017, ainda sairá um
volume chamado O espantalho inquieto, que reunirá textos dispersos
e inéditos do escritor. A organização desse título é do pesquisador e crítico
Noel Arantes. Entre os textos que nunca foram publicados em livro, está boa
parte da coluna "Os anais de Campos de Carvalho", publicada no
Pasquim nos anos 1970, o conto "Os trilhos", publicado na
extinta revista Senhor, em 1961 e a novela Espantalho
habitado de pássaros, que saiu em uma antologia de 1965, e dois poemas
inéditos de Campos de Carvalho.
Quinta-feira,
08/12
>>> Brasil: Edição que reúne
toda a poesia de Hilda Hilst e inéditos sai no primeiro semestre de 2017
Desde julho
de 2016, a obra de Hilda Hilst está com a Companhia das Letras;
foi então revelado que se editaria um volume reunindo a poesia completa da
poeta. Pois bem, a obra que tem os 25 livros publicados de 1960 a 1995 e
mais alguns poemas inéditos encontrados na Sala de Memória Casa do Sol e no
acervo da Unicamp sai no primeiro semestre de 2017. Da poesia traz ainda fortuna crítica, que inclui um posfácio de Victor Heringer, entrevistas e
textos de outros escritores. Em 2018, o plano é editar outro volume com a prosa
de Hilda; esta edição intitula-se Da prosa.
>>> Brasil: Projeto de
tradução coordenado por Denise Bottmann quer apresentar um dos dois únicos
livros editado em vida de Henry David Thoreau
Um foi
Walden e o outro A Week on the Concord and Merrimack.
Este último é o que está na vez. A tradução será de Silvana Silva, Marina
Ernst, Marcílio Garcia de Queiroga e Sérgio Leo. O livro sairá pela e-galáxia,
com ilustrações de Gabriela Castro e introdução de Eduardo Vicentini Medeiros.
A Week... foi publicado em 1848. A obra teve que esperar o século
XX para se tornar um clássico da literatura estadunidense. Quando publicado o
interesse da crítica e do público foi parco: a edição inicial, de 2000
exemplares, levou três anos para esgotar; destino semelhante ao vivido por
Moby Dick, de Melville e Folhas de relva, de Whitman,
que só gerações posteriores souberam ler.
Sexta-feira,
09/12
>>> Israel: Mais de 70
anos depois do suicídio do escritor Stefan Zweig encontram vinte e seis cartas
e seis cartões postais trocados com Hans Rosenkranz, um jovem que o austríaco
quis mostrar o caminho para ser escritor
A coleção
está no arquivo da Biblioteca Nacional de Israel e pertencia a Hanah Jacobson,
enteada de Rosenkranz. O jovem, natural de Koenigsberg (atualmente território
russo mas naquele tempo pertencente a Alemanha), tinha 16 anos quando decidiu
escrever a Zweig, já então um renomado escritor; a relação epistolar durou 12
anos e terminou sem aviso prévio em 1933. Rosenkranz mudou-se como muitos
outros judeus para a Palestina movido por suas aspirações sionistas enquanto
Zweig olhava com crescente angústia o futuro de uma Europa sob o fascismo. As
cartas, entretanto, não revelam o olhar pesaroso de Zweig; estão sempre
repletas de mensagens profundas e marcadamente filosóficas. Manuscritas ou
datilografadas, acompanharam Rosenkranz em toda sua existência como um tesouro.
Vê-se uma relação paterno-filial; Zweig dá muitos conselhos ao jovem de como
seguir a vida como judeu numa Europa avessa aos judeus. Isto é, elas são
um documento raro de um homem que mesmo distante de seu continente – estava
refugiado no Rio de Janeiro – não deixou de viver as agruras concernentes ao
seu povo.
>>> Estados Unidos: O sol é para todos e As aventuras de Huckleberry Finn voltam a
ser proibidos em algumas escolas dos Estados Unidos depois de protestos de pais
de alunos. Um condado da Virginia irá levar as obras a julgamento a título de
decidir se as obras serão excluídas em definitivo do programa escolar.
As acusações
contra o livro de Harper Lee e o de Mark Twain são de racismo; o contraditório
é que essas foram sempre obras tratadas como fundamentais para o debate sobre o
tema nos EEUU. A negação à leitura das duas obras chega num momento de intenso
debate na área de Educação neste país sobre a criação de espaços nos quais os
estudantes possam escolher não ler ou ouvir palavras que firam sua
sensibilidade. O sol é para todos se passa no Alabama dos anos 1930 e conta a
história de um advogado branco que aceita defender um negro acusado de estuprar
uma mulher também branca. Já As aventuras de Huckleberry Finn retratam a vida
de um jovem no sul dos Estados Unidos em finais do século XIX. A acusação na
Virginia coloca a obra de Twain no primeiro lugar da lista dos títulos mais censurados
nas escolas estadunidenses. O livro de Lee também não fica para trás: está
entre os primeiros acusados pela linguagem. A lista da censura não é pequena,
entretanto: O grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald, as Vinhas da ira, de
John Steinbeck, Amada, de Toni Morrison e até A cor púrpura, de Alice
Walker estão inscritas nesse rol.
>>> Brasil: A reedição
de uma coletânea de Leonard Cohen mais outra com traduções inéditas
Ainda é
possível encontrar edições de A brincadeira favorita, texto-exemplo
da prosa do escritor canadense publicado no Brasil pela extinta Cosac Naify; mas
a edição de Atrás das linhas inimigas de meu amor há muito que
estava fora de circulação. A Editora 7Letras recoloca a obra no mercado e
acrescenta A mil beijos de profundidade, outra antologia que reúne
uma bela série de textos de seu último livro, A book of longing,
entre outros, além de diversas canções do autor em traduções inéditas. As duas edições
são bilíngues (inglês-português) e os textos reunidos foram escolhidos e
traduzidos por Fernando Koproski.
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