Bertolt Brecht no banco dos réus



Poeta, dramaturgo e teórico, Bertolt Brecht autor de obras famosas como Ópera dos três vinténs (1928) e Mãe coragem e seus filhos (1938) nunca negou ser um marxista comprometido. Propôs um novo teatro para quebrar o que via como confortável às convenções da classe média, tanto o drama trágico como o realista. Sua teoria do teatro épico subjacente à sua prática firmou-se como uma tentativa de chocar o público complacente com o que chamou de Verfremdungseffekt (estranhamento ou efeito de distanciamento).

A enorme influência de Brecht é sentido não só na Europa, mas também fora do continente, como nos Estados Unidos, onde se estabeleceu por um tempo curto, juntamente com muitos outros artistas e intelectuais alemães que fugiam da perseguição nazista.

Em 1943, colaboraram com Brecht os companheiros também exilados Fritz Lang e o compositor Hanns Eisler para um filme Os carrascos também morrem, seu único roteiro produzido para Hollywood, vagamente baseado no assassinato do número dois da Schutzstaffel (a SS), Reinhard Heydrich. A SS era uma esquadrilha de proteção fundada em 1925 com o intuito de proteger Adolf Hitler.

Apesar das atividades antinazistas, em 1947, Brecht foi chamado ate ao Comitê de Atividades Antiamericanas (HUAC, sigla em inglês para House Um-American Activities Committee) acusado de escrever “uma série de poemas, peças de teatro e outros escritos muito revolucionários”.

Até aquela época, o Comitê alimentou-se da paranoia pós-guerra do comunismo subversivo e investigou dezenas de artistas e forneceu o modelo para a caça às bruxas do senador Joseph McCarthy, atuante na década de 1950. O amigo de Brecht, Eisler também foi chamado a depor, depois de ter sido denunciado pela própria irmã.

Brecht foi acusado ao lado de um grupo de roteiristas, o “Hollywood Nineteen”, e foi o único dos doze integrantes desse grupo que compareceu ao HUAC e depois o único que escolheu responder as acusações. Os outros dez, incluindo escritores que estavam já tinha algum tempo na lista negra, como Dalton Trumbo e Ring Lardner, invocou seus direitos contra a incriminação usando da Quinta Emenda. Embora Brechet não tenha sido o único estrangeiro no grupo, como ele mesmo disse, era um ‘convidado’ no país e temia que sua viagem de volta para a Europa fosse adiada se ele não cooperasse. Após seu depoimento, Brecht redigiu em uma carta para Eisler:

“Eu vejo em alguns jornais que certos jornalistas pensaram que eu me comportei com arrogância em Washington; a verdade é que eu simplesmente tinha que obedecer os meus seis advogados que me aconselharam a dizer a verdade e nada mais. Não sendo um cidadão qualquer, eu não podia mais me recusar a testemunhar, o que você conseguiu.”

O depoimento de Brecht tornou-se um tanto lenda. O homem que inventou o teatro contra alienação transforma essa audiência numa espécie de peça de teatro. Brecht não mentiu à comissão; ele negou a adesão oficial a qualquer partido, inclusive, o Comunista, o que não era verdade, mas ficou sendo apenas uma omissão. Confessar sua posição política naquela ocasião era decididamente algo problemático para ele diante da HUAC.

Atestando o espírito teatral de Brecht, suas respostas foram muitas vezes ditas com o tom do equívoco, da ironia, da evasão e desfazendo-se em questões conceituais ou fazendo uso das ambiguidades da tradução. Por exemplo, o investigador-chefe Robert Stripling pede a Brecht que fale sobre “Forward We’ve Not Forgotten” (da peça A decisão), em seguida lê uma tradução em inglês para a canção. Pergunta se ele a tinha escrito, ao que Brecht responde: “Não, eu escrevi um poema em alemão, mas é muito diferente dessa coisa”, provocando risos na plateia.

Em resposta aos tais escritos revolucionários, Brecht responde de forma inteligente: “Eu escrevi uma série de poemas, de canções e de peças de teatro na luta contra Hitler, e é claro que pode ser considerado, portanto, como revolucionário, porque eu fiz para a derrubada desse governo.”

Você pode ler o depoimento de Brecht na íntegra aqui. E ver aqui, um vídeo com trecho do depoimento.



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