10 filmes essenciais a partir das peças de William Shakespeare
O poeta e dramaturgo inglês William Shakespeare tem sido,
mesmo sem saber, um dos maiores roteiristas do cinema. Atende quase pelo epíteto
de infinito a quantidade de obras do gênero produzidas a partir de sua
literatura: uma contagem recente acusava mais de 400 produções, entre longas e
curtas, sendo que entre 2013 e este ano cerca de 12 filmes tendo por base sua
obra foram ou estão em produção. Só Hamlet,
por exemplo, já mereceu meia dúzia de adaptações, seguido de Romeu e Julieta com cinco releituras;
outras obras como, O mercador de Veneza,
Otelo, Sonho de uma noite verão, Macbeth,
A megera domada já tiveram, aos menos,
duas adaptações.
Entre essa leva de títulos, Alfredo Monte indica aos
leitores 10 títulos indispensáveis: “tem o indefectível Hamlet, de Laurence Olivier” que não aparece na lista, “não
desgosto, muito pelo contrário, da versão completa da peça, dirigida por
Kenneth Branagh, mas é ‘estilosa’, amaneirada demais, com seu elenco
irregularíssimo” – por isso prefere a versão russa. Mas, “se é, entretanto,
para indicar somente 10 filmes entre as centenas de versões cinematográficas
(incluindo filmes de fantasia, como o belo Planeta
proibido, que evoca A tempestade),
escolho os seguintes:”
1. Hamlet (1964),
a versão russa de Grigori Kozintsev (com codireção de Iosif Shapiro), até hoje
a mais impressionante que tive oportunidade de assistir, a que se parece mais
com a ideia que tenho da peça. Que fotografia! Um detalhe: o roteiro teve
colaboração de Boris Pasternak (autor de Doutor
Jivago). Apesar do nome finneganswakiano, Innokentiy Smoktunovskiy no
papel-título eclipsa Oliviers, Branaghs etc;
2. Trono manchado de
sangue (1957). Gosto do Macbeth
de Welles, gosto bastante da versão “suja” de Polanski, todavia essa
apropriação da trama shakesperiana para o universo de Kurosawa é arrasadora, e
tem a ligeira vantagem sobre Ran (o Rei Lear do genial diretor japonês) de
ser mais seca, desidratado de grandiloquência. Para mim, um dos filmes
essenciais da história do cinema;
3. Rei Lear (1971).
Peter Brook (que já tinha dirigido Orson Welles numa versão de 1953) encena
quase que com um espírito bergmaniano esta belíssima e controversa versão (que
parece ter sido filmada nos confins do universo, no território da desolação). E
que ator é Paul Scofield, um dos maiores entre os maiores. Listo o de Brook,
mas é bom lembrar do filme de Kurosawa (e, claro, da versão do mesmo Konzintsev
do Hamlet acima, e que sempre foi
muito difícil de ter a oportunidade de assistir);
4. Otelo (1952).
A versão de Orson Welles vale mais pelo visionarismo e visceralidade do próprio
diretor do que exatamente pela harmonia do conjunto (para a qual contribuiu
principalmente a caracterização do próprio e ultranarcisista diretor no
papel-título). Ainda assim, um filme grandioso. A versão corretinha de Oliver
Parker, de 1995, tem, para mim, a melhor e mais linda Desdêmona do cinema,
Irène Jacob;
5. César deve morrer
(2011). Ainda que o filme de 1953 de Joseph L. Mankiewcz seja o mais bem-sucedido
e equilibrado espetáculo hollywoodiano já levado a cabo utilizando uma tragédia
shakesperiana (além de ser um grande momento de James Mason), há muitos anos já
não esperava mais nenhuma versão realmente inovadora e brilhante de uma peça do
bardo. E eis que os irmãos Taviani resolvem a equação de forma genial e
simples: colocando presidiários para interpretar o drama da conspiração romana.
Um dos maiores filmes recentes;
6. A megera domada (1967). Não posso
dizer que sou muito fã de Franco Zeffirelli. Mas, se algum dia ele já acertou a
mão num filme, foi nessa deliciosa travessura do casal Elizabeth Taylor-Richard
Burton, inspiradíssimo nos seus arrufos e arrulhos, numa encenação bela de ver,
leve, dinâmica, cheia de verve e charme;
7. Como gostais
(1936). Um jovem Laurence Olivier (ainda sem aqueles maneirismos canastrônicos
que ele foi cristalizando no cinema) atua, nessa adaptação dirigida por Paul
Czinner, no papel de Orlando, naquela que é a comédia mais espirituosa e
engenhosa de Shakespeare. Apesar do roteiro não dar conta plenamente disso, o
filme tem aquele timing dos anos
1930, e pode ser uma boa introdução para quem quer começar a conhecer o lote
menos trágico da sua obra;
8. Henrique IV -
2ª. parte (2012). Richard Eyre não é um grande diretor, longe disso, mas ele
fez a mais cirúrgica e precisa adaptação de uma peça histórica de Shakespeare,
pelo menos em anos recentes. Essa segunda parte é bem mais interessante que a
primeira (diga-se a verdade: é impossível entender todos os imbróglios ligados
à sucessão real dessas peças). Jeremy Irons, soberbo;
9. O mercador de Veneza (1973). E
eis uma interpretação shakespeariana de Laurence Olivier na lista, enfim! Na
verdade, incluo este telefilme de John Sichel porque foi a primeira vez, quando
eu ainda era garoto, que um texto de Shakespeare me despertou a atenção,
siderado que eu fiquei com as cenas de julgamento, as réplicas, a atmosfera
toda dessa estranha peça;
10. Sonho de uma noite de verão
(1935). Acho que Max Reinhardt deu o toque de classe, o “plus” ao codirigir com
William Dieterle uma versão americana da sublime farsa sazonal, muito menos
ridícula e forçada (talvez pela pátina nostálgica) que quase todas as versões
posteriores das comédias shakespearianas com elencos mais castiços. O elenco é
inusitado, indo de James Cagney (não, não, ele não interpreta Puck, papel de
Mickey Rooney, mas encarna Bottom, curiosidade que já valeria uma olhada no
filme) a Olivia de Havilland (Hermia).
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