Conjunto de correspondências inéditas de Mary Shelley virão a lume em breve

Até então desconhecido, selo com carimbo para correspondências de Mary Shelley.
O achado faz parte de uma "descoberta do acaso" da pesquisa Nora Crooker.
Foto: Keith Crook/ The Guardian

Era apenas um clique ocioso num site para Nora Crook fazer uma descoberta das mais importantes para sua carreira acadêmica. Professora emérita na Anglia Ruskin University e especialista no período romântico da literatura estadunidense, na ocasião ela buscava na internet informações sobre a romancista Mary Shelley. No clique ocioso, uma lista de 13 arquivos associados ao site Essex Record Office – uma plataforma de arquivos on-line. A lista de treze arquivos estava denominada com o título “Carta de Mary Wollstonecraft Shelley”.

“Eu pensei, mas o que é isso, e cliquei no link” – relembra a pesquisadora que logo teve certeza da originalidade dos arquivos e do seu ineditismo. Graças ao puro acaso, Crook tinha à sua frente a maior coleção de cartas inéditas da autora de Frankenstein; uma descoberta e tanto em décadas sem muitas novidades do gênero em torno do nome de Shelley.

As missivas datam de entre 1831, nove meses depois da morte de seu marido, o poeta Percy Bysshe Shelley, e 1849, quando Mary Shelley estava já indisposta pela acentuação dos sintomas que lhe afligiam o tumor cerebral que iria matá-la dois anos depois. Mostram uma mulher hábil em conseguir o apoio dos amigos e próximos a ela, explodindo de orgulho e ao mesmo tempo preocupação com seu filho adolescente.

As últimas cartas escritas à mão leve são curtas e cheias de frases distraídas, pedindo desculpas pela falha de memória. Algumas delas ainda estavam lacradas com uma bolha de cera escarlate com carimbo da própria autora – designativo que até então não era conhecido, de acordo com Crook.

Há correspondências escritas para Horace Smith e sua filha Eliza. Smith era um corretor da bolsa e era amigo da família de Shelley desde quando se tornou viúva. Essas cartas, em particular, constituem uma surpresa especial – diz a pesquisadora – uma vez que Smith tinha por hábito destruir as correspondências com o teor que se apresenta, com determinados pedidos de favores. Para Crook um testamento sobre uma amizade até então despercebida pelos biógrafos da escritora.

O mais tocante dos conteúdos das cartas está no orgulho que Shelley nutre pelo filho, único dos homens que sobreviveu à infância: “Percy está crescendo muito bem e é um jovem que tem desenvolvido seus gostos e talentos que faz lembrar de seu pai.” Depois que o filho vai estudar em Cambridge, escreve: “Ele está recebendo tudo o que poderia desejar – está ficando mais liberal – e tem muita personalidade e talento – embora seja ainda tímido – eu tenho toda a esperança sobre sua felicidade futura. Sua natureza doce me paga os muitos anos de tristeza.” Mais tarde escreve da triste surpresa de que ele não é mais alto que pensaria que fosse chegar.

O abalo de sua saúde, cada vez mais debilitada com o avançar dos anos dificulta a comunicação nos últimos anos. “Hoje fui descer as escadas e tomei um tombo pela primeira vez – espero não ter uma recaída”, escreve a Eliza em 1846. O surpreendente em tudo, observa Crook, é que, nenhum momento ela menciona Frankenstein, mesmo nas cartas de 1831, ano em que o livro foi republicado.

As cartas deverão ser publicadas em breve pela Keats-Shelley Journal. Para os editores do periódico elas desenterram um passado importante da vida de Shelley. Satisfeita, Crook diz ser muito gratificante um descoberta do gênero. “Talvez nada disso se repita novamente comigo, mas eu queria era que todo pesquisador também tivesse a sorte de descobertas como esta que tive.”


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