O conselho de John Updike para os jovens escritores
John Updike (ainda falaremos desse sujeito muito por aqui)
disse certa vez que sua tarefa e “única obrigação” era “descrever a realidade
como ela tinha chegado a mim – dar ao mundo sua beleza devida.” Termos que
parecem ir na esteira do que disse Stendhal ainda muito antes do boom da literatura naturalista, “Um
romance é um espelho que passeia pelo real”. Nas duas afirmações não está em
questão a ideia de reprodução ou cópia da realidade, mas de criação a partir
dela. Descrever a realidade tal qual ela vem até a mim é oferecer uma
possibilidade dentre tantas de leitura do mundo; do mesmo jeito aquilo que reflete o
espelho não é uma mera cópia do refletido, mas uma recriação do que se reflete.
A crítica tem lido toda obra de Updike por essa ótica
defendida pelo escritor e atesta que, sim, ele alcançou essa qualidade. Com um
olho afiado e um intelecto criativo, o autor de Coelho cresce buscou reconstituir os detalhes da vida cotidiana
alinhavando possibilidades por um tênue fio lírico. “Ele se tornou frase
melhor do que ninguém”, disse Ian McEwan quando da morte de Updike em 2009.
Philip Roth acrescentou, “John Updike é o maior homem de letras de nosso tempo,
um brilhante crítico literário e ensaísta, além de romancista e contista. Ele é
e sempre será um tesouro nacional e um precursor de Nathaniel Hawthorne.”
Em junho de 2004, Updike deu uma entrevista para o Academy of Achieyement, um grupo sem
fins lucrativos com sede em Washington cujo objetivo é o de motivar jovens para
o sucesso. Numa conversa aberta, Updike é perguntado se ele tem algum conselho
para os escritores que estão apenas começando: “Você hesita em dar conselhos
aos jovens escritores”, disse o escritor, “porque há um limite para o que você
pode dizer... Que não é exatamente como ser músico, ou até mesmo um artista, em
que há um número definido de competências que têm de ser dominadas.” No
entanto, ele continua fazendo várias sugestões:
“Para os jovens escritores, limito-me a dizer: ‘Tente
desenvolver hábitos de trabalho reais, e mesmo que você tenha uma vida muito
atribulada, tente reservar uma hora, por exemplo, ou mais, do dia para
escrever.’ Algumas coisas muito boas têm sido escritas numa hora por dia. Henry
Green, um dos meus poetas de estima, era na verdade um industrial. Ele estava
correndo sempre por causa da empresa, mas ao voltar para casa e escrevendo em
apenas uma hora, escreveu livros maravilhosos dessa maneira. Então, deve levar à
sério essa cota do tempo."
"Tente pensar em se comunicar com algum leitor ideal
em algum lugar. Tente pensar numa impressão. Não se contente apenas ser chamado
de escritor e, ser cão fiel às grosserias do mundo editorial que não aceitam
publicar seu material. Ainda somos um país capitalista, e escrever, até certo
ponto, é uma empresa capitalista, e quando não, é um pecado total para tentar
construir uma audiência viva. ‘Leia o que lhe excita’, seria um conselho, e
mesmo que você o imite, você vai aprender com isso. Todos esses romances de
mistério que eu li acho que me deram alguma lição sobre como manter um enredo
tenso, tentando avançar ou fazer o leitor sentir que tipo de tensão está sendo
alcançada. Fora isso, não tente ficar rico. Se você quer ficar rico, você deve
ir em busca de um investimento ou de ser um certo carreira de advocacia... Mas, por
outro lado, eu gostaria de pensar que num país desses, grande, e com uma
linguagem ainda maior, deveria haver uma vida para alguém que se importa e
quer entreter e instruir pela leitura.”
A entrevista completa pode ser vista e lida aqui.
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