Maurice, de James Ivory
Por Pedro Fernandes
O filme é de 1987; é uma adaptação de Maurice, de E. M. Forster e um dos que revelaram para o cinema o
ator Hugh Grant, que dividiu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Veneza, no
ano seguinte. Talvez seja clichê dizer que estamos diante de uma narrativa sobre
os limites do amor, sua existência e a superação deles. Maurice, depois de
apresentado por Risley para participar de um dos clubes privados de discussões muito
comuns nas universidades europeias de meados do século XIX, se aproxima de
Clive Durham. A princípio, os dois desenvolvem uma amizade fora do comum; das
amizades em que ambos são capazes de alterar suas rotinas e planos do dia para
estarem juntos. A intimidade dos dois chega ao limite de se perceberem que,
mais que a amizade, há entre os dois uma natureza variada de sentimentos, como
desejo, paixão, amor carnal.
Nesse instante instala-se o drama: a atitude de Maurice em
assumir seu amor por Clive, o repúdio de Clive e depois a assunção comporá o
movimento da trama narrativa até o seu desfecho. É preciso que se diga o
contexto social no qual ambos estão situados para compreender a necessidade do
ir e vir da trama, capaz de provocar no telespectador mais ingênuo uma torcida
interna pelo final feliz dos dois. Maurice e Clive vivem na Inglaterra em que a
homossexualidade era considerada crime de sodomia e assim terá sido até meados
do século passado. Diante do desfecho trágico de muitos gays próximos aos dois –
que ora foram condenados à prisão e trabalhos forçados, ora foram abandonados
pelas famílias e assassinados como indigentes, é natural que antes de qualquer
loucura que justifique um amor sem limites, a situação tenha um peso negativo
para um ou ambos os lados.
Como numa relação há sempre um dos lados que ama mais que o
outro, não será diferente dessa vez. Depois de ser expulso de Cambridge por
matar aula para passar o dia sem fazer nada, Maurice decide fazer carreira no
mercado financeiro como o pai; Clive, depois de formado quer ingressar na
carreira pública como político. Ao sentir-se pressionado socialmente pela ligação
com o amigo é Clive que deixará de apostar na plenitude romântica do amor entre
os dois. Quer manter-se próximo a Maurice, com os encontros sexuais dentro das
possibilidades de não ser descoberto, mas Clive casa-se com Anne. A capacidade
racional do amigo em lidar com a situação, faz Maurice buscar tratamento psicanalítico,
na possibilidade de que sua homossexualidade pudesse ser revertida. Tratamento que
não dará em nada.
Tomado pelo desejo de estar junto a Clive e,
simultaneamente, se sentido desprezado pelo único amor, Maurice buscará
completar-se com um empregado da propriedade do amigo. O encontro repentino
entre os dois é garantia única para que o amor de Maurice por Clive desande em
definitivo; a partir de agora é Alec Scudder, é este o nome do segundo sujeito
na sua vida amorosa, a quem Maurice dedicará seu interesse de realização da felicidade.
Depois de A room with
a view, adaptação também de um romance de E. M. Forster, James Ivory, então
indicado a oito categorias no Oscar pelo filme, cumpre com Maurice uma tradição que se iniciou ainda no final da década de
1970, de transpor para as telas, clássicos da literatura inglesa do fim do
século XIX e início do século XX. Apesar de Maurice
não ter tido grande aceitabilidade pela crítica – muito provavelmente pelo tema
– o filme consegue, diferentemente de outros do gênero, dramatizar uma relação de
amor proibido, por vários ângulos possíveis. Em 1992, entretanto, Ivory retorna
à forma e Howard’s end, outro filme
baseado numa obra de Forster, tem o reconhecimento merecido. Ainda assim, Maurice levou o Leão de Prata para
Melhor Diretor e ainda obteve uma indicação ao Oscar como Melhor Figurino.
Ligações a esta post:
>>> Há notas sobre o livro de E. M. Forster.
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