James Joyce e a explicação de um desenho
Uma das imagens mais comuns na web quando o assunto da pesquisa é James Joyce é uma em que o
escritor aparece com o olho esquerdo coberto por uma bandana preta. Quem tiver
lido algumas notas esparsas sobre terá sabido que Joyce teve sérios problemas
com visão. Quando ainda tinha seis anos de idade recebeu o seu primeiro
conjunto de óculos e, quando ele tinha vinte e cinco anos, veio o primeiro caso
de irite, um tipo de inflamação muito dolorosa que ocorre na região do olho
responsável pela decomposição das cores, a íris.
Católico, o nascimento da sua filha foi oportunidade para
que a santa dos olhos fosse homenageada e ela foi batizada com o nome de Lucia.
Sem milagres, Joyce teve de suportar uma série horrenda de cirurgias e
tratamentos não apenas para olho esquerdo, mas também para o direito, incluindo
a remoção de partes da íris, aplicação de sanguessugas diretamente no olho para
remoção de líquidos e até mesmo a retirada de todos os seus dentes pela teoria
de que sua irite recorrente estava ligada a uma infecção bacteriana em sua dentadura,
causada pelo descuido com a higiene bucal nos anos de pobreza.
Depois de uma cirurgia em 5 de dezembro de 1925, de acordo
com Gordon Bowker em James Joyce: a new
biography, ainda sem tradução no Brasil, Joyce era incapaz de ver qualquer luminosidade devido as dores contínuas da operação; chorava muito e ficava
muito nervoso porque era incapaz de raciocinar com equilíbrio. Passou ser
dependente dos que estavam ao seu redor para ações simples como chamar um táxi
e levá-lo ao lugar aonde queria ir. Durante o dia, quando não saía de casa, passava
o dia deitado em um sofá, profundamente triste; querendo trabalhar, mas incapaz
de fazer qualquer coisa.
No início do ano seguinte, Joyce teve uma pequena melhora
num dos olhos. Foi nessa época, janeiro
de 1926, contam, que ele fez uma visita ao amigo Myron C Nutting, um pintor
estadunidense que tinha seu estúdio na Montparnasse, em Paris. Para demonstrar
que sua visão estava a melhorar, Joyce pegou um lápis preto e fez alguns
rabiscos numa folha de papel junto com uma caricatura de um homem com ar
malicioso, de chapéu e amplo bigode, e disse sê-lo Leopold Bloom, o
protagonista do seu romance, Ulysses.
Ao lado da caricatura, Joyce escreveu em grego – “com um pequeno erro de grafia
e acentos distorcidos”, diz R. J. Schork em Greek
and Hellenic Culture in Joyce – a passagem de abertura da Odisseia, de Homero: “O homem
multiversátil, Musa, canta”¹
Esse desenho de Bloom feito por Joyce atualmente faz parte
do acervo da Biblioteca Charles McCormick Deering e integra as coleções especiais
da Universidade de Northwestern. Nutting foi uma fonte importante para a
escrita da biografia do autor de Ulysses
composta por Richard Ellmann, então professor em Northwestern. De acordo com
Scott Krafft, curador da coleção de especiais da biblioteca, Ellmann foi um dos
que intermediaram o acordo ainda na década de 1960 para que a biblioteca
adquirisse as pinturas que Nutting fez de James Joyce e Nora, além de seus
feitos para os filhos do casal.
¹ Utilizamos a tradução do Trajano Vieira, publicada pela
Editora 34.
O texto foi escrito a partir de livre tradução de matéria na Open Culture.
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