Moby Dick, de Herman Melville




Há escritores de um livro só. Mesmo que tenham escrito uma leva significativa de textos, mas ainda assim são reconhecidos por apenas um texto. No Brasil, Herman Melville, um dos nomes principais da literatura estadunidense, é um deles. Há outros livros seus traduzidos por aqui, como Taipi, seu primeiro romance, Benito Cereno, Billy Budd e Bartleby, o escrivão – uma história de Wall Street. Mas, se perguntado, mesmo entre os do público de leitores assíduos, o citado será sempre Moby Dick. E pensar que quando o romance foi lançado há 160 anos foi considerado um fracasso porque não conseguiu atingir os 3 mil na sua primeira impressão. Também não era de se esperar, depois disso, que pudesse, tanto depois ser lido como um dos principais textos da literatura produzida nos Estados Unidos. E alcançou. Está no panteão de livros que já têm sua própria legião como Os irmãos Karamazov, de Dostoievski, ou Anna Kariênina, de Tolstói.

Com um enredo bastante completo a narrativa do romance de Melville tem início quando Ishmael, personagem e narrador, toma a decisão de se aventurar no mar e embarca no baleeiro Peqoud, nome esse que retoma o da primeira tribo indígena exterminada pelos colonizadores brancos. Já depois de vários dias em alto mar o capitão da tripulação Ahab revela o objetivo da viagem que é o de caçar e matar a baleia gigante conhecida como Moby Dick aí responsabilizada pela mutilação de uma das pernas de Ahab.

O livro foi originalmente publicado em três fascículos com o título Moby-Dick ou a baleia em 1851, em Londres; no mesmo ano ganha uma edição integral em Nova York. Como ponto de partida, Melville tomou o naufrágio do navio Essex, comandado pelo capitão George Pollard, quando este foi atingido por uma baleia. O romance, no entanto, se beneficia de uma série de elementos, desde às intricadas e imaginativas descrições das aventuras do narrador-personagem, aos intertextos com detalhes sobre o universo das baleias ou os métodos de caça da época. Fruto, todas essas considerações, das próprias experiências do autor em navios baleeiros. É sabido que antes de completar 20 anos Melville embarcou na sua primeira viagem marítima como marujo num navio Mercante rumo a Liverpool, experiência que terá repetido ao longo de sua vida e numa delas, a mais longa, 18 meses, acompanhando expedições de caça às baleias. Jonh Updike conta Herman começou a escrever o romance em Nova York, onde vivia com a esposa grávida, um filho pequeno e uma leva de parentes. A forma do livro teria sido ganhada quando o escritor mudou-se para uma fazenda vizinha à de Hawthorne, o autor de A letra escarlate, um dos admiradores de Melville e a quem dedicou Moby Dick.

Cena de Moby Dick. O filme teve Gregory Peck (foto) como o capitão Ahab, lendário inimigo da baleia branca.

Pelas razões intimistas do narrador, Felipe Cruz num texto para o blog da Cosac Naify (aqui) considera Moby Dick um itinerário da alma humana, “um mapa para os tortuosos caminhos do espírito.” A odisseia de Melville é vista por ele como mais uma obra que tem no embate entre prosa e poesia, racionalização e abstração, inteligência e incompreensível como bases para a sustentação da trama: “O absurdo que a terrível baleia branca personifica jamais poderá ser inteiramente dominado pela determinação sistemática e doentia de Ahab, personagem que desde sempre já perdeu a batalha em que transformou sua existência. Da mesma forma, Melville luta bravamente ao impor uma narrativa clara e objetiva a um universo prenhe do mais incontrolável desespero, da mais tirânica sensibilidade.”

Além de uma circunavegação pelos caminhos da alma humana, alguns críticos, como Daniel Puglia, concordam que Moby Dick – pela ideia de domínio da razão sobre a emoção numa trajetória cujo fim prima pela destruição – é um romance que pode ser lido como uma alegoria acerca do nascimento dos Estados Unidos.

Somente em 2008, o livro ganha uma versão definitiva no Brasil, versão essa feita por Irene Hirsche por Alexandre Barbosa de Souza que conjugam a larga experiência com o romance de Melville e um minucioso trabalho de pesquisa de vocabulário náutico. A edição publicada pela Cosac Naify incorpora três textos tidos como fundamentais à compreensão do romance: uma resenha de Evert Duyckinck, publicada em 1851, um ensaio de D. H. Lawrence que aparece incluído no livro de 1923 Estudos sobre Literatura Clássica Americana recém-editado no Brasil pela Zahar Editora e um parte de um estudo escrito por F. O Mathiessen, de 1941.

Moby Dick teve uma adaptação para o cinema em 1956, por John Huston.

Ligações a esta post:
>>> Há um projeto on-line de edição de um áudio-book para Moby Dick sobre o qual falamos aqui.
>>> Matt Kish, artista plástico, e as ilustrações página a página para o livro de Melville, aqui.



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