Uma garrafa no mar de Gaza, de Thierry Binisti
Por Pedro Fernandes
Se houve uma questão que perpassou boa parte dos
filmes franceses exibidos este ano no Festival Varilux de Cinema Francês foi a
dos trânsitos identitários e posso, de memória citar, aleatoriamente, o título
de alguns desses filmes: Aliyah, Americano, O barco da esperança, Intocáveis,
E agora, aonde vamos?, e este Uma garrafa no mar de Gaza.
Pode ser que não seja, neste, como em alguns dos
outros citados, uma questão central, mas o tema está lá. Aqui, Thierry Binisti,
elege a história de um amor impossível tal qual o dos clássicos que nós já conhecemos,
mas, a família rival, é substituída pela pátria e, diferentemente do amor à
primeira vista, é um amor que se constrói meio pela passagem do tempo a partir
de um acaso; isso porque é a partir de uma garrafa lançada ao mar em Israel e
encontrada por um grupo de adolescentes na Palestina, desse simples fato, que
se instaura o enredo amoroso.
Percebo que não foi interesse do cineasta tratar
meramente da descoberta do amor, mas pela sutileza e talvez pela secular ideia
de que o amor vence todos os cercos reais e imaginados, propor uma reolhar para
ódio também secular que separa dois países. Mas, também não é interesse
discutir politicamente esse ódio e atribuir ao telespectador a capacidade de
opinar qual dos dois lados está com a razão. Isto é, parece não haver uma preocupação
em reatualizar o mito do amor impossível e nem ser um panfleto sobre a questão Israel-Palestina
e o filme conseguirá atingir muito bem o seu pretexto. Antes tudo, até mesmo de
uma história de amor, Uma garrafa no mar
de gaza quer singularizar a ideia de superação como elemento primordial
para revisão das formas identitárias.
A atitude de um dos adolescentes em responder o
bilhete disposto na garrafa o colocará diante de Tal, uma francesa que mora com
a família em Jerusalém. A troca de correspondências eletrônicas entre os dois
num território movediço entre a vida e a morte, já que tanto os moradores de
lá, quanto os de cá estão à mercê das bombas, num conflito que é mais impiedoso
que o da guerra propriamente dita, porque o limite entre viver e morrer é
determinado, mas que naturalmente, artificialmente ao sabor do acaso.
O contato de Naim com Tal, levará o rapaz, filho
único e órfão de pai que fora um homem bomba, ao contato com uma nova cultura e
a um destino diferente do já elaborado pela família que é, a exemplo do primo Hakim,
casar e continuar levando os negócios da família. Naim trabalha para o tio e
com este primo numa confecção com o serviço de transporte e entrega de encomendas.
Conhecendo Tal, tem a iniciativa de estudar francês e, dedicado ao idioma,
consegue uma bolsa de estudos em Paris. O itinerário dessa conquista é responsável
por toda carga emotiva do filme, daí porque entendo ser este um filme sobre a superação.
Singular no conjunto de cenas é o cruzamento solitário de Naim da fronteira
entre Palestina e Israel, como se denotasse ali, a possibilidade de uma via
outra, ou mesmo um ato de resistência que não o de desperdício da vida em nome
de pátria.
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